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Logo a seguir ao 25 de Novembro, o Conselho da Revolução e o VI Governo tomaram uma série impressionante de medidas antipopulares, a mais impressionante que os reaccionários deste país puderam esperar desde o 25 de Abril de 74.
A que assistimos nós?
A prisão de muitos militares antifascistas, obreiros do 25 de Abril, incluindo o general Otelo. A desarticulação das organizações democráticas nos quartéis, o saneamento de milhares de soldados muitos deles com a ameaça de não poderem arranjar emprego nos serviços do Estado nem nas empresas nacionalizadas.
O controlo de todos os órgãos de informação por parte das forças mais reaccionárias.
O congelamento dos salários e o aumento do custo de vida desmesurado dos preços dos produtos de primeira necessidade.
A libertação dos pides e chefes fascistas, carrascos odiados por todo o povo, como o capitão Maltês, antigo chefe da polícia de choque da P. S. P., o Kaúlza de Arriaga, chefe militar salazarista e responsável pelos grandes massacres em Moçambique, o Moreira Baptista, ministro da censura e da P.I.D.E., etc.
A repressão brutal da G. N. R., da P. S. P., e dos comandos do Jaime Neves sobre manifestantes populares — Custóias, Caxias, Rossio, etc. — com o assassinato de vários antifascistas.
Os ataques às conquistas dos camponeses, em particular à Reforma Agrária, agora contestada pelos grandes agrários que querem reconquistar as posições que tinham no tempo de Salazar.
O aumento da dependência do nosso país em relação ao Imperialismo americano e europeu através de uma série de «empréstimos» de milhões de contos.
Em poucas semanas, os grandes burgueses e os imperialistas sugaram ao povo trabalhador milhões e milhões de contos e muitas das liberdades duramente conquistadas. Este Inverno foi um dos mais duros que tivemos que suportar, de há muitos anos para cá. Comparados aos preços dos produtos e serviços de primeira necessidade, os salários e proventos dos trabalhadores são agora mais baixos do que em 1972!
Este ataque monstruoso ao pão e às liberdades dos trabalhadores é acompanhado pela hipoteca do nosso país ao estrangeiro, pela. cedência às piores condições que nos impõem os imperialistas. Os vende-pátrias querem-nos alimentar com esse bolo envenenado. Comportam-se como fiéis lacaios das grandes potências imperialistas e social-imperialistas e desbaratam a nossa Independência Nacional.
Com efeito, nos últimos meses, o governo endividou-se em mais de 20 milhões de contos aos países estrangeiros e está a negociar mais umas dezenas de milhões de contos de empréstimos. Tentam convencer-nos de que não têm outra solução, de que esses empréstimos são feitos em excelentes condições, que só temos a beneficiar com isso. O governo sabe que mente, e por isso procura esconder as condições que tem aceitado e até as taxas de juro que vamos pagar.
Na realidade, já começámos a pagar as primeiras consequências. Por imposição dos imperialistas subiu o preço da gasolina e do fuel-oil, diminuíram as taxas de importação que protegiam algumas indústrias nacionais, dificultaram o crédito às empresas aumentando as dificuldades de milhares e milhares de pequenos e médios industriais, põe em sérios riscos cerca de 40 por cento das indústrias nacionalizadas, abrem as nossas costas à pilhagem dos pesqueiros russos.
E para que servem esses empréstimos?
Para financiar a compra de equipamentos aos mesmos países que emprestam dinheiro. Para abrirem algumas fábricas que poucos empregos vão criar e que vão produzir aquilo que convém aos imperialistas, e não aquilo que o nosso povo precisa. Para se continuarem a importar milhões de contos de alimentos que podiam ser produzidos nos campos portugueses.
Alguns desses empréstimos só puderam ser obtidos à custa de empenhar uma parte do ouro de reserva, avaliado a um preço mais baixo que o do mercado mundial.
