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Esquematicamente, eis o que foi possível apurar em nossos apontamentos, que visam apenas mapear a atuação do PCB-PPS na área da realização cultural, sempre ressaltando que os comunistas e socialistas não foram os únicos a produzir cultura no Brasil, nos últimos 90 anos:
1922-1927
O PCB — nunca é demais lembrar — foi fundado no mês seguinte à Semana de Arte Moderna. Alguns modernistas se aproximariam ou mesmo adeririam ao Partido, como a pintora Tarsila do Amaral e o pintor Di Cavalcanti — o idealizador da Semana —, e os escritores Oswald de Andrade e Pagu, um pouco mais adiante. Fora isso, o PCB tem na sua secretaria geral um intelectual autodidata que se destacaria logo como especialista da obra do escritor Machado de Assis: o gráfico, linotipista e jornalista Astrojildo Pereira. Alguém que ousaria escrever, de Moscou, em 1925, que “a democracia, ainda que burguesa, é vista como um bem pelas massas...”.
Fervoroso defensor da Revolução Russa de 1917 o escritor Lima Barreto, prematuramente falecido em 1923, é um dos intelectuais que simpatizam, então, com as posições políticas dos comunistas brasileiros. O jornalista Domingos Ribeiro Filho, grande amigo pessoal de Astrojildo Pereira, foi outro. E o mesmo diríamos de Everardo Dias, que adere ao Partido em 1923, tendo amargado inúmeras prisões.
Como parte de seu esforço para entender a realidade brasileira, o Partido Comunista lança algumas publicações, como Movimento Comunista (1922) e A Classe Operária (1925).
Em 1923, Otávio Brandão, intelectual comunista alagoano, também autodidata, publica a obra Agrarismo x Industrialismo, primeiro ensaio a reivindicar a necessidade de uma reforma agrária no Brasil, afirmando o caráter feudal da colonização do país. Enquanto expressão de um processo — lento, mas inexorável — de industrialização em marcha no país, o PCB passa a ter nos setores mais politizados das camadas médias urbanas, potencialmente ao menos, um poderoso aliado. Já era uma clara demonstração da complexidade da estrutura de classes do país, àquela época.
1927-1930
Período marcado pela formação do Bloco Operário, posteriormente Bloco Operário e Camponês (BOC), a primeira frente única eleitoral do PCB. Entre outras reivindicações de caráter político e social, o BOC luta pela criação de bibliotecas públicas no país. Nessa fase, o PCB se aproxima um pouco mais das camadas médias, representadas de certa forma pelo capitão insurreto Luiz Carlos Prestes e outros membros militares da chamada Coluna Invicta. Tanto que, em 1929, é criado o setor militar do Partido, com a adesão de Almir Neves, Agliberto Vieira de Azevedo e outros membros das Forças Armadas. Esse setor, evidentemente, opera na mais estrita clandestinidade. Com o tempo, vira uma espécie de Partido dentro do Partido.
Carlos Marighella, então estudante de Engenharia na Bahia, adere ao PCB por essa época (1929, exatamente). Leôncio Bausbaum é outro importante quadro intelectual formado pelo Partido nos anos que antecedem à chamada Revolução de 30. Foi o fundador da Juventude Comunista, em 1925, e futuro autor de obras de peso, como História sincera da República. Nessa fase ainda, cumpriu importante papel o jornal A Nação, que não era o porta-voz oficial do Partido, dirigido pelo professor Leônidas Resende, que o colocou à disposição dos comunistas.
1930-1933
O triunfo das teses obreiristas, isto é, sectárias, pautadas apenas pela inserção no mundo proletário, afasta do PCB os setores médios da sociedade. Intelectuais e formuladores políticos como Astrojildo Pereira (gráfico e jornalista, como já mencionado), Cristiano Cordeiro (funcionário público) e Heitor Ferreira Lima (alfaiate) são alijados do Partido. Eles se reintegrariam somente muitos anos depois. Outros — como Alberto Passos Guimarães, que aderira à organização em 1931 — logram permanecer no PCB. Outros nele ingressam precisamente nessa época, como o então estudante Joaquim Câmara Ferreira. Ainda nesse período, o Partido afasta de suas fileiras militantes intelectuais e artistas que posteriormente se identificariam plenamente com o movimento trotskista, entre os quais poderíamos citar o crítico Mário Pedrosa, a escritora Rachel de Queiroz e o gravurista Lívio Abramo. Esses afastamentos todos certamente dificultam a plena compreensão, pelo PCB, da nova realidade formada a partir dos episódios de outubro de 1930. Vale dizer, o Partido perde a capacidade de intervir na nova realidade formada pela chegada de Getúlio Vargas ao poder. E o fato concreto é que o PCB se isolaria tremendamente nessa fase, apresentando, talvez pela primeira vez, um rosto político sectário.
1933-1935
A ascensão do nazifascismo faz com que o PCB adote uma política de alianças mais efetiva, materializada na Aliança Nacional Libertadora (ANL). Nessa quadra da vida política nacional, figuras de certa forma representativas do mundo da cultura como o historiador Caio Prado Júnior, o jornalista Aparício Torelly (o Barão de Itararé), que se elegeu vereador para a Câmara Municipal do Rio de Janeiro, em janeiro de 1947 e os médicos Valério Konder, Isnard Teixeira, Adão Pereira Nunes e Manoel Venâncio Campos da Paz se aproximam do Partido.
Jovem estudante à época, o maranhense Ignácio Rangel se engaja no PCB e no movimento aliancista, sendo preso em seguida. Os então estudantes Carlos Lacerda e Wiliam Moreira Lima também passam a simpatizar com as propostas do Partido. Há indícios de que o compositor Noel Rosa simpatizaria com as teses do PCB, recebendo publicações do Partido, como o jornal A Classe Operária, pelas mãos de um dentista comunista do bairro carioca de Vila Isabel. Um primo seu, em suas memórias, fala dessas simpatias de Noel. Em Belo Horizonte, há notícias da formação de um centro cultural, inspirado pelos comunistas, já em 1934. Neste ano, no Paraná, o médico comunista Otávio da Silveira elege-se deputado federal. O documento da Conferência Nacional do PCB, em julho de 1934, afirma que “estribando-se no conceito escravocrata de raças ‘superiores' e raças ‘inferiores', as camarilhas dominantes aproveitam-no para explorar, perseguir e maltratar mais ainda negros e índios no Brasil”. No mesmo ano, no livro A caminho da revolução, Leôncio Basbaum, dirigente do PCB de origem judaica, escreveu que “somente a hipocrisia das classes dominantes e seus lacaios pode negar a existência do problema negro do Brasil (...) De tal modo se acha arraigado esse preconceito que atingiu mesmo as classes trabalhadoras, no meio das quais não deveria existir, pois nas fábricas e no campo o branco trabalha igual ao negro”. Para Basbaum, a questão negra se revestia de grande especificidade, uma vez que não poderia ser combatida, por exemplo, “com um decreto, nem mesmo que este seja do governo soviético do Brasil”. O PCB foi, provavelmente, o primeiro partido político brasileiro a se pronunciar com tanta objetividade sobre a questão dos afrodescendentes. Em tempo: Caio Prado Júnior seria, por sinal, o redator do programa da ANL, com menos de 30 anos de idade. Fora isso, a ANL apoia, com firmeza, a organização das mulheres. Jovens intelectuais como a psiquiatra Nise da Silveira, Beatriz Riff e Maria Werneck são detidas após o levante de novembro de 1935. Elas ficariam presas na mesma cela de Olga Benário Prestes, posteriormente deportada por Getúlio Vargas para a Alemanha nazista. Incentivada pelo PCB, a ANL talvez tivesse se configurado no primeiro partido político de massas da História do Brasil, conforme salientou o sempre lúcido e veterano revolucionário Severino Teodoro de Mello.
1935-1942
O envolvimento do PCB com o levante armado da Aliança Nacional Libertadora, de novembro de 1935, contribui para isolar e muito o Partido das massas. Uma grande repressão se abateria, então, sobre os comunistas. Intelectuais, escritores e artistas como Graciliano Ramos, Emílio Carrera Guerra, Ivan Pedro de Martins, Mário Lago e Dionélio Machado são presos. O estado da Bahia foi, por esse período, um dos únicos a preservar intactos os contatos com a intelectualidade progressista, por intermédio da revista Seiva, fundada em 1938 e dirigida por João Falcão, então um jovem comunista. Outro jovem revolucionário à época, Armênio Guedes, egresso da Faculdade de Direito de Salvador, também participa ativamente da publicação, assim como Jorge Amado, Edison Carneiro, Walter da Silveira, Jacob Gorender e Dias da Costa (este último irmão do futuro dramaturgo Dias Gomes). E o mesmo podemos dizer de Eduardo Maffei, paulista, Paulo Cavalcante, pernambucano, Ledo Ivo, alagoano, Rubem Braga, capixaba, Joel Silveira, sergipano, Carlos Drummond de Andrade, mineiro — todos muito jovens à época. A relativa liberdade de expressão existente na Bahia se explica pelo fato de a rebelião aliancista não ter atingido o estado, a repressão se concentrando no Rio de Janeiro, Recife e Natal, praticamente. Isto é, áreas onde ocorreram embates armados.
Com as mudanças ocorridas no cenário externo — o Brasil começa a se unir contra as forças do Eixo —, os comunistas voltam a se inserir com muita cautela nas lutas nacionais. Os estudantes, em particular, conseguem se manifestar pela retomada das liberdades democráticas, incluindo aí a liberdade de expressão cultural. Nascia, praticamente, a União Nacional dos Estudantes (UNE), na qual comunistas como o futuro médico fluminense Irun Sant'Anna e o futuro engenheiro baiano Fernando dos Reis Sant'Anna (que foi presidente de honra do PPS, até sua morte, no dia 1° de março de 2012) marcavam forte presença.
