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Escrito: Em 2000, revisado em 2018 - veja a versão de 2006
Primeira Edição: Em forma completa como Linha Política Geral, estabelecido e adotado pelas LCPs no 1º Congresso da LCP, em 2000.
Fonte: (Desconhecida)
Transcrição e HTML: Anônimo
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
“Juramos pelo sangue derramado dos nossos companheiros na fazenda Santa Elina, levar a qualquer custo a luta pela terra, pela democracia, justiça e trabalho até a vitória final.”
Juramento feito pelos resistentes da Batalha de Santa Elina na fundação do MCC, em Jaru-RO, 25 de fevereiro de 1996. Juramento assinado pelos continuadores da luta de Santa Elina e fundadores da LCP.
Companheiras e companheiros,
Nosso Caminho apareceu pela primeira vez há mais ou menos dez anos, em meados de 1996. Continha o resumo dos estudos e idéias resultantes da prática social, principalmente na luta de classes, de centenas de companheiras e companheiros militantes revolucionários e das massas populares de diferentes regiões do nosso país. O seu propósito era servir de orientação básica para a intervenção no movimento camponês na luta pela conquista da terra e pelas transformações necessárias à libertação social e política do povo pobre do campo em particular, e da libertação do povo brasileiro e da nossa Nação do jugo do imperialismo, no geral.
Sob o impacto dos dramáticos acontecimentos de 9 de agosto de 1995 em Corumbiara — Rondônia, onde na fazenda Santa Elina, milhares de camponeses ali acampados impuseram a mais feroz resistência à selvageria do latifúndio e seu velho Estado burocrático genocida em seu ato covarde de semear o terror e realizar o despejo de mais de 600 famílias, o movimento camponês de nosso país começou uma nova etapa de sua história.
Aqueles acontecimentos marcaram profundamente a história do movimento popular no estado de Rondônia e em nosso país, fazendo também profundamente uma demarcação de campo entre as diversas correntes políticas do movimento popular e na sociedade brasileira. Com eles iniciou-se uma luta aberta no interior do movimento camponês sobre os rumos, métodos de organização e de luta. Na verdade deu início a um processo de separação e depuração necessários e inevitáveis ao movimento camponês em seu longo e complexo curso em nosso país.
Aqueles acontecimentos marcaram profundamente a história do movimento popular no estado de Rondônia e em nosso país, fazendo também profundamente uma demarcação de campo entre as diversas correntes políticas do movimento popular e na sociedade brasileira. Com eles iniciou-se uma luta aberta no interior do movimento camponês sobre o rumo, linha política e métodos de organização e de luta. Na verdade deu início a um processo de separação e depuração necessários e inevitáveis ao movimento camponês, da luta no seu seio entre os dois caminhos — o proletário ou o burguês, o democrático ou o burocrático — em seu longo e complexo curso em nosso país.
Tal luta é a que se dá entre o caminho do oportunismo, que é o mesmo caminho burocrático da burguesia e do latifúndio, que sempre subordinou o movimento camponês aos projetos eleitoreiros, tratando os camponeses como classe secundária na luta de classes, e o caminho revolucionário, único capaz de efetivamente conquistar a terra através da destruição completa do latifúndio, por guiar-se no programa revolucionário de transformações para o campo e por considerar os camponeses pobres como a força principal para as transformações democráticas revolucionárias de nosso país, assentadas na aliança operário-camponesa.
Desde a heroica Batalha de Santa Elina, ao longo de 23 anos, a experiência da luta popular no país só confirmou a análise e a orientação do Nosso Caminho. Também apresentou importantes desafios que têm exigido novas respostas para novos problemas nos impondo a necessidade de revisar e ajustar aspectos de nossa orientação, como ocorreu ao longo dos 13 anos e meio de gerenciamento do oportunismo PT/PCdoB/PSB/PDT, apoiados pelo restante da “esquerda eleitoreira”, pela CONTAG, MST, as centrais sindicais e outras organizações controladas pelo oportunismo.
Com o triunfo eleitoral de Luiz Inácio em 2002, as direções oportunistas, que embora cada vez mais decadentes, ainda têm prevalecido no movimento camponês, tiveram todas as oportunidades para demonstrar e comprovar a quem realmente serve suas teses: à grande burguesia, os latifundiários e ao imperialismo. Menos aos camponeses pobres. Senão vejamos: aqui estamos após 13 anos e meio de seus governos (Luiz Inácio e Dilma), na verdade mero gerenciamento de turno do velho Estado de grandes burgueses e latifundiários, serviçais do imperialismo que desembocou no seu mais completo fracasso, afundado na crise econômica e geral de decomposição do capitalismo burocrático e em meio da crise geral do imperialismo. Mais ainda, da grave crise política que depôs por impeachment Dilma Rousseff, expressão que é da briga das frações das classes dominantes em razão da mesma crise econômica. Em todos estes anos os camponeses pobres só podem dizer que sua situação piorou. Não foi Luiz Inácio quem disse, entre tantas promessas de campanha, que “se tivesse que tomar só uma medida em seu governo, ela seria a de fazer a reforma agrária”? Sim, foi ele mesmo! Não foram os oportunistas que obtiveram, nada mais nada menos, que o controle do Ministério do Desenvolvimento Agrário e não foram os quadros ligados à direção nacional do MST e da CONTAG que ocuparam os mais importantes cargos do INCRA em nível nacional e nos estados? Sim, foram eles mesmos!
E para que tudo isto serviu? O que tudo isto está servindo é para que todos os camponeses pobres vejam o fracasso da velha conversa fiada de sempre da “reforma agrária do governo”. Isto está servindo é para desmascarar todos oportunistas, eleitoreiros descarados que são, e todo este governo, que revelou ser nada mais que uma gerência de turno do velho Estado de grandes burgueses e latifundiários serviçais do imperialismo. Que somente resta ao movimento camponês levar a luta por uma verdadeira revolução agrária. Mas para isto se necessita rechaçar o podre caminho oportunista da conciliação e tomar o caminho revolucionário espinhoso e nada fácil da luta pela destruição completa do latifúndio.
E é para travar esta luta e dar grande impulso ao movimento camponês que aqui está Nosso Caminho, sempre novo, invariável, revigorado e irrenunciável.
A comissão de revisão e redação, Goiânia, junho de 2018.
A questão agrário-camponesa no Brasil, ao contrário da secundarização de seu significado a que relega a reação, os acadêmicos burgueses, os monopólios dos meios de comunicação e os oportunistas de diferentes filiações, segue sendo central, de importância fundamental para a solução de grandes problemas nacionais e está na base para se alcançar uma verdadeira democracia. Não é por acaso que a luta pela terra nunca se deteve e veio crescendo nas últimas décadas, a ponto de as próprias classes dominantes terem que tocar a questão como ponto central em suas políticas de governo, e claro, não para alterar em nada em relação a sua estrutura, mas como tentativa de paralisar o crescente e combativo movimento camponês.
A crise geral econômico-social do sistema, com o avanço do capital financeiro no campo, provocando a mais brutal expulsão de milhões de suas terras através do açambarcamento destes para os megaprojetos de produção primária para exportação (cana, soja, café, além de gado, florestas homogêneas e a expansão desbragada da mineração). Às massas de camponeses pobres sem terra ou com pouca terra somam-se os povos indígenas, remanescentes de quilombolas, dezenas de milhões acossados pela concentração da terra em mãos de uma ínfima minoria de latifundiários e corporações transnacionais, pelo trabalho servil e pela falta de qualquer apoio e incentivo governamental. Esta situação agrava-se ainda mais com a aplicação continuada das políticas de “ajustes” e liberalizações à livre ação do capital estrangeiro exigidas pelo império, aprofundam-se as contradições de classe no campo, fazendo explodir por todas as partes do país mobilizações, ocupações e tomadas de terras confrontadas com a perseguição do poder judiciário, com a repressão mais brutal pelas forças policiais e militares do Estado, ataques de pistoleiros e bandos paramilitares, com leis ambientais proibitivas. Frente a isto, os camponeses pobres respondem de forma mais organizada, despontando como o fator mais dinâmico e impulsionador da luta popular.
Para a grande burguesia e para os diferentes setores latifundistas a alteração da estrutura fundiária no país é inaceitável, pois que é fator determinante como sustentáculo do imperialismo e reprodução do capitalismo burocrático que impulsiona no país. Assim, como sempre foi, as classes dominantes seguem empregando todas as formas de violência para impedir qualquer reforma, seja ela a mais superficial, combinando a ação jurídica e policial-militar do velho Estado com a dos bandos de pistoleiros e paramilitares na repressão, assassinatos seletivos e massacres em massa. Nos últimos vinte e dois anos, mais de duas mil pessoas, entre camponeses, advogados, religiosos, foram assassinados no campo. Quatro massacres selvagens, Corumbiara-1995 e Eldorado dos Carajás-1996, Colniza-Mato Grosso, 2016 e Pau D’Arco-Pará, 2017, são a demonstração mais dramática do peso que a questão da terra tem e da centralidade da contradição entre camponeses pobres e latifundiários na luta de classes em nossa sociedade.
Atualmente, após 13 anos e meio da gerência do oportunismo (frente eleitoreira encabeçada pelo PT, PCdoB, PSB, etc.) aprofundou-se a aplicação das políticas “neoliberais” ditadas pelo imperialismo, particularmente no sentido do fortalecimento do país da sua condição de produtor de bens primários para exportação (alimentos primas in natura).
