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Antes de considerações mais detalhadas acho hoje oportuno também divulgar a seguinte moção aprovada em plenário de 14-8-75 (dez dias antes de ser suspensa a 5.ª Divisão):
«Os militares da 5.3 DIV/EMGFA reunidos em reunião plenária, no dia 14 de Agosto de 197F não podem deixar de considerar o afastamento do coronel VARELA GOMES da 5.ª DIV/EMGFA como mais uma medida tendente a enfraquecer os órgãos vitais do MFA e a dissolver o próprio MFA na totalidade das Forças Armadas Portuguesas, anulando, deste modo, e a breve trecho, o destacamento de vanguarda das Forças Armadas que é o MFA.
Simultaneamente com a vertiginosa progressão das forças contra-revolucionárias e fascistas, assiste-se, no seio das Forças Armadas, a diversas acções todas elas convergindo para a desautorização e paralisação das estruturas democráticas do MFA a todos os níveis e o desrespeito pelas decisões nelas tomadas.
Ao mesmo tempo que o MFA vai perdendo os seus contornos de vanguarda político-militar, verifica-se uma intensa actividade à margem dos órgãos do MFA no sentido de fazer ressuscitar todos os sentimentos conservadores e de casta ainda existentes nas Forças Armadas para que o MFA perca gradualmente a sua influência e autoridade política.
Pelo conhecimento que as massas trabalhadoras têm do papel de vanguarda desempenhado pela 5.ª DIV/EMGFA, no âmbito do MFA, na defesa, consolidação e aprofundamento do processo revolucionário, particularmente manifesto em 28 de Setembro e 11 de Março, e, por sua vez, pelo inigualável contributo do coronel VARELA GOMES na orientação e prática político-militar da 5.ª DIV/ EMGFA, os militares da 5.ª DIV/EMGFA, reunidos em plenário:
Depois desta introdução vamos às considerações mais detalhadas. Um pouco de história sobre o que era a 5.ª DIVISÃO.
Fazer a história da 5.ª Divisão é o mesmo que recapitular a trajectória do processo revolucionário português, as resistências que encontrou, os êxitos que obteve e as crises que soube superar. A 5.ª Divisão foi idealizada e começou a ser organizada pela primeira Comissão Coordenadora do Programa do MFA, em Maio/Junho de 1974, por alturas de uma reunião efectuada na Manutenção Militar, na qual Spínola, Vieira de Almeida e Sá Carneiro tudo tentaram para dissolver o MFA». Contudo, a correlação de forças, na altura, não era totalmente favorável ao MFA, e, nestas condições, a Comissão Coordenadora do Programa, o órgão então mais representativo do MFA, saiu do Palácio de S. Bento, instalando-se na Cova da Moura. Os sete elementos que constituíam essa primeira Comissão, da qual faziam parte alguns dos «nove», nomeadamente Melo Antunes, Vítor Alves e Vítor Crespo, chefiada pelo então coronel Vasco Gonçalves, por ser o militar mais graduado, foram o núcleo inicial da 5.ª Divisão, ampliada posteriormente para doze elementos. Todavia, essa primeira equipa, como não dispunha de forças para vencer todas as resistências que lhe eram opostas, nunca conseguiu sair para o exterior, encalhada, primeiro no Palácio de Belém, depois em S. Bento, e, por último, noutros palácios.
A 5.ª Divisão foi, portanto, uma trincheira de defesa da primeira Comissão Coordenadora do MFA e do espírito revolucionário de vanguarda. Porém, poucos dias depois de formada a 5.ª Divisão, como órgão do Estado-Maior-General das Forças Armadas, foi nela integrado o coronel Varela Gomes, depois de ter estado preso por ordem da Junta de Salvação Nacional, e outros militares progressistas. Seguiu-se um período tumultuoso e angustiante sempre à espera dos golpes de Spínola e, de uma maneira geral, da reação, num clima que se prolongou até ao 28 de Setembro. Angústia revolucionária, que estamos a viver agora outra vez.
Valeu nessa altura à 5.ª Divisão a chegada de um conjunto de oficiais vindos da Guiné, que pertenceram à respectiva Comissão Coordenadora do MFA, o que constituiu um reforço considerável para se passar à fase de organização — sempre na medida do possível, dadas as resistências que subsistiam.»
