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Transcrição de: Alexandre Linares para o Marxists Internet Archive, 2004.
HTML por José Braz para o Marxists Internet Archive, 2004.
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Todos os centros industriais e comerciais da Inglaterra têm agora uma classe operária dividida em dois campos inimigos: proletários ingleses e proletários irlandeses. O operário inglês comum detesta o operário irlandês como um concorrente que rebaixa seu nível de vida, sente-se a seu respeito, como membro de uma nação dominante e torna-se, desta forma, um instrumento de seus aristocratas e capitalistas contra a Irlanda e assim consolida seu poder sobre si próprio. Preconceitos religiosos, sociais e nacionais jogam-no contra o operário irlandês, comporta-se em relação a ele, mais ou menos como os brancos pobres contra os negros, nos antigos estados escravistas da União americana. O irlandês lhe paga na mesma moeda; vê nele simultaneamente o cúmplice e o instrumento cego da dominação inglesa na Irlanda.
Este antagonismo é mantido artificialmente e atiçado pela imprensa, pelos sermões, revistas humorísticas, enfim, por todos os meios de que dispõem as classes no poder. Este antagonismo constitui o segredo da impotência da classe operária inglesa, a despeito de sua boa organização. É também o segredo da força persistente da classe capitalista, que disto se dá conta perfeitamente.
Mas o mal não acaba aí. Ele atravessa o oceano. O antagonismo entre ingleses e irlandeses é a razão oculta do conflito entre os Estados Unidos e a Inglaterra. Ele impede qualquer colaboração séria e sincera entre as classes operárias dos dois países. Ele permite aos dois governos mascarar, quando lhes convém, o conflito social, excitando os dois países um contra o outro e, em caso de necessidade, provocando uma guerra.
A Inglaterra, metrópole do capital, potência até agora dominante no mercado mundial, é no momento o país mais importante para a revolução operária e além disso o único país onde as condições materiais desta revolução chegaram a um certo grau de maturidade. Por isso, a Associação Internacional dos Trabalhadores visa, antes de mais nada, acelerar a revolução social na Inglaterra. E o único meio de conseguí-lo é tornar a Irlanda independente.
Eis porque a Internacional deve sempre dar prioridade ao conflito entre a Inglaterra e a Irlanda, tomando abertamente o partido desta última. A tarefa especial do Conselho Central em Londres é despertar na classe operária inglesa a consciência de que a emancipação nacional da Irlanda não é para ela uma abstrata questão de justiça e de humanitarismo, mas a condição primeira de sua própria emancipação social.
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Minha intervenção na questão da amnistia irlandesa e além disso, a proposta que fiz, de discutir no Conselho Geral(2), a posição que a classe operária inglesa deve adotar a respeito da Irlanda e sobre ela deliberar, tudo isto naturalmente não tinha outro objetivo senão falar abertamente e de forma decisiva a favor dos irlandeses oprimidos, contra seus opressores.
Pouco a pouco cheguei à convicção, falta apenas inculcá-la na classe operária inglesa, de que ela nada poderá fazer de decisivo, aqui na Inglaterra, enquanto não romper da maneira mais clara, em sua política irlandesa, com a política das classes dominantes; enquanto não associar seus interesses aos dos irlandeses, também não tomará a iniciativa de dissolução da União forçada de 1801 e de sua substituição por uma confederação igualitária e livre. É preciso visar esta meta, não por simpatia à Irlanda, mas como uma reivindicação no próprio interesse do proletariado inglês. Senão, o povo inglês continuará a ser tutelado pelas classes dirigentes, pois ele é obrigado a unir-se a elas para enfrentar a Irlanda. Todo movimento popular, na própria Inglaterra, está paralisado de antemão pela contenda com os irlandeses que constituem, na própria Inglaterra, uma fração muito importante da classe operária. Aqui, a condição primeira da emancipação - a derrubada da oligarquia agrária - é impossível, pois não se poderá "tomar de assalto a cidadela" enquanto a aristocracia fundiária preservar, na Irlanda, seus postos avançados fortemente entrincheirados. Em contrapartida, assim que a causa do povo irlandês estiver em suas próprias mãos, assim que ele se torne seu próprio legislador, assim que passe a governar a si mesmo e goze de sua autonomia, o aniquilamento da aristocracia fundiária (em grande parte os mesmos indivíduos que os latifundiários) tornar-se-á infinitamente mais fácil que aqui. Na Irlanda, o problema não é somente de ordem econômica: a questão nacional coloca-se ao mesmo tempo, pois os latifundiários irlandeses não são, como na Inglaterra, os tradicionais dignatários e representantes, mas os odiados opressores da nação irlandesa. Não somente a evolução social interna da Inglaterra está paralisada pelas relações existentes com a Irlanda, mas também sua política externa e sobretudo sua política com a Rússia e os Estados Unidos da América.
Sendo incontestavelmente a classe operária inglesa que fará pender a balança em prol da emancipação social, convém aí aplicar a alavanca. Na realidade, foi a Irlanda que provocou a perda da República de Cromwell. Non bis in idem! (Que não ocorra outra vez!), Os irlandeses inflingiram uma boa peça ao governo inglês elegendo membro do Parlamento o convicto conspirador O'Donovan Rossa. Os jornais governamentais já ameaçam com uma nova suspensão do Habeas Corpus Act, com um novo terror! De fato, a Inglaterra jamais governou a Irlanda senão empregando o terror mais ignóbil e a corrupção mais detestável, e, enquanto subsistirem as condições atuais, nunca poderá governá-la de outra forma.
Notas:
(1) Texto extraido da carta enviada por Marx à Ludwig Kugelmann em 29 de novembro de 1869. (retornar ao texto)
(2) da I Internacional. (retornar ao texto)
Inclusão | 25/11/2004 |