Isto acarretou um incremento na valorização das terras através do crescimento do açambarcamento de grandes extensões para esta produção, seja despojando os pequenos proprietários de suas terras, seja com a incorporação massiva e gratuita de terras públicas (de 2003 a 2015 mais de 150 milhões de hectares de terras públicas foram doadas aos latifundiários através do “Terra Legal”), significando um reforço colossal e fortalecimento da velha classe latifundiária. Ao lado disto, e como decorrência direta, paralisou-se por completo o já tímido programa de reforma agrária, aumentou a repressão contra o movimento camponês combativo e desencadeou-se uma ofensiva latifundista através do poder judiciário com ondas de despejos e revisão de decisões de “assentamentos” e campanhas de difamação da luta camponesa pela imprensa burguesa. Em uma só frase, a política de reforma agrária da gerência oportunista reduziu-se unicamente em repressão ao movimento camponês combativo, além de facilitar projetos e transações do Estado com MST e CONTAG.
Com a grave crise política que depôs por impeachment Dilma Rousseff, expressão que é da briga das frações de classes dominantes em razão da mesma crise econômica. Com a posse do bandido Temer, junto ao prosseguimento da ofensiva reacionária no campo, desatou-se a ofensiva contra os operários e demais trabalhadores assalariados com cortes de direitos, duramente conquistados em anos de duras lutas da classe, com a aprovação pelo congresso da “reforma trabalhista” e preparação pela aprovação da “reforma da Previdência”, além de toda sorte de ataques contra a educação pública gratuita e outros direitos do povo. Com a posse do bandido Temer, junto ao prosseguimento da ofensiva reacionária no campo, desatou-se a ofensiva contra os operários e demais trabalhadores assalariados com cortes de direitos duramente conquistados em anos de duras lutas da classe com a aprovação pelo congresso da “reforma trabalhista” e preparação pela aprovação da “reforma da Previdência”, além de toda sorte de ataques contra a educação pública gratuita e outros direitos do povo. O impeachment de Dilma e posse de Temer foi a reação do mundo político oficial contra a “Operação Lava-Jato” movida pelos guardiões deste velho Estado, que através do Ministério Público pretendeu fazer uma faxina na fachada de suas instituições e sistema político desmoralizados e cada vez mais sem legitimidade alguma ante as massas populares. Tudo para tentar salvar a velha ordem de seu colapso geral, desviando o ódio das massas contra todo este sistema de exploração e opressão, instigando-as contra a corrupção, como se fora esta podridão a principal causa de tanta injustiça, abusos, miséria e abandono de que padecem, bem como da rapinagem e subjugação da nação.
A crise só fez aprofundar-se, e os massacres, chacinas, prisões e repressão brutal contra as massas em luta pela terra e em defesa dos seus direitos pisoteados no campo e na cidade não para, porque a farsa eleitoral se desmascarou por completo e não há outro caminho para o povo que não seja a luta cada vez mais cruenta. As massas populares precisam preparar conscientemente sua inevitável rebelião. Diante da crise e divisão das classes dominantes e crescente revolta das massas, o braço armado do velho Estado, as forças armadas reacionárias, já puseram em marcha um golpe militar contrarrevolucionário preventivo a essa rebelião. As massas de nosso povo em geral e dos camponeses na luta pela terra em particular, estão diante de um grande desafio.
Para dar respostas a esta questão, na luta cotidiana pela conquista da terra, entendemos que é extremamente necessário que o movimento sindical classista, ao lado do movimento camponês combativo, tenha uma consciência profunda sobre esta realidade para estabelecer e desenvolver a mais profunda e sólida aliança operário-camponesa, força determinante para realizar as grandes transformações pendentes, a começar pela questão agrária, que as massas empobrecidas e a nossa Pátria exigem e necessitam. Para tal faz-se necessário um exame da realidade histórica de nosso país, partindo da sua formação econômico-social na qual o problema da terra ocupa papel central e determinante, para fundamentar e formular um autêntico programa agrário que parta da necessidade de romper por completo as velhas relações de propriedades da terra existentes secularmente no país e nunca alteradas, senão sempre reforçadas e reproduzidas.
O capitalismo é um sistema baseado na exploração do homem pelo homem. A sociedade capitalista está dividida em classes antagônicas e de interesses irreconciliáveis. Fundamentalmente, a classe exploradora (a burguesia), dona dos bancos, das fábricas, das empresas, das terras (os grandes proprietários de terras, latifundiários), que acumulam suas riquezas explorando o trabalho da classe explorada, o operariado, ou proletariado. O sistema capitalista é o que domina por completo o mundo hoje, e ele não é um capitalismo em geral. Ele é o capitalismo monopolista como um sistema mundial, o imperialismo. E o capitalismo que se desenvolveu em nosso país foi o que o imperialismo, principalmente inglês inicialmente e depois principalmente o norte-americano, impôs na condição semicolonial do país e apoiado na sua base semifeudal, o capitalismo burocrático. Condições particulares importantes que determinaram o atraso e conservação de estruturas totalmente arcaicas e retrógradas no econômico, social, político e cultural do país, vigente ao longo de mais de século até os dias de hoje.
A partir do final do século XIX (1890 a 1900), o capitalismo passou à sua etapa monopolista (deixou de ser um regime baseado na livre concorrência e passou a um regime de monopólios), se transformando num sistema único internacional imperialista. Em razão direta disto o mundo foi dividido em nações opressoras e nações oprimidas e foi repartido entre as grandes potências. Assim, o desenvolvimento do capitalismo no Brasil se dá apoiado sobre uma base semifeudal e sempre esteve submetido pelo imperialismo (capitalismo monopolista) na condição de semicolônia, primeiramente pelo inglês e a partir da Segunda Guerra Mundial pelo norte-americano principalmente.
O capitalismo surgiu em nosso país na segunda metade do século XIX e cresceu mais a partir do início do século XX (a partir de 1901). Assim, o capitalismo surgiu no Brasil num período em que ele já se encontrava em sua fase monopolista, ou seja, a fase imperialista. Ele foi introduzido aqui pelo imperialismo inglês, principalmente, em aliança com os grandes proprietários de terras (as oligarquias rurais latifundiárias) e grandes negociantes locais importadores (burguesia comercial e compradora). Tal origem e desenvolvimento nunca alterado radicalmente determinou que, por mais que ao longo de um século tenha se desenvolvido o capitalismo, o Brasil continua sendo um país atrasado, submetido à dominação estrangeira e milhões de nosso povo vivendo na miséria, doentes e analfabetos.
Assim, ainda que tenha se desenvolvido o capitalismo, ele não conduziu à democratização sequer e minimamente da propriedade da terra, como ocorreu nos países imperialistas: Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Inglaterra, França, Japão, etc. Ao contrário, o desenvolvimento do capitalismo no Brasil só acentuou o monopólio e concentração da propriedade da terra, bem como as relações atrasadas que originam e reproduzem, ainda que muitas vezes de forma subjacente, através da evolução de suas formas.
Atrasada, a nossa sociedade está dividida não somente em classes burguesas e proletárias, existe a classe de latifundiários, donos de grandes extensões de milhares e mesmo dezenas de milhares de hectares, latifúndios de tipo improdutivo e de tipo produtivo (o chamado agronegócio) que explora e oprime os camponeses pobres. Existem ainda setores médios que são classes de médios e pequenos proprietários (industriais, comerciantes e fazendeiros) que compõem a média e pequena burguesia, também oprimidas pela grande burguesia local e o imperialismo. Além do mais, existem outras classes exploradas formadas de funcionários do setor privado e público, empregados do comércio e dos serviços e outros, como vendedores ambulantes.
Por isto mesmo a questão da terra no Brasil está relacionada profundamente não somente com a formação das classes sociais, como também tem determinado o tipo de Estado burocrático, semifeudal, genocida e corrupto, necessário para a manutenção do poder nas mãos dos latifundiários e grandes burgueses, lacaios e a serviço do imperialismo.
Desde quando aqui chegaram, os portugueses apossaram-se das terras, e para isso fizeram o massacre das nações indígenas; depois, o rei de Portugal distribuiu terras aos amigos e protegidos seus, através de sesmarias (grandes extensões de terras). Imediatamente a Coroa portuguesa proibiu a posse de terra devolutas pelos pobres e, em 1850, com a Lei da Terra, o Estado instituiu que a posse de terra só seria reconhecida através da sua compra, precavendo-se quanto à situação que já se delineava com a inevitável abolição da escravatura e crescente ingresso no país de imigrantes pobres.
Ao longo dos anos foi se formando uma população de camponeses pobres que viviam explorados pelos grandes senhores de terras, trabalhando como colonos, agregados, parceiros e meeiros, etc., ao lado da escravização dos negros, que durante mais de 300 anos foram trazidos da África, e que conformavam um sistema de servidão destinado exclusivamente a abastecer as metrópoles européias. Com a abolição da escravatura em 1888, surge uma grande massa de alguns milhões de trabalhadores sem terras, os ex-escravos e imigrantes pobres indesejados em seus países e empurrados para fora. Grande parte deste contingente se embrenhou pelas profundas extensões de terras e se estabeleceram como posseiros, e parte dos imigrantes foram absorvidos em sistemas de colônias, principalmente na cultura do café.
Assim a luta pela terra no Brasil foi se tornando uma aguda contradição entre camponeses pobres e o latifúndio, e, consequentemente, com seu Estado. O camponês aspira conquistar a terra para poder tirar dela o seu sustento e nunca mais precisar de vender, um dia sequer, a sua força de trabalho a um latifundiário. Ao latifúndio e à burguesia em geral interessa a concentração da terra e o fracasso da pequena produção, expulsando os camponeses da terra, gerando força de trabalho (mão-de-obra) abundante para ser explorada no seu interesse, e uma grande e permanente massa de desempregados. Interessa, ainda, a estas classes reacionárias a existência em determinado nível de uma massa que vive da economia camponesa, capaz de abastecer o mercado interno de gêneros de primeira necessidade (alimento, matérias-primas e pequenos utensílios artesanais), de forma totalmente submetida e explorada pelo capital que a condena a uma existência permanentemente arruinada. Esta é uma realidade nunca alterada de forma qualitativa. Nas últimas cinco décadas, principalmente, a crescente exploração mecanizada de grandes extensões de terra, o emprego de alta tecnologia, de sementes melhoradas, do uso intensivo de fertilizantes e defensivos agrícolas deixaram o pequeno produtor, em sua maioria integrado ao mercado, totalmente incapaz de concorrer com os grandes produtores, cada vez mais formados por monopólios.