1942-1947
O PCB vai ganhando prestígio junto às forças da cultura, no bojo da luta antifascista e pela anistia política. Naturalmente, a resistência que a União Soviética impõe às forças nazistas também influencia a intelectualidade. Oscar Niemeyer, por exemplo, se aproxima do Partido já em 1942, assim como Marcos Jaimovitch, seu principal contato com o PCB. O poeta Manoel de Barros adere à Juventude Comunista, ainda que dela se afastasse pouco tempo depois, desiludido com o que considerava apoio de Luiz Carlos Prestes a Getúlio Vargas. Mas, até hoje apoia candidatos do PPS no Mato Grosso do Sul. Por essa mesma fase, Jorge Amado escreve boa parte do livro Cavaleiro da Esperança, na casa de Ernesto Sábato, nos arredores de Buenos Aires. Trata-se de um relato romanceado da vida de Prestes, então na prisão. O livro é lançado em 1944 e causaria grande impacto. Por essa mesma fase, Astrojildo Pereira é o principal articulador da União dos Trabalhadores Intelectuais, de firme oposição à ditadura do Estado Novo. E Astrojildo dá publicidade ao texto Tarefas da inteligência brasileira. Homem de partido, mas consciente das tensões que existem entre cultura e política, dá ênfase às tarefas específicas da intelectualidade. Tudo leva a crer que ele percebeu que o intelectual, mesmo quando engajado partidariamente, segue sendo um intelectual e que seu engajamento não deve sufocar o que há de específico em sua atuação social. Pois fora por intermédio dessa especificidade que essa intelectualidade se aproximara bem ou mal do Partido e também seria por ela que permaneceria atrelada aos órgãos partidários. No Partido, o objetivo era fazer com que sua criatividade se expandisse ainda mais.
Rompendo cada vez mais com o seu isolamento, o PCB marca forte presença no I Congresso Nacional dos Escritores, presidido pelo comunista Aníbal Machado. Há comunistas entre os redatores da resolução do Congresso, a começar por Alberto Passos Guimarães e Caio Prado Júnior. Os congressistas exigem uma ampla campanha de alfabetização no Brasil. Surgem ou ressurgem a União Nacional de Estudantes (UNE) e a Associação Brasileira de Escritores, entidades apoiadas pelos comunistas. Astrojildo Pereira é, inegavelmente, uma das grandes referências da intelectualidade nacional, nesse período.
Muitos representantes da área cultural filiam-se oficialmente ao PCB na redemocratização de 1945, quando o prestígio da União Soviética se encontra no auge. Cândido Portinari lança-se, até, candidato ao Senado pelo Partido, perdendo por ínfima margem de votos, em pleito muito questionado. Mas um nome da estatura de Jorge Amado é eleito deputado federal. Mário Schemberg (que aderira ao Partido já na década de 30), Graciliano Ramos, Arnaldo Estrela, Quirino Campofiorito, Oduvaldo Viana, Elias Chaves Neto, Mário Gruber, Vasco Prado, Guerra Peixe, Aníbal Machado, Bruno Giorgi, Antonieta Campos da Paz, Abelardo da Hora, José Pancetti, Wanda Sidou, Eugênia e Álvaro Moreyra, Moisés Vinhas, Rui Santos, Dalcídio Jurandir, Orígenes Lessa, Darcy Ribeiro, Dionélio Machado, Pedro Mota Lima, Paulo Motta Lima, Procópio Ferreira, Mário Lago, João Saldanha, Aline Paim, Justino Martins, Ana Montenegro, Marco Antônio Coelho e Nelson Pereira dos Santos (os dois últimos jovens estudantes ainda) e outros nomes expressivos (ou que se tornariam expressivos) da cultura nacional assumem oficialmente sua condição de comunistas. Agora podem fazê-lo plenamente.
O poeta Carlos Drummond de Andrade, que entrevistara Prestes ainda na cadeia, chega a dirigir um jornal do Partido no Rio de Janeiro, o mesmo ocorrendo com Jorge Amado, em São Paulo. Aliás, fiel ao preceito leninista de que o jornal ajudava a organizar as massas populares, o PCB monta uma verdadeira escola jornalística no país, da Tribuna Popular do Rio de Janeiro, ao Hoje, de São Paulo; de O Momento, em Salvador, à Tribuna Gaúcha, de Porto Alegre; da Folha do Povo, do Recife, ao Jornal do Povo, em João Pessoa; de O Democrata, em Fortaleza, ao O Estado, em Goiânia; da Tribuna do Povo, em Curitiba, à Folha Capixaba, em Vitória do Espírito Santo. Heloísa Ramos, militante das mais atuantes, esposa de Graciliano Ramos, trabalhava no jornal Momento Feminino, dirigido pela jornalista Arcelina Mochel. No ano de 1946, circula a revista quinzenal Divulgação Marxista. No Rio Grande do Sul, circula Libertação, até 1946. Em algumas capitais, o PCB organiza os chamados Comitês Culturais, para apoiar as atividades artísticas progressistas. O Partido tem, então, uma concepção dos fatos culturais mais calcada no realismo socialista, em uma visão demasiadamente curta dos fatos culturais, visão esta diretamente influenciada pela experiência stalinista, diga-se de passagem. Mas esse quadro se confrontaria em breve com a realidade, sempre plural e dinâmica.
No Rio de Janeiro, reduto do samba, compositores populares como Paulo da Portela, Ataulfo Alves e Silas de Oliveira mantêm ligações com o PCB. A própria União Geral das Escolas de Samba (Uges) era muito próxima do PCB, a ponto de ser chamada também de União Geral das Escolas Soviéticas, segundo constatou o crítico e jornalista Sérgio Cabral. O hino da campanha de Luiz Carlos Prestes ao Senado foi composto por ninguém menos do que o simpatizante Dorival Caymmi com letra de Jorge Amado. Os compositores Paulo da Portela e Monarco criaram, também à época, a música Prestes, Cavaleiro da Esperança. Um nome respeitado como Monteiro Lobato fazia campanha para Luiz Carlos Prestes, votando nos candidatos comunistas e publicando o folheto Zé do Brasil, que põe em cena um camponês e o próprio Prestes. A área musical contribuiria ainda com a dupla de cantores Jararaca e Ratinho, o primeiro nascido em Alagoas e o segundo na Paraíba, e a jornalista e crítica Eneida de Morais, oriunda do Pará. Ela foi a primeira brasileira a traduzir artigos e ensaios de Marx e Engels sobre cultura, enfeixados em livro na França, e publicados, em 1945, pela Editorial Calvino, do PCB.
Além disso, a Editorial Vitória cumpre importante função ao divulgar os clássicos do marxismo no Brasil, assim como parte da boa literatura internacional, na coleção Romances do Povo, dirigida por Jorge Amado, contribuindo assim para modernizar o conhecimento entre nós. Astrojildo Pereira é um dos responsáveis pela linha editorial. Em São Paulo, a editora Argumento tem uma atuação semelhante. A ação do PCB lançando obras de qualidade, pautava-se pela necessidade de transmitir às novas gerações — que acabavam de sair de uma longa ditadura — o legado das gerações anteriores. Afinal, como apontaram Marx e Engels, a burguesia, em sua busca desenfreada por lucros, colocava tudo abaixo. “Tudo que é sólido desmancha no ar”, garantiam no Manifesto. E nunca é demais recordar a importância que os livros adquirem na conscientização dos simpatizantes e militantes comunistas. Em 1946, Jorge Amado e Pedro Pomar lançam a obra O Partido Comunista e a liberdade de criação, uma coletânea de discursos e textos dos dois deputados comunistas. E o PCB consegue montar ainda uma produtora de cinema, a Liberdade Filmes, bem modesta, é verdade. Mais, até: Alinor Azevedo, um dos criadores da importante produtora de filmes Atlântida, era membro do PCB. Atraídos pela resistência heroica da União Soviética ao chamado eixo nazifascista, muitos intelectuais e artistas de origem ou formação judaica aderem então ao Partido Comunista. Entre eles poderíamos alinhar o artista plástico Carlos Scliar, que participara da Segunda Guerra Mundial na campanha da Itália. Mesmo atletas como Leônidas da Silva, o Diamante Negro, aderem ao PCB (da mesma forma que o craque Didi, mais tarde). O pugilista Waldemar Zumbano, tio do futuro campeão mundial Éder Jofre, ingressaria igualmente no Partido, onde militaria por décadas a fio. Dir-se-ia que esses foram os primeiros anos dourados do PCB.
1947-1954
A ida do PCB para a ilegalidade e as próprias posições extremadas adotadas então pelo Partido (sobretudo após o Manifesto de Agosto, que propõe a luta armada) contribuem para afastar os comunistas do movimento de massas em geral e dos setores culturais, em particular. Trata-se de um dos períodos mais difíceis do ponto de vista da relação do PCB com os criadores culturais. Daí ser, nessa fase, que intelectuais da importância de Paulo Mercadante, por exemplo, deixam o Partido. Para acentuar ainda mais as contradições do momento político, o PCB mantém boa parte de sua imprensa na legalidade, o que contribui para divulgar suas ideias, inclusive aquelas mais voltadas para a atividade intelectual ou artística. Mais: os jornais do PCB têm então boa penetração popular, sobretudo nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Bahia e Ceará. São relativamente bem aceitas as revistas teóricas e culturais, como Fundamentos (dirigida por Elias Chaves Neto), Literatura (com Manuel Bandeira e Arthur Ramos no conselho editorial) e Horizonte (editada na capital gaúcha). Escritores como José Lins do Rego e Álvaro Moreyra trabalham em órgãos orientados pelo Partido. Também é dessa fase a esquecida revista Leitura, editada no Rio (1942-1968) e dirigida pelo pernambucano José de Barboza Mello, chamada de linha auxiliar dos comunistas. O conhecido intelectual Alvaro Lins (que fora integralista e militante da juventude católica em Pernambuco) incorporou-se às fileiras do PCB, nesse período, chegando, inclusive, a chefiar a delegação brasileira que foi ao Congresso Mundial da Paz, em Moscou, indicado pelo Comitê Central, ante a impossibilidade da ida de Ênio Silveira e Nelson Werneck Sodré. Um dos principais jornalistas partidários dessa fase é Raul Azêdo. Juntamente com Ivan Alves, ele ingressara na imprensa partidária ainda na condição de gráfico. O Partido se faz presente também na área musical e pertence ao PCB a compositora de concerto Eunice Catunda, que organiza corais populares, sobretudo em São Paulo, atraindo muitos jovens.
