Textos Históricos da Revolução

Organização e introdução de Orlando Neves


Entre duas datas


Introdução 9

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Crises políticas vencidas, a Revolução deparava a todo o momento com o feroz incremento da sabotagem económica por parte dos grandes potentados capitalistas nacionais e de outros países. Se o estabelecimento de relações políticas e comerciais com os países socialistas poderia vir a mitigar as deficiências económicas isso revelava-se como uma potencialidade apenas futura. No imediato, assistia-se a uma batalha contra a Revolução praticada a todos os níveis do capital. A linguagem revolucionária começa a modificar-se ao surgirem na ribalta as expressões de raiz socializante, via única que conduziria o País para a salvação económica. Neste aspecto são claros indícios os discursos publicados de Vasco Gonçalves e a Conferência de Imprensa de Comissão Coordenadora do Programa do MFA.

Mas a contradição permanecia. Enquanto se exigia aos trabalhadores uma luta pela recuperação económica, a estrutura capitalista, mantinha-se e, um tanto idiotamente, o capitalismo travava o processo que, nessa altura, ainda o não punha definitivamente em causa. Era facilmente previsível que esta contradição havia de levar a embates frontais entre as duas classes. Não soube o capital aproveitar inteligentemente o momento para se salvar. Preferiu a sabotagem e, com isso, se conseguia prejudicar o processo também levava a uma agudização cada vez maior da citada contradição. As massas trabalhadoras continuavam a sua batalha pelas reivindicações que o mesmo era dizer pela definição clara dos objectivos económicos sociais e políticos, claros e irreversíveis. Também as grandes potências ocidentais cometiam o mesmo erro táctico. (Estaríamos hoje na opção socialista se o capital nacional e estrangeiro tivesse investido em massa?).

Entretanto, na ONU, Costa Gomes proferia um dos mais comoventes discursos da História portuguesa. Palavras onde, antes da estratégia política, estava a sinceridade de um Homem e de um País que se queriam livres. Idêntica honestidade de processos se notaria na sua mensagem de Ano Novo.

Facto mais saliente desta época é a difícil gestação do Programa Económico e Social que sofreu várias arremetidas do capital até vir à luz do dia em forma de documento tíbio e desolador.

Não esqueçamos as lutas políticas partidárias que então se travavam. O MFA consagrara o princípio da unicidade sindical e isso levantou uma onda de protestos por parte dos partidos defensores do «socialismo em liberdade» ou da social-democracia.

Spínola, no refúgio de Massamá, prosseguia a sua acção contra-revolucionária e encontrava apoio nas forças mais reaccionárias e até em algumas ditas progressistas. Perante a esperança que o homem de Massamá representava, a reacção sabotava e esperava que o cabo de guerra desencadeasse a guerra. O ambiente favorecia a sua reentrada no palco político. Por um lado, a pressão dos trabalhadores no sentido da definição de uma política justa, por outro, as querelas partidárias e, por outro ainda, o ambiente internacional adverso.

A nacionalização dos bancos emissores, o fim do condicionamento industrial, a intervenção legal do Estado em determinadas empresas eram medidas de algum modo perturbadoras para o capital mas não ainda suficientes para lhe destruir o domínio e pouco convincentes como satisfação dos interesses das classes exploradas.

Uma certa insegurança e fraqueza na adopção de medidas realmente inovadoras e revolucionárias, a preocupação dos partidos em concentrar todo o seu fogo nas eleições para a Assembleia Constituinte, permitiam também o levantar das armas por parte da reacção. Era facilmente previsível que algo estava para acontecer.

Como aconteceu.

Costa Gomes, a 5 de Outubro de 1974

A marcha da história é um contínuo fluir do presente, por isso necessitamos de ter os olhos postos no futuro com clarividente extrapolação das lições do passado.

Esta necessidade dá sentido profundo a comemorações como as do dia de hoje, que encerram denso conteúdo histórico.

Em 5 de Outubro alvorece a I República derramando a esperança no peito dos republicanos que se batiam pela criação de instituições democráticas.

O curso da I República foi dificultado e depois interrompido até 25 de Abril, condenado pelo aparecimento de vários factores dos quais recordarei quatro:

Pois bem. Se temos os olhos postos no futuro democrático do País haveremos de meditar profundamente nesta efeméride tão significativa.

Recolhamo-nos em respeito ao recordar os velhos republicanos democratas que de coração quente e espírito puro tornaram possível a esperança na I.ª República.

Mas não deixaremos de considerar os factores centrífugos que ditaram o seu termo criando um fenómeno de desagregação social cuja repetição haveremos de impedir.

Mantenhamo-nos empenhados na criação acelerada de condições económico-financeiras que garantam a todos os portugueses a satisfação do direito ao trabalho em condições justas de distribuição da riqueza produzida. Atentar contra uma vivência socioeconómica tranquila, e sobretudo justa, é atentar contra todos os trabalhadores.

Criar ou contribuir para divisionismos entre correntes de pensamento ou acção democrática, no sentido superior e digno do conceito democrático, é atentar contra um futuro onde floresce a dignidade humana.

Incluir ou manter nas instituições homens que demonstrem incapacidade de se adaptar ao espírito do M. F. A. é entravar o caminho à democracia pluralista que tal espírito nos ofereceu.

Não cultivemos o espírito mesquinho de denúncia, mas sejamos tranquilamente firmes na reclassificação e selecção de homens dispostos a servir o seu povo nos postos essenciais da acção democratizante.

Finalmente sejamos puros e sinceros ao informar o nosso povo, a nossa juventude, esclarecendo as vias que conduzirão Portugal a uma verdadeira democracia em liberdade autêntica.

Terminarei, dirigindo-me a todos os presentes para saudar neles, todos os vivos e os mortos que contribuíram para a primeira experiência democrática iniciada no 5 de Outubro, e para a alvorada da segunda, que se iniciou em 25 de Abril.

Que na variedade de opiniões que a verdadeira democracia consente, possamos encontrar uma unidade pluralista que crie a todos os portugueses uma vida futura de digna de ser vivida.

Vasco Gonçalves, a 5 de Outubro de 1974

«Povo do Porto: comemoramos o 5 de Outubro, comemorando também a primeira vitória que obtivemos depois do primeiro ataque em forma da reacção. Faz hoje oito dias correram perigo as conquistas do 25 de Abril, mas a unidade do povo e das Forças Armadas travou a reacção.

Foi fundamental o papel desempenhado pelas organizações populares, pelos partidos políticos, pelas associações cívicas, como o M. D. P. e a C. D. E, por toda a população. Foi fundamental a grande manifestação que fizestes sábado passado. Faz hoje oito dias que realizastes. defronte do Quartel-General, uma manifestação que pesou profundamente na solução da crise que vivemos. E todo esse movimento do povo, em estreita união com as Forças Armadas não foi anarquia nem desordem. Onde é que há um povo no mundo que possa atravessar uma crise como a que atravessamos e que no próprio dia em que o Presidente da República foi substituído nem sequer teve necessidade de proclamar o recolher obrigatório? Haverá melhor prova de que não caminhamos para o caos nem para a desordem? Nós caminhamos para a ordem, para a ordem democrática, para a ordem que é feita na competência hierárquica, no respeito mútuo; hierarquia da competência e não hierarquia da incompetência.