Os pequenos e médios camponeses não conseguem sobreviver num país dominado pelos monopólios como o Brasil, a não ser na constante ruína. Toda a pequena e média propriedade está submetida à espoliação do capital financeiro. O sistema burguês-latifundiário protege o grande capital e o latifúndio, massacrando sistematicamente a pequena e média propriedade e explorando e espoliando ao extremo o proletariado e as massas populares, dentro delas o campesinato pobre sem terra. Por isto, além da conquista da terra que vai destruindo o latifúndio, é fundamental a organização da pequena produção em formas associativas para torná-la minimamente viável como economia de resistência. Organizar cooperativas, grupos coletivos de ajuda mútua ou qualquer modalidade de trabalho conjunto é fundamental para que o camponês não desista da terra conquistada e ela não retorne às mãos do latifúndio e sirva de ponto de apoio para sustentação e continuidade da luta.
As tarefas que correspondem às necessárias e urgentes transformações radicais no campo, nenhum governo surgido dentro da atual ordem pode realizar. Só pode ser obra do próprio movimento camponês organizado no seu objetivo e em aliança com a classe operária urbana e rural. Tais tarefas programáticas implicam numa luta prolongada para ir tomando a terra, distribuí-la aos camponeses pobres sem terra ou com pouca terra, libertar as forças produtivas através da organização da produção de forma coletiva com base na associação das parcelas nos vários níveis de cooperação e organizar o exercício do poder político nas áreas tomadas e circundantes (vilarejos e pequenas cidades), fazendo dessas vitórias novos pontos de apoio para continuar golpeando o latifúndio e todo esse sistema de fome, miséria e exploração sustentado pelo velho Estado.
Mantendo em perspectiva a estatização das grandes empresas capitalistas rurais e a própria “nacionalização da terra”, desenvolvendo e fortalecendo com a classe operária a aliança estratégica, ampliando-a com os outros setores oprimidos do povo na frente única para confiscar as terras do latifúndio parte por parte e pôr abaixo o velho Estado burocrático-latifundiário, serviçal do imperialismo, por meio do aprimoramento da forma de luta que mais fortaleceu a sua luta pela terra, a da guerra camponesa, para edificar o poder popular de nova democracia como o único caminho possível para realizar a verdadeira transformação agrária e conquistar a democracia, a justiça, terra e trabalho.
A luta pela terra no Brasil vem desde a chegada dos portugueses com a revolta dos povos indígenas em defesa de suas terras. Em seguida tivemos longos anos de resistência dos povos trazidos como escravos da África. Eles se rebelavam e organizavam bases de resistência e retaguarda da guerra contra os escravocratas — os Quilombos — em terras de difícil acesso em longínquas e isoladas regiões dos domínios dos senhores de escravos. Também para cá vieram muitos colonos europeus, alemães, italianos, poloneses que se fixaram principalmente no sul do país e que se transformaram e se multiplicaram rapidamente em uma volumosa massa de camponeses pobres.
Nos últimos anos do século XIX e início do XX, ocorreram muitas lutas pela terra. Elas são conhecidas preconceituosamente como revoltas “messiânicas” por se constituírem, aparentemente, de seguidores de “messias”. Assim foi Canudos, no sertão da Bahia (1870-1897), que teve como líder Antônio Conselheiro e foi a mais importante luta camponesa da época. Contestado, em Santa Catarina/Paraná (1912-1916), liderada pelo monge José Maria. Todos esses movimentos foram ferozmente reprimidos pelo Exército Brasileiro, transformando-se em grandes massacres de milhares de camponeses.
Depois ocorreram movimentos no nordeste, como os liderados pelo padre Cícero e outros (Caldeirão, Pau de Colher, etc.), e surgiu também o cangaço como revolta de camponeses contra a miséria e a violência dos “coronéis” latifundistas (nordeste) e o jagunçado (norte de Minas, de Goiás de então e sertão da Bahia), dentre outros semelhantes em outras regiões do país. A partir de 1940 começaram a surgir novas lutas pela terra com um caráter político mais definido. Foram lutas principalmente de posseiros que se viam ameaçados por grandes fazendeiros ou empresas de despojo de suas terras, após trabalharem anos e décadas a terra ocupada. As mais importantes foram em Porecatu, no Paraná (1950-1954) e Trombas e Formoso, em Goiás (1952-1958), que tiveram apoio e direção do Partido Comunista do Brasil (P.C.B.).
No final dos anos de 1950 surgem várias organizações camponesas, principalmente sindicatos e a ULTAB — União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil — resultado de um maior trabalho do Partido Comunista junto aos camponeses. No Nordeste, principalmente, mas não somente lá, surgem Ligas Camponesas que organizavam dezenas de milhares de camponeses na tomada de engenhos. As Ligas Camponesas foram as mais importantes organizações de massa de camponeses na luta pela terra. O seu crescimento colocou a questão da reforma agrária como uma questão nacional de primeira ordem e radicalizou a luta de classes no país com a palavra de ordem “reforma agrária na lei ou na marra”. A grande burguesia, o latifúndio, e o imperialismo norte-americano se sentiram gravemente ameaçados e organizaram o golpe militar de 1º de abril de 1964, destinado a destruir as organizações populares, principalmente as Ligas Camponesas, e deter o crescente movimento de massas reformista.
Na luta contra a ditadura militar pró-ianque, que protegia a ferro e fogo o latifúndio, muitas tentativas foram feitas de resistência e luta armada pela terra, como foi a luta no interior do Maranhão, na Zona da Mata, nos canaviais nos estados litorâneos do Nordeste e na região do Araguaia, no sul do Pará. No final dos anos de 1970, a luta pela terra começa a ter novo crescimento, com a atuação de setores reformistas da Igreja Católica (Pastoral da Terra) e outros movimentos populares. No começo dos anos de 1980, a luta pela reforma agrária ganha novo impulso, e muitos sindicatos de trabalhadores rurais passam a ter direções combativas; no sul do país, surge o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.
De colonização relativamente recente, Rondônia tem suas melhores terras nas mãos do latifúndio. Atraídos pelas promessas de terras férteis e ajudas do governo, dezenas de milhares de famílias camponesas migraram para aquele Estado. Ali chegando a grande maioria tornou-se mão-de-obra barata para a exploração dos latifundiários. O sonho da conquista da terra só começou de fato a virar realidade com as primeiras tomadas de terras que aconteceram no Estado. Em todas elas tiveram que enfrentar a violência do latifúndio através dos bandos de pistoleiros e da polícia.
O grande volume de massas camponesas pobres sem terra abandonadas à própria sorte teve a reação imediata e preventiva dos latifundiários já escolados em massacrar aldeias indígenas no sul de Rondônia e noroeste de Mato Grosso para se apossarem de seus territórios. As tomadas de terra espontâneas se desencadearam. Com a violência e a covardia do latifúndio, usando a polícia e seus bandos de guaxebas (pistoleiros funcionários das grandes fazendas de gado), tentou-se paralisar as tomadas de terras. Foram as agressões, os assassinatos covardes, massacres bárbaros que obrigaram o movimento a avançar na sua organização e autodefesa. Ou seja, face à violência crescente do latifúndio e do governo é que a defesa das massas de camponeses nas tomadas e acampamentos exigia uma maior mobilização, organização, combatividade e coragem das suas direções.
A radicalização na luta pela terra provocou um deslinde de posições no movimento camponês e consequentemente sua divisão em Rondônia. A cúpula do MST naquele Estado passou a ter uma atitude vacilante e policialesca, tendo o PT se aliado com o governo do PMDB de Valdir Raupp, hoje senador, tentando isolar os companheiros mais combativos e adotando uma atitude conciliadora na luta pela terra. Estes companheiros, que correspondiam às aspirações de luta das massas, foram, um a um, rompendo com aquela cúpula vacilante e se juntaram na preparação da histórica tomada da fazenda Santa Elina, em Corumbiara.
A região sul de Rondônia tem as melhores e mais sadias terras do Estado. Grande parte delas improdutivas, eram — e continuam sendo a melhor alternativa para as 40 mil famílias de camponeses pobres da região. Já haviam ocorrido, nos anos 80 e início dos anos 90, as tomadas vitoriosas de Verde Seringal, Vitória da União e Adriana. Continuar enfrentando o latifúndio, encabeçado pelo coronel do exército reformado Antenor Duarte, que com seus jagunços espalhava o terror tentando intimidar as massas e suas lideranças, exigia coragem e combatividade. Foi isso que um grupo de companheiros demonstrou quando iniciou a mobilização e organização de mais de 600 famílias para tomar um latifúndio, a fazenda Santa Elina, com 18 mil hectares, no Município de Corumbiara.