Outra atividade importante dos comunistas, nesse momento, é a criação de cineclubes em várias partes do Brasil, notadamente em Salvador, com Walter da Silveira à frente. Nas artes plásticas, fato notável foi a participação dos comunistas na organização, em 1951, da I Bienal de Artes Plásticas do Brasil, realizada em São Paulo, pelo comunista Luiz Saia, seu primeiro presidente. Clubes de gravura proliferaram, ainda, em vários pontos do país, como no Rio Grande do Sul, sobretudo.
E convém destacar ainda, nessa fase, como fato extremamente significativo, a atuação dos militantes intelectuais negros do PCB na organização do Congresso do Negro Brasileiro, realizado em 1950. É o caso, por exemplo, do antropólogo Edison Carneiro e do poeta Solano Trindade. Aqui, interessa recordar que, em 1930, o Partido lançara um negro como candidato à Presidência da República, o operário marmorista Minervino de Oliveira, o primeiro vereador — naquela época se dizia intendente — negro da então capital da República, o Rio de Janeiro. E que, em 1945, o Partido elegeria o primeiro negro da Constituinte, Claudino José da Silva, ferroviário que ingressara no PCB ainda em 1928.
A campanha do Petróleo é Nosso — um dos movimentos de massa mais densos da história do país em todos os tempos — atrairia para as fileiras do PCB muitos intelectuais, jornalistas e artistas, ajudando a romper, sem dúvida, o isolamento em que o Partido se confinara, sobretudo após 1948. Uma curiosidade: é por essa fase, mais exatamente em 1949, que um jovem intelectual se aproximaria do PCB. Seu nome Fernando Henrique Cardoso, um homem que deixaria marcas profundas na vida do país, nas décadas seguintes.
Mas esse período, grosso modo, é marcado pelas posições sectárias assumidas pelo Partido Comunista, que avalia o segundo Governo Vargas — equivocadamente, como se veria mais tarde, no bojo dos dramáticos acontecimentos que conduziriam ao suicídio do presidente da República — como reacionário. Essa postura radical acaba contaminando igualmente a própria esfera cultural do Partido, que assume um viés muitas vezes excludente, sobretudo em relação àqueles intelectuais e artistas que manifestavam alguma divergência com o marxismo ou a versão oficial que o PCB tinha dele. Os dirigentes comunistas da época pareciam desconhecer aquela assertiva de Friedrich Engels, formulada em 1888: “Quanto mais dissimulados estejam os pontos de vista, melhor para a obra artística”.
E é a época, também, em que o PCB cria uma espécie de escola de quadros, o famoso Curso Stalin. Dirigidos por Marco Antonio Coelho, que integra o PCB desde o início da década de 40, esses cursos contribuirão, apesar de suas limitações, para formar centenas de militantes, familiarizando-os com a filosofia, a literatura e a política marxista.
1954-1958
Importantes greves, verificadas no início da década de 50 e que pipocaram entre as operárias têxteis do estado do Pará, atuam no sentido de fazer com que o Partido comece um processo de ruptura com as posições estreitas que vinha assumindo desde 1948, reaproximando-o assim da população pelas mãos do movimento sindical. Deve-se observar, também, que a crise política interna adquiriria novas e dramáticas proporções com a denúncia do chamado culto à personalidade, que atinge a figura quase sagrada de Josef Stalin, todo-poderoso secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética. Desiludidos, alguns intelectuais de peso deixam o Partido, como Jorge Amado e Antonio Paim. Um número considerável de jornalistas (entre eles se alinharia Moacyr Werneck de Castro), lotados na imprensa partidária, também rompe com o PCB nessa ocasião.
1958-1964
Buscando superar a grave crise interna que o sacudia, o PCB elabora a chamada Declaração de Março de 1958, que privilegia o caminho da democracia para a solução dos problemas nacionais e a superação do próprio capitalismo. Com isso, a intelectualidade volta a se aproximar do Partido, sentindo que este se arejava novamente.
Surgem, daqui e dali, inúmeras manifestações de ordem cultural. A revista Para Todos, fundada em 1956 pelos comunistas, influencia parcelas consideráveis da intelectualidade. E o mesmo se pode dizer do jornal Novos Rumos, que chega a vender mais de 50 mil exemplares, em um país então com cerca de 50 milhões de habitantes ou pouco menos do que isso. Os dois principais responsáveis pelo semanário, os jornalistas e dirigentes partidários Mário Alves e Orlando Bonfim, seriam assassinados pela ditadura poucos anos após o empastelamento do jornal em 1964. Luiz Mário Gazzaneo, Josué Almeida, Almir Matos, Renato Guimarães e Maria da Graça Dutra participam ativamente do Novos Rumos.
Jornalistas e militantes como Sérgio Cabral e Ivan Alves também dão sua colaboração ao jornal em diversos níveis, indicando textos ou revisando algumas matérias ou ainda organizando finanças para a sua manutenção. A revista teórica do Partido, Estudos Sociais, dirigida por Astrojildo Pereira e Armênio Guedes, exerce uma certa influência sobre os estudiosos e parcelas da academia. Nelson Werneck Sodré, Fausto Cupertino, Jacob Gorender e Jorge Miglioli integram a revista, que publica dezenas de artigos de peso até 1964, inclusive de intelectuais não comunistas e de enorme prestígio entre seus pares, como Josué de Castro e Hermínio Linhares.
Dirigentes, militantes e intelectuais do PCB se debruçam então sobre a questão agrária, como Alberto Passos Guimarães, autor do clássico Quatro séculos de latifúndio, Caio Prado Júnior, Carlos Marighella e Fragmon Carlos Borges. Entre os cientistas sociais começam a despontar, nas fileiras partidárias, Joel Rufino dos Santos, Nailton Santos (que irá auxiliar
Celso Furtado na Sudene e era irmão de Milton Santos (um intelectual muito próximo do PCB), Ruth Cardoso, Zuleide Faria de Melo, Dirceu Lindoso, Décio Freitas, Hermógenes Lazier Antonio Carlos Peixoto, Antonio Fausto Nascimento, Amaro Quincas, Clóvis Moura e Rui Facó.
Surge o Cinema Novo, com decisiva participação de realizadores ligados ao PCB, como Nelson Pereira dos Santos (que dera partida no movimento, com o clássico Rio 40 graus), Roberto Santos e Leon Hirzsman. Fora isso, o livro intitulado Introdução ao cinema brasileiro, publicado em 1959 pelo crítico e cineasta comunista Alex Viany, marca toda uma geração de criadores. Alex Viany seria o coautor, juntamente com Glauber Rocha, do célebre texto-manifesto Estética da Fome, que opera um primeiro balanço do Cinema Novo, já em 1965. Miguel Borges, autor do manifesto propriamente dito do Cinema Novo, era, além de cineasta, jornalista e comunista.
Na literatura de ficção, os nomes cobrem o país todo, a rigor: do goiano Bernardo Éllis ao paraense Abguar Bastos e do cearense Jairo Martins Bastos ao maranhense José Louzeiro, que se iniciava então nas letras e já exercia o jornalismo no Rio de Janeiro. Ainda nos anos 60, escritores jovens como Ciro Martins e Sérgio Faraco aproximam-se do PCB. José Paulo Paes, tradutor e poeta, intelectual e autodidata, também atua no Partido no estado de São Paulo.
No teatro, a presença do PCB também se faz sentir e autores consagrados como Dias Gomes (O pagador de promessas) e Gianfrancesco Guarnieri (Eles não usam black-tie) pertencem às suas fileiras. A ação de Flávio Rangel, Zbigniew Ziembinsky e João das Neves também leva a marca de suas militâncias no PCB. Entre os críticos, destaca-se o gaúcho Fernando Peixoto, também ator, diretor e um dos maiores divulgadores no Brasil das obras e ideias do alemão Bertolt Brecht. E, entre os atores e atrizes, poderíamos citar Paulo Gracindo, Paulo José, Glauce Rocha (ela abrigou a família de Giocondo Dias, após o golpe de 1964), Juca de Oliveira, Raul Cortez, Ítala Nandi, Dina Sfat, Carlos Vereza, Joel Barcellos, Francisco Milani, Stênio Garcia, Lima Duarte e José Wilker Bráulio Pedroso e Benedito Ruy Barbosa, que iriam se consagrar posteriormente nas novelas televisivas.
Há ainda criadores do PCB atuando com brilho na arquitetura e nas artes plásticas, de maneira geral. Além dos já citados Oscar Niemeyer, Di Cavalcanti, Portinari e Carlos Scliar são comunistas Iberê Camargo, Renina Katz, Lina Bo Bardi, Paulo de Camargo e Almeida (fundador da Universidade Federal de São Carlos), Paulo de Mello Bastos, Virgínia e Vila- nova Artigas. Ficaria celebrizada a presença dos comunistas nas rádios Tupi, de São Paulo, e Nacional, no Rio de Janeiro, onde desponta o cantor Jorge Veiga.