Em suma, estamos a ficar na situação do pequeno lavrador que tem de empenhar a terra para poder pagar as dívidas, e que vai ficando cada vez mais endividado até a terra (e tudo o que ele tem) deixar de lhe pertencer. Assim o imperialismo reforça O seu domínio sobre o nosso povo. Nalguns casos, o empréstimo é mesmo um pretexto para infiltrarem em Portugal os seus «técnicos» e «especialistas», agentes dos seus exércitos e das suas polícias secretas que vêm cá dar uma mão aos fascistas.
Para os grandes capitalistas portugueses e estrangeiros, a ambição do poder e a ganância de lucros rápidos são como sacos sem fundo. Quanto mais têm, mais querem — isso sabíamos nós já nos tempos do regime fascista.
As crises económicas e sociais que eles assim provocam, querem que sejam os trabalhadores a pagá-las, a bom preço. Os 60 milhões de contos que roubaram ao país em 1974, as sabotagens económicas que fizeram queimando searas, roubando e matando o gado, abandonando centenas de empresas na falência e praticando o açambarcamento e o mercado negro dos alimentos — tudo isso os grandes ricaços e os imperialistas querem que o povo lhes pague agora.
A restauração dos lucros da grande burguesia e o sugadoiro dos empréstimos imperialistas vão levar à continuação da subida do custo de vida e a uma quebra violenta nos salários reais da generalidade dos trabalhadores; ao aumento da miséria dos desempregados; à miséria ainda maior de certas camadas do povo como os retornados pobres, os trabalhadores a domicílio, e reformados; vai ser atingido o nível de vida e mesmo a segurança de emprego de largas camadas de empregados urbanos, onde a burguesia semeara ilusões de promoção social — bancários, profissionais de seguros e comércio, funcionários, etc. Muitas centenas de pequenos comerciantes, artesãos e pequenos industriais vão ser atirados para a ruína, em nome das «reestruturações» da produção e do crédito e da «racionalização» dos circuitos de distribuição. Vai acelerar-se a proletarização nos campos, para dar alento à burguesia rural. A marcha-atrás da Reforma Agrária lançará no desemprego e nos salários de miséria muitos assalariados agrícolas. O ataque às cooperativas de comércio e indústria, e especialmente o encerramento de empresas que estão em auto-gestão, por fuga dos patrões, atirará para o desemprego dezenas de milhares de trabalhadores que se haviam lançado na luta, muitos deles confiando na miragem do «socialismo» gonçalvista. Os patrões, de um modo geral, aumentarão ainda a repressão dentro das fábricas e tentarão despedir sistematicamente os trabalhadores mais combativos, especialmente os delegados sindicais que não queiram ser seus lacaios. |
Como vimos, os grandes capitalistas portugueses e estrangeiros pensaram, na altura do 25 de Abril, que o nosso povo se contentaria com a modificação do regime de Caetano, com a fachada de exploração e opressão pintada com cores frescas e mais «moderadas», com a fraseologia populista e a política inconsciente dos dirigentes reformistas.
Mas, como vimos também, a todos eles esse tiro lhes foi saindo pela culatra, à medida que o movimento popular e os povos das colónias, avançando decididamente na luta, lhes iam estafando os tais cavalos frescos de reserva, e sobretudo o reaccionário e neo-colonialista Spínola.
Hoje, os imperialistas e os fascistas, já não têm dúvida: para conseguirem obrigar o povo trabalhador a pagar com juros e rendas a crise do grande capital, precisam de um regime duro, um regime em que o povo não tenha (como tem tido) possibilidades de se organizar e lutar pelos seus direitos, um regime onde o povo produza muito, ganhe pouco e se cale sempre. Ou seja, um regime fascista ou fascizante. Isso só lhes será possível se conseguirem dividir profundamente o país e o povo, reprimindo as suas lutas e cortando-lhe a cabeça, ou seja, a sua parte mais combativa e mais organizada as suas organizações revolucionárias. Precisam também de meter na ordem aquelas forças hesitantes e conciliadoras que nutrem algum sentimento antifascista e se vão opondo, ainda que timidamente, ao seu regresso ao poder.
O único factor de divisão que existe no seio dos imperialistas e dos fascistas diz respeito ao modo de atingir esse objectivo.