Ao ser convidada para contribuir com a tomada, a direção do MST de Rondônia não só se recusou como delatou ao governo estadual nomes de companheiros que estariam encabeçando a mobilização. Já nesta época o PT tinha fechado acordo com o PMDB e participava do governo de Valdir Raupp. Esta traição foi a senha para que os latifundiários planejassem, junto com o governo do Estado, o bárbaro massacre que ocorreu a partir da madrugada do dia 9 de agosto de 1995. Resultado, 16 mortos, 7 desaparecidos, mais de 200 companheiros com graves sequelas resultantes da selvageria desencadeada pela polícia e vários companheiros perseguidos. O número de vítimas só não foi maior porque os camponeses organizaram a resistência com as armas que tinham: paus, foices e espingardas de caça.
O massacre foi uma ação intencionalmente preparada, com planejamento militar, com o objetivo de espalhar o terror entre as famílias de camponeses e assim paralisar as tomadas de terras dos latifúndios em Rondônia e no país. No entanto, ao contrário do que se esperava, a repressão sangrenta gerou uma enorme solidariedade e fez explodir o ódio das massas, levantando uma onda de novas tomadas em todo o Brasil.
Os oportunistas e conciliadores da direção do MST em Rondônia foram completamente desmascarados e os companheiros que lideraram aquela luta passaram a ter a responsabilidade de dar prosseguimento à luta contra o latifúndio no Estado, honrando o generoso sangue daqueles companheiros que tombaram na luta pela terra. Alguns meses após, mais uma derrota para os oportunistas: vitória da oposição para a direção da FETAGRO, sendo eleitos companheiros que apoiaram a luta em Santa Elina, derrotando a situação, apoiada por aquela direção do MST.
A luta aberta pela Batalha de Santa Elina de uma forma geral demarcou dois caminhos no movimento camponês brasileiro e, neste sentido, se tornou um marco fundamental da história do movimento camponês, principalmente de sua fase mais recente. Essa cisão dentro do movimento camponês seguiu se aprofundando, não como um enfraquecimento do mesmo, e sim, pelo contrário, como a possibilidade de desenvolvimento de um autêntico movimento camponês combativo. Da luta de Santa Elina surgiu o MCC — Movimento Camponês Corumbiara no propósito de seguir sustentando a herança da luta de Santa Elina. Com o tempo a luta se instaurou no interior do próprio MCC dando curso ao processo de depuração iniciado com a Batalha de Santa Elina. Da luta dentro do próprio MCC contra a influência do oportunismo vertido principalmente pelo petismo e pela igreja católica e pelo aprofundamento do movimento camponês combativo que avançava a largos passos no Norte de Minas, surgiu a Liga dos Camponeses Pobres.
Com o surgimento das Ligas de Camponeses Pobres e sua multiplicação por outras regiões do país, o movimento camponês entrou numa nova fase, a de desempenhar seu papel histórico de principal força na revolução democrática que se encontra entravada no país. O nível de organização e os métodos de luta ganharam novos contornos sob a bandeira de "Conquistar a terra" e "Destruir o latifúndio". Novas e mais massivas batalhas são dadas pelo movimento camponês, que enfrenta maior recrudescimento da repressão jurídico-policial do velho Estado, da ação paramilitar dos latifundiários e das campanhas de difamação por parte da imprensa burguesa. Também, a luta entre os dois caminhos — o de seguir o oportunismo e a burguesia com sua “reforma agrária” a conta-gotas e o de seguir o da luta revolucionária pela destruição de todo o latifúndio — passou a um patamar mais avançado que coloca para curto e médio prazos o desmascaramento completo de todo o oportunismo no movimento camponês, representado principalmente pela direção do MST, pela CONTAG e sua estrutura de federações estaduais e sindicatos assistencialistas. E esta é a principal vertente do movimento camponês combativo que segue se desenvolvendo e buscando orientar-se por um programa revolucionário de transformação do agrário, um programa que combata as influências da burguesia e do oportunismo e que contemple a aliança operário-camponesa. Enfim, um programa em que a classe operária apoiando objetivamente a luta dos camponeses pobres pela destruição do latifúndio seja a base para as profundas transformações não só no campo, mas de toda a sociedade brasileira.
Muitos estudiosos da questão fundiária em nosso país e, inclusive, partidos políticos que se autodefinem como socialistas e até comunistas, têm defendido que uma reforma agrária no país não é mais necessária para resolver o problema da produção de alimentos e de matérias primas, alegando que, hoje, a solução destes problemas está garantida com a agroindústria, o “agronegócio”, como tanta alardeia a Rede Globo “a indústria riqueza do Brasil”, com a aplicação de modernas técnicas, novas tecnologias e avançados equipamentos, e que a necessidade da reforma agrária só se coloca em função do problema social de grandes desigualdades e marginalização de milhões de brasileiros. E, portanto, basta que seja alguma e qualquer reforma.
Tais conclusões não correspondem à realidade. Primeiro, porque a grande produção onde se aplicam os recursos mais modernos está voltada para a exportação e com base na monocultura, concentrada na região centro sul e centro-oeste, ocupando as melhores terras. Segundo, que seguindo os ditames do capital monopolista, está voltada para a obtenção do lucro máximo, e não da satisfação das necessidades do país e da população. Terceiro, que por consequência, a tão propagandeada produção de grãos, com suas safras recordes, que só tem resultado numa deformação da economia nacional e no aprofundamento da dependência do país, sua relação per capita (720 kg/pessoa/ano) está muito abaixo dos padrões internacionais. Inquestionavelmente, o abastecimento de alimentos básicos do país é feito pelas pequenas e médias propriedades, submetidas cada vez mais à mais completa exploração da agroindústria.
Não se trata, portanto, de realizar uma “reforma agrária” tal ou qual para desenvolver o capitalismo no campo como sempre foi enfocado a questão agrária no país, pois o capitalismo pelo caminho burocrático penetrava no campo mantendo as relações semifeudais através da evolução de suas formas, tanto nas relações de propriedade da terra quanto nas demais relações sociais e culturais delas derivadas. Ou de “nacionalizar a terra”, tornando-as todas terras públicas para seu usufruto e não propriedade privada (estatizar), o que asseguraria o maior impulso no desenvolvimento do capitalismo no campo, permitindo o livre acesso à terra pela burguesia sem o obstáculo do latifundiário que cobra renda ou ter de empacar capital na sua compra. Tampouco se trata de sua estatização para, como difundem os oportunistas eleitoreiros que se escondem atrás da autodenominação de “socialistas” propondo a “coletivização da terra”, enquanto na prática, apoiam e promovem as políticas que só reforçam os latifundiários e a manutenção, em última instância, das vigentes relações de propriedades de monopólio e concentração da terra.
A alta concentração da terra no país (1% dos proprietários detém quase 50% das terras, enquanto que os 91% detêm apenas 20% delas) vem se acentuando e quanto mais penetra o capitalismo no campo mais esta tendência se acelera. Inclusive, o próprio crescimento da agroindústria não tem significado um aumento do operariado agrícola (por volta de 4,5 milhões). A utilização de maquinarias modernas têm reduzido drasticamente os postos de trabalho, exemplo disto é a região canavieira para produção de açúcar e álcool, de Ribeirão Preto, e o emprego crescente de formas arcaicas de exploração da força de trabalho, como semisservil nas tradicionais culturas de café e outras.
Tamanho da propriedade (ha) | Número de propriedades | Porcentagem | Área (ha) | Porcentagem |
---|---|---|---|---|
Menos de 10 ha | 2.543.681 | 51% | 7.993.969 | 2% |
De 10 a menos de 100 ha | 1.980.684 | 40% | 63.810.646 | 18% |
De 100 a menos de 1.000 ha | 420.719 | 8% | 112.257.692 | 32% |
De 1.000 ha e mais | 51.203 | 1% | 167.227.511 | 48% |
Total | 4.996.287 | 100% | 351.289.818 | 100% |
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2017 |
Por mais que a economia nacional não seja mais essencialmente agrícola, como fora até 40 anos atrás (a produção total da agropecuária tem chegado a quase 40% do PIB), a força de trabalho ligada diretamente à produção agropecuária ultrapassa a casa dos 50 milhões de pessoas. O país segue importando grandes quantidades de alimentos, além do que, a aplicação de novas tecnologias, equipamentos, insumos, fertilizantes, venenos, etc., têm acentuado de forma exponencial a dependência do país ao capital estrangeiro, que por sua vez passou a dominar também a agroindústria.
A concentração da terra no Brasil tem concorrido para a manutenção e agravamento da crise econômico-social historicamente, ao constituir-se na base de sustentação desse capitalismo burocrático, contribuindo decisivamente para a manutenção de um colossal exército de reserva, da existência de uma economia camponesa permanentemente arruinada que serve ao abastecimento de alimentos (reposição da força de trabalho explorada pelo capitalista) e matérias primas à indústria e que têm sido fatores fundamentais para obtenção de elevadas taxas de lucros pela burguesia, para a formação do capital financeiro e hoje, mais do que nunca, como fonte geradora da massa de excluídos e de um enorme lumpesinato. Por fim, como resultado, funciona como freio da luta operária e elemento para sua desorganização.
A modernização da agricultura, ocorrida principalmente nos últimos 30 anos, se baseou na grande propriedade, na monocultura e voltada para exportação (café, cana de açúcar, soja, fumo, cacau, laranja para suco, algodão), concentrada na região centro-sul e centro-oeste, em torno da área mais industrializada do país, aumentando a concentração da terra e expulsando, por diferentes formas, o homem do campo. Além do que, a utilização crescente da mecanização, automação, sementes melhoradas e o emprego sistemático de adubos, fertilizantes e diferentes tipos de venenos aumentou violentamente a dependência estrangeira, já que a indústria estatal e nacional da petroquímica, de máquinas e implementos, ou foram privatizadas e entregues aos monopólios, ou liquidadas por completo, reinando livremente as Monsanto, Cargill, Agroceres, Massey Ferguson, etc.