O PCB se implanta no mundo da ciência e os comunistas Luís Hildebrando Pereira da Silva e Samuel Pessoa ajudam a elaborar uma política de pesquisa médica para o país, influindo de forma decisiva na criação da própria Fapesp, ainda hoje o principal organismo de apoio à pesquisa em todo o estado de São Paulo. O médico Mário Magalhães Silveira também se destaca como profissional e militante. Célio Guedes, dentista, é homem da mais absoluta confiança do aparelho partidário. Por seu turno, a cientista Olga Bohomoletz integraria uma das primeiras diretorias da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Figuras lendárias no PCB, àquela altura, eram as médicas Maria Aragão, de São Luiz do Maranhão, e Naíde Teodósio, do Recife. Outro pesquisador muito respeitado e que seria afastado da Fundação Oswaldo Cruz por suas ligações com o PCB no pós-64 era Haiti Moussatché. Mais jovem no Partido, Leia Scheinvar também começa a se destacar na área da pesquisa botânica. A psicanalista Helena Besserman Vianna é membro do Partido. Ainda no campo da ciência aplicada, alinham-se entre os comunistas os jovens engenheiros e cientistas Raymundo de Oliveira, Joel Teodósio, Ulrich Hoffmann, Amélia Império Hamburger e Sérgio Augusto de Moraes, figuras que teriam um papel importante nos embates democráticos. Fernando Santana, também engenheiro e um dos mais competentes deputados da história do parlamento brasileiro, por sinal, já havia aderido ao PCB em 1934.
Vale dizer, o Partido cresce visivelmente aos olhos dos intelectuais e artistas. Nei Lopes, futuro historiador e sambista de talento, integra, ainda na condição de estudante, as hostes juvenis do PCB, assim como Aspásia Camargo, que se destacaria depois como socióloga e militante da ecologia, Mariza Campos da Paz, bióloga e jornalista, o futuro engenheiro Ulrich Hoffman, o cientista social Eurico Figueiredo, o então estudante de Engenharia Sebastião Rodrigues Paixão, a atriz e escritora Jalusa Barcellos, o futuro médico Jacob Klingerman, o futuro advogado e ministro da Justiça Aloysio Nunes Ferreira, o futuro engenheiro e escritor Ailton Benedito de Souza, o futuro animador do Movimento de Cultura Popular no Recife, Joacir de Castro, o ator e dirigente comunista Hiram Pereira, o futuro jornalista Jarbas de Holanda, também do MCP do Recife, o futuro advogado e parlamentar Roberto Freire, o futuro ministro do Supremo Tribunal Federal Eros Grau (torturado durante a ditadura Médici, em 1972), o futuro sociólogo Rubem César Fernandes e Aléxis Stepanenko, mais tarde ministro do Planejamento do Governo Itamar Franco.
Na verdade, o Partido talvez buscasse, com todas suas limitações, unir prática política e reflexão teórica, e nisso acompanhava o conjunto do chamado movimento comunista internacional, sobretudo os partidos italiano e francês no imediato pós-guerra. Além do que, nunca é demais recordar, dirigentes revolucionários de grande envergadura eram também pensadores de alto nível — a começar por Karl Marx e Friedrich Engels, mas também Vladimir Lênin, Rosa Luxemburgo, Antonio Gramsci, José Carlos Mariátegui e Ernst Fischer, entre outros. Talvez não seja equivocado afirmar que o PCB caminhava para se tornar uma espécie de agente antropológico, servindo de mediador, de um lado, entre o fazer estético dos artistas e a reflexão dos intelectuais e, de outro, a sociedade em geral.
É preciso reconhecer que os governos democráticos de Juscelino Kubistchek e João Goulart, com suas propostas re- formadoras, fomentam as condições políticas mínimas para o alastramento da atividade cultural. Um comunista dos idos de 1935, o economista e teórico Ignacio Rangel, será um dos elaboradores, inclusive, do famoso Plano de Metas de JK. São os tempos de Brasília, com o comunista Oscar Niemeyer à frente. Do CPC da UNE, os comitês de cultura popular incentivados pelos estudantes e presidido pelo poeta Ferreira Gullar Convém destacar ainda que, no plano do CPC, tiveram importante atuação na massa estudantil os comunistas Marcos Jaimovich, Zuleika Alambert e Givaldo Siqueira. E são também os tempos do Comando dos Trabalhadores Intelectuais, que congrega nomes de primeira grandeza, a saber: o general e historiador Nelson Werneck Sodré — ligado ao Partido desde o final do Estado Novo, pelo menos —, o crítico progressista Álvaro Lins, o dramaturgo Dias Gomes e outros. Isso, para não aludirmos ao Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), incentivado pelo Ministério da Educação e Cultura, com forte presença comunista. Intelectuais da importância de Roland Corbusier, Osny Duarte Pereira, Nelson Werneck Sodré e Álvaro Vieira Pinto participam de inúmeros debates e publicações, contribuindo para a criação de marcos ideológicos que iriam balizar a política do chamado desenvolvimentismo entre nós. Além do que, há um clima cada vez mais favorável às lutas por reformas e, mesmo aos embates de corte mais propriamente revolucionário, como a resistência armada dos povos vietnamita e cubano e os próprios combates travados pelos movimentos de libertação na África.
Nessa fase, a produção intelectual pecebista tende a se tornar hegemônica, no sentido de que ela conduz, cada vez mais, o processo artístico-cultural em vários pontos do país.
1964-1968
A ditadura militar instalada no país em 1° de abril de 1964 golpeia com todas as suas forças o mundo da cultura, além do mundo do trabalho material e as instituições democráticas do país. Criação intelectual, evidentemente, não é compatível com obscurantismo e perseguições políticas, como a falta de liberdades públicas. Nesse quadro, as relações do PCB com o ambiente da cultura ficam abaladas, uma vez mais. Mesmo assim, o Partido se esforça para recompor as suas bases intelectuais e influir, por intermédio de práticas diversas, para isolar e derrotar o regime militar. Afinal, a ditadura não poderia colocar toda a cultura viva da nação na clandestinidade, conforme fizera com o próprio Partido.
São os tempos do chamado Comitê Cultural, que busca reagrupar toda a militância intelectual e artística do Partido. Givaldo Siqueira é o assistente ou o representante partidário nele. O livro Síntese de história da cultura brasileira, de Nelson Werneck Sodré, considerado por alguns uma espécie de plataforma cultural dos comunistas, teria sido escrito atendendo solicitação do Comitê Central do PCB. Dessa maneira, jornalistas e intelectuais comunistas, entre os quais Luís Mário Gazzaneo, Maurício Azêdo, Sérgio Cabral, Alfredo Trajano, Artur José Poerner, Anderson Campos e Leandro Konder lançam, no Rio de Janeiro, o jornal Folha da Semana, o primeiro periódico alternativo da era da ditadura. O prestigiado intelectual e católico progressista Otto Maria Carpeaux colabora com o jornal, assim como a atriz Odete Lara.
Ainda são expressões da resistência cultural dos comunistas o Teatro Opinião, comandado por Ferreira Gullar, Tereza Aragão, Oduvaldo Viana Filho e Armando Costa, no Rio de Janeiro; o Teatro de Arena, de São Paulo, com Gianfrancesco Guarnieri, Lima Duarte, Rafael de Carvalho (também poeta de cordel) e vários outros; a revista Civilização Brasileira, da editora homônima, conduzida pelos comunistas Ênio Silveira e Moacyr Félix, no Rio de Janeiro. Importante destacar um momento pouco conhecido da Editora Civilização Brasileira, quando cumpriu rica e inesquecível missão do PCB, ao desenvolver o trabalho de aproximação com a Igreja Católica, numa articulação coordenada por Luis Maranhão, pelo lado dos comunistas, e por Alceu Amoroso Lima (o Tristão de Ataíde), pelos católicos, o que deu muitos frutos, não apenas na luta de resistência democrática (aí considerando-se muitas pessoas libertas e várias vidas salvas, graças sobretudo à ação realizada por dom Eugênio Salles, que era arcebispo do Rio de Janeiro) como no apoio aos movimentos de libertação do colonialismo na Africa, Vietnã, Cuba etc. Foi dessa atividade aberta, mas mantida nos bastidores, que surgiu a revista Paz e Terra. E até alguns livros simbolizam toda uma resistência coletiva, como o célebre Febeapá ou Festival de besteira que assola o país, do comunista Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta. Isso, sem esquecer a música de protesto de João do Vale, um ex-pedreiro comunista originário do Maranhão, e as canções nativistas do gaúcho Leopoldo Rassier.