Uns defendem desde já a necessidade dum golpe a «quente» que esmague num banho de sangue o movimento operário e popular, outros parecem preferir continuar na via do «golpe a frio», evitando desmascarar-se completamente a nível nacional e internacional. Os que no seio dos fascistas defendem esta via, tentarão usar as eleições e alguns aspectos formais da democracia para legitimar as medidas de esmagamento do movimento — popular, esforçar-se por reunir condições políticas — a adesão de vastas camadas do Povo aos fascistas — que lhes permitam com um aparente apoio popular deitar pela borda fora a fachada democrática quando se tornar um estorvo.
No 25 de Novembro, ao desmantelar a organização revolucionária dos soldados e liquidar as posições antifascistas na estrutura das Forças Armadas, os fascistas conseguiram criar condições militares, que lhes permitem atacar de frente as conquistas populares. Os seus piões de brega, a parte mais reaccionária da oficialagem em que assentava o exército colonial-fascista antes do 25 de Abril, foram sendo rapidamente colocados nos lugares chave — estados-maiores, comandos de unidades, comandos das forças repressivas, etc. Hoje, eles estão já em posição, mesmo ao mais alto nível, (Conselho da Revolução), de ameaçar os próprios oficiais conciliadores que lhes abriram caminho para o 25 de Novembro, como Melo Antunes, Vasco Lourenço, Charais, Pezarat, Crespo, etc.
Os fascistas precisam de poder criar condições militares e políticas favoráveis, pensamos, no entanto, que as condições políticas são, sem dúvida alguma, as determinantes. Isto é: os fascistas, tendo apenas o exército e a polícia, mas sem o apoio de (pelo menos) uma parte do povo enganado, podem tentar reprimir duramente as lutas populares — mas o resultado disso seria inevitavelmente o reagrupamento das camadas hesitantes do nosso povo, que não desejam o fascismo, em torno da parte mais consciente e combativa do povo, organizada para resistir à acção dos fascistas. O seu golpe, o seu regresso ao poder, não teria hipóteses de se manter por muito tempo e de resistir às avançadas do movimento popular anti-fascista.
O seu reforço ao poder só tem possibilidades de alguma estabilidade se eles forem capazes de manter um certo apoio em camadas importantes do povo que se encontram hoje em situação mais desesperada e mais desligada das forças progressistas e antifascistas. Por isso, os fascistas tentam, por todas as maneiras, acentuar e estabilizar a sua influência sobre os pequenos e médios lavradores do centro e do norte do país, sobre os retornados pobres, os desempregados e pequenos comerciantes e industriais — ou seja, as camadas do nosso povo que podem dizer «o 25 de Abril não nos trouxe ainda qualquer benefício, mais valia o governo do Marcelo».
É aqui que assenta a grande fragilidade do nosso inimigo principal: eles são poucos e, as suas posições na economia, no aparelho de Estado e nas colónias foram seriamente abaladas pelas conquistas populares após o 25 de Abril. Por isso, eles terão hoje muito pouca força se lhes faltar esse apoio de certas camadas do povo. Nem lhes basta, sequer, o apoio activo dos imperialistas estrangeiros a quem estão dispostos a vender Portugal ao desbarato a troco do regresso aos seus latifúndios, aos seus monopólios e aos seus tachos.
Nós temos que ser capazes de criar, rapidamente, laços de unidade com essas camadas do povo que são igualmente pobres e exploradas. Temos que fazer das suas lutas as nossas lutas, temos que banir para sempre a ideia, muitas vezes fomentada pelo partido do Dr. Cunhal, de que essas camadas exploradas são fascistas ou reaccionárias. O que acontece é que muitos desses trabalhadores, que amanhã estarão ao nosso lado na luta antifascista e por uma vida melhor, não vêm actualmente que os fascistas que tentam manobrá-los são os mesmos que exploraram e oprimiram o povo durante 48 anos, são os grandes e principais responsáveis pela crise em que o povo tem vivido antes e depois do 25 de Abril.