Consequentemente a concentração da terra tem sido historicamente a causa principal da aguda desigualdade social de extrema miséria de milhões de famílias de camponeses, do inchaço das grandes cidades, da marginalização, fome, miséria e violência permanente que se abate sobre os pobres do campo. Na luta de resistência contra a sua expulsão da terra ou pela conquista dela, os camponeses enfrentam a mais sistemática e prolongada violência desatada pelo velho Estado reacionário brasileiro e pelos bandos paramilitares dos latifundiários, com o acobertamento criminoso “Justiça”, na mais descarada impunidade que açula ainda mais a selvageria das classes dominantes.
Como demonstra o quadro abaixo, a violência com mortes segue aumentando ao longo das últimas décadas, o que revela a intensificação da ação repressiva do velho Estado, combinado com o braço armado do latifúndio, como ocorreu no massacre de Corumbiara, Eldorado dos Carajás, entre outros, onde o despejo foi realizado por tropas da PM juntamente com pistoleiros, que inclusive utilizaram fardamento da polícia. Os oito anos de governo de FHC e de Luiz Inácio, à parte da grande publicidade sobre reforma agrária, revelam-se como meras gerências administradoras do velho Estado de grandes burgueses e latifundiários, que a ferro e fogo tem sabido muito bem zelar pelos interesses da reação.
1976 a 1991 | Mais de 1000 assassinatos |
1991 a 1995 | 268 assassinatos |
1995 a 2002 | 292 assassinatos |
2003 a 2013 | 402 assassinatos |
2013 a 2017 | 251 assassinatos* |
Dados aproximados — fonte: imprensa nacional, CPT |
Todo este quadro se constitui como fator fundamental na engrenagem do sistema dominado pelo capital financeiro internacional, mantendo o país num permanente redemoinho de crise econômica, aprofundando de forma assustadora a crise social, com fome para milhões, miséria, violência e morte. Portanto, a questão agrária é uma questão central e de importância fundamental não só para os camponeses, mas para todos os trabalhadores, para os setores médios e para a independência e progresso da Nação.
Ademais de partir das reivindicações imediatas e gerais dos diferentes setores de trabalhadores rurais, pequenos produtores e assalariados, temporários (como os bóias- frias) donde imperam tanto, sob denominação formal de assalariamento, variadas formas de relações servis e semisservis (relações tratadas pela legislação do velho Estado por “análoga ao trabalho escravo”), questões já presentes no programa geral de resistência dos trabalhadores, considerando que o problema fundamental e basilar do agrário é a questão da propriedade da terra, o programa agrário para realizar as transformações radicais exigidas supõe a destruição total do latifúndio e entrega imediata de parcelas da terra aos camponeses pobres sem terra ou com pouca terra. Para conquistar este objetivo os camponeses só podem contar com suas próprias forças, em primeiro lugar, e com o apoio decidido da classe operária urbana e rural. Esta é uma luta radical que não tem espaço para conciliações, é em si uma questão política e de poder. Nas condições históricas e atuais de organização dos camponeses pobres, esta conquista torna-se completamente impossível ser realizada da noite para o dia, e demandará um longo tempo e prolongado processo. Os camponeses, por isto mesmo, não devem renunciar a este programa em troca das promessas e migalhas ofertadas pela burguesia e os oportunistas com suas reformas agrárias de faz de conta. Devem lutar desde já, como estão fazendo, pela aplicação deste programa nas áreas tomadas do latifúndio, até que com a completa conquista em todo país das grandes transformações democráticas seja finalmente concluído, dando início a uma nova etapa de total nacionalização, estatização e coletivização das terras defendidas e aplicadas pelo próprio movimento camponês.
1 — destruição do latifúndio e entrega das terras aos camponeses pobres sem terra ou com pouca terra;
2 — libertação das forças produtivas do campo nas áreas tomadas do latifúndio, através da eliminação de todas as relações de produção baseadas na exploração do homem com a adoção de formas cooperadas. A organização em formas associativas das parcelas em diferentes níveis de cooperação segundo sua experiência, desde os Grupos de Ajuda Mútua, forma elementar a formas superiores de cooperação, passando por outros níveis de formas cooperativas. Adoção de meios de produção e instrumentos de trabalho mais avançados e das técnicas mais modernas.
Organização cooperada do sistema de produção, distribuição, comercialização, abastecimento e troca entre as diversas áreas e regiões, da infra-estrutura como armazéns, transporte, estradas, pontes, saneamento básico, etc.;
3 — organização e exercício do Poder político das massas nas áreas tomadas. Organização das diversas formas da participação das massas nos diferentes níveis para a tomada de decisões e embrião do seu autogoverno (Assembleia Popular e o Comité Popular). Organizar a vida cultural, suas diversas manifestações. Organizar o sistema de autodefesa de massas. Organizar a nova Escola Popular baseada nos três princípios de estudar, trabalhar e lutar (investigação científica, produção e luta de classes) para liquidar o analfabetismo e promover a elevação do conhecimento científico e técnico de todos. Organizar um sistema popular de saúde preventiva e curativa (policlínicas);
4 — defesa desde já da futura estatização das grandes empresas capitalistas rurais e controle de sua produção e gestão pelos trabalhadores quando se estabelecer o novo Poder nas regiões que estas se acham instaladas.
O problema indígena em nosso país se insere no conjunto dos grandes problemas nacionais e democráticos. Para compreendê-lo corretamente, se faz necessário investigações e estudos sobre o mesmo. No entanto, não poderíamos desde já deixar de tomar uma posição clara frente a ele. Reconhecemos no problema indígena não uma mera questão de direito à demarcação de terras. A questão indígena, questão dos povos originários destas terras, é um problema de nacionalidades e hoje, mais que nunca, é o problema de minorias nacionais oprimidas pelo velho Estado brasileiro de grandes burgueses e latifundiários serviçais do imperialismo. As populações indígenas que se somam hoje mais de 700.000 resulta de uma longa heróica e trágica resistência contra a cultura de dominação, exploração, destruição e genocídio dos brancos colonizadores, grandes senhores de terras indevidamente apropriadas, grandes comerciantes, grandes burgueses e imperialistas. Sustentamos em nosso programa agrário e na luta por uma nova democracia o direito inalienável de autodeterminação das nações indígenas. Empenhamos nossos esforços para integrar nossa luta pela terra e pela nova democracia com a luta indígena, a qual passa pelo rechaço à intervenção e controle exercido pelo velho Estado através de seu instrumento de tutela a Funai, bem como as intervenções de instituições religiosas e ONGs, nacionais e estrangeiras, que em nome da “defesa dos povos indígenas” buscam traficar com seus interesses e servir a interesses escusos e das potências estrangeiras.
Partindo do reconhecimento de que são povos originários destas terras, sendo assim comunidades de mesma língua, cultura, costumes e psicologia habitando um mesmo território, constituem-se, portanto, nacionalidades em conformação que passaram à condição de nacionalidades oprimidas no curso dos últimos 500 anos. Inicialmente através do processo de conquista (genocídio), em que o branco colonizador se impôs e adonou-se dos territórios que vieram a compor o Brasil enquanto um novo país e na continuidade do genocídio com o advento e conformação do Estado brasileiro já na era do colonialismo modemo capitalista, o imperialismo. Assim como também os brancos pobres e explorados, os trabalhadores, são povos oprimidos por este Estado fundado pelos colonizadores portugueses (Brasil colônia) e logo explorados por potências estrangeiras, monopólios e capital financeiro (Brasil semicolônia), os povos indígenas também seguiram sendo oprimidos por este mesmo velho Estado.
Da mesma forma defendemos incondicionalmente a reivindicação histórica das comunidades remanescentes de quilombolas pelas terras que, em sua resistência contra a escravidão e logo contra todas as formas de exploração, segregação, preconceitos e racismo, territórios onde construíram seu modo de vida. As comunidades remanescentes de quilombolas, expressão mais tradicional da resistência cultural do povo preto, sempre marginalizadas e alvo de permanente pressão e despojo de suas terras tiveram, nos anos de gerenciamentos do oportunismo, ao mesmo tempo de um impulso em sua mobilização em defesa da demarcação e regularização de “territórios” reivindicados, uma institucionalização que conduziu à sua corporativização, dependência e subordinação ao projeto político petista.
Na busca do total controle por parte do velho Estado, suas políticas, com a iniciativa dos governos do oportunismo, fazendo-se passar por “grande conquista”, estabeleceu a homologação de “territórios quilombolas” na condição de posse para usufruto coletivo, subordinada à reacionária legislação sobre o uso do subsolo, equivalente à tutela que se impõe às terras indígenas. A tradição de luta das comunidades quilombolas caminharam ao lado, semelhante e simultaneamente com a luta dos camponeses pobres no apossamento das terras legalmente da União, em diferentes fases históricas. Ademais de que a imensa maioria do campesinato brasileiro ser composto por pretos e pardos e mesmo muitas comunidades remanescentes de quilombolas que mantiveram-se mais fechadas, isto nunca foi base para conflitos e hostilização, mesmo que o racismo, muitas vezes velado, nunca tenha sido superado.
A partir do reconhecimento desta condição dos povos indígenas e das comunidades quilombolas verificamos que estes e todo o restante do povo brasileiro têm um inimigo comum, o velho Estado de grandes burgueses e latifundiários serviçais do imperialismo. As causas de cada um são parte integrante da luta de libertação de nosso povo e nossa pátria. A frente única revolucionária baseada na aliança operário-camponesa tão fundamental para a luta e seu triunfo não poderia ser de todo democrática, popular e revolucionária se não abarcasse os povos indígenas e sua demanda histórica, seu direito à autodeterminação, bem como das reivindicações das comunidades quilombolas. Tal aliança se fundamenta como necessidade de uma frente única revolucionária em cujo programa se inscreve e realiza com a construção de um novo Estado democrático, popular e revolucionário. Somente com base no reconhecimento do direito à autodeterminação dos povos indígenas, que de forma democrática, com autodecisão e autoconsentimento poderá se realizar; tal realização por sua vez só é possível numa República de Nova Democracia.