A intelectualidade e os artistas comunistas jogam um papel importante na reestruturação do PCB logo após o golpe de Estado. No Pará, um intelectual da qualidade de Rui Barata passa a dirigir o Partido desde a clandestinidade. No Amazonas, José Maria Monteiro, que iria posteriormente se formar em Medicina, e José Augusto de Souza Rodrigues, o Guto, músico e produtor cultural, assim como o engenheiro Chico de Assis um pouco mais tarde, dirigem o Partido local. No Espírito Santo, a professora Myrthes Bevilacqua e o hoje escritor Dino Gomes lutam para colocar o Partido de pé novamente. O mesmo fazem o jornalista Francisco Inácio de Almeida e os advogados Tarcísio Leitão e Aníbal Bonavides, no Ceará. Um intelectual e cineasta da qualidade de Vladimir Carvalho já integrava a direção estadual do Partido na Paraíba. Jarbas Marques da Silva, futuro jornalista e historiador, cumpre importantes funções em Goiás, vindo amargar, posteriormente, quase dez anos de cadeia. O professor universitário Fausto Mato Grosso e os advogados Onofre da Costa Lima Filho e Carme- lino Resende ajudariam, sobretudo a partir do início dos anos 80, a estruturar o PCB no atual estado do Mato Grosso do Sul. O mesmo ocorreria em Santa Catarina com o escritor e editor Francisco José Pereira, que se exilara após o Golpe de 1964, o odontólogo Antonio Gonçalves Filho (Toninho) e o professor Sérgio Grando, que viria a ser o primeiro prefeito de capital, no caso Florianópolis, eleito na legenda do PPS, no mesmo ano em que este se originou (1992), fazendo uma gestão que deixou uma marca na Ilha. Estudantes ainda, Juca Ferreira e Ana de Holanda, futuros ministros da Cultura dos governos Luiz inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, respectivamente, se aproximam por essa época do PCB, assim como os músicos Jards Macalé e Buru. Os irmãos Régis e Rogério Duprat já haviam aderido desde antes ao Partido, da mesma forma que a regente e compositora Esther Scliar, que ingressara em 1951. Nas redações dos grandes jornais e revistas — notadamente do eixo Rio-São Paulo — os jornalistas comunistas travam uma luta renhida contra os censores. Milton Coelho da Graça, Elio Gaspari, Ivan Alves, Aristélio de Andrade, Alberto Rajão, Danúbio Rodrigues, Anivaldo Miranda, Derly Barreto, George Duque Estrada, Rodolfo Konder, João Antônio Mesplé, Léo Guanabara (que teve seus direitos cassados logo após o Golpe), Carlos Alberto Caó de Oliveira, Beatriz Bonfim, Vladimir Herzog, Jairo Régis, Luiz Fernando Cardoso, Fabiano Villanova, Maurício Azêdo (posteriormente presidente da Associação Brasileira de Imprensa), Sérgio Cabral, Teixeira Heizer, Célia Maria Ladeira (depois professora na UnB), Roberto Müller, Antonieta Santos, Narceu de Almeida Filho, Mauro Santayana, Heloneida Studart, Nilson Miranda, Carlos Eduardo Ullup, Elias Fajardo, Carlos Jurandir, Ancelmo Góis e Milton Temer são alguns desses profissionais. Muito qualificados, esses jornalistas eram imprescindíveis ao funcionamento da imprensa profissional, embaraçando os patrões: mesmo sabendo que eram comunistas, não poderiam abrir mão deles nas redações. Quase todos são presos. Em Minas Gerais, Roberto Drummond, também jornalista, é membro do Partido. Outros jornalistas, extremamente próximos do PCB, mas sem vinculação orgânica foram Mário da Cunha, Maria Inês Duque Estrada e Celso Kinjô — todos integraram o combate à ditadura. Não se pode esquecer que a modernização profissional das redações criadas na grande imprensa brasileira foi, também, em boa parte, esforço dos comunistas. Nessa época, dois jovens estudantes — o atual jornalista Cid Benjamim e o editor e economista Cesar Benjamim, que fariam história nas esquerdas mais adiante — aproximam-se do PCB. Cid chega a ingressar formalmente no Partido, enquanto seu irmão, um pouco mais novo, participa de um organismo parapartidário.
1968-1978
A fase mais dura do regime militar, é a na qual se vive sob o império do Ato Institucional n° 5, carta de natureza fascistoide, que suprime todas as liberdades democráticas. Quase um terço do Comitê Central do PCB é assassinado pelas forças repressivas. Seus corpos até hoje não apareceram. São eles: David Capistrano, Luis Inácio Maranhão, João Massena Melo, Élson Costa, Itair Veloso, Orlando Bonfim, Jaime Miranda,Hiram Lima e Walter Ribeiro. Barbaramente torturados, dirigentes nacionais como Hilário Pinha, Renato Guimarães, Gregório Bezerra, Moacyr Longo, Marco Antonio Tavares Coelho, Paulo Elisiário Nunes e Renato Oliveira da Motta conseguem sobre viver, cumprindo anos de cadeia. Sequestros, prisões, torturas e assassinatos dos opositores políticos atingem igualmente a esfera da cultura. Muitos criadores e intelectuais deixam o país. Acusada de militar no PCB, a historiadora Emília Viotti da Costa é aposentada compulsoriamente pelo AI-5 e recebe convite para lecionar nos Estados Unidos. Outro historiador respeitado, Edgar Carone, mantém-se ligado ao Partido, apesar das pressões que sofre. O mesmo acontece com José Nilo Tavares. Jovens estudantes, como Maurício Siqueira, vão estudar em países socialistas. O jornalista cearense Francisco Inácio de Almeida segue para Moscou, onde trabalha na assessoria de Luiz Carlos Prestes. A economista paraense Dulce Rosa de Bacellar Rocque também vai estudar em Moscou, tornando-se intérprete do Cavaleiro da Esperança. Quadro político de origem operária, o cearense Ederval Araújo Xavier, o Poly, também cursaria Economia em Moscou.
Impossibilitados de trabalhar em seu próprio chão, muitos intelectuais comunistas contribuirão para o desenvolvimento de outros países. É o caso do físico Ubirajara Brito, que acompanhará os arquitetos Oscar Niemeyer, Edgar Graeff e Marcos Jaimovich, na Argélia. Ou do pesquisador Luiz Hilde- brando, um dos diretores do prestigioso Instituto Pasteur, de Paris. Em Moçambique se encontram o economista Gilson Leão e o professor de história Kunio Suzuki, que dão grande contribuição à formação do Estado nacional naquele país, juntamente com o médico e ex-deputado Davi Lerer. Gilson Leão trabalharia igualmente na Guiné-Bissau. Ulrich Hoffman e Sérgio Augusto de Moraes, engenheiros, colaboram com o governo socialista de Salvador Allende, no Chile.
O PCB, além das perseguições, enfrenta, também, a crítica dos grupos radicais de esquerda, que fascinam determinados setores da intelectualidade e da massa estudantil. Um quadro intelectual da envergadura de Jacob Gorender, formado nas hostes partidárias desde o início dos anos 40, rompe com o PCB após o golpe. O mesmo poderíamos dizer de homens como Mário Alves e Joaquim Câmara Ferreira, dirigentes comunistas respeitadíssimos, os quais, com Gorender e Apolônio Carvalho, fundam o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, PCBR.
Apesar do contexto político desfavorável, o PCB busca incentivar algumas iniciativas democráticas no campo da cultura. Um dos fundadores do jornal Pasquim, em 1969, é o comunista Sérgio Cabral. Antes, em 1966, junto com os amigos de infância Max Haus, Moysés Ajhaenblat e Moisés Fuks (todos comunistas), ele participa da fundação do Teatro Casa Grande, no Rio de Janeiro. O Casa Grande, como é conhecido, se revela uma fonte permanente de finanças para o Partido e, a partir de 1974-1975, abrigará toda uma série de debates sobre a realidade brasileira, reunindo a intelectualidade progressista de forma geral.
Mas o mar não estava para peixe, como se diz. Muitos músicos ganham o caminho do exílio — a exemplo do comunista Carlos Lyra — porém representantes da chamada MPB buscam manter acesa a chama no interior do país. Entre eles, artistas também ligados ao PCB — Rildo Hora, Sidney Miller (criador do projeto Pixinguinha), José Carlos Capinam (posteriormente secretário de Estado de Cultura da Bahia), Luiz Gonzaga Jr. — Gonzaguinha, Paulinho da Viola, Tom Zé, Jorge Goulart e Nora Ney, assim como o simpatizante Zé Keti. O PCB mantém, por essa época, uma relação conflitante com os músicos do Tropicalismo, apesar de alguns deles pertencerem aos quadros do Partido, e Caetano Veloso — filho de um simpatizante comunista — e Gilberto Gil terem tido boa aproximação com os membros do CPC na Bahia. Em 1966, por exemplo, Gil lança um disco compacto que obteve muito sucesso, contendo a “socialista” marcha Rancho da Rosa Encarnada, bela mensagem de sua autoria junto com o piauiense Torquato Neto e o paraibano Geraldo Vandré. No campo da música de concerto, Camargo Guarnieri, José Siqueira e Cláudio Santoro, todos ligados ao Partido Comunista, procuram igualmente dar sua contribuição cultural e política. Mesmo um músico como João Gilberto, normalmente pouco afeito à participação política, recebe influência das ideias marxistas. Pertence igualmente ao Partido a cenógrafa e bailarina Gisele Santoro. Também o teatro resiste: quando a ditadura proíbe a peça Abajur Lilás, do ex-estivador e dramaturgo comunista Plínio Marcos, todos os teatros da cidade de São Paulo fecham suas portas, em sinal de protesto. Uma ousadia, sem dúvida. O comunista Paulo Pontes escreveu, em parceria com Chico Buarque, a peça Gota d'Água, de grande sucesso. Atuando sobretudo na Bahia, o ator Bemvindo Sequeira também cumpre um importante papel na resistência cultural ao regime ditatorial, chegando a disputar a vereança pelo MDB com o apoio dos comunistas, então clandestinos. Bemvindo teve, também, uma atuação destacada nas batalhas da intersindical e na formação dos primeiros grupos que lutavam pela anistia. Os diretores de fotografia ligados ao PCB também resistem, à sua maneira, como o então jovem fotógrafo Antonio Luiz Mendes Soares. Espedito Rocha, um revolucionário profissional do Partido, torna-se escultor — e dos bons — ainda na cadeia. O comunista Roberto Pontual, respeitado crítico de arte, esforça-se para manter uma reflexão sobre os rumos da criação plástica.