Se soubermos aprender com os nossos erros passados, e dar passos importantes na luta e na unidade com todos os explorados do campo e da cidade, então é como se estivéssemos a retirar o chão debaixo dos pés do fascismo, conseguiremos isolá-lo e reduzi-lo à sua ínfima base social, conseguiremos obrigá-lo a recuar de trincheira em trincheira e condenar ao fracasso as suas tentativas de golpe sangrento.
Assim vemos melhor como são erradas e traiçoeiras as ideias que espelham os partidos conciliadores, de que para evitar o golpe fascista é preciso o povo ficar quieto e não lutar. Pelo contrário, o que é preciso é unirmos todas as camadas do nosso Povo explorado, «o que faz falta é organizar a malta» e avançar decididamente na luta.
Mas avançar na luta não é avançar às cegas e à aventura. Para conseguirmos esses resultados, devemos conhecer bem a situação política e a relação das forças em cada momento. Devemos conhecer bem o inimigo, estudar os seus pontos fortes e os seus pontos fracos, e assestar-lhe com golpes certeiros na altura própria. Precisamos de conhecer as forças intermédias e conciliadoras que têm feito o jogo do fascismo mas não são fascistas, e temos que pressioná-las e obrigá-las (sem nunca nos colocarmos a seu reboque) a assumirem posições antifascistas e tomarem medidas contra esse inimigo principal do povo, por mais pequenas que sejam.
Temos, igualmente, enquanto organização revolucionária que deve unir o povo para derrotar o fascismo, que nos tornar uma força em que o nosso povo tenha razão para acreditar, uma força política presente em todas as frentes de luta pelos interesses do povo, capaz de apresentar a todo o momento o nosso programa, a alternativa viável, as soluções concretas de que o povo precisa para melhorar a sua condição e avançar na luta.
— O C. D. S. e o P. D.C. nunca estiveram em nenhum governo provisório por serem organizações demasiado comprometidas com o fascismo, por serem os partidos onde se foram juntar os grandes burgueses e antigos A. N. P.'s legionários, bufos, etc. Tentando atirar aos olhos do povo com a incapacidade dos militares e dos governos para resolverem a crise, e fazer esquecer que eles próprios estiveram a mandar nisto tudo durante 48 anos, eles aparecem hoje a querer canalizar os descontentes e o desespero de algumas camadas do povo que nada beneficiaram com o 25 de Abril e estão a ser arrastadas no — turbilhão da crise. Mais descarados os do P. D. C., mais hábeis e poderosos os do C. D. S., atirando como figura de proa Galvão de Melo cujos discursos são quase tirados a papel químico dos do Marcelo e do Tomás, eles baseiam toda a sua propaganda nos grandes temas de que os fascistas sempre se serviram para reduzir o povo à escravidão: ordem e trabalho, «Deus, Pátria e Família», reconciliação entre as classes exploradas e exploradoras, etc.
O reforço da influência fascista sobre certas camadas do Povo, permitir-lhes-ia usá-las como arma de pressão em qualquer altura (plenários de agricultores e de retornados, por exemplo). Por outro lado poderia aumentar o peso do C. D. S. nas eleições, tornando-o um grande partido fascista eleitoral, na «oposição».
— O P.P.D. não é propriamente um partido fascista, mas é impossível não ver que a sua cabeça, a sua direcção, são inteiramente dedicados ao imperialismo americano e à grande burguesia monopolista que ora se apoia nele, ora nos C. D. S. e P. D. C.
De carácter mais «democrático» e ornamentado com mais cravos, o P.P.D. foi desde o início a ponte que ligou os fascistas aos cunhalistas nos sucessivos governos provisórios.
A ameaça do desemprego, a manipulação dos sentimentos religiosos do povo, a influência política dos caciques parasitas, os atropelos à democracia cometidos pelos cunhalistas e outros, oportunistas nos sindicatos, nas comissões de trabalhadores e no Ministério do Trabalho — eis alguns dos trunfos que o P.P.D. pretende utilizar para organizar a sua influência em camadas populares que, neste momento, dificilmente se iriam juntar a partidos claramente anti-operários como o C.D.S. e o P.D.C. Estão nestas condições dezenas de milhares de operários das fábricas afastadas dos grandes centros industriais de Lisboa, Porto e Setúbal. A maioria desses operários são rendeiros e pequenos lavradores arruinados que foram procurar emprego nas fábricas, aceitando salários de miséria, e que, depois das horas de fábrica, ainda têm que ir cultivar as suas pequenas courelas de terra para garantir a subsistência regular das suas famílias. Estão nessas condições milhares de empregados pobres das cidades carregados de letras e de prestações, que os fascistas querem pôr a reboque dos patrões na defesa da sua «ordem» e contra o movimento revolucionário.