A Liga dos Camponeses Pobres luta para destruir o latifúndio, única via de garantir a terra para os camponeses pobres e de impedir que a pequena e média propriedade rural continuem sendo massacradas pelos latifundiários e pelo governo. Esta luta pela terra atinge diretamente o governo.
O latifúndio faz parte do bloco de classes que dá sustentação ao poder burguês e à política oficial para o agrário, bem como as instituições (Ministério do Desenvolvimento Agrário, INCRA, etc.) e órgãos técnicos (Embrapa, Emater, etc.) são para atender e viabilizar seus interesses. A luta radical contra o latifúndio e pela sua completa destruição, conduz inevitavelmente ao choque com as classes dominantes em seu conjunto e com os interesses do imperialismo, que se expressa no confronto direto com o aparelho repressivo jurídico e policial-militar do Estado.
A revolução agrária é a bandeira em torno da qual mais setores da sociedade podem se aglutinar. Nesta luta os camponeses têm como aliados os operários, estudantes, intelectuais honestos, os setores médios, pequenos e médios comerciantes e as massas populares da cidade e do campo.
O velho Estado e suas diferentes gerências independentes de qual partido ou coligação de partidos seja (PFL, PMDB, PSDB, PT, PTB, PCdoB, PP, PL, PSB, PDT, PPS, etc.) enfrentam a luta dos camponeses de duas maneiras e da combinação delas: pela repressão e pela cooptação. Uma hora usa a violência contra os camponeses em luta, em outra hora propõe negociações e entendimentos, apresentando políticas e programas de “reforma agrária” só para publicidade. O governo busca com isto frear a luta pela terra, tentando isolar os setores mais combativos e cooptando os setores conciliadores e oportunistas do movimento.
Como comprova a história da luta dos camponeses no país que só com as formas violentas de luta conquistaram a terra, ainda que não puderam sustentar e mantê-las, as lutas recentes têm mostrado que para conquistar a terra e desenvolver formas que assegurem sua conquista é necessária uma organização cada vez maior dos camponeses, dando particular atenção ao sigilo dos planos das tomadas e à organização da autodefesa ativa. E o que se apreende de experiência numa tomada, seus erros e acertos devem ser utilizados como base para a continuidade da luta.
Surgido do processo de depuração no movimento camponês, as Ligas de Camponeses Pobres tem sido resultantes e continuação das históricas lutas pela terra no país de uma forma geral e particularmente da luta combativa dos camponeses de Rondônia, desde os anos de 1970, cujo desenvolvimento culminou com a histórica Batalha de Santa Elina que, em agosto de 1995, estabeleceu um divisor de águas e uma nova fase na luta pela terra não só em Rondônia, mas também de todo o país.
Desde este crucial momento as LCP vem lutando para superar os obstáculos que se apresentam no caminho da luta pela terra, bem como travando uma tenaz luta contra o oportunismo no meio do movimento camponês em geral e particularmente de organizações que buscam arrastar o movimento para a conciliação, para o colaboracionismo e para servir de instrumentos para projetos políticos pessoais.
Ao longo destes dezesseis anos a LCP, enfrentando toda sorte de dificuldades, de ataques por parte da direita e dos oportunistas, enfrentando a perseguição de seus líderes pela Justiça, polícia e pistoleiros, enfrentando as intrigas e difamações pelo governo e a imprensa burguesa, não tem se cansado de lutar e tem ativa participação na luta popular no país.
As LCP tem buscado, a despeito de suas dificuldades e defeitos, realizar inúmeras atividades internas de formação e de luta contra os vícios para avançar sua organização, os dirigentes e militantes de base. A LCP tem considerado como principal debilidade a ser superada as atividades pós-tomada de terras, de maior integração, organização e atividades produtivas nas áreas tomadas (mesmo naquelas reconhecidas pelo INCRA denominadas de Projetos de Assentamentos). Um melhor e mais eficiente trabalho nas áreas tomadas é o desafio principal e constante. Outros problemas como os de organização nos vários níveis e esferas, finanças e formação, também são importantes tarefas para a construção e desenvolvimento das LCP.
As LCP lutam por destruir o latifúndio como única via para realizar uma verdadeira transformação agrária, para entregar a terra a quem nela trabalha, entregar a terra aos camponeses pobres sem terra ou com pouca terra e organizá-los de forma a avançar para a compreensão de que, somente através das formas coletivas de trabalho — na produção, armazenamento, comercialização, saúde, educação e organização social — será possível viabilizar a seu progresso frente a dominação do capital monopolista. Ao lado de definir como objetivo principal imediato a conquista da terra, as LCP levantam também a luta reivindicativa por créditos para os pequenos proprietários e por organizá-los em cooperativas, ajudando-os a avançar sua consciência para a coletivização. Lutam por uma nova política agrícola voltada para ampliar a produção voltada fundamentalmente para melhorar as condições de vida dos trabalhadores do campo, da cidade, da população em geral e dos interesses da nação. As LCP lutam para defender todos os trabalhadores assalariados do campo e por conformar com eles e os da cidade para conquistar melhores condições de vida e trabalho.
Criar os Comitês da Revolução Agrária no campo para organizar impulsionar e centralizar a aplicação do seguinte programa:
1 — Fim do latifúndio, a terra para quem nela trabalha;
2 — A terra com destinação social segundo os interesses da imensa maioria do nosso povo e dos interesses nacionais;
3 — Nacionalização da terra e estatização das grandes empresas capitalistas rurais, em perspectiva;
4 — Por nova política agrícola e de créditos voltada para viabilizar os pequenos e médio proprietários;
5 — Criação de agrovilas e promoção da agroindústria em toda região rural do país;
6 — Criação do sistema de saúde dotado de toda infra-estrutura no campo;
7 — Criação do sistema de educação centrado na concepção da Escola de novo tipo vinculada à produção e a luta de classes;
8 — Organização social e política independente baseada na democracia direta das Assembleias Populares;
9 — Política especial para a região de seca (semi-árido) região nordeste;
10 — Política especial para a região amazônica, fim da exploração predatória e fortalecimento da produção agrícola segundo as vocações do meio geográfico, os interesses das massas trabalhadoras e da Nação;
11 — Apoio à luta dos trabalhadores da cidade, desenvolver e fortalecer a aliança operário-camponesa;
12 — Reconhecimento e apoio ativo à autodeterminação das nações e povos indígenas;
13 — Fortalecimento e desenvolvimento ideológico-político das massas voltadas à coletivização da terra em perspectiva;
14 — Por uma nova economia, uma nova cultura, uma nova política de nova democracia e um novo Poder Democrático Popular;
15 — Solidariedade internacionalista com a luta dos povos contra o imperialismo e pelo progresso.
Ressalta-se que os pilares fundamentais do Programa Agrário que orientam e submetem todas suas tarefas e já mencionados anteriormente são:
1 — destruição do latifúndio e entrega das terras aos camponeses pobres sem terra ou com pouca terra;
2 — libertação das forças produtivas do campo nas áreas tomadas do latifúndio, através da eliminação de todas as relações de produção baseadas na exploração do homem com a adoção de formas cooperadas. A organização em formas associativas das parcelas em diferentes níveis de cooperação segundo sua experiência, desde os Grupos de Ajuda Mútua, forma elementar a formas superiores de cooperação, passando por outros níveis de formas cooperativas. Adoção de meios de produção e instrumentos de trabalho mais avançados e das técnicas mais modernas.
Organização cooperada do sistema de produção, distribuição, comercialização, abastecimento e troca entre as diversas áreas e regiões, da infra-estrutura como armazéns, transporte, estradas, pontes, saneamento básico, etc.;
3 — organização e exercício do Poder político das massas nas áreas tomadas. Organização das diversas formas da participação das massas nos diferentes níveis para a tomada de decisões e do seu autogoverno (Assembleia Popular e o Comité Popular). Organizar a vida cultural, suas diversas manifestações. Organizar o sistema de autodefesa de massas. Organizar a nova Escola Popular baseada nos três princípios de estudar, trabalhar e lutar (investigação científica, produção e luta de classes) para liquidar o analfabetismo e promover a elevação do conhecimento científico e técnico de todos. Organizar um sistema popular de saúde preventiva e curativa (policlínicas);
4 — Estatização das grandes empresas capitalistas rurais e controle de sua produção e gestão pelos trabalhadores desde já nas áreas tomadas.
A curto e médio prazos as LCP lutam por desenvolver sua organização para transformá-la num grande movimento das massas camponesas em todo país, buscando unir-se com todas as organizações populares, combativas, ajudando a construir a aliança operário-camponesa e fazer avançar a luta pela terra, pela democracia e pela justiça em todo o país.
A longo prazo as LCP têm como objetivo fortalecer a luta contra todo o sistema burguês-latifundiário serviçal do imperialismo, pela sua destruição e pelo estabelecimento do poder popular para edificar uma democracia nova, conquistar a independência e progresso da Nação e do nosso povo, construindo a sociedade socialista.
As LCP partem do princípio de que o centro de tudo são as massas, são elas que decidem tudo, são elas que fazem a história. A luta só tem sentido se está centrada nas massas como forças fundamentais para resolver seus problemas, para conquistar e realizar seus amplos interesses. A razão de ser da luta parte da existência das massas nas duras condições em que vivem.