Mas essa também é a fase marcada pelo assassinato do jornalista Vladimir Herzog e pelas torturas infligidas contra outros profissionais de imprensa membros do Partido, como João Batista Aveline, redator do jornal Zero Hora, de Porto Alegre, futuro diretor de Voz da Unidade, Paulo Markun, Georges Duque Estrada e Rodolfo Konder. Responsável então pelo setor de comunicação do Partido, Elson Costa é barbaramente assassinado pela repressão. E é o momento em que desaparece nas garras da repressão o jovem José Montenegro de Lima, secretário-geral da Juventude Comunista. E essa é ainda uma época em que jovens intelectuais, como Aloísio Teixeira, Gildo Marçal Brandão e Marco Aurélio Nogueira dão o melhor dos seus esforços à reorganização do PCB em São Paulo, o principal reduto operário do país. Nicolau Sevcenko aproxima-se do PCB em meados dos anos 70, ainda na condição de estudante, em São Paulo. André Motta Lima — que se inicia no jornalismo na primeira metade da década de 70 — também ingressa no Partido, ao mesmo título que o jovem fotógrafo Luiz Paulo Santana Machado e a cientista política e jornalista Lúcia Hippólito. Em 1977, os comunistas — apesar de a organização partidária estar praticamente estraçalhada pela repressão política, sobretudo após a vitória eleitoral da oposição em 1974 — conseguem lançar uma revista teórica, Temas de Ciências Humanas, que circularia até 1981, graças em boa parte aos esforços do editor comunista Raul Mateos Castell. Dela participariam Nelson Werneck Sodré e Renato Guimarães, este último o responsável pelo setor de educação no Comitê Central do PCB na década de 60 e parte da de 70, e um dos redatores da resolução do VI Congresso, de 1967 Ainda em 1977 graças em boa medida à intensa movimentação dos comunistas, quase três mil jornalistas de todo o país assinam o Manifesto da ABI contra a censura aos órgãos de comunicação. Durante parte da década de 70, trabalhando nos núcleos de criação da TV Globo, alguns membros do Partido Comunista Brasileiro logram criticar o obscurantismo do regime, valendo-se de novelas e seriados de grande audiência popular.
Era um começo promissor de diálogo com a indústria cultural cada vez mais presente na vida nacional. A política do Partido se pauta pela ocupação das brechas, esquivando-se tanto de uma postura adesista quanto da adoção de um posicionamento com base em hipotéticas políticas conspiratórias ou de infiltração. Vale dizer, o que conta para o PCB é a negociação, por sua vez equidistante, no plano da política tout court, tanto da revolução clássica quanto da chamada conciliação. E, nisso, o Partido também se vale de uma especificidade do processo de transformação social do Brasil, no qual a via negociada tem um papel central.
Na própria direção nacional do PCB, há dirigentes ou intelectuais orgânicos com capacidade de elaboração política e visão cultural mais ampla, ou até sofisticada, entre os quais se poderiam citar Armênio Guedes, Luiz Ignácio Maranhão Filho, Marco Antônio Tavares Coelho, Dinarco Reis, Salomão Malina, Giocondo Dias, Moisés Vinhas, Givaldo Siqueira, Moacyr Longo, Severino Teodoro de Mello, Marly Vianna e Anita Prestes, as duas últimas hoje conceituadas professoras universitárias e escritoras. A presença desses nomes, por si só, revelava a importância da experiência coletiva na elaboração do pensamento político e também cultural. E não só: ainda da clandestinidade, dirigentes e militantes como Geraldo Rodrigues dos Santos e Abgail Páscoa ajudam a organizar o movimento negro e o combate ao racismo. Abgail teve, por exemplo, participação decisiva na criação do Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN). O arquiteto Zulu Araújo desponta, já em meados da década de 70, como uma das lideranças mais significativas do movimento negro na Bahia, participando da criação do grupo Olodum, em 1979. Ele presidiria mais tarde, de 2007 a 2010 a Fundação Cultural Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura. Wellington Mangueira, respeitado militante e dirigente sergipano, também revela sensibilidade para a questão das relações raciais no país. Como secretário de Segurança Pública no Governo Albano Franco, deixou um exemplo de seriedade com a coisa pública e com os direitos humanos. Outro destacado combatente é o jornalista e professor Sionei Leão, militante do Movimento Social Negro e diretor do documentário Kamba Racê, em que narra a presença dos negros no Exército, durante a Guerra do Paraguai, filme premiado pela Fundação Cultural Palmares. Ele é também dirigente da Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira), seção do Distrito Federal, e do Núcleo Afro-Brasileiro do PPS. A propósito das chamadas lutas étnicas, convém observar ainda que o Partido tampouco desconheceu, ao longo da sua existência, a enorme contribuição dos índios para a formação do que é o hoje o Brasil. Foram membros do PCB, afora Darcy Ribeiro, os antropólogos Eduardo Galvão, Carlos Moreira, Berta Ribeiro, Sylvia Carvalho e também Noel Nutels e os indigenistas Chico e Apoena Meirelles, pai e filho. Os comunistas tiveram um papel relevante na criação do Parque do Xingu, por exemplo.
Essa foi uma fase em que os intelectuais comunistas, apesar da clandestinidade do Partido, buscavam dialogar com certas formas de pensamento, como a psicanálise e o estruturalismo. Havia carências, como, por exemplo, um certo desconhecimento ou falta de diálogo com a obra do filósofo Michel Foucault, obra essa que, por vezes, revelava uma certa descrença em relação à liberdade humana.
Apesar de tudo e a duras penas, o Partido se esforçava por manter sua influência junto à sociedade, no quadro de um combate desigual travado com a ditadura militar.
Na Bahia, nomes como o professor universitário Othon Jambeiro, os engenheiros Luiz Fernando Contreiras e Luiz Carlos Gurgel, o advogado Eduardo José Santiago, o cientista político Paulo Fábio Dantas Neto (que chegou a secretário geral estadual do PCB), o jornalista Emiliano José, do fim do anos 70 aos de 80, retomam o trabalho de reconstrução partidária, juntamente com suas atividades intelectuais.
1978-1985
Com o fim do AI-5, a decretação da anistia e o retorno dos comunistas do exílio, o PCB tenta se rearticular. Reconhecendo a importância sempre crescente do mundo da comunicação, o Partido lança, em março de 1980, o semanário Voz da Unidade, o qual abre algum espaço para o debate cultural. O jornal é dirigido, em uma primeira fase, por Noé Gertel e, depois, por João Batista Aveline e, por fim, por Luiz Carlos Azedo, oriundo do setor estudantil do Partido e um dos seus melhores intelectuais orgânicos até hoje, já no PPS. Um dos editores de cultura da Voz é o respeitado escritor e professor universitário paulista Martin Cezar Feijó. O Comitê Central do Partido encarrega Renato Guimarães e Ivan Alves de criarem a Editora Revan, hoje uma das mais conceituadas do país.
Nesse mesmo período, nasce a revista Presença, coordenada pelo veterano dirigente comunista Armênio Guedes, que exprime a chamada visão eurocomunista que se desenvolve dentro do PCB e conta com a participação, entre outros, de Luiz Werneck Vianna, Maria Alice Rezende de Carvalho, Manuel Palácios, Gilvan Cavalcanti de Melo, Luiz Sérgio Henriques, Rubem Barboza Filho, Alberto Aggio e Milton Lahuerta. Dois anos antes, ressurgia das cinzas a revista Civilização Brasileira, agora denominada Encontros com a Civilização Brasileira, também dirigida pela dupla Ênio Silveira e Moacyr Félix, comunistas. Ex-líderes egressos do movimento estudantil, como Carlos Alberto Muniz e Franklin Martins, assumem as propostas do Partido naquele momento. Também oriundos do movimento estudantil, as lideranças Arnaldo Jordy do Pará, Luzia Ferreira e Juca Amorim, ambos de Minas Gerais e Ana Batista, do Rio de Janeiro, reforçam consideravelmente o PCB. Luiz Paulo Velloso Lucas reafirma a sua condição de militante do Partido. Jovens estudantes ainda, Hamilton Garcia (hoje cientista político) e Kadu Machado (hoje jornalista) também aderem ao Partido. O hoje historiador João Luiz de Araújo Ribeiro adere à juventude do Partido no bojo da abertura política. Sergio Cabral Filho toma o mesmo caminho. O jornalista Alon Fuerwerker e Silvano Tarantelli fazem o mesmo, engajando-se inclusive no semanário Voz da Unidade, ao mesmo título que o médico e jornalista Luis Mir, hoje escritor. Em Minas Gerais, o hoje historiador Rodrigo Patto de Sá Motta ingressa no PCB. Em São Paulo, a jovem geógrafa e professora Arabela Pereira Madalena assume plenamente a sua condição de comunista, após retornar de Moçambique. O sociólogo José Claúdio Barrighelli, preso durante alguns anos na ditadura, mantém sua ligação com o Partido. Na esfera mais institucional, uma comunista, Maria José Feres, torna-se a primeira presidente da Adesp (Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior), em 1981. O professor de física, Robespierre Teixeira, comunista, assume a Presidência do Sindicato dos Professores do Rio de Janeiro nessa mesma fase. A jornalista Lu Fernandes, comunista, torna-se a primeira mulher a presidir o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, em 1982. Antonio Rezk funda, em 1978, na capital paulista, o Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos (Ipso), e se torna primeiro vice-presidente da União Brasileira dos Escritores (UBE).
Contudo, o PCB ainda não obtém a sua legalidade. Pior, até: encontra-se muito dividido. De um lado, existe o grupo que se articula em torno das posições defendidas por Luiz Carlos Prestes, partidário da formação de uma frente das esquerdas. O conceituado advogado Aldo Lins e Silva o acompanha nesse posicionamento, assim como os históricos dirigentes comunistas Agliberto Vieira de Azevedo e Gregório Bezerra. De outro, há os chamados eurocomunistas, partidários da aplicação da rica experiência política de alguns partidos irmãos europeus à realidade brasileira, notadamente no que tange à valorização da questão democrática na ultrapassagem do modo de produção capitalista, já percebida pelos comunistas nacionais em 1958. Acaba prevalecendo a linha política expressa por Giocondo Dias — mas a influência do PCB junto à intelectualidade já não é mais a mesma, decididamente.