«No momento, em que comemoramos o 5 de Outubro, devemos ter bem presente a memória desse grande herói nacional, que foi o general Humberto Delgado; esse homem que tombou na luta antifascista é que constitui uma honra para as Forças Armadas Portuguesas; caiu possuído pelo mesmo espírito que animou o Movimento as Forças Armadas quando derrubaram o fascismo em 25 de Abril.

Os oficiais que fizeram o Movimento das Forças Armadas empenharam a sua honra no Programa das Forças Armadas; cada um poderá ter as suas convicções políticas, mas a sua honra está empenhada no cumprimento do Programa. É sobre o que fazemos em relação ao Programa que o povo português nos deve julgar. A nossa cara está bem defronte do povo português. É esta a cara que o povo português exigirá no cumprimento do Programa do Movimento das Forças Armadas.

Toda a luta que o Movimento das Forças Armadas em unidade com o povo tem travado é no sentido do cumprimento do nosso Programa, sem ambiguidades.

Mas temos muitos caluniadores, caluniadores do Movimento das Forças Armadas e caluniadores do povo português. Os nossos caluniadores não estão interessados na democracia de Portugal porque essa democracia trás mais justiça social. Acusam-nos de coisas infames como, por exemplo, a de que queremos roubar as casas aos pobres. Que queremos roubar as pequenas propriedades do pobres. E acusam-nos de muitas outras calúnias infames. A vigilância popular e a vigilância das Forças Armadas devem estar sempre presentes para desmascarar todos aqueles que não querem que se consolide a democracia em Portugal. Acusam-nos de desvios ao Programa das Forças Armadas; acusam-nos de desvios; mas que desvios fizemos nós? Nós prometemos solenemente que a guerras coloniais só teriam solução por via política e pacífica. É isso que temos cumprido.

Cinco meses depois do 25 de Abril não há guerra na Guiné, nem em Moçambique. Estamos a colaborar com o povo da Guiné e com o povo moçambicano na construção de novas pátrias lusíadas em África. Isso não é desvio ao Programa das Forças Armadas. Foi o cumprimento de um compromisso de honra nas condições com que deparámos quando derrubámos o fascismo.

O povo tem de estar atento contra os demagogos, contra aqueles que se servem de figuras eminentes da nossa Pátria ou de valores que calam fundo no nosso coração, como a nossa bandeira ou como o nosso hino. É preciso que o povo português não se deixe arrastar pelos demagogos que se servem precisamente do que lhes é mais caro para enganar, para o levar por maus caminhos como o fizeram aqueles rebeldes em Moçambique, que, servindo-se e utilizando a emotividade de de alguns honestos moçambicanos brancos, lançaram-se numa rebelião que só trouxe a destruição e a morte. Esperamos que isso tenha sido uma vacina e que tenha sido um ensinamento para o povo português e para o de todos os outros territórios ultramarinos.

Era essa mesma táctica demagógica que a reacção utilizava na manifestação que projectava para sábado passado. Foi esse ataque da reacção que foi travado pela vossa luta e pela nossa luta. Nós não desejamos a anarquia e o caos económico, nem para lá empurramos a Nação. O que desejamos é a ordem e o trabalho.

Só o trabalho do povo português pode reconstruir esta Nação tão abalada por 50 anos de fascismo.

Nós saímos desta provação mais disciplinados e mais ordeiros que éramos dantes. Como disse o sr. Presidente da República, onde é que há no mundo um país que depois de uma revolução tão profunda, ao fim de cinco meses a tenha feito praticamente sem um tiro?

O Movimento das Forças Armadas deseja cumprir solenemente, com toda a honra, os pontos principais do seu programa em que se empenhou e que são: a descolonização, e isso temos feito e estamos a caminho de o fazer em relação aos outros territórios. E ninguém pode duvidar dos nossos objectivos. Não duvidam dessa sinceridade os movimentos emancipalistas como os da Guiné, de Moçambique e os de Angola. Eles não duvidam da nossa sinceridade, antes querem a nossa colaboração.

Queremos a democratização, estamos instaurando, estamos institucionalizando a democracia em Portugal; estamos elaborando leis democráticas para que o povo veja alcançado finalmente tudo aquilo porque aqui lutou e ansiou durante anos.

As leis que elaboramos poderão ser criticáveis, mas são lei democráticas. Ninguém pode negar que aquelas leis que temos aprovado não sejam democráticas; mas o povo tem de nos ajudar a institucionalizar a democracia cumprindo essas leis que nós vamos elaborando, manifestando-se dentro da lei, associando-se dentro da lei, desenvolvendo a sua actividade sindical dentro dela porque o que hoje é fundamental é consolidar as conquistas políticas, é consolidar a democracia. Nós vivemos numa situação democrática, mas não temos ainda a nossa democracia completamente institucionalizada; só com a vossa colaboração consciente, só com a vossa atitude consciente em relação à presente situação, consolidaremos a democracia. Não julguemos que tal é tarefa fácil; levará anos a consolidar essa democracia e as Forças Armadas são garante da consolidação da democracia portuguesa.

Nós pretendemos o desenvolvimento económico e social mas todos temos presente que herdámos uma Pátria que está na cauda da Europa; nós não podemos partir para o desenvolvimento sem sacrifícios de todos, do trabalho e do capital; nós não podemos arrancar para o desenvolvimento com padrões de vida como os que têm uma França ou uma Itália ou uma Inglaterra. Estes são países que já vivem há largos anos em democracia, que não sofreram 50 anos de fascismo opressor. O povo tem que ter consciência disso, tem que ter consciência dos limites que são impostos às nossas reivindicações, porque nós não podemos arrancar para o desenvolvimento com os mesmos salários mínimos com que hoje se vive nesses países. Para lá chegar os povos desses países percorreram um longo caminho de luta e trabalho. Tem que haver compreensão e lucidez da vossa parte e ela já tem sido demonstrada em numerosos casos. Em muitos casos o povo tem compreendido que as reivindicações têm limitações. Por seu lado o patronato deve cumprir os contratos que livremente estabelece com os seus trabalhadores.

Há agora um ponto que é preciso que nós definamos sem ambiguidades frente a frente, olhos nos olhos. Vocês acreditam ou não que o Governo Provisório é o vosso Governo?

As Forças Armadas também afirmam solenemente que estão ao lado do Governo Provisório e do Povo Português. É por isso que tendes que ter confiança em nós e tendes que ter paciência porque hoje ser impaciente é ser fascista.

Não podemos de um dia para o outro dar o céu e a terra ao nosso povo porque ele foi subjugado durante 50 anos.

Na vida sindical, nas vossas relações de trabalho, devereis estar permanentemente atentos às provocações que vos possam dividir do Governo Provisório e das Forças Armadas.

Será o povo português quem livremente escolhera o seu futuro político. As Forças Armadas pretendem apenas lançar os fundamentos da voz do povo. Será o povo português que conscientemente, pelo seu voto, decidirá o seu futuro em eleições para a Assembleia Constituinte. E essas eleições, podeis estar certos, serão eleições livres.

O Movimento das Forças Armadas só fixa um objectivo: lançar os fundamentos para que o povo português possa escolher livremente as instituições por que se quer reger. Depois recolherá aos quartéis para defender as conquistas democráticas.

Ao contrário do que dizem aqueles que nos caluniam e que vilmente nos acusam de ter vendido os territórios ao inimigo, nós estamos criando condições para que a Pátria portuguesa seja perene em África e no Mundo.