O P.P.D. tenta já tomar sindicatos de serviços e mesmo operários para os transformar em instrumentos do patronato que dividam os trabalhadores e favoreçam os que aceitam lamber as botas aos donos das fábricas.
No jogo das eleições, o P.P.D. vai ter um n papel bem preciso: agitando a ameaça de fazer uma aliança com o C. D. S., ele quer obrigar os partidos e militares conciliadores a cederem constantemente à chantagem, a apoiarem sucessivas medidas contra as conquistas populares. Assim, os fascistas teriam caminho aberto para reprimir os trabalhadores com os seus bandos terroristas e unidades de comandos.
Nas zonas rurais e do interior do país, torna-se quase sempre impossível distinguir os fascistas do E.L.P. dos C.D.S. ou do P.P.D. As relações sociais e políticas nessas zonas não foram quase nada modificadas e a divisão política continua a ser, muitas vezes, a mesma que foi durante os 48 anos de fascismo: os chefes e caciques fascistas, os seus lacaios e cães de fila e o povo trabalhador dos campos ou das pequenas fábricas. No campo e no interior, vê-se à transparência como todos esses partidos e organizações se confundem e estão ao serviço do fascismo, como estavam antes do 25 de Abril.
Ao mesmo tempo, a grande burguesia foi forjando os seus instrumentos de repressão, constituindo um corpo de mercenários como núcleo central do seu exército, vestindo a farda de «operacionais» a centenas de efectivos do E.L.P. /M.D.L.P. e organizando às claras o aliciamento de mercenários com associações como a dos ex-comandos. Assim vão reconstituindo, sob nova capa e com novos nomes, as organizações fascistas que foram desmanteladas pelo povo e os oficiais antifascistas no 25 de Abril: a Pide, a Legião e a M.P.
Os fascistas vão, ao mesmo tempo, ocupando lugares-chaves no exército. Promovem oficiais afectos ao Kaúlza e ao Spínola, afastam oficiais democratas hesitantes e garantem assim um único comando às principais unidades militares e aos bandos terroristas que vão constituindo fora do exército. Um claro exemplo disso foi o comando unificado que eles organizaram na altura do 25 de Novembro: um único comando centralizado dirigiu todas as operações combinadas, seja o cerco de Lisboa, sejam as acções provocatórias e repressivas dos comandos do Jaime Neves antes e depois do 25 de Novembro.
Os fascistas encobriram-se com o grupo dos «nove» para atacarem o movimento democrático dos soldados, para expulsarem e prenderem os militares antifascistas e, de um modo geral, organizarem o ataque às conquistas populares. Os fascistas vêem hoje esses militares conciliadores como um empecilho. Enquanto não decidirem deitá-los pela borda fora, vão fazer tudo para os cercarem com estados-maiores reaccionários e para os cegarem com a ameaça de um golpe militar e assim obterem deles concessões políticas.
Mas há um ponto em que a grande burguesia precisa de preparar o terreno para poder, no dia oportuno, reduzir ao silêncio esse grupo de oficiais. Vai minar-lhes o prestígio no plano em que eles se mostraram mais consequentes aos olhos do povo: a descolonização. Ou seja, vai tentar criar uma situação semelhante à que se vivia na altura do golpe Palma Carlos-Sá Carneiro e do golpe do 28 de Setembro, mas agora em condições político-militares e sociais que lhe são mais favoráveis. Os reaccionários de toda a espécie sabem que a descolonização foi uma das maiores conquistas do nosso povo; reconheceu as legítimos direitos dos povos irmãos das colónias que lutaram longamente pela sua independência; reconheceu a derrota: militar inevitável do exército colonial-fascista antes que o desastre fosse levado até ao fim; e sobretudo acabou com o rol de sofrimentos, lutos e privações que essa guerra infame atirou para cima do nosso povo durante 13 anos. O nosso povo aclamou o fim da guerra e exprimiu a sua solidariedade com os povos libertados; o nosso povo viu que o 25 de Abril era também um fruto do «25 de Abril» dos povos das ex-colónias.