Para realizar os interesses das amplas massas populares é indispensável que elas se organizem cada vez mais adquirindo consciência profunda dos seus problemas e das formas justas de resolvê-los. Nada nem ninguém poderá resolver os problemas das massas a não ser elas mesmas. Só as massas podem transformar a realidade.
As LCP são um processo de construção de uma organização das massas camponesas pobres do nosso país. É um movimento de massas que luta pelos interesses econômicos, sociais, políticos e culturais dos camponeses, principalmente os camponeses pobres. Por mais que possa avançar uma direção, ela tão somente poderá auxiliar como força dirigente, pois a força para mover obstáculos, desimpedir o caminho e transformar a realidade, só as massas a possuem e só elas podem realizar. Por isto as LCP propõem a seus ativistas unir-se com a maioria das massas, viver como elas, aprender com elas e servir a elas.
Exatamente por isto a razão de existir das LCP só tem sentido realizando um permanente e paciente trabalho entre as massas. Este trabalho não pode ser qualquer um, tem que ser de um determinado tipo, ou seja, classista, que se processe nas esferas política, ideológica, cultural e orgânica, obedecendo a etapas diferentes para seu desenvolvimento: antes da tomada da terra, durante a tomada e, após a conquista da terra, na organização da vida na área tomada.
De um modo geral o trabalho de massas nas suas distintas etapas deverá no plano político levantar as reivindicações mais sentidas, apontar a origem do sofrimento do povo, as causas que provocam e mantêm o povo na miséria e debaixo da opressão, denunciando os diferentes governos como governos de plantão da grande burguesia e do latifúndio a serviço do imperialismo.
Denunciar suas políticas, tal como vem ocorrendo na etapa atual com a chamada política “neoliberal” iniciada pelo governo Collor de Mello e por FHC e aprofundada aos extremos por Luiz Inácio, que seguindo os ditames do capital financeiro internacional e as ordens do Estados Unidos completam a desnacionalização da economia e entrega do nosso país através de leiloatas das Estatais que chamam de privatizações, liquidando o resto de soberania destroem a indústria nacional e arruina a agricultura com as altas taxas de juros, impõem um desemprego cruel semeando a fome e a miséria por todos os lados, sucateiam os serviços públicos como de saúde, educação e de seguridade social, promovem “reformas” para retirar direitos históricos adquiridos pelos trabalhadores através de muita luta e sacrifícios e avassalar o país à sanha das potências estrangeiras e de seus monopólios.
Para aprofundar o trabalho de massas na esfera política é necessário esclarecer estas questões para levantar o combate contra tal política, defendendo uma nova política econômica voltada para os interesses da imensa maioria do povo brasileiro e de defesa dos interesses e soberania nacionais.
No ideológico, apontar que este sistema de exploração e opressão é o sistema capitalista mundial, o imperialismo que mantém no poder dos países dominados as classes reacionárias com um sistema de capitalismo burocrático que lhes servem e o velho Estado burocrático-latifundiário, que só espalha fome, doença, morte, ódio, egoísmo, injustiça e opressão para a esmagadora maioria da população. Mostrar que a altemativa é de classe, é o socialismo, sistema social dos trabalhadores e que para atingi-lo é necessário construir a aliança operário-camponesa, desenvolvendo a luta radical contra o latifúndio, a grande burguesia e o imperialismo a quem servem, para destruir seu sistema podre, conquistar o poder popular que assegure a construção da nova sociedade.
Além do que é decisivo, para fortalecer o trabalho ideológico de massas, educar-nos todos do ponto de vista de classe, difundir a ideologia da classe operária, termos claro o papel do Estado como instrumento de dominação e violência da burguesia, do latifúndio e do imperialismo. Educar as massas na luta contra o aparelho policial-militar e judicial. Desenvolver e encarnar os símbolos da luta como a bandeira vermelha do movimento, as canções combativas e o seu Hino.
No cultural, desenvolver a luta contra a cultura apodrecida que o latifúndio, a burguesia e o imperialismo dissemina para manter sua dominação, cultura do individualismo, egoísmo, consumismo e de destruição dos valores humanos, além de esmagar toda manifestação da cultura nacional e popular, impondo uma verdadeira lavagem cerebral através do controle dos meios de comunicação de massas e da difusão de músicas, novelas, publicações, verdadeira pornografia cultural. Desenvolver e promover a cultura popular, principalmente com a música, a dança e o teatro e estimular, organizar e desenvolver a educação física e as diversas modalidades de esporte.
No orgânico, desenvolver pacientemente a organização baseada na democracia popular, fortalecendo o trabalho de base como elemento determinante e a promoção permanente da participação cada vez maior das massas nas instâncias de direção. A criação e fortalecimento de núcleos e grupos de base é fundamental para assegurar um maior enraizamento do movimento, além de intensificar a sua participação nas comissões para diferentes assuntos, elevando assim o compromisso e a consciência política das massas.
Desenvolver e estimular a organização das mulheres, da juventude e das crianças, construindo-se para isto organizações específicas que possam zelar pela maior atividade destes setores. Difundir a importância da disciplina, da conduta correta perante o inimigo e a vida de uma forma geral.
O período de acampamentos e seu regime que impõe muitas restrições devem ter a menor duração possível. O objetivo do movimento não é o acampamento, ele é uma necessidade, porém é uma fase transitória. De uma forma geral a vida nos acampamentos e nas áreas tomadas têm que ser regulada por um conjunto de normas que são aprovadas pela Assembleia Geral do Acampamento e da Área, segundo as definições disciplinares do movimento. Especificamente durante o período de acampamento vigorará o regime com normas disciplinares definidas pelo movimento. Já nas áreas, o regime deve ser definido e aperfeiçoado permanentemente pela Assembleia Popular. A vida nos acampamentos e áreas deve estar regulada por direitos e deveres aplicados a todos e o seu processo de definição tem que passar por amplas discussões com as massas.
Para assegurar uma maior organização da vida nestes locais, o conjunto da massa deverá fazer parte de uma das comissões encarregadas das distintas atividades que dizem respeito ao seu funcionamento, tais como:
A distribuição de atividades e responsabilidades nos acampamentos:
No caso das áreas conquistadas, devem se reproduzir o mesmo nível de organização, no entanto é necessário observar o grau de desenvolvimento da consciência das massas, as particularidades de cada área no objetivo de estar constantemente buscando elevar o nível de organização, para que o máximo de membros daquela área tenha a mais efetiva participação da vida coletiva.
A luta pela produção é o objetivo mais imediato e importante para as massas e é decisiva para assegurar o desenvolvimento e sustentação da luta pela terra. Toda a nossa atividade deve ter como base o trabalho de organizar e viabilizar a produção. As massas lutam por possuir um pedaço de terra para organizar a sua vida e a de suas famílias, assim sendo, lutam inicialmente pela posse individual da terra. As LCP reconhecem e apoiam este direito das massas e lutará para mostrar-lhe que frente à existência do latifúndio e do monopólio da terra, a pequena produção individual é muito difícil de se viabilizar e de uma forma geral reforçam a ideologia burguesa da propriedade sobre meios de produção e exploração do trabalho. Deve-se mostrar que o caminho para enfrentar ambos problemas é a cooperação, iniciando pelas formas mais simples da Ajuda Mútua na produção, desenvolvê-la em formas superiores e mais avançadas de cooperativização, tendo como perspectiva futura a coletivização completa no campo.
Mas só a prática, através da persistência na experiência concreta no longo prazo, poderá levar as massas a compreender que a coletivização é a única alternativa. Para isto é necessário estimular, todo o tempo e de forma paciente, formas de trabalho coletivo, associação das parcelas particulares para produção e distribuição/comercialização coletivas. No entanto, é determinante compreender que é necessário ajudar os que ainda não compreendem e não aceitam estas formas, estimulando-os sempre a se organizar em cooperativas e associações de ajuda mútua, debatendo permanentemente as diferenças e vantagens entre umas e outras formas.
Realizada a tomada é decisivo iniciar os trabalhos de roças coletivas, procurando fortalecer ao máximo a autossustentação de cada acampamento. Durante o período de acampamento, temos de lutar para que todas as formas de organização se realizem de forma coletiva, particularmente a produção. Na esfera da produção o movimento tem como objetivo estimular e avançar ao máximo a viabilização dos processos coletivos de produção, mas sem de modo algum impô-los às massas. Os mesmos esforços e objetivos são necessários à comercialização da produção.
Na vida diária dos acampamentos e assentamentos devemos trabalhar duramente por solucionar os problemas de educação e de saúde. As comissões responsáveis devem assumir a iniciativa de não permitir que estas questões fiquem em segundo plano. Lutar para arrancar do governo as condições para funcionamento da escola regular nestas áreas é decisivo e importante por duas razões: Primeiro, por assegurar a permanência das famílias que têm filhos na idade escolar; segundo, para garantir a educação regular de todas as crianças como um direito fundamental e necessário para seu desenvolvimento. O movimento deve lutar para ganhar a simpatia de professores para aplicar a concepção da escola de novo tipo do ensino ligado à produção e à luta de classes, segundo os objetivos do movimento. Enquanto não se obtenha este objetivo em cada área deve de imediato ser organizada a Escola da Família Camponesa, de mesma concepção só que totalmente sustentada pelos próprios camponeses de cada área. Alfabetizar e elevar a escolaridade de crianças, jovens e adultos é de vital importância para o movimento e para a luta.
Da mesma forma, a questão de saúde deverá receber a mesma atenção, buscando viabilizar postos de saúde e periódica visita de profissionais nas áreas, dando atenção especial aos problemas da saúde de mulheres e crianças. É de grande valia a organização de campanhas e de ações de prevenção a doenças.