Nós somos um País pobre, nós não somos um País rico e, portanto, a ajuda que podemos dar aos povos das nossas colónias é uma ajuda sincera, não é uma ajuda neocolonialista. É uma ajuda para que aí se criem novas Pátrias livres, de expressão portuguesa e em que os portugueses possam das as mãos aos africanos, depois de quinhentos anos em que lá estivemos. É preciso não esquecer que temos um dever histórico de ajudar os Africanos a criar novas Pátrias para colmatarmos os erros e os crimes dos regimes anteriores.

Nós, no Programa das Forças Armadas, dissemos solenemente que cumpriríamos os compromissos anteriormente assumidos pelo País e assim o faremos.

Desejamos a cooperação e a amizade com todos os povos do Mundo, independentemente do seu sistema político ou social. As condições que nós pomos é que não interfiram nos nossos assuntos internos, e que respeitem os nossos interesses. O nosso desejo é que a colaboração com os outros países seja de ajuda mútua, recíproca, e não aquele tipo de colaboração em que uns povos exploram outros povos.

Nós não desejamos agravar as dissenções sociais que existem em qualquer sociedade capitalista, entre o patronato e os assalariados.

Queremos é que haja compreensão mútua, mas essa compreensão não pode ser só de uns, tem de ser de uns e de outros.

O País não está à beira de ir para o caos económico. Ainda ontem a Confederação da Indústria Portuguesa, que agrupa dezenas de milhares de empregados, o negou.

Eu daqui quero também apelar para os estudantes. Um novo ano lectivo começa. Os estudantes sabem muito bem que no nosso País, beneficiando de um situação especial e da sua origem de classe, têm tido certas condições especiais de vida, no contexto da nossa Nação. Claro que os estudantes com a sua instrução e com a sua lucidez, têm sido os maiores lutadores contra o fascismo. Viram as suas associações académicas destruídas, viram os seus camaradas mortos, passaram pelas prisões ou foram expatriados.

Os estudantes, como os intelectuais, têm um grande papel a desempenhar na reconstrução desta Pátria. E o seu papel devem desempenhá-lo nos seus locais de trabalho, que são as aulas, que são os liceus, as escolas técnicas, as Universidades. Procurando colaborar no sentido da instituição de verdadeiros organismos democráticos e progressivos, não fazendo tábua rasa do que está feito, mas aproveitando as actuais plataformas para partirem para o futuro. Os estudantes também devem ter presente que hoje a nossa principal luta é a consolidação do processo democrático e que na medida em que tivermos escolas geridas por professores competentes teremos uma democracia autêntica. Os estudantes devem ser exigentes consigo mesmos, porque a sua condição de estudantes já está muito beneficiada em relação aos mineiros, aos pescadores, ou aos operários que trabalham arduamente nas oficinas.

Os estudantes também são trabalhadores de Portugal, mas para que toda a gente o sinta é preciso trabalhar nas escolas.

É preciso muito trabalho. E preciso que sejam exigentes para consigo mesmos e que sejam exigentes para com o ensino, que sejam exigentes para com o professor. Mas é preciso também que compreendam que nas aulas, nas universidades, nos liceus e nas escolas é necessário a hierarquia, a hierarquia democrática, a hierarquia da competência. É preciso que tenham bem presente que há homens que cometeram erros e que podem ser recuperáveis. É preciso não amarrar os homens eternamente aos erros que cometeram. Há homens que são recuperáveis.

E qual é o critério pelo qual podem saber e ter a certeza se esses homens são recuperáveis? É o critério da prática, é por aquilo que eles vejam fazer a esses homens que poderão ter a certeza se são ou não são recuperáveis.

Temos de ter presente todos que o País não abunda em quadros, que o País precisa dos seus quadros e que se esses quadros se integrarem na ordem democrática, se por aquilo que fazem todos os dias mostrarem que são democráticos, esses quadros são recuperáveis e têm também direito de cidadania na nossa sociedade democrática.

Isso não significa que se ande com os fascistas ao codo. É preciso ter a lucidez para saber distinguir. E não é preciso ser nenhum intelectual para poder distinguir onde está o bem e onde está o mal.

Eu também apelo daqui para os nossos camponeses. Tenham confiança no Movimento das Forças Armadas, que não vos quer roubar as terras, nem as casas, nem a lavoura. Estas e outras mentiras são espalhadas pelos nossos inimigos, que aproveitam precisamente a despolitização de que nós falámos tanto tempo, durante 48 anos e ela está à vista, agitando «slogans» que vos são caros. Esses mentirosos caluniam o Movimento e procuram abrir brechas entre o Movimento da Forças Armadas e o povo.

Nós não podemos modificar o País de um dia para o outro. Toda a gente sabe que a agricultura estava arruinada. Toda a gente sabe que os problemas da agricultura levam mais tempo a resolver do que os problemas da indústria. Nós estamos também ao lado dos camponeses. Porque é que não havíamos de estar ao lado dos camponeses, se eles também sofreram as agruras do fascismo, se eles também têm sido explorados, se eles também fazem parte do nosso povo?

Na nossa democracia cabem todos, todos os que não sejam fascistas nem reaccionários.

Nós queremos a união do povo português, queremos que o povo se una e escolha os representantes que no próximo ano na Assembleia Constituinte votem as leis que sirvam o povo e que não sejam contra o povo. O povo só, e quando digo o povo é a população de todo o País e são as classes trabalhadoras, são os camponeses, são os intelectuais, são os estudantes, são os pequenos comerciantes, são os pequenos, médios e grandes industriais.

Todos! Todos nós devemos estar atentos aos demagogos e aos reaccionários.

O nosso povo é um povo cristão, é um povo católico. Nós não queremos lutas anticlericais, embora por vezes assistamos a actos a que não devemos assistir.

Há um campo para a religião e há um campo para a política.

Nós não desejamos que estes campos sejam misturados. Nós não queremos, nem permitiremos, que alguém tente por este ou outro motivo dividir o nosso povo. Dividir o povo é comprometer o seu futuro.

Finalmente: o que significa a jornada de trabalho de amanhã?

Significa que não vamos para o caos e para a anarquia. Significa que o povo compreendeu que é preciso construir este País e que, para a sua construção, todos são poucos. É o povo que livremente decide que vai amanhã trabalhar e vai trabalhar voluntariamente, não vai trabalhar metido em caixotes, pago a tanto por cabeça para se ir manifestar.

O povo ao trabalhar amanhã vai dizer a toda a Nação, vai dizer aos medrosos: aqui estão as forças que são capazes de reconstruir Portugal.

E não é só o povo que vai trabalhar amanhã. Vão trabalhar amanhã os estudantes, vão trabalhar amanhã os funcionários públicos, vão trabalhar amanhã todos os portugueses de recta intenção, que têm a consciência do momento que vivemos.

Mas atenção: nós deveremos estar firmes, pacientes e vigorosos, mas não devemos pensar que não estamos sujeitos a novos ataques da reacção, porque estamos com certeza.

Só a vigilância, vigilância que não quer dizer P.I.D.E. — é preciso distinguir bem a vigilância democrática da vigilância da P.I.D.E. —, só a vigilância democrática que se exerce de olhos nos olhos, actuando imediatamente contra o boato, contra a calúnia, contra a mentira e contra os pontos de vista errados, só essa vigilância, em conjugação com a vigilância das Forças Armadas, poderá garantir a consolidação da Democracia em Portugal.

Eu peço que me acompanhem em três vivas solenes, que são três compromissos de honra que nós tomamos convosco e vocês connosco.