«Quinze dias antes do 28 de Setembro, saiu o primeiro número do «Boletim», da responsabilidade da C. C. P., que constituiu um elemento importante na luta política. O seu aparecimento causou tal impacto que chegou a preencher uma ou duas sessões da extinta Junta de Salvação Nacional, que o discutiu, gritando a sua indignação. E foi assim que esse elemento de combate abriu a luta entre o MFA e a facção anti-MFA.
Na noite angustiosa de 28 de Setembro, a 5.® Divisão esteve no posto que lhe competia, desempenhando a acção indispensável para o triunfo da causa revolucionária, isto é, dar a entender aos camaradas de todo o País, às organizações de massas, às organizações políticas e a outras que com ela contactaram, que a vitória seria da Revolução, porque a correlação de forças estava a seu favor. Desempenhou, nessa altura, o papel que compete a um órgão político-militar, dando um sinal de serenidade, de controlo da situação, de confiança e de perspectiva de êxito. O contributo da 5.ª Divisão, nessa noite de incerteza, foi a de uma voz serena dirigida aos camaradas, demonstrando que não bastavam os pára-quedistas, a G.N.R. e a P.S.P. para derrotar o povo português.
O 28 de Setembro resultou numa mudança qualitativa da situação, transpondo-se determinado patamar de contradições. Foi a partir dessa data que a 5.ª Divisão se organizou sob a chefia do coronel Robin de Andrade. Passou a emitir regularmente emissões de rádio e a publicar o «Boletim do MFA» todas as quinzenas, a realizar um programa semanal de televisão e a intervir intensamente junto das populações, através da Comissão Dinamizadora Central (CÓDICE)».
Entretanto foi na então Região Militar de Tomar que as resistências a esta actividade se revelaram mais fortes, tornando-a praticamente impenetrável. Apesar disso, no período entre o 28 de Setembro e o 11 de Março, a actuação da 5.® Divisão foi importante, não só através do esclarecimento das populações, mas simultaneamente pela recuperação para o processo revolucionário de numerosos militares, que só em contacto com a realidade da miséria em que vive o povo português puderam compreender a natureza e os objectivos do MFA. Por outro lado, a actuação da 5.* Divisão, foi de vigilância revolucionária, pois na medida em que encontrava obstáculos e oposição aí se reconhecia a existência de um foco contra-revolucionário ou, pelo menos, reaccionário. Foi assim fácil deduzir, antes do 11 de Março, que se preparava, naquela Região Militar (hoje incluída na Região Militar Centro), um golpe contra-revolucionário. Apesar de ter sido dado conhecimento prévio da situação às instâncias competentes, elaborados relatórios e lançados inúmeros alertas, pouca ou nenhuma atenção foi prestada a esses avisos, e, por isso mesmo (ou por outras e misteriosas razões) o golpe de 11 de Março surgiu como uma surpresa.
Quem ficou «verdadeiramente surpreendido», quando, às 11.55 do dia 11 de Março, receberam por telefone a informação de que o RAL 1 estava a ser bombardeado pela aviação, foram os militares da 5.‘ Divisão, mas «as disposições e iniciativas decisivas tomadas rapidamente (por aquele organismo militar), neutralizaram o golpe. No entanto, salientam desde já «a importância que teve a mobilização das massas populares e, ao mesmo tempo, a acção desmobilizadora sobre os militares pára-quedistas que a 5.* Divisão operou através dos microfones da Emissora Nacional».
«Depois da histórica assembleia do MFA, na noite de 11 de Março, criaram-se novos órgãos revolucionários», como aliás é do domínio público. «Pareceu que a 5.ª Divisão poderia então começar a trabalhar com certa tranquilidade de espírito, na consolidação do espírito democrático dentro das Forças Armadas, e no alargamento da acção de esclarecimento e actividades cívicas, junto das populações mais atrasadas». Para isso, «criou-se o Centro de Sociologia Militar, dedicado à formação de quadros do MFA, onde já se realizaram três estágios, o último dos quais interrompido pelo repentino assalto de 27 de Agosto». Por outro lado, «a CODICE também ampliou as suas actividades, de tal modo que a ocupação efectiva do terreno que está realizando nos distritos de Bragança, Viseu e Castelo Branco, tem contribuído, de forma determinante, para conter a onda reaccionária nesses distritos».