Para liquidarem politicamente os militares anticolonialistas, e tentarem recuperar as perdas que lhes provocou o fim da guerra, os tubarões que durante tantos anos parasitaram os mercados coloniais e se encheram com os fornecimentos ao exército precisam de convencer o povo de que a descolonização foi uma coisa má. Vão atribuir culpas ao fim da guerra, e não à própria guerra que eles fizeram. Vão tentar excitar os ódios e ressentimentos dos 300 000 retornados, metendo no mesmo saco os retornados pobres e os ricaços que vieram de lá com enormes fortunas, e utilizá-los como força de pressão social.
A U. D. P. e todos os revolucionários devem dizer claramente que, apesar das hesitações e de algumas vergonhosas concessões aos blocos imperialistas americanos e russos, apoiam sem reserva todas as medidas que esses oficiais tomaram para acabar com a guerra assassina e para reconhecerem os legítimos direitos dos povos escravizados.
Nós consideramos que esses oficiais se caracterizam pelo seu reformismo e pela sua inconsequência. Pensamos que eles têm graves culpas na situação que deixaram o imperialismo e o fascismo criar no nosso país. Que a sua inconsequência os atira, em permanência, dos braços dos agentes do imperialismo americano para os braços dos agentes do social-imperialismo russo. As suas profissões de fé em defesa da independência nacional só teriam algum crédito se se apoiassem decididamente no movimento popular para aplicar uma política de não sujeição às superpotências, de aliança com o 3.º Mundo e de corte dos principais laços de dependência económica para com o imperialismo.
Não podemos cair em ilusões de entregar os destinos do povo nas mãos desses oficiais. Já tivemos a experiência de como eles têm interesses próprios e estão dispostos a golpear o movimento popular para conservarem a sua posição e tentar acalmar a grande burguesia fascista. Além do mais estes oficiais têm tendência a se enganarem a si próprios. Fixam-se no golpe fascista militar e não vêem o perigo a avançar com as concessões políticas que vão fazendo aos piores inimigos do povo.
Mas seria um grande erro não tentar obrigá-los a tomar medidas antifascistas, não apoiar toda e qualquer acção, por pequena que seja, que trave o passo aos fascistas. O contrário seria empurrá-los para o campo do fascismo « e fortalecendo este em vez de o enfraquecer.
Só um movimento popular forte e independente de manipulações cunhalistas, pode levar a cabo esta política.
Tanto o partido de Mário Soares como o de Cunhal se caracterizam por penetrarem com mais facilidade em amplas camadas do nosso Povo.
Embora de maneiras diferentes, ambos utilizam sem regatear toda uma série de palavras e ideias que representam profundas aspirações dos trabalhadores (liberdade, democracia, revolução, socialismo). Ambos pretendem convencer o Povo de que essas ideias se realizam através de programas de reformas e modificações feitas pelos seus ministros. Ambos tentam apagar no Povo a ideia de que à sociedade injusta em que vivemos só se pode mudar realmente através da violência revolucionária e comportam-se como se a Revolução se limitasse às intrigas palacianas entre políticos profissionais, sem que o Povo tenha que a fazer em toda a parte e a todo o momento.
Se bem que entre um e outro haja distinções a fazer, na situação que estamos a viver, estes dois partidos burgueses no seu esforço para conservar influências políticas e fazer concessões aos fascistas atam de pés e mãos o movimento popular e tornam-no mais vulnerável aos ataques do inimigo principal, o fascismo e o imperialismo americano.