Primeiro: saudemos o militar mais ilustre que temos em Portugal, que é Senhor General Costa Gomes, Presidente da República. Esse Militar é símbolo de unidade das Forças Armadas, é o garante do Programa do Movimento das Forças Armadas, o garante de paz social, da paz interna em Portugal.

Saudemos as Forças Armadas e em especial os jovens oficiais dos 30 a 40 anos, que são os homens mais puros, mais íntegros e mais fortes que eu conheço até hoje.

Gritemos bem alto um viva para Portugal, pela nossa Pátria, pelo nosso Povo.»

Na ONU, Outro Rosto
Discurso proferido pelo Presidente da República, General Francisco da Costa Gomes, perante a Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque (18-10-1974)

Senhor Presidente:

Em nome do povo português saúdo fraternalmente todos os povos do mundo, reconhecendo fazê-lo numa mui digna assembleia cuja vocação universalista é o polo de condensação das melhores esperanças dos que amam a justiça e a paz.

Saúdo VV. Ex.ªs, Senhor Presidente, e todos os representantes nesta Assembleia Geral em que recaem as mais transcendentes responsabilidades da História da Humanidade.

Reconhece o mundo que, com as deficiências próprias das obras humanas, tem esta Organização procurado garantir um clima mundial de tolerância, de paz, de segurança e de justiça.

Todos os homens de talento e de génio que nesta Organização têm sabido colocar os ideais do bem e da equidade universal acima dos interesses nacionais ou regionais são marcos na rota ascensional da dignidade humana.

Sou o primeiro Chefe de Estado de Portugal que tem o privilégio de se dirigir à opinião pública mundial beneficiando da vantagem de o fazer aqui e perante VV. Ex.ªs.

O meu País tem uma História longa de mais de oito séculos, e não nos será difícil perdoar a memória do último meio século, orientado por homens que não souberam sintonizar os seus ideais com a alma colectiva do povo a que pertenço.

Nas histórias de todos os povos há relâmpagos de inspiração que lançam as suas forças vivas no caminho mais nobre e mais eficaz, e há golpes de cegueira política alienam a vontade popular e lançam as pátrias em caminhos obscuros e estéreis.

Os espíritos superiores são aqueles que pairam acima dos acontecimentos historicamente fugazes e conseguem visão global e sintética que crie uma perspectiva crítica e justa da vida de um país

Não sou optimista ao atribuir ao povo português um saldo histórico fecundamente positivo; contribuímos decisivamente para o conceito planetário que o homem de hoje tem de si próprio; estivemos com os pioneiros bons em cuja legislação a abolição da escravatura foi mais uma conquista da ciência jurídica; demonstrámos que a pobreza de recursos não impede o fenómeno fecundo de uma vivência que torna os povos mais irmãos e mais unidos (no grande espaço da expressão portuguesa, 130 milhões de pessoas respondem por esta afirmação); somos um povo europeu em cuja paisagem e arte se amalgamaram influências de todos os continentes e em cujo sangue há marcas genéticas dos clãs europeus, das tribos do norte ao sul da África, da Ásia e das Américas.

Senhor Presidente:

Sou o Chefe de Estado de um País que, depois de humilhado por meio século de ditadura, soube iniciar na longa noite de 25 de Abril uma revolução sem sangue que outros classificaram da mais pura do século.

Estamos perfeitamente determinados a salvaguardar a pureza dos principais objectivos revolucionários: devolver ao Povo Português a dignidade perdida, implantando condições de vida mais justas com instituições democráticas pluralistas legitimadas na vontade do povo livremente expressa; iniciar o processo irreversível e definitivo de descolonização dos territórios sob administração portuguesa. Não mais admitiremos trocar a liberdade de consciência colectiva por sonhos grandiosos de imperialismo estéril.

A nossa revolução iniciada com o 25 de Abril, apesar de embaraços e dificuldades, continua a demonstrar o alto civismo do povo de Portugal.

Aqui deixo um convite aos altos responsáveis políticos desta Assembleia para verificarem em Portugal que o ambiente geral de tranquilo labor e de ordem social não justifica generalizações alarmistas a partir de pequenas perturbações sociais que o Governo Provisório sempre sanou e ultrapassou.

Nestas condições, estou à vontade para afirmar sole- nemente que o Governo Português tem intenção e capacidade para cumprir na letra e no espírito a Carta das Nações Unidas e todos os compromissos internacionais políticos, comerciais ou financeiros a que se encontra vinculado.

No plano interno manteremos um processo democrático, onde, com um mínimo de sofrimento, vamos desintoxicar os espíritos de meio século de propaganda de extrema-direita; construiremos um ambiente de tolerância política multipartidária, iniciaremos a politização do nosso povo e dar-lhe-emos as condições para a livre escolha do regime pluralista em que deseje viver.

No processo de descolonização manter-nos-emos fiéis aos princípios do direito internacional da autodeterminação e independência; na aplicação concreta dos princípios teremos a flexibilidade de espírito suficiente para salvaguardar os interesses dos povos a descolonizar; seremos tão dinâmicos quanto o exige a impaciência de quem toma uma tarefa com muitos anos de atraso, e tão pacientes quanto o indispensável à felicidade de povos que sofreram na carne as consequências da anterior situação política portuguesa. Saberemos evitar figurinos estereotipados e procurar para cada território a solução mais adequada à garantia da génese feliz de uma nova Pátria.

No plano das relações internacionais, procuraremos intensificar as relações económicas e políticas com todos os países amigos tradicionais e com todos os povos do mundo.

Aproveitaremos as relações históricas com outros povos para desenvolver aceleradamente justas situações de interesse mútuo, incluindo os países existentes de expressão portuguesa, as novas nações irmãs em formação pelo processo de descolonização em curso, e não esquecendo os estados árabes e outros, cujas raízes históricas se cruzaram com as nossas ao longo dos séculos.

As origens culturais latinas facilitar-nos-ão o reforço da solidariedade com todos os países latinos da Europa e da América.

O estádio do nosso desenvolvimento, a nossa situação geográfica, o sentimentalismo e anti-racismo congénito do nosso povo são a garantia de uma ligação de fácil entendimento e fraterna entreajuda com todos os povos do Terceiro Mundo.

Não mais resta o direito a sociedade internacional para anatemizar Portugal com o ferrete da suspeição ou da consideração condicionada.

Nestes termos, Portugal, no desenvolvimento de uma revolução dos espíritos, dos comportamentos e das atitudes sociais, na pacífica revolução da escala de valores que colocará em lugar justo os pobres e os desprotegidos, sente-se no direito à solidariedade e auxílio da sociedade internacional em que se integrou.

Esperamos das Nações Unidas, e suas agências especializadas, o rápido levantamento de todos os embargos e restrições que vimos sofrendo.

A situação pré-democrática em que vivemos tem importantes dificuldades económicas e financeiras que melhor serão vencidas se os países democráticos do mundo se dispuserem a uma solidariedade material e moral, rápida, fraterna e justa no seu preço financeiro e político. Esperamos deles essa atitude amiga.

Ao nível das preocupações internacionais, Portugal manifesta o seu profundo desejo de ver as grandes potências mais dinâmicas no caminho do desarmamento mundial e que os enormes recursos que ficariam disponíveis sejam canalizados para os países mais desfavorecidos, onde em cada homem a luta pela sobrevivência é um drama que lhe nega o direito à cultura e ao progresso espiritual.

