A Traição do "Partido Operário de Unificação Marxista" Espanhol

Leão Trotsky

22 de janeiro de 1936


Transcrição de: Alexandre Linares, junho 2005
HTML de: Fernando A. S. Araújo, junho 2005.
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A organização espanhola dos "comunistas de esquerda", que sempre se caracterizou como uma organização confusa, terminou, depois de muitas oscilações à direita e à esquerda, por se unificar, sobre um programa centrista, com a Federação Catalã de Maurín, no interior do partido de "unificação marxista" (!!). Induzidos ao erro por este nome, algumas das nossas publicações escreveram deste novo partido que se aproximava à IV Internacional. Nada é mais perigoso que exagerar as próprias forças sobre a base de uma imaginação demasiado crédula. A realidade nunca tarda em nos trazer uma desilusão cruel.

Os jornais nos informam que na Espanha o conjunto dos partidos "de esquerda", tanto burgueses como operários, constituíram um bloco eleitoral sobre a base de um programa comum, que, evidentemente, em nada se distingue do programa da "Frente Popular" francesa nem de todos os outros programas charlatanescos do mesmo gênero. Ali encontramos "a reforma do tribunal de garantias constitucionais", a manutenção rigorosa do "princípio de autoridade" (!!), a "libertação da justiça de todas as pressões de ordem política ou econômica" (A libertação da justiça capitalista da influência do capital!) e outras coisas do mesmo gênero. O programa constata a recusa, da parte dos republicanos burgueses que participam do bloco, de nacionalização da terra, porém, em "em compensação", ao lado das habituais promessas baratas aos camponeses (créditos, revalorização dos produtos da terra etc.), ele proclama (como um dos seus objetivos) o "saneamento (!!) da indústria", e a "proteção da pequena indústria e do comércio" segue-se o inevitável "controle sobre os bancos" no entanto, uma vez que os republicanos burgueses segundo o texto de este programa, rejeitam o controle operário, trata-se do controle sobre os bancos... pelos próprios banqueiros, por intermédio dos seus agentes parlamentares, do mesmo gênero de Azaña e de seus semelhantes. Enfim, a política exterior da Espanha deverá seguir "os princípios e os métodos da Sociedade das Nações". E que mais?

Assinaram, ao pé deste documento vergonhoso, os representantes dos dois grandes partidos burgueses de esquerda, o Partido Socialista Operário Espanhol, a União Geral dos Trabalhadores, o Partido Comunista (evidentemente!), as Juventudes Socialistas - ai! -, o "Partido Sindicalista" (Pestaña) e, por último, o "Partido Operário de Unificação Marxista" (Juan Andrade). A maioria destes partidos esteve à cabeça da revolução espanhola durante os anos do seu ascenso e eles fizeram tudo ao seu alcance para esgotá-la. A novidade consiste na assinatura do partido de Maurín-Nin-Andrade. Os antigos "comunistas de esquerda" se transformaram simplesmente no vagão a reboque da burguesia "de esquerda". É difícil conceber uma queda mais humilhante!

Há poucos meses apareceu em Madri um livro de Juan Andrade, "A burocracia reformista e o movimento operário", no qual são analisadas, por meio de citações de Marx, Lênin e outros autores, as causas da corrupção dos burocratas operários. Juan Andrade dedicou-me seu livro por duas vezes, as duas vezes com dedicatórias muito calorosas, onde me chama de seu "chefe e mestre". Este gesto que, em outras circunstâncias não poderia fazer mais que me alegrar, obriga-me agora a declarar com tanta maior firmeza que nunca ensinei, jamais ensinei a ninguém, a traição política. Ora, a conduta de Andrade não é outra coisa que uma traição do proletariado no interesse de uma aliança com a burguesia.

Não é supérfluo relembrar a este propósito que os "comunistas de esquerda" espanhóis, como o indica seu próprio nome, endureceram suas posições para aparecer, em cada ocasião propícia, como revolucionários intransigentes. Em primeiro lugar condenaram severamente os bolcheviques-leninistas franceses em função do seu ingresso no partido socialista: jamais e de modo algum! Entrar de modo temporário em uma organização política de massas para lutar implacavelmente em suas fileiras contra seus chefes reformistas sob a bandeira da revolução proletária, isto é oportunismo; porém, concluir uma aliança política com os chefes do partido reformista sobre a base de um programa manifestamente desonesto e que serve para enganar as massas e encobrir a burguesia, isto é coragem! É possível envilecer e prostituir o marxismo mais que isso?