Senão vejamos:
a) Os partidos conciliadores abandonam soldados e outros militares antifascistas à repressão desencadeada sobre eles a seguir ao 25 de Novembro, enquanto, deixam sair da prisão militares e políticos fascistas, bufos e legionários. Com isto, semeiam a desmoralização e o alheamento nos antifascistas que ainda existem nas Forças Armadas é reduzem assim as possibilidades de resistência aos planos dos altos comandos fascistas. Por outro lado, aceitam de braços cruzados o reforço de posições reaccionárias e fascistas nas Forças Armadas, na P.S.P. e GNR e o desenvolvimento à luz do dia dos bandos armados do E.L.P.-M . D.L.P., não chamando o povo à luta.
Nesta actuação, é particularmente responsável o partido de Cunhal que tentou lançar soldados e oficiais antifascistas em movimentações militares destinadas a dar força às suas negociatas de cúpula, abandonando-os na hora seguinte à repressão, com uma desfaçatez só digna de traidores refinados.
b) Os partidos conciliadores fazem o jogo do fascismo colaborando na divisão do país. Cedem às pressões dos grandes agrários do Sul, feitas a coberto da Confederação dos Agricultores, em vez de satisfazerem as justas reivindicações dos pequenos agricultores e rendeiros do Norte e Centro em luta contra a miséria. Deste modo, os conciliadores contribuem para fortalecer a influência dos fascistas sobre o movimento camponês e ao mesmo tempo, atiram assalariados rurais do Alentejo para o isolamento, a confusão e o desânimo.
Nesta actuação, tem particular responsabilidade o partido de Cunhal. Esses falsos amigos dos assalariados alentejanos começaram por se opor às ocupações das herdades; mas, quando viram que não conseguiam parar esse movimento, meteram-se nele para o negociar como força de pressão, conduzindo-o no mais completo desprezo pela aliança indispensável com os camponeses pobres, os seareiros e os rendeiros do Alentejo, do Ribatejo e do resto do país. Os cunhalistas estão, assim, sempre a ajudar os fascistas a pôr camponeses contra operários, a pôr o Norte contra o Sul.
c) Os partidos conciliadores desorganizam lutas fundamentais do Povo das cidades, como a luta dos moradores pobres.
Cedem perante os ultimatos dos grandes construtores civis que exigem repressões sobre as ocupações de casas devolutas e querem ter as mãos livres para aumentar as rendas.
Os conciliadores vão querer desorganizar o movimento dos moradores pendurando-o nas promessas eleitorais de novos bairros camarários e de cooperativas de construção, o partido de Cunhal que se tem destacado nas tentativas para dividir os moradores, para criar Comissões e Assembleias fantasmas e para utilizar o movimento para a sua política partidária, pretende agora esconder a sua acção dizendo que, nesta conjuntura, «há que escolher entre sindicatos e organizações de moradores e que a escolha tem de ir para os sindicatos» (onde o seu domínio antidemocrático é mais forte). As suas atitudes divisionistas na altura das manifestações de 16-17 de Janeiro, em Lisboa é no Porto, são exemplos recentes dessa política antipopular.
d) Os partidos conciliadores ameaçam os sindicatos e a unidade sindical, que são o principal instrumento da classe operária e dos assalariados em geral na sua luta pelo PÃO.
Aqui, o partido de Mário Soares cede às pressões do patronato reaccionário e fascista para que seja tirada da lei a existência de uma única central sindical dos trabalhadores. O. P. S. abre as portas à criação de sindicatos fantoches dos patrões enquanto se propõe fazer uma central a meias com o partido cunhalista, jogando para isso com os sindicatos de serviços que controla contra os sindicatos Operários e cavando um fosso entre eles.