No seu instinto de intercontinental humanismo, o povo português considera-se irmão de todos os povos oprimidos e declara a disposição de contribuir para todas as iniciativas que visem debelar a fome no mundo, melhor distribuir as riquezas e salvaguardar os princípios da Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Senhor Presidente:

Dentro de dias a Organização das Nações Unidas celebrará o seu 29.º aniversário.

A voz dos mais fracos teve aqui um tribuna quando a lei da força se sobrepôs à força da lei.

A voz dos oprimidos aqui lamentou a ignomínia dos opressores.

O clamor dos pobres aqui feriu a consciência dos que esbanjam em supérfluos o excesso de recursos disponíveis.

Adversários exaltados aqui descomprimiram em palavras as pseudo-razões que a opinião pública reduziu a dimensões razoáveis.

Quantas canseiras e esforços desta Organização têm sido estéreis quando os orgulhos calaram a voz da justiça e da razão.

Mas em larga contrapartida quantos fracos sentiram apoio, quantos oprimidos foram libertos, quantos pobres foram amparados, quantos exaltados sentiram o ridículo das suas posições apaixonadas.

O 29.º aniversário abre novo capítulo de uma organização que seguramente consolida a mais transcendente instituição que o espírito humano soube criar.

A todos os que directa ou indirectamente contribuíram para a génese e funcionamento da O. N. U. a nossa gratidão por nos haverem oferecido mais um Dia Maior da Humanidade.

Vou terminar dentro de momentos, porque de nós o mundo espera muitos esforços concretos e pouca retórica.

Saúdo os países tradicionalmente amigos nas boas e más horas do meu País.

Saúdo os países de expressão lusíada, actuais e potenciais, dos quais a Humanidade espera o fortalecimento de laços comunitários fraternos e de mútuo respeito.

Saúdo os povos latinos, países irmãos numa cultura de cujo sentir humanístico os povos oprimidos têm o direito de esperar auxílio.

Saúdo todo o Terceiro Mundo, com a certeza da sua compreensão quando sublinho especialmente os povos irmãos da África, incluindo os povos árabes, também gravados no sangue e na alma do povo a que pertenço.

Saúdo os povos africanos que, depositando inteira confiança na honestidade e sinceridade do nosso processo de descolonização, estabeleceram connosco relações diplomáticas e de amizade que muito nos sensibilizaram.

Termino saudando todos os homens bons cujas preocupações se localizam em construir uma Humanidade melhor, mais pacífica, mais segura, mais fraterna, mais progressista.

Que cada nova geração tenha uma vida mais digna de ser vivida.

Muito obrigado, Senhor Presidente!

Primeira Conferência de Imprensa da Comissão Coordenadora do Programa do M. F. A. (31/12/1974)
(excertos)

1.º GRUPO DE QUESTÕES

DIÁRIO DE LISBOA

— Certos sectores, ainda que surgindo com toda uma aparente sinceridade democrática, advogam e parecem desejar o regresso do M. F. A. aos quartéis. Os meios mais reaccionários é isso que desejam. Pensa a C. C. P. que esse regresso poderá ser feito sem perigo do desmoronamento de todo o processo democrático?

— A institucionalização definitiva do M. F. A. não será o único processo de garantir os objectivos do 25 de Abril?

— Quais os obstáculos que se opõem a essa institucionalização?

CAPITAL

— Após a formação da Assembleia Legislativa que em princípio, poderá verificar-se em Outubro do próximo ano prevê o abandono, por parte do M. F. A., de uma actividade política circunscrevendo-se esta aos direitos dos seus membros como cidadãos? Em caso negativo como se prevê que o M. F. A. possa inserir-se no quadro político nacional?

DIÁRIO DE NOTÍCIAS

— Caso não se dê a participação na Constituinte, como vê a C. C. P. a possibilidade de continuar a intervir, como largos sectores entendem impor-se, na evolução da situação política portuguesa em ordem à consolidação da democracia?

— Segundo o Programa do M. F. A. , a J. S. N. deveria exercer o poder político até à formação de um Governo Provisório Civil. De civil esse Governo passou parcialmente a militar e a J. S. N. deixou de assumir aos olhos do povo a preponderância que tinha logo após o 25 de Abril, lugar que, gradualmente, foi cedendo ao próprio M. F. A.

Qual é a opinião da C. C. P. quanto à possibilidade de a nova democracia se tornar frágil, se o M. F. A. se limitar, após as eleições, conforme já foi anunciado, a uma actividade puramente defensiva da integridade nacional?

DIÁRIO DE LISBOA

— Ao longo destes 8 meses têm surgido diversas crises e a imagem que surge no exterior é de que, de tempos a tempos, aparecem organizações ou grupos que pretendem criar as condições necessárias à diluição do M. F. A. na hierarquia tradicional e numa pretensa legalidade. Esta imagem corresponderá a uma realidade?

RESPOSTAS

A perguntas feitas levam-nos a uma questão da maior actualidade que nos parece ser a síntese de todas as interrogações formuladas.

Qual o futuro do M. F. A. ?

Antes de, de uma forma «seca», pretendermos dar imediata resposta, a essas interrogações, interessa repensar um pouco sobre a evolução que, sob determinada ética o processo sofreu após o 25 de Abril.

Com a acção militar então decorrida surge à face do próprio Movimento a definição dos órgãos de soberania. Essa definição deixava «omissa» a fórmula de participação de todo o M. F. A. Sabe-se que surgiram correntes e que sem dúvida, determinados sectores, embora minoritários remetiam-no, referimo-nos ao movimento, aos quartéis, já que segundo esses sectores, a representatividade do M. F. A. ficaria a cargo da J. S. N. e da C. C. P. (membros também do C. E).

Falava-se em representatividade e bem, já que esses membros teriam que ser fiéis intérpretes do pensamento e vontade revolucionários, que inspirou larga camada de jovens militares. E estes logicamente teriam que por processo adequado fazer chegar as suas obrigações de colaboração, aos escalões executivos, seus representantes. O dinamismo do processo revolucionário exigia assim uma reestruturação do M. F. A. que institucionalizado, poderia ser o garante de todo o processo e alargá-lo a todas as F. A.

Só após o 28 de Setembro tal realidade foi compreendida e logo que eleita a nova Junta de Salvação Nacional se iniciaram os trabalhos que breve conduziriam à institucionalização do M. F. A.

Surgem assim dentro do Movimento os órgãos já conhecidos como:

Estavam agora criadas as condições para em conjunto os militares analisarem o curso dos acontecimentos políticos o que até então não tinha sido possível concretizar.

Se atentarmos que do próprio programa se extrai que o sistema político vigente terá de processar-se sem convulsões internas que afectem a paz, o progresso e o bem-estar da Nação, e que se comprometia o M. F. A. como plataforma necessária a garantir a adopção de medidas, todas elas expressas no programa, lógico seria que em consequência se procurasse fazer como que um balanço. Sem dúvida que muito de positivo e algo mesmo quase transcendente se operou.