Seguramente, a maneira como o PCB tratou da questão eurocomunista contribuiu para esse afastamento da intelectualidade do seio do Partido. Intelectuais históricos do PCB, com mais de vinte ou trinta anos de militância — Leandro Konder é um deles; Carlos Nelson Coutinho, outro; o médico David Capistrano Filho, outro ainda — afastam-se do Partido. Um jornalista da importância de Mauro Malin também se desliga nessa ocasião do PCB (ele fora um dos redatores, juntamente com Giocondo Dias e Leandro Konder, da resposta à Carta aos Comunistas, de Luiz Carlos Prestes). Zuleika Alambert, que sempre trabalhara com a juventude e se tornara a principal expressão feminina do partido, deixa igualmente a agremiação. Mesmo assim convém recordar que a ação inovadora sobre a questão feminina de Zuleika deixaria marcas profundas no Partido: Abgail Páschoa, Bete Barreiros, Cleia Schiavo, Elaine Faria, Guiomar Monteiro, Iáris Ramalho Cortês, Irina Storni, Jane Neves, Neusa Melo e Tereza Vitale, vozes feministas no interior do PPS, seguem seu legado sempre destacando o pioneirismo de sua atividade, e capitaneadas por Almira Rodrigues, uma referência nacional do movimento feminista. Seja como for, enfraquecido, o PCB se defronta ainda com a forte presença do Partido dos Trabalhadores (PT) nos meios culturais, sobretudo na academia.
Marco Aurélio Nogueira e Gildo Marçal Brandão se afastam organicamente do Partido, mas mantêm inúmeros vínculos com a organização. Um importante quadro intelectual e formulador político, José Paulo Neto, permanece, contudo, nas fileiras partidárias naquele momento, assim como o economista alagoano Cícero Péricles e a socióloga Iara Brayner Mattos.
Ironias da História: não se pode deixar de lembrar que, no exato momento histórico em que o PCB afirma a vitória de sua linha política de massas sobre a ditadura militar, esse mesmo Partido começa igualmente a declinar.
1985-1992
O PCB obtém a sua legalidade somente em maio de 1985, após o fim do regime militar, quando outras agremiações de esquerda já se encontravam legalizadas, como o PT e o PDT O Partido tenta reconstruir as pontes com o movimento cultural de maneira geral. O médico comunista Sérgio Arouca assume a Presidência da Fiocruz. O veterano jornalista comunista Ivan Alves torna-se Diretor de Jornalismo da TVE, a única televisão educativa que ainda depende do governo federal (as demais são estadualizadas). Horácio Macedo passa a ser o reitor da UFRJ, eleito por seus pares. São espaços que os comunistas voltam a ocupar na sociedade. Um poeta libertário como Paulo Leminsky, uma das vozes mais originais de sua geração, assume a sua plena condição de comunista. Um ensaísta da qualidade de Ivan Ribeiro Filho confirma a sua permanência no Partido. Os historiadores José Antônio Segatto e Celso Frederico mantêm-se alinhados com as teses partidárias. O economista Rogério José Dias faz o mesmo, por seu lado, assim como o jornalista e escritor Jocelyn Brasil e o advogado e poeta Eusélio Oliveira.
Advogados prestigiosos, atuando na esfera trabalhista, defensores dos direitos humanos, como Marcelo Cerqueira, Paulo Saboia, Humberto Jansen, Modesto da Silveira, Flora Strozenberg (todos do Rio), Aníbal Fernandes (São Paulo), Felix Palacci e José Vigilato Cunha (Distrito Federal) também renovam ou mantêm suas ligações antigas com o Partido, que sempre encerrou em seus quadros advogados brilhantes, como Calheiros Bonfim, Sinval Palmeira e Herman Baeta. Em 1986, o PCB decide lançar a revista Novos Rumos, de caráter mais teórico. Dirigida pelo veterano antifascista Noé Gertel, a publicação visa ampliar a inserção do PCB na intelectualidade.
Aos poucos, os contatos com o mundo do samba também vão sendo retomados. Lícia Canindé, a Ruça, vereadora comunista pelo Rio de Janeiro e integrante do PCB desde 1968, passa a presidir a escola de samba de Vila Isabel, ganhando o carnaval de 1988, em memorável desfile que homenageia Zumbi dos Palmares no centenário da Abolição, justamente. Noca da Portela, sambista dos mais respeitados, integra oficialmente o Partido ao qual se ligava ainda nos tempos da clandestinidade. Monarco, outro portelense histórico, comparece a inúmeros atos promovidos pelo Partido — lembrando sempre que sua prima, Zélia Magalhães, seria assassinada em um comício do Partido, durante o Governo Dutra, em 1946. Um compositor da qualidade de Almir Sater comparece a espetáculos promovidos pelo Partido no Mato Grosso do Sul. No plano específico da cultura popular, ressalte-se o excepcional trabalho do maranhense Teodoro Freire que criou e fez atuar permanentemente, em Brasília, o Bumba Meu Boi e Tambor de Crioula do Seu Teodoro. Militante do PCB, desde jovem, no Rio de Janeiro, então capital da República, transferira-se, em 1962, para a nova capital, a pedido do seu conterrâneo, o poeta Ferreira Gullar, então diretor da Fundação Cultural do Distrito Federal.
Criadores como os cineastas Denoy de Oliveira, Sílvio Tendler, João Batista de Andrade e Vladimir Carvalho e os pintores Siron Franco, Waldomiro de Deus e Aparecida Azedo tomam o mesmo rumo. Que é também aquele do criativo cartunista e jornalista Cláudio de Oliveira.
Um economista da qualidade de Raul de Mattos Paixão, autor de uma tese importante que considera a inflação um instrumento de transferência de renda do salário para o capital, em uma fase em que ela recrudescia, renova seus vínculos partidários, assim como o também economista Demétrio Carneiro, originário do movimento estudantil do Partido no Rio de Janeiro. O cineasta Zelito Vianna e a produtora cinematográfica Vera de Paula permanecem estreitamente ligados ao Partido, ainda que sem vínculos orgânicos, propriamente. O rumo do PCB seria também o do ator Stepan Nercessian e da atriz Bete Mendes, que, com apenas 15 anos de idade, aderira ao PCB no Rio. Jovem estudante ainda, Paulo Ribeiro Cunha, que depois se destacaria como sociólogo, ingressa oficialmente no Partido. Muitos desses intelectuais e artistas estarão presentes na bela campanha do deputado Roberto Freire à Presidência da República, em 1989. Entre eles, citaríamos Cristiane Torloni, João Câmara, Noca da Portela, Mário Lago, Joel Barcellos. Quando do segundo turno das eleições, os partidários e simpatizantes do PCB vestiram uma camiseta de campanha onde se podia ler: “Sou Freire. Estou Lula”. Aliás, a campanha presidencial foi um desses momentos em que o PCB mobilizou toda sua massa crítica, apresentando ao país temas de grande modernidade, como a questão da privatização do Estado e a atualidade, entre nós, inclusive, dos efeitos da revolução tecnocientífica em curso no mundo.
Mas — é preciso que se reconheça, igualmente —, o PCB representa um modelo internacionalmente esgotado — o chamado socialismo real — e os estudantes e a nova intelectualidade progressista não se sentem nem um pouco atraídos mais por ele. Apesar dos esforços de alguns reformadores — à frente dos quais o próprio secretário geral do Partido Comunista da União Soviética, Mikhail Gorbachev —, o socialismo real se extingue em 1991, com o fim da União Soviética. E esse fato não poderia deixar de abalar profundamente o Partido, ligado desde os seus primórdios à Revolução Russa de 1917 Em 1992, o PCB decide mudar de nome e de política, sobretudo, e passa a se chamar Partido Popular Socialista, PPS.
1992-2012
Ao perceber a importância fundamental da democracia (o Partido se pronuncia pela chamada radicalidade democrática, a ampliação contínua dos espaços de ação e expressão populares) e o alcance da revolução tecnocientífica em curso no mundo, o PPS vai se posicionando como uma organização que almeja reunir condições de atrair e influenciar, com sua política, aqueles que atuam na área da cultura e da ciência. Trata-se, na passagem do PCB para o PPS, de uma ruptura com determinadas práticas organizativas do velho Partidão, para além de uma mudança de concepção de mundo. Ademais, o Partido percebe que há novos atores sociais em cena. E espaços políticos novos, igualmente. Afinal, a chamada sociedade do conhecimento, o capitalismo cognitivo, começava a mostrar a sua cara, revelando o grande papel que a intelectualidade e os criadores possuem no processo de mudança social, deslocando as fronteiras da classe operária tradicional. O trabalho imaterial como que ganha materialidade.
Apesar disso não se traduzir em fortalecimento imediato do Partido, homens como o economista Luís Gonzaga Beluzzo, os jornalistas José Hamilton Ribeiro e Andrei Bastos, os advogados Almir Pazzianotto e Airton Soares, o antropólogo Mércio Gomes, o influente líder indígena Marcos Terena, o poeta Athayde Nery, o também poeta e letrista Wally Salomão, o advogado Byron Sarinho, o filósofo Luiz Sérgio Coelho Sampaio (esses três últimos prematuramente falecidos), o médico Luciano Rezende, o engenheiro Arnaldo Jardim, o advogado e professor de Direito Dimas Ramalho, a jornalista e apresentadora de TV Soninha Francine, a advogada Linda Monteiro, a juíza Denise Frossard, o historiador Lincoln Penna, o jornalista e blogueiro Maurício Huertas, juntaram-se nesses últimos anos ao PPS, agremiação presidida por um respeitado quadro parlamentar, Roberto Freire.
