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Primeira edição: Setembro de 1947. Fonte: Problemas Revista Mensal de Cultura Política, nº 2, setembro de 1947 Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo, fevereiro 2008 Direitos de Reprodução: A cópia ou distribuição deste documento é livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License. |
HOJE, na Itália, vendo o desenvolvimento impetuoso do Partido Comunista nestes últimos anos, após a libertação, muitos que apenas conheceram o comunismo através das infames calúnias da propaganda fascista, se indagam o porquê desta nossa ascensão, o porquê do apoio popular que circunda as nossas iniciativas e as nossas organizações, o porquê das vitórias eleitorais, como recentemente na Sicília, que nós conquistamos através de lutas travadas com as armadas da liberdade e da democracia. Bem, o segredo deste nosso sucesso está no fato de que nós fomos e continuamos fiéis ao pensamento de Gramsci, o qual queria que o Partido da classe operária e das classes trabalhadoras fosse um Partido profundamente nacional, que não separasse nunca a causa dos operários, dos camponeses, dos trabalhadores da causa de todas as classes, que contribuem para a vida e para a prosperidade do país, que soubesse ligar estreitamente a luta pela emancipação dos trabalhadores à luta pelo renovamento de toda a Nação.
A este ensinamento nós temos sido e continuaremos fieis. Daí a nossa política de unidade, daí o papel que temos sabido desempenhar no curso da luta de libertação, daí o papel que será sempre maior e se tornará, a um certo momento, decisivo, que nos cabe e nos caberá na obra de reconstrução do nosso país.
Grande, de fato, era o objetivo que Gramsci via diante de si. Mas, precisamente, porque ele compreendia quão grande era nosso objetivo, precisamente por isso ele compreendeu a fundo, desde os primeiros instantes, o fascismo e, direi, quase a inelutabilidade do seu desenvolvimento numa sociedade como a italiana, no momento em que o primeiro impulso renovador, partido em formas, às vezes, dispersas das massas trabalhadoras, se fez sentir no outro após-guerra. Ele compreendeu que àquele primeiro impulso renovador seria oposta a união de todas as forças conservadoras e reacionárias, a união de todos aqueles que, durante séculos, viveram da prepotência, dos privilégios, da exploração, os responsáveis pela miséria e pelos sofrimentos tanto dos trabalhadores quanto de inteiras regiões italianas. De fato, constituiu-se uma frente única de todos aqueles que não querem que a sociedade italiana se renove e transforme em nome da justiça, da liberdade e do trabalho. Ele o compreendeu e também o fascismo compreendeu que no pensamento de Gramsci estava a mais eficaz arma de luta pelo renovamento da sociedade italiana. Gramsci tornou-se, assim, ao lado de outros grandes dirigentes e mártires do movimento operário e democrático, o inimigo número um do fascismo, que tudo fez para destruir o seu débil corpo.
O ESPÍRITO profético de Gramsci está à frente deste povo, que se renova. À frente deste povo os primeiros na luta e no sacrifício são os seus discípulos melhores, os operários, os camponeses, os intelectuais que se sentem herdeiros do seu pensamento e da sua vontade. Presente entre nós neste momento é o seu espírito. Ele nos deve guiar ainda por longo tempo.
O nosso país, com efeito, deve ser hoje renovado, reconstituído; mas deve ser reconstruído de modo novo, diferente. Não devemos refazer uma casa, que, mais uma vez, venha a cair sobre a cabeça daqueles que a habitam. Devemos renovar profundamente a estrutura econômica, política, social do país. Para isto é necessário uma força dirigente nova. Mas esta força dirigente nova não poderá sair de um só grupo social, do grupo somente dos proletários. Não, aqui o pensamento de Gramsci ainda uma vez nos deve guiar. Elemento essencial do seu pensamento foi a afirmação da necessidade de uma aliança entre os proletários e todos os outros elementos progressivos da sociedade italiana para poder renovar a nossa ordem política e social.
Nos últimos meses da sua existência, mesmo em todos os anos passados no cárcere, um problema particularmente preocupava o nosso grande companheiro: o problema da função que os intelectuais tiveram no passado, têm hoje e deverão ter no futuro da nossa Pátria, Sobre a base do mais rigoroso exame histórico, ele demonstrou a necessidade de que as camadas intelectuais italianas, deixando de ser instrumento dos grupos privilegiados reacionários, entrem numa estreita colaboração com as massas populares, se enlacem numa aliança com elas e desta unidade das forças do trabalho manual e intelectual saia finalmente uma nova força dirigente democrática e progressiva, que saiba, não só salvar a Itália de novas ruínas, mas renová-la para sempre.
A ITÁLIA deve ser reconstruída de modo que desapareçam as manchas de miséria, de desagregação econômica, de atraso social, que até agora a distorcem. Entre estas manchas, estava no passado e ainda está hoje a Sardenha, que espera o início da sua redenção. Mas, para que esta redenção se inicie e possa processar-se rápida, é necessária a estreita colaboração de todas as forças da Ilha, e, sobre um plano nacional, é necessária a colaboração destas forças progressivas sardas, como das sicilianas e meridionais, com as grandes massas trabalhadoras das regiões mais avançadas. Se queremos verdadeiramente renovar a Itália, o problema da Sardenha, da Sicília e da Itália meridional deve ser posto como problema central deste renovamento.
Mas, ai de nós, comunistas, se acreditássemos que o patrimônio de António Gramsci é somente nosso. Não, este patrimônio é de todos, de todos os sardos, de todos os italianos, de todos os trabalhadores que combatem pela sua emancipação, qualquer que seja a sua fé religiosa, qualquer que seja a sua crença política, A todos foi dirigido o seu ensinamento, para todos ele pensou, para todos ele falou, por todos ele sofreu. Ele viveu, ele combateu, ele morreu pela redenção da Sardenha, pelo renovamento da sociedade italiana, pela emancipação de todos os trabalhadores. Empenhemo-nos por que estas três grandes causas estejam para nós sempre unidas, empenhemo-nos em saber combater, simultaneamente, pela libertação da Sardenha numa Itália democrática e renovada e pela emancipação dos trabalhadores de todas as explorações, de todas as escravidões. Lutemos para transformar em ação, com o nosso trabalho, o apelo, que se desprende de toda a obra de Gramsci, à unidade dos oprimidos e dos explorados operários com as populações que mais sofrem nesta nossa velha Itália, à unidade de todas as forças democráticas e progressivas, às quais foi confiada a criação de uma Itália nova.
Notas:
(1) O que se segue é o trecho de um discurso pronunciado por Palmiro Togliatti, na Sardenha, terra natal de António Gramsci, por ocasião do décimo aniversário da morte do grande dirigente comunista italiano. Togliatti se referiu, na maior parte do seu discurso, à ligação de Gramsci com os problemas da Ilha da Sardenha, que é uma das regiões mais atrasadas da Itália, de economia agrária com base no latifúndio, o que acontece também com a Sicília e a Itália Meridional, em contraste com o Norte do país, industrializado e de economia agrícola capitalista. (retornar ao texto)
Inclusão | 03/09/2008 |