Não obstante quanto a medidas preparatórias de carácter material, económico, social e cultural que garantam o futuro exercício efectivo da liberdade política dos cidadãos;

Quanto a uma nova política económica, posta ao serviço do Povo Português, em particular das camadas da população até agora mais desfavorecidas, tendo como preocupação imediata a luta contra a inflação e a alta excessiva do custo de vida, o que necessariamente implicará uma estratégia antimonopolista;

Quanto a uma nova política social que, em todos os domínios, será posta ao serviço do Povo Português, defesa dos interesses das classes trabalhadoras e o aumento progressivo, mas acelerado, da qualidade da vida de todos os Portugueses;

Quanto a todas estas medidas apercebeu-se o M. F. A. de que para além de correcções introduzidas e dos esforços feitos, muito havia por concretizar, e assim, lhe cabia de momento a responsabilidade de como se disse se repensar e reforçar;

Paralelamente ao 2.º Governo Provisório surgiam momentos de idênticas interrogações e ajustamentos. Daí o reforço de unidade dentro do Movimento, daí a consciencialização da sua responsabilidade, daí a obrigatoriedade de ter de admitir tal como o M. F. A. proclamou ao País:

— A obrigatoriedade de zelar pelas já referidas plataformas mínimas.

Esta a génese da questão

Qual o futuro do M. F. A. ?

A exposição já feita permite responder, agora com objectividade, aos problemas que nós consideramos fundamentais no grupo de questões apresentadas.

1. Institucionalização do M. F. A.

Consideramos que a institucionalização agora, ou mais tarde do M. F. A. , é problema de somenos importância.

A lei é fruto da prática, pois só assim, os decretos vertidos no papel, possuem a legitimidade real que os permite cumprir.

Portanto a institucionalização formal do M. F. A. é um fenómeno natural resultante da própria dinâmica em curso.

2. Relações J. S. N.—M. F. A.

A J. S. N. é o órgão supremo institucionalizado pela Revolução.

Para actuar, necessita de estar permanentemente a par da vontade de quem o criou (o M. F. A. ).

Esta a razão porque, a partir de 28 de Setembro, há uma ligação profunda e permanente da J. S. N. com o M. F. A.

3. Continuação ou não do M. F. A. além do período pré-democrático que terminará cerca de Outubro próximo.

Nunca se pôs, nem nunca se porá a questão de terminar com o M. F. A. em qualquer momento. Isto para o próprio M. F. A.

O M. F. A. durará enquanto existirem Forças Armadas porquanto estas estão-se transformando aceleradamente, no M. F. A.

O Movimento das Forças Armadas é o mesmo que Forças Armadas em Movimento.

4. Intervenção política do M. F. A. na vida nacional além da Assembleia Legislativa.

A prática da Revolução Portuguesa parece mostrar que a tenra democracia que haverá (este é o ponto de honra do M. F. A. ) de surgir institucionalizada cerca de Outubro próximo (com a entrada em funções da Assembleia Legislativa e outros órgãos do Poder), que essa tenra democracia, dizíamos, necessita de ser amparada e garantida, tendo em vista o seu enraizamento profundo na sociedade de todos nós.

O M. F. A. não enjeita as responsabilidades que assumiu perante o Povo Português. O M. F. A. está pronto a contribuir para esse enraizamento, em ligação estreita com todas as forças progressistas e democráticas.

2º GRUPO DE QUESTÕES

DIÁRIO DE LISBOA

— O problema da participação ou não do M. F. A. na Constituinte. Quando haverá uma decisão final?

3º GRUPO DE QUESTÕES

DIÁRIO DE LISBOA

— Da última reunião de delegados das F. A. poderá concluir-se que vão surgir em curto prazo as leis necessárias para o progresso da resolução de 25 de Abril?

RÁDIO CLUBE PORTUGUÊS

— É evidente a necessidade de saneamento no âmbito do Ministério da Justiça. Considerando o futuro julgamento de fascistas (caso dos Pides entre outros) e a recente libertação de detidos por acusação de sabotagem económica, que pensa a C. C. P. do legalismo que tem sido aplicado em substituição da legitimidade revolucionária que o M. F. A. impôs em 25 de Abril?

— A recente Assembleia de Delegados do M. F. A. aprovou a decisão de se promulgarem leis revolucionárias.

Dada a sua urgência:

  1. Para quando essa promulgaçao?
  2. Quem as porá em Prática?
  3. Sobre que matéria incidirão?
  4. Estarão relacionadas com a extinção definitiva das muitas erupções fascistas existentes a par do domínio ainda efectivo dos monopolistas e latifundiários?

DIÁRIO POPULAR

Tem vindo a público, nos últimos dias, expressa ao nível do M. F. A. a ideia da necessidade de promulgação de uma legislação adequada à revolução. É possível neste momento adiantar algo mais quanto ao conteúdo dessa ideia?

— É possível saber-se quando e por que instâncias serão julgados os ex-Pides mais responsáveis bem assim como destacadas figuras do regime fascista, entre a quais por exemplo o Almirante Henrique Tenreiro?

RÁDIO CLUBE PORTUGUÊS

— O brigadeiro Otelo Saraiva de Carvalho afirmou em entrevista ao R. C. P. que o M. F. A. terá sempre uma palavra a dizer em tudo o que for decisivo nas Constituintes. A Coordenadora subscreve esta afirmação?

CAPITAL

— Diversos têm sido os oficiais das F. A. que se têm pronunciado quanto à participação ou não do M. F. A. nas eleições da Constituinte. Pergunta-se: já está decidido que essa participação não se verificará?

DIÁRIO DE NOTÍCIAS

— Qual a posição da C.C. quanto à participação na Constituinte?

RESPOSTAS

Perante o Povo Português, a responsabilidade que o M. F. A. assumiu em 25 de Abril, mantém e não pretende alienar, implica necessariamente uma vigilância atenta e uma participação activa em tudo quanto disser respeito à Democracia que tem de defender e ajudar construir. É neste contexto que o problema da Constituinte deve ser encarado; falta apenas definir a forma pela qual essa vigilância deverá ser exercida uma vez que a vontade política do Movimento é inabalável quanto à defesa dos interesses democráticos. Entretanto, aguardamos ainda que a decisão suba das bases do M. F. A. até à C. C. P. como aliás tem vindo sempre a ser desde que a ideia da Revolução nasceu entre nós.

DIÁRIO DE LISBOA

— As F. A. tencionam continuar a adoptar medida“ drásticas anticorrupção?

RESPOSTAS

Problema da legalidade Revolucionária e da actuação Revolucionária.

Torna-se evidente a necessidade de em todo o processo iniciado em 25 de Abril se manter uma coerência revolucionária, para que o Movimento não seja a expressão dum simples levantamento militar, que seria incapaz de resolver as contradições da sociedade portuguesa, mas se converta numa autêntica revolução que concretize as aspirações do Povo.

Neste contexto se se torna necessária a implantação duma legalidade revolucionária, o que é evidente, essa legalidade não poderá ser o resultado de leis mais ou menos abstractas havendo, como muitas vezes se nota ainda, a tendência para decalcar modelos da legalidade fascista, mas sim o resultado de actos concretos que em cada momento sejam uma resposta aos problemas objectivos que há que vencer, resposta essa que será função da capacidade revolucionária existente em cada momento.

Cometem portanto um erro, todos quantos pensam que será um texto escrito – lei, programa, plano, o que for – que irá resolver sozinho, situações concretas.

As situações resolvem-se pela prática adequada que~concretize uma análise objectiva de cada situação, análise essa que terá que ter em conta, necessariamente, as relações das forças em presença. Isto implica a adequação de cada resposta a cada problema.

Só assim tem sido possível ao M. F. A. superar as crises que têm surgido e ir consolidando, o que é um facto , a sua consciência revolucionária, em íntima comunhão com o Povo, com cujos objectivos se identifica cada vez mais.