Nas artes plásticas, Rubens Gerchman, um nome de peso, colabora com o Partido. Maurício Seidl, fotógrafo reconhecido no Brasil e fora dele, faz o mesmo. Delcio Marinho, diretor de teatro carioca e sobrinho-neto de Astrojildo Pereira, retoma suas ligações com a frente cultural partidária. Luiz Carlos Prestes Filho, estudioso e pioneiro, entre nós, no exame das chamadas indústrias criativas, também mantém relações muito amistosas com o aparato cultural do Partido. Esportistas como o velejador Lars Grael adere ao PPS, assim como a ex-jogadora de voleibol, pentacampeã pelo Flamengo e sobrinha de Astrojildo Pereira, Norma Dias, e o técnico de futebol Wanderley Luxemburgo. A esportista Georgette Vidor ingressa igualmente no Partido, sagrando-se, inclusive, deputada estadual pela legenda do PPS. Igualmente deputado estadual pelo PPS, Comte Bittencourt enriquece a visão partidária sobre a questão educacional, assim como a bióloga e professora Renata Cabrera. O ator David Pinheiro milita igualmente nas hostes partidárias.
Um passo importante — ou até fundamental — no sentido da integração com a esfera da cultura se deu com a criação da Fundação Astrojildo Pereira (FAP), instituída pelo Partido em 2001. Ela cumpre a função de um Comitê Cultural contemporâneo. Intelectuais, jornalistas e artistas conceituados integram esse órgão. E o conselho editorial da sua revista, a Política Democrática, reúne alguns nomes expressivos, muitos dos quais colaboram também com artigos para suas edições. Eis alguns desses nomes: o poeta Ferreira Gullar, o documentarista Vladimir Carvalho, o cientista político Luiz Werneck Vianna, o economista Sérgio Besserman Vianna, o promotor e escritor Oscar d'Alva, o historiador Alberto Aggio, o sociólogo Raimundo Santos, o constitucionalista Paulo Bonavides, a física Dina Lida Kinoshita, o promotor de Justiça e escritor Ruszel Cavalcante, o jornalista e escritor Luciano Barreira (já falecido), o ex-ministro Raul Jungmann, o professor Amílcar Baiardi, o economista Raul de Mattos Paixão Filho (já falecido), o professor e geólogo George Gurgel, o sociólogo Luiz Eduardo Soares, o ensaísta e tradutor Luiz Sérgio Henriques, o crítico e historiador musical Ricardo Cravo Albin, o professor Marco Aurélio Nogueira, a poeta Graziela Mello, a socióloga Cleia Schiavo, o jornalista Luiz Carlos Azedo, o cientista político Augusto de Franco, a historiadora Maria do Socorro Ferraz, o historiador Ricardo Maranhão, o professor e ex-secretário de Estado do Mato Grosso do Sul Fausto Mato Grosso, o ex-secretário de Educação do Estado do Mato Grosso e professor Antonio Carlos Máximo. Fora isso, a Política Democrática estampa, em seus dez anos de atividade, artigos e ensaios de intelectuais de grande prestígio no mundo da cultura e da academia, os quais não possuem ligação direta com o PPS ou até mesmo com a própria FAP.
A revista — editada por Marco Antônio Coelho, ex-deputado comunista, pelo sociólogo da UnB Caetano Araújo e pelo jornalista Francisco Inácio de Almeida — vem desempenhando um papel semelhante ao da Estudos Sociais nos anos 50 e 60, tornando-se um instrumento central para o diálogo do Partido com o mundo do conhecimento e a sociedade organizada politicamente. Absorvendo a cultura pecebista, a Política Democrática soube se abrir para diversas tendências e paradigmas políticos e filosóficos, buscando sempre debater o novo. E é interessante observar que, desde seu primeiro número, no ano 2001, ela ilustra sua capa e contracapa, a cada edição, com obras de um grande artista nacional, divulgando assim importante parcela da nossa produção plástica, de Oscar Niemeyer a Candido Portinari, passando por Aparecida Azedo, Waldomiro de Deus, João Câmara Filho e Douglas Marques. Artistas mais novos, como aos pintores cearenses Audifax Rios, Sergio Pinheiro, Felix Ximenes e Berenice, o paraibano Marcos Pereira e o pernambucano Jô de Oliveira também foram capa da publicação. Sintomaticamente, o primeiro secretário-geral do PPS, Francisco Inácio de Almeida, um dirigente forjado nos duros tempos da luta clandestina e um de seus mais preparados intelectuais orgânicos, é desde o início um dos principais organizadores da FAP — o que, por si só, traduz a importância que o PPS dedica à questão do conhecimento e da cultura. E não é por outra razão que, transcorridos dez anos de sua fundação, a FAP já publicou dezenas de livros, alguns deles em coedição com a prestigiosa Academia Brasileira de Letras e as aguerridas editoras Brasiliense e Contraponto. De 2000 até julho de 2007, a PD foi uma coedição da FAP com a Editorial Abaré num trabalho de cortesia da dirigente Tereza Vitale.
Seus editores têm consciência das mudanças que se operaram nas esferas intelectuais do país. A figura do intelectual crítico — não necessariamente público — se impôs cada vez mais, a partir da academia, muitas vezes sem atuação diretamente política ou partidária. Qual a função da revista da FAP nesse quadro? Contribuir para aproximar as duas pontas. Vale dizer, por intermédio do equilíbrio entre qualidade teórica e busca por alternativas políticas, a revista se esforça por encurtar a distância entre pensamento e ação. A rigor, não apenas a atividade política sofre com esse distanciamento: a própria teoria corre o risco de se esclerosar ao girar somente em torno de si mesma, fechando-se ao diálogo com um mundo em permanente e inexorável transformação.
Um projeto importante da FAP e que merece ser mencionado aqui, implica o resgate do passado político promovido pela série Brasileiros e Militantes, que, no final de 2011, já editara cerca de 30 documentários, a partir de depoimentos de figuras relevantes da vida do PCB-PPS e do próprio Brasil, como Oscar Niemeyer, Leandro Konder, Ferreira Gullar, Armênio Guedes, Zuleika Alambert, Severino Teodoro de Mello, Moacyr Longo, Joel Rufino dos Santos, Antônio Ribeiro Granja, Sérgio Cabral, Adalberto Timóteo da Silva, Bemvindo Sequeira e tantos outros. Há ainda vários outros depoimentos para serem editados, nos próximos anos. E é preciso mencionar ainda, entre as realizações da FAP, a manutenção de um portal diário que já publicou, entre o início de 2007 e o final de 2010 milhares de artigos, notícias e notas culturais, sobretudo. A FAP edita, anualmente, uma Agenda de caráter temático, abordando assuntos como feminismo, cultura brasileira e militância partidária.
Evidentemente, nada disso seria possível sem o apoio administrativo determinado de Renato Albuquerque Martins, gerente da FAP e militante partidário desde a juventude no PCB.
É possível concluir que o PPS tem como um de seus objetivos apoiar-se nesse rico passado, na tentativa de oferecer ao país um projeto cultural consistente. Refazer a utopia, em síntese. Sem tal projeto, não há construção (ou reconstrução, melhor dizendo) possível de qualquer saída política para o Brasil, a nosso juízo.
Seja como for, o fato é que, em meados de 2005, o Partido organizou, em conjunto com a FAP no Rio de Janeiro, mais exatamente no Museu da República, um seminário nacional para contribuir para a elaboração de uma política cultural para o país na passagem para o terceiro milênio. E o PPS ainda organizou, em julho de 2007 sempre em parceria com a FAF, a Conferência Nacional Caio Prado Júnior para debater com a intelectualidade, sobretudo, os novos rumos da esquerda brasileira. Participaram alguns dos intelectuais e homens públicos mais brilhantes do país, como Ferreira Gullar, Roberto Freire, Fernando Gabeira, José de Souza Martins, Luiz Werneck Vianna, Rui Fausto e César Benjamim. Em 2008, durante a Feira do Livro de Brasília, foi organizado um rico debate sobre os 120 anos da Abolição da Escravatura, tendo à frente Zulu Araujo e Sionei Leão, e lançado mais um número especial da Política Democrática — Cadernos de Debates, abordando o fato e a atual realidade dos afrodescendentes no Brasil. Em 2009, tocou a vez do Recife, onde a FAP organizou, em parceria com a Fundação Joaquim Nabuco e o Departamento de Ciências Humanas da Universidade Federal de Pernambuco, um importante simpósio sobre os 120 anos da República, no campus da UFPE, o qual contou com a presença de expressivos cientistas sociais — como Socorro Ferraz, Francisco Weffort, Maria Alice Rezende de Carvalho e Cesar Benjamim — e homens públicos — a exemplo de Roberto Freire.
A influência cultural — e política — da FAP depende totalmente da autonomia que seus integrantes e colaboradores dispõem na montagem de suas propostas e de seus projetos. Essa é a condição básica para o Partido e sua Fundação enfrentarem as próximas batalhas políticas e embates eleitorais, pois não existe outra forma de influir na construção de um novo bloco de forças para mudar, de fato, o Brasil, em plena transição para a sociedade do conhecimento — na qual a criatividade desponta como verdadeiro meio de produção.
É possível concluir que o PPS tem como um de seus objetivos se apoiar nesse rico passado na tentativa de oferecer ao país um projeto cultural consistente. Refazer a utopia, em síntese. Sem tal projeto, não há construção (ou reconstrução,
melhor dizendo) possível de qualquer saída política para o Brasil, a nosso juízo. Todas as ações do PCB-PPS, no campo da cultura, nesses anos todos, contribuíram — tal é, ao menos, nossa convicção — para despertar vocações entre os jovens, o que fortaleceu a identidade brasileira.
Inclusão | 16/08/2019 |