«Parece que esta acção de alto valor revolucionário e patriótico não consegue ser compreendida em toda a sua extensão pelos grandes revolucionários teóricos que, sentados nas cadeiras palacianas, apenas se dedicam a apontar erros e insuficiências»; melhor fariam e com muito mais proveito para a Revolução Portuguesa se deixassem os palácios e as intrigas conspirativas e se fossem estabelecer entre as populações, entre as massas trabalhadoras, que com tanta «coragem» verbal, dizem defender».
«O contacto da 5.ª Divisão com as necessidades populares tem sido uma realidade, não só por intermédio das campanhas de acção cívica junto das populações, como ainda através do Centro de Relações Públicas, ao qual acorrem, diariamente, centenas de pessoas e entidades colectivas, designadamente trabalhadores, sindicatos, comissões de moradores, pequenas empresas e muitas outras, pedindo conselho e celeridade no encaminhamento para a solução dos mais diversos problemas que interessam o povo português. Além do mais, a sua intervenção nos órgãos de comunicação social, que o País muito bem conhece, através dos programas radiofónicos diários, em várias estações emissoras e do programa semanal na TV — já referidos—, de inegável importância para a tomada de consciência patriótica e revolucionária dos problemas políticos, económicos e sociais que nos afectam. Por seu lado, o Boletim do MFA, cuja tiragem atinge os 120 mil exemplares, transformou-se no veículo ideológico escrito de maior aceitação e penetração nas unidades militares.»
Tudo isto o assalto do 27 de Agosto pretendeu destruir, numa submissão total às pressões das forças reaccionárias e pseudo-revolucionárias deste País. É curioso como, em nome do apartidarismo, se cumprem as consignas da direcção do Partido Socialista e se caluniam órgãos revolucionários do MFA. Os mesmos que acusam a 5.ª Divisão de conotações partidárias, não têm a menor relutância em obedecer às palavras de ordem da direcção do P. S. São os mesmos que se exaltam porque os «Nove» foram melindrados, mas não levantam a voz quando o camarada Vasco Gonçalves é vilmente insultado. São ainda esses que emitem comunicados sediciosos, numa pretensa defesa do respeito devido ao Presidente da República, nada comentam quando um comandante como o brigadeiro Corvacho é vaiado e apelidado de fascista, numa manifestação claramente manipulada.»
«Os tais apartidários que tanto utilizam o conceito de independência nacional estão dispostos a todas as subserviências para conseguirem os em- préstimos-esmola do capitalismo internacional. Esses «independentes» que fingem tremer com os perigos da dominação de Portugal pelo «imperialismo» soviético, negoceiam, como amigos, com o sr. Carlucci e todas as tenebrosas figuras do imperialismo mundial. Esses militares socialistas revolucionários de última hora, não consta que estejam dispostos a prescindir dos seus vencimentos de generais graduados e dos seus «Mercedes», em benefício das classes mais desfavorecidas, com que enchem constantemente a boca.»
O socialismo é boa receita, enquanto não belisca os pequenos privilégios de pequenos-burgueses, os quais nem percebem que estão a ser comprados pela sociedade de consumo.
Que os camaradas com responsabilidades na revolução de Abril, procedam a um honesto exame de consciência que os ajude a compreender que o seu anti-comunismo é apenas uma má-fé de lutadores inconsequentes».
A 5.ª Divisão foi um órgão que sempre proclamou a austeridade revolucionária desde a primeira hora e reclama ainda o primado da competência e da inteligência. A existência deste órgão tornava-se assim incómoda aos objectivos de exercício irrestrito do poder de alguns.
«A 5.ª Divisão incomoda, mas não os revolucionários. Tentando destruí-la, à boa maneira fascista denunciam uma falta de lealdade para com as opções democráticas e socialistas que dizem partilhar. Quem está contra a 5.ª Divisão está contra o processo revolucionário português. É bom que disso tomem consciência os «nasseristas» que se querem impor como donos da revolução portuguesa, como donos deste sacrificado País.»
(31-8-75)
Inclusão | 24/04/2019 |