Que assim é, o Povo o tem dito. Se assim continuarmos e a tal dedicarmos todas as nossas energias, estamos seguros que em cada momento surgirão as respostas ou leis adequadas à resolução dos problemas concretos que se nos põem e assim a consolidação da resolução será um facto, resolução que terá que ser um processo que resolva as contradições objectivas da nossa sociedade e o julgamento revolucionário de todos os responsáveis e sustentáculos do estado fascista que nos submergiu durante meio século e de todos os que pela sua prática, após o 25 de Abril, se opunham à Revolução.

Assim, dessa prática revolucionária, imposta pelas situações concretas, está nascendo a necessária legislação que institucionalizará, de forma positiva, aquela prática, permitindo uma actuação coerente e imparcial dos órgãos que administrarão a justiça.

4.º GRUPO DE QUESTÕES

DIÁRIO DE LISBOA

— O M. F. A. estará atento ao aproveitamento da ignorância e atraso de muitas populações dos meios rurais peos sectores políticos vinculados ao regime anterior mas que surjam agora no acto eleitoral com uma capa democrática?

RÁDIO CLUBE PORTUGUÊS

— Os relatórios elaborados sobre as primeiras campanhas de dinamização do M. F. A. demonstram um elevado grau de despolitização das populações, manipuladas e intimidadas pelas forças reaccionárias locais, a maior parte não saneadas. Pensa que este facto poderá ter algum peso na decisão de o M. F. A. participar ou não nas Constituintes?

RESPOSTAS

Os 48 anos do regime fascista, em que falar de política era crime, para os outros, pois políticos só podiam ser os do partido no governo, ou sejam os fascistas, fizeram com que o povo português, nomeadamente o rural, estivesse quase totalmente despolitizado.

Para isso contribuiu todo o sistema daquele regime e não interessa estar agora a escalpelizar esses factos. Q que custa é verificar que as populações que mais teriam de ganhar com a instauração de um regime de feição socialista, continuam a ser as que têm mais medo do papão comunista e outros. De qualquer modo esses aspectos eram já do nosso conhecimento ao elaborar o Programa e preconizar uma data como limite do período até às eleições. Poderemos concordar que se «perderamr cerca de oito meses, na efectivação de um programa largo de esclarecimento e politização às populações. Certo, no entanto, tal como foi prometido, tudo fazemos para realizar eleições no prazo previsto. Não poderemos no entanto deixar de estar atentos a todas as possíveis manobras feitas a coberto de disfarces, mas de qualquer modo isso é de facto mais um pormenor que nos leva ao exercício da vigilância e participação efectiva no processo democrático, em curso, como já aqui foi dito.

5º GRUPO DE QUESTÕES

DIÀRIO DE LISBOA

— Alguns jornais publicaram certas afirmações do Sr. Brig. Otelo S. de Carvalho que posteriormente o Sr. Gen. Spínola pretendeu desmentir. O Sr. Gen. Spínola, segundo os jornais, afirmou também que já “procedera militarmente”.

Qual o comentário da C. C. P. a este confrontamento de opiniões e que reflexos poderá ter dentro do M. F. A. ?

RESPOSTA

Sobre este assunto parece-nos de facto que muito sensacionalismo se está a fazer à volta do mesmo. Não nos restam dúvidas quanto à veracidade das declarações do Brg. Otelo S. de Carvalho, pois do assunto já a C C P. era conhecedora desde que tal aconteceu. Aliás não foi a única vez que o Sr. Gen. Spínola fez certas afirmações que poderiam ser aproveitadas, contra ele mesmo, tal como as que estão em causa. No entanto nunca a C. C. P. lhes deu importância, pois as considerou desde sempre inseridas na personalidade do próprio Gen. Spínola. Esta figura de militar muito controverso, cheio de grandes virtudes, não deixou de cumprir a missão histórica que lhe estava reservada.

Esta missão foi cumprida, e ainda que mais curta e com mais deficiências do que o M. F. A. esperava no início, parece à C. C. P. que há que encerrar o assunto.

Sobre o chamado «procedimento militar» parece-nos que está tudo respondido com o que acabamos de dizer.

Quanto aos reflexos que tal assunto poderá ter dentro do M. F. A. , não nos parece que, eles possam ser perniciosos de modo algum, pois desde que a verdade seja dita, isso nunca poderá afectar a união dentro do M. F. A. , até porque a clarificação das situações só poderá servir para reforçar a unidade.

6º GRUPO DE QUESTÕES

DIÁRIO DE LISBOA

Considera a C. C. P. que as recentes prisões de capitalistas pode ser considerada no âmbito da estratégia antimonopolista prevista no Programa do M. F. A. ?

RESPOSTAS

De maneira nenhuma estas prisões podem ser consideradas no âmbito da estratégia antimonopolista. Estão sim dentro de uma luta anticorrupção.

Quanto à estratégia antimonopolista isso é um assunto que terá que ser encarado no âmbito do Programa económico.

Em relação à actuação do C. O. P. C. O. N., ele actuou a pedido do Governo e de acordo com a legislação que o criou a ele C. O. P. C. O. N. De qualquer modo esse assunto parece-nos que já estará respondido no que respeita à entrada em vigor de legislação revolucionária.

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14.º GRUPO DE QUESTÕES

REVOLUÇÃO (Órgão do P. R. P.)

A crise económica pela sua própria natureza, gerada pelo capitalismo, determina que se faça uma escolha: ou via capitalista ou opção socialista, sob ponto de vista de determinada forma de produção económica. Neste princípio do ano, de que lado se situa a Comissão Coordenadora?

RESPOSTA

Sobre este assunto, a C. C. P. não poderá situar-se de qualquer dos lados, dado que a C. C. P., como já foi afirmado variadíssimas vezes, mais não representa que a vontade do próprio M. F. A. , pois neste vive-se efectivamente em Democracia, desde o seu aparecimento. E a C.C.P. não poderá ainda pronunciar-se em virtude de o assunto estar em discussão no seio do M. F. A. e não haver ainda qualquer resolução.

No entanto a C.C.P. não quer deixar de referir que a via é socializante, como transparece do próprio Programa, e que, ou o capital colabora nessa mesma via ou ela terá forçosamente que se transformar em socialista, e ao fazê-lo recorda as passagens desse Programa do M. F. A. em que se determina uma estratégia antimonopolista.

Costa Gomes, em Novo Ano

«Portugueses:

Hoje é o Dia Mundial da Paz. Aparentemente, o conceito da Paz é de uma evidência tão natural que, desde logo, seria um tema exausto.

Para o analisar comecemos por referenciá-lo em quatro planos fundamentais:

Teremos o primeiro ângulo da complexidade do tema. Consideremos que do mistério da Vida sempre se insere uma marca dialéctica nos conceitos humanos.

O fenómeno existencial tende a oscilar no quadrante cujos extremos limites são a Paz digna e a luta injusta. Aqui reside um segundo ângulo da complexidade da Paz.

Finalmente verifiquemos que Paz pode parecer um bem absoluto; mas que diríamos da Paz interior dos homens marginais? Que diremos da Paz das relações explorador-explorado e da Paz social dos povos oprimidos por extremismos totalitários?

Nestas dúvidas assenta o fulcro maior da complexidade real do conceito da Paz.

Como corolário haveremos de concluir:

Se as minhas palavras, a vossa atenção e os nossos propósitos contribuírem um átomo para a manutenção e sublimação da Paz em Portugal teremos celebrado bem este Dia Mundial da Paz.

