O Que é o Marxismo?

Chris Harman


A Classe Trabalhadora


Marx iniciou o Manifesto do Partido Comunista com a declaração,

«A história de toda a sociedade até aqui é a história de luitas de classes».(1)

Para a classe dominante a questão crucial era obrigar a classe oprimida a produzir riquezas. Devido a isso, em todas as sociedades anteriores, ocorreram enormes luitas entre as classes, que frequentemente culminaram em guerras civis — a insurreição de escravos na Roma Antiga, as revoltas camponesas na Europa Medieval, as grandes guerras civis e revoluções dos séculos XVII e XVIII.

Em todas essas grandes luitas, a massa das forças insurgentes vinha da parte mais oprimida da sociedade. Mas, como Marx logo acrescentou, no final todos os seus esforços serviram apenas para substituir uma minoria dominante por outra. Assim, por exemplo, na China Antiga, houve várias revoltas camponesas vitoriosas, mas substituíram um imperador por outro. Da mesma forma, aqueles que fizeram os maiores esforços durante a Revolução Francesa eram o “bras nus”, as classes mais pobres de Paris, mas no final, a sociedade acabou não sendo governada por eles, mas polos banqueiros e industriais que assumiram o lugar do rei e dos seus cortesãos.

Houve duas razões para esta impossibilidade das classes oprimidas em manter controle sobre a revolução para a qual tinham luitado. A primeira, o nível geral de riqueza da sociedade era bastante baixo. Foi apenas porque a grande maioria das pessoas foi forçada a uma enorme miséria que uma pequena minoria tinha tempo e lazer para desenvolver as artes e ciências para manter a civilização. Noutras palavras, a divisão da sociedade em classes era necessária para progredir.

Em segundo lugar, o estilo de vida da classe oprimida não a preparou para assumir o controle da sociedade. Em geral eram analfabetos, faziam pouca ideia do que acontecia além do seu ambiente imediato e, acima de tudo, a maneira como estava organizada jogava uns contra os outros. Cada lavrador só se preocupava polo seu próprio pedaço de terra. Cada artesão nas cidades cuidava do seu próprio estúdio, de alguma forma em concorrência com os outros, não unido com eles. As revoltas camponesas começavam com um vasto movimento que se levantava para dividir as terras do senhor, mas assim que o derrotaram, começava a luita sobre como esta terra seria dividida. Como Marx sublinhou, os camponeses eram como “batatas no saco”: podiam ser mantidos juntos sob a pressão de uma força externa, mas eram incapazes de se unir permanentemente para defender os seus próprios interesses.

Os trabalhadores que criam a riqueza sob o capitalismo moderno diferem de todas as classes anteriores. Primeiro porque a divisão da sociedade em classes já não é mais necessária para o desenvolvimento da humanidade. Há tantas riquezas criadas que o capitalismo periodicamente destruiu uma enorme quantidade em guerras e crises. Estas riquezas poderiam ser partilhadas com equidade e sociedade continuaria progredindo nas ciências, nas artes, etc.

Em segundo lugar, a vida sob o capitalismo prepara de várias maneiras os trabalhadores para tomar o controle da sociedade. Por exemplo, o capitalismo necessita de trabalhadores treinados e educados. Além disso, força milhares de pessoas a trabalhar em fábricas enormes e morarem em conurbações cada vez maiores, onde elas ficam em contato próximo, e onde eles podem se tornar uma poderosa força de mudança social. O capitalismo força os trabalhadores a cooperar na produção dentro das fábricas. Esta cooperação pode voltar-se contra o sistema, como quando os trabalhadores se organizam num sindicato. Por estarem concentrados em grandes unidades, torna mais fácil para os trabalhadores exercerem o controle democrático destas estruturas. Cousa que não acontecia com as anteriores classes dominadas.

Além disso, o capitalismo tende a transformar grupos de pessoas que se acham superiores (como gerentes e técnicos) em trabalhadores salariados que são forçados a organizar-se igual que os outros trabalhadores.

Finalmente, o desenvolvimento das comunicações — ferrovias, estradas, transporte aéreo, correios, telefone, rádio e televisão — vem permitindo aos trabalhadores se comunicarem fora da sua própria cidade ou indústria. Podem se organizar como classe em escala nacional e internacional — o que era inimaginável para as classes oprimidas anteriores.

Todos esses fatores fazem que a classe trabalhadora não seja apenas uma força capaz de se rebelar contra o sistema, mas que pode organizar-se, eleger os seus próprios representantes a fim de mudar a sociedade segundo os seus próprios interesses, e não apenas para instalar no poder outro imperador ou grupo de banqueiros.

Como disse Karl Marx:

Todos os movimentos históricos foram, até agora, realizados por minorias ou em proveito de minorias. O movimento proletário é o movimento espontâneo da imensa maioria em favor da imensa maioria”.


Nota do tradutor:

(1) veja Burgueses e Proletários (retornar ao texto)

Inclusão 18/09/2010