O partido traiçoeiro de Cunhal, pela sua prática antidemocrática e golpista na Intersindical, pelas manipulações partidárias dos sindicatos que controla, tem feito com que milhares de trabalhadores abandonem essa frente de luta e não vejam a importância do seu sindicato e da central sindical única.
e) Os partidos conciliadores criam uma barreira entre a organização da luta dos desempregados e a luta sindical em defesa dos salários. Desprezam a luta e a organização ampla dos desempregados pelo direito ao trabalho com receio de desencadear um movimento que o Governo de que fazem parte não seja capaz de satisfazer. Com isso, eles cavam divisões no seio dos trabalhadores e abrem caminho aos fascistas que querem lançar os desempregados contra os trabalhadores com emprego, com o objectivo de abafar as lutas e as reivindicações e de imporem salários de miséria.
f) Os partidos conciliadores recusam-se a apoiar as lutas de certas camadas do nosso Povo que se encontram «em muito má situação e ainda pouco organizadas — como sejam, os reformados da Previdência, os trabalhadores ao domicílio, os vendedores ambulantes, os retornados pobres, os deficientes das Forças Armadas, etc. Não querem levantar problemas «insolúveis» aos Governos incapazes de que fazem parte. Se não contarem com a solidariedade e o esclarecimento dos revolucionários, também essas camadas descontentes do Povo poderão ser infiltradas e utilizadas pelos fascistas.
Em suma: os partidos conciliadores querem acalmar as forças fascistas e imperialistas, sacrificando e dividindo o movimento popular; com isso só conseguem agravar a situação de miséria do nosso Povo e abrir o caminho ao fascismo.
Muitos camaradas, sinceros antifascistas e patriotas e verdadeiros lutadores pela causa do Povo, compreendem facilmente que a linha de conciliação com a burguesia fascista que Soares segue o tornam um aliado impossível. Como: também estão de acordo em que é possível e absolutamente necessário que a esmagadora maioria dos simpatizantes desse partido, sejam trazidos à luta contra o fascismo e a miséria e ganhem confiança nos revolucionários.
Mas muitos dos camaradas que acham impossível a aliança com Soares pensam de maneira diferente a respeito do partido de Cunhal.
Muitos não aceitam o que para nós está claro: o, partido de Cunhal é um partido burguês, um partido que está seriamente implantado nas massas operárias e populares, mas que é dominado por capatazes e encarregados, técnicos e intelectuais oportunistas e carreiristas, e dirigido por funcionários inteiramente dedicados aos interesses da Rússia imperialista. O partido de Cunhal abandonou completamente a via da revolução e não procura senão usar-se das massas populares para conquistar lugares aos outros partidos da burguesia, ora negociando e traindo as nossas lutas, ora atirando-nos para aventuras golpistas.
A estes camaradas temos que demonstrar essas verdades que começam a tornar-se mais evidentes para muitos.
Outros camaradas aceitam que essa é a verdadeira face do partido de Cunhal mas como vêem ainda largas massas de trabalhadores a segui-lo e a apoiá-lo, hesitam e preparam-se para ceder, construindo toda uma série de argumentos sobre a unidade da esquerda, etc. Muitos, perguntam com sinceridade se nós estaremos a ser sectaristas e divisionistas quando nos mantemos claramente separados dos cunhalistas e recusamos qualquer aliança com eles.
Esta é para nós uma questão decisiva, que determina a vitória ou a derrota do movimento popular. Consideramos que o partido de Cunhal é muito mais perigoso que o partido de Soares porque está infiltrado nos sectores mais avançados e combativos da classe operária e do Povo.
Ao analisarmos, uma por uma, as atitudes assumidas por esse partido nas diversas lutas e momentos difíceis que o nosso Povo atravessou ao longo destes 20 meses, consideramos que está claramente provado que sempre que guiou a luta do Povo o conduziu à derrota, à divisão, à desorientação, ao desânimo.
O nosso dever é em todas as circunstâncias mostrar claramente ao Povo que tem de se separar desse falso amigo para poder marchar para a vitória, unido e organizado.
Hoje somos poucos e os cunhalistas são muitos mais, mas se dobrarmos os ombros por causa disso nunca chegamos a ver a vitória do Povo.
Neste ponto somos intransigentes porque esse é o interesse dos trabalhadores.
Mas deve também ficar claro que não é porque eles estão presentes no seio das massas populares que nós vamos pôr-nos de fora do movimento a espernear e a gesticular contra o social-fascismo. Campos de batalha, só há dois. o do Povo e o do inimigo, e os falsos amigos desmascaram-se e expulsam-se no decurso do combate contra o inimigo principal.
continua>>>Inclusão | 10/09/2019 |