O dia de hoje é também a primeira página que se volta sobre o ano de 1974, onde a Revolução de 25 de Abril foi acontecimento grande nas Histórias de Portugal e do Mundo.

O balanço imediato de 1974 é um risco ingrato, mas teremos que o fazer para traçar o rumo de 1975.

Os jovens oficiais a quem devemos o 25 de Abril ofereceram ao País um programa suficientemente genérico para dar ao Povo ampla liberdade de escolha quanto ao esquema político a preparar.

Esta redacção genérica era indispensável, constituiu uma solução inteligente e sensata.

Como tudo na vida teve os seus inconvenientes. Foi um testamento interpretado consoante os credos dos vários herdeiros da Liberdade que oferecia.

Tem sido a própria dinâmica da Revolução, o jogo das forças políticas, a formação acelerada de uma opinião pública politizada, a pressão de classes e grupos à procura da sua dimensão válida, que vem clarificando a situação política transitória.

À medida que o testamento do M. F. A. se foi e vai clarificando surgem os herdeiros descontentes, porque lhes não agrada a liberdade e a esperança da maioria dos seus irmãos.

Encerrou-se em 1974 uma primeira fase de aprendizagem político-social em que o Povo Português demonstrou alto civismo e revela capacidade para reconstruir uma sociedade, pela via democrática autêntica e livre.

Terminou o ano com alguns homens e correntes de pensamento oportunistas da liberdade, vendendo mitos e explorando as turbulências e desvios que provocam.

Como saldo entendo afirmar categoricamente que em oito meses se fizeram experiências políticas e sociais muito válidas conduzidas por homens saídos do Povo e ao serviço do Povo.

O fenómeno de descolonizar em que nos empenhamos progrediu em bom ritmo; nem sempre se aproximou da rota idealista que sonharíamos, mas a inspiração e o talento político realista têm sabido imprimir-lhe um curso original, mais fecundo, mais humano e mais eficaz do que muitas experiências anteriores conduzidas com meios muito mais amplos.

Angola constitui neste momento o problema mais complexo, o que nos exige carinhosa preocupação; tem dificuldades compreensíveis pela circunstância da sua vastidão ter originado várias correntes emancipalistas.

Com a paciência, inspiração e boa-vontade de todos os responsáveis poderemos rapidamente atingir uma situação de equilibrado entendimento, uma plataforma firme para que o Mundo possa ver instituir-se um grande país sem graves sacrifícios do Povo que o vivifica.

Na democratização de Portugal a quantidade e a essência da legislação saída é considerada pequena e tímida por uns, excessiva e arriscada por outros; quererá isto dizer que se tenha conseguido um compromisso aceitável entre rapidez e ponderação, entre necessidades de fundo e limitações de um Governo Provisório. Cremos que sim.

Criaram-se novos conceitos na vivência do mundo do trabalho, embora trabalhadores e empregadores, sindicaos e associações patronais, tenham muito que cooperar e melhorar na definição de relações mútuas mais dignas e mais fraternas, mais justas e mais iguais.

A informação pública subitamente livre é um festival capitoso, uma fonte poderosa de força popular. Muito de autenticamente bom e livre irrompe da ganga do conformismo e oportunismo.

Homens de letras, dos sons e das imagens, leitores, ouvintes e espectadores, todos temos ainda muito a aprender e progredir no sentido da autenticidade, da liberdade e do respeito mútuos necessários a uma informação ainda mais digna.

A democratização do ensino timidamente aflorada no regime anterior, necessita de tantos meios materiais e humanos que irão levar anos a reunir, se não nos unirmos todos em esforço conjunto de recuperação.

As medidas legislativas tomadas actuarão no campo da gestão, dos programas e da avaliação de conhecimentos: mas serão apenas uma primeira experiência-piloto no aspecto qualitativo de toda uma obra gigantesca a alargar a todos os jovens de Portugal do futuro, sem distinção das classes ou recursos económicos das respectivas origens.

Ministério, organismos, professores, empregados e alunos quanto tereis a realizar para obter e aplicar os meios, a organização, a metodologia e programação adequados ao verdadeiro Portugal? Quanta generosidade e paciência, diálogo e esclarecimento, para banir relações e comportamentos radicalizados pelo ambiente estéril do passado?

Não poderei esquecer outro sector fundamental, o económico-financeiro.

A alteração súbita das relações capital-trabalho, em busca do equilíbrio justo ainda não alcançado, minaram a confiança dos investidores menos corajosos.

A tendência altista das matérias-primas, dos novos níveis salariais, a falta de organização e de técnica, a impreparação dos gestores, os negócios de rentabilidade marginal ou radicados na distorção do mercado, tudo se conjugará para liquidar alguma centenas de empresas inviáveis num Portugal actualizado, e levará seu tempo a criar alguns milhares de outras, mais úteis e necessárias.

A recessão do turismo, a diminuição das remessas dos imigrantes menos esclarecidos, a correria aos bancos a levantar dinheiro que se entesoura inutilmente, tudo contribui para diminuir os meios de investimento e a criação de novos postos de trabalho.

Esperam-nos meses difíceis. O plano económico a publicar dentro de dias, algumas medidas de emergência, a coragem dos empresários e sobretudo a vontade dos trabalhadores para trabalhar mais e produzir melhor, são indispensáveis para suprir uma crise que se agudizou desde Novembro de 1973.

Com o aumento dos níveis salariais mais baixos que permitirá a entrada de mais pessoas nos circuitos económicos, e com a redução contínua das despesas militares que permitirá investimentos estatais mais reprodutivos, não é preciso ser profeta para prever que se vão criar condições para, dentro de dois anos, termos uma evolução económica-financeira nitidamente favorável, desde que saibamos criar um clima de confiança nas relações dos factores de produção.

Tenho fé e esperança. Faremos um Portugal mais próspero com uma riqueza mais justamente distribuída.

A fechar o «balanço-1974», referirei o sector da política externa onde o saldo positivo da Revolução é francamente alto, talvez espectacular. De um Povo envergonhado, folheando pergaminhos heróicos do passado, renasceu um Povo orgulhoso do seu presente, que a sociedade internacional olha com simpática expectativa. Éra-mos um País mal tolerado mesmo no Ocidente que dizíamos defender, somos agora um País ao qual, sucessivamente, se vão abrindo as portas de todos os quadrantes do Mundo.

Saberemos ser dignos de nós próprios, exigiremos os os legítimos direitos na sociedade internacional em relação à qual cumpriremos os deveres a que livremente nos vincularmos.

Vou terminar com um sentido apelo a todas as mulheres e homens do Povo a que pertenço.

Vamos entrar num período económico difícil; sejamos sensatos e comedidos nos nossos anseios e exigências sejamos eficientes e desmedidos nos trabalhos e esforços que nos couberem.

Vamos entrar num trimestre eleitoral com o ansioso nervosismo de participar nas primeiras eleições autênticas; sejamos serenos nas atitudes emocionais; procuremos desintoxicar-nos da propaganda autocrática do antigo regime, mas evitemos deslumbrar-nos com correntes de pensamento demagógicas do presente; votemos esclarecidamente em partidos autênticos que nos provem a sua vocação de contribuir para uma democracia pluralista e livre.

Vamos todos às urnas com sinceridade e recta intenção, determinados a exigir sinceridade e recta intenção àqueles em quem votarmos.

Para o nosso país vão os meus desejos de toda a felicidade e prosperidade possíveis em 1975.»

continua>>>


Inclusão 02/04/2019