O "partido de unificação marxista" pertence à famosa associação de Londres dos "partidos socialistas revolucionários" (ex- I. A.G.). A direção desta última encontra-se atualmente nas mãos de Fenner Brockway, secretário do Independent Labour Party. Já dizemos que pese aos antiquados e previsivelmente incuráveis preconceitos pacifistas de Maxton e de outros, o ILP assumiu na questão da Sociedade das Nações e das sanções uma posição revolucionária honesta, e todos nós lemos com satisfação uma série de excelentes artigos a este respeito no New Leader. Nas últimas eleições parlamentares o Independent Labour Party recusou-se até mesmo a apoiar no plano eleitoral os trabalhistas justamente porque estes últimos sustentavam a Sociedade das Nações. Em si, esta recusa constituía um erro tático: ali onde o Independent Labour Party não tinha condições de apresentar seus próprios candidatos devia apoiar os trabalhistas contra os conservadores. Mas isto é, apesar de tudo, um pormenor. Em todo caso, não havia nenhuma possibilidade de um "programa comum" com os trabalhistas. Os internacionalistas deviam ligar o apoio eleitoral (aos trabalhistas) com a denúncia do modo como os social-patriotas britânicos rastejavam diante da Sociedade das Nações e das suas "sanções".

Nós nos permitimos formular a seguinte pergunta a Fenner Brockway: o que admite como correto a "internacional" da qual é secretário? A seção inglesa desta "Internacional" se recusa a dar um simples apoio eleitoral a candidatos operários, se eles são partidários da Sociedade das Nações. A seção espanhola conclui um bloco com partidos burgueses sobre um programa comum de apoio à Sociedade das Nações. Será possível ir mais longe no domínio das contradições, da confusão, da degeneração? Ainda não há guerra e as seções da "Internacional" de Londres tendem desde agora em direções diametralmente opostas. Até onde irão quando ocorrerem os acontecimentos decisivos?

Voltemos, porém, ao partido espanhol de "unificação marxista" com a burguesia. Os "comunistas de esquerda" espanhóis - Andrés Nin, Juan Andrada etc. - mais de uma vez rejeitaram nossa crítica de sua política conciliadora invocando nossa incompreensão das "condições particulares" da Espanha. Argumento habitual de todos os oportunistas, pois o primeiro dever do verdadeiro revolucionário proletário consiste em traduzir as condições particulares do seu país para a linguagem internacional do marxismo, compreensível também no interior das fronteiras de seu próprio país (1). Por enquanto, porém, não há necessidade destes argumentos teóricos. O bloco espanhol formado pelas direções do movimento operário com a burguesia de esquerda não tem em si mesmo nada de "nacional", pois em nada difere da "Frente Popular" formada na França, na Tchecoslováquia, no Brasil e na China. O "Partido Operário de Unificação Marxista" nada mais faz que aplicar servilmente a política que o VII Congresso da Internacional Comunista impôs a todas as suas seções, de modo completamente independente das suas "particularidades nacionais". A verdadeira originalidade da política espanhola reside desta vez unicamente no fato de que ao bloco com a burguesia aderiu também a seção da Internacional de Londres... Pior para ela! Quanto a nós, preferimos a clareza. Haverá seguramente na Espanha verdadeiros revolucionários para desmascarar impiedosamente a traição de Maurín, Nin, Andrade e consortes e colocar os elementos de uma seção espanhola da IV Internacional.


Notas:

(1) Em busca de justificações para sua própria política, Maurin e Nin recorrem ao sistema eleitoral espanhol, que faz extremamente difícil ao jovem partido apresentar candidaturas independentes (veja-se resolução do C.C. em La Batalla, num. 234). Mas este argumento está totalmente desprovido de valor. A técnica eleitoral não pode justificar a política de traição consistente em propor um programa comum com a burguesia. (retornar ao texto)

Inclusão 17/07/2005
Última alteração 09/03/2010