Contribui para a organização e o bem estar geral do acampamento e das áreas tomadas a execução e manutenção da limpeza geral, assegurando as condições necessárias à higiene coletiva, bem como de serviços que melhorem o saneamento (água e esgoto). Para executar tais atividades é extremamente importante a preparação do máximo de promotores de saúde.
Estimular, organizar e promover ao máximo as atividades esportivas, de lazer e de cultura (artes e literatura) para assegurar um completo e sadio desenvolvimento das massas, particularmente à juventude e às crianças. Tais atividades são determinantes também para estimular os jovens a não se afastarem dos acampamentos, das áreas tomadas e da própria luta pela terra e pela nova sociedade.
Uma das mais importantes lutas que tem que ser travadas cotidianamente no interior do movimento, dos acampamentos e áreas é por animar a todos ao esforço por adotar uma conduta correta, como fator determinante para destruir-se toda a podridão da moral burguesa hipócrita, individualista, egoísta, desonesta e corrupta. A luta por nossos objetivos maiores só poderá triunfar se construirmos desde já uma nova forma de convivência e relacionamento baseados no coletivismo.
Combater todas as atitudes incorretas, não acobertá-las, não conciliar com condutas levianas, malandras, espertas, sabidas, desleais e desagregadoras, partam elas de quem for, é a luta principal que podemos realizar para forjar a moral e confiança coletivas e o crescimento de cada um. Praticar de forma sistemática a crítica e autocrítica é o modo correto de combater as mazelas que a sociedade burguesa faz penetrar em todos nós. A sociedade pela qual lutamos e sonhamos um dia realizar, o socialismo, é feita de fraternidade e solidariedade coletivas e desde já temos que praticá-las. Lutemos para transformar nossa organização em embriões da sociedade futura.
Uma das questões a destacar-se nesta luta é o enfrentamento do problema do alcoolismo e das demais drogas. Todos sabemos o quanto é destruidor para os seres humanos do ponto de vista da saúde física e mental e da vida social e familiar. A sociedade capitalista estimula e facilita a utilização das drogas por duas razões: a primeira é que ela representa um fabuloso negócio onde se lucra bilhões de reais; a segunda, é que a droga, o alcoolismo são instrumentos eficientes para afastar as massas da compreensão real dos seus problemas, tornando-as apáticas e descrentes, facilitando sua exploração e dominação.
Na luta contra o velho Estado, seja por arrancar as reivindicações mais exigidas pelas massas ou de construção de nossa organização, temos que nos defrontar com seus órgãos federais, estaduais e municipais. Toda a política dos diferentes governos não tem por objetivo atender nenhum dos nossos interesses, ao contrário, o velho Estado, através dos seus gerentes de turno, procura desmoralizar-nos e destruir nossa luta. Em nossas relações com os órgãos governamentais devemos nos manter sempre vigilantes e alertas. O inimigo utiliza estes relacionamentos para tentar atingir seus objetivos.
Quando o governo demonstra atender uma exigência, não podemos confiar em promessas e alardear vitória. O inimigo é traiçoeiro e utiliza desse lero-lero para desacreditar a liderança perante as massas. Não confiar, não acreditar, só realizar entendimentos que sejam corretos às claras e na presença das massas, pressioná-los todo o tempo, é a nossa tarefa. É preciso ter em conta que a chamada “negociação” é um artifício que os exploradores desenvolveram para destruir as organizações populares combativas. As “negociações” aparecem nos momentos de conflito como instrumento para desestabilizar a posição de força que um movimento desenvolve e que ameaça o poder dos exploradores. É necessário que todos sejam muito bem preparados para os embates contra as formas duras (repressão) e as formas brandas (negociações) empregadas pelos nossos inimigos.
Questão em que se deve ter a maior atenção é a possível relação com as ONGs — organizações não governamentais — que a cada dia proliferam por toda parte. No caso das regiões amazônicas elas existem aos milhares. Grande parte destas instituições são instrumentalizadas desde o estrangeiro, são financiadas por instituições do imperialismo destinadas a corromper, domesticar e destruir as organizações combativas dos povos dos países dominados. Em relação às ONGs no seu conjunto devemos ter uma posição de vigilância a seu respeito.
As ONGs não têm surgido pelos objetivos que se autoproclamam. Trata-se de uma política deliberada em escala internacional, voltada principalmente para interferir nos países dominados, como é o nosso. Esta política tem por objetivo envolver as “comunidades carentes”, as “minorias”, como os indígenas, os de defesa de “gênero” (mulher), “proteção ambiental” como “defesa da floresta amazônica”, etc. Estas organizações aparecem com muitos recursos financeiros e passam a financiar projetos de saúde, de desenvolvimento agrícola, de produção, de preservação ambiental, de defesa dos direitos humanos, etc.
Esta é uma política destinada a criar toda uma estrutura paralela ao Estado, enquanto este vai se desobrigando através das “reformas” que promovem os governos. Esta é uma estratégia do capital internacional para retirar do Estado qualquer atividade de serviços públicos em favor do povo. Posteriormente tais organizações dirão que os recursos financeiros acabaram, e seu papel estará cumprido. Além do mais, cumprem o papel de corromper dirigentes e lideranças populares através do seu assalariamento, mudança de padrão de vida, afastamento das bases, etc.
Muitas destas organizações abrigam agentes de governos de potências estrangeiras destinados a espionar e infiltrar as organizações populares combativas. Umas e outras são controladas por pessoas honestas que pretendem verdadeiramente apoiar a luta do povo. Conhecendo-as bem devemos buscar estabelecer relações em prol da organização e do fortalecimento da luta, mas sempre mantendo-se alertas e vigilantes.
A imprensa é outro setor com o qual necessitamos ter o maior cuidado no relacionamento. De uma forma geral, os meios de informação e comunicação estão sob o forte controle da grande burguesia e têm como objetivo manipular a realidade, mentir, desinformar para manter o povo sob sua influência. Frente à luta popular, os meios de comunicação, a imprensa cada vez mais cumpre papel decisivo a favor do inimigo. Hoje é o principal instrumento de informação, mapeamento, conhecimento interno dos movimentos de luta e de desvirtuamento dos objetivos visando criar uma imagem negativa da luta dos trabalhadores.
No nosso relacionamento com a imprensa devemos ser vigilantes e atuar de forma extremamente organizada e objetiva para reduzir ao máximo as margens de manipulação e distorção das informações que nos interessa passar à opinião pública. Alerta especial para as técnicas de cooptação em que a imprensa, particularmente a Rede Globo de Televisão, se especializou, através da promoção, endeusamento, criando ilusões da importância pessoal das lideranças. Devemos lutar contra todos estes instrumentos do inimigo agindo de maneira firme, enérgica e sem contemplações para com os mesmos. Toda relação com estes órgãos deve ser feita de forma planejada através de responsáveis definidos pela organização e segundo os interesses da organização.
Definir clara e objetivamente quem são, em nossa árdua luta, os nossos verdadeiros amigos, e quem são nossos inimigos jurados, é também uma questão fundamental para o fortalecimento e êxito do nosso movimento. De forma geral, nossos amigos são todos aqueles que vão sendo beneficiários direta ou indiretamente dos resultados da luta pela terra, e que no futuro o serão plenamente. São também aqueles que já possuem uma consciência democrática e honesta. Ou seja: os trabalhadores da cidade e do campo, o povo de uma maneira geral. São os pequenos proprietários rurais e urbanos, pequenos comerciantes, estudantes, professores, intelectuais honestos, “políticos” sinceros (de rara existência no país), organizações sindicais e populares e de defesa dos direitos do povo (devemos desconfiar de muitos órgãos que se dizem defender “direitos humanos”, dado que geralmente são ONGs ou órgãos do Estado), artistas comprometidos e religiosos progressistas.
Nossos inimigos são os latifundiários, grandes fazendeiros e seus bandos de pistoleiros, grandes comerciantes, a grande burguesia e seus partidos cheios de políticos corruptos, os partidos eleitoreiros que se dizem de “esquerda”, os órgãos de governo, a burocracia da Justiça e o aparelho repressivo policial-militar. Existem ainda alguns setores que poderíamos chamar de “médios” dentre os quais, uma parte devemos lutar para neutralizar ou mesmo atrair para ganhar seu apoio.
Por todas as razões que implicam a luta pela terra, desde as condições históricas como as atuais, o movimento não pode ter a ingenuidade de esperar qualquer tratamento democrático por parte do velho Estado e do latifúndio. Tirando as lições da experiência histórica e pesado tudo que se tem passado na luta pela terra no Brasil, é necessidade e obrigação moral assumir todas as tarefas necessárias para defender o nosso movimento e nossas organizações dos diferentes tipos de ataques de nossos inimigos.
Para manter a situação imutável, o velho Estado brasileiro e o latifúndio tem larga experiência e não medem esforços para destruir qualquer organização que contrarie seus interesses e que principalmente trabalhe concretamente por transformar a situação fundiária e destruir seu sistema de exploração e opressão. O sistema se utiliza não só de todos os instrumentos que o Estado dispõe para reprimir e destruir nossa luta, mas também conta com inúmeras organizações políticas e paramilitares para executar seus planos criminosos.
Conscientizar as massas sobre a repressão, sobre o real e verdadeiro conceito de Estado e do que é em essência o velho Estado brasileiro, do seu papel, bem como denunciar a ação dos bandos de pistoleiros, é decisivo. O velho Estado junto com a imprensa trata de difamar e descaracterizar toda a luta social combativa, buscando em seguida criminalizá-la para justificar toda repressão sobre ela. Mas não basta apenas denunciar os seus métodos e objetivos, é preciso combatê-los com firmeza e determinação. E isto só se pode fazer com a definição de uma política de autodefesa e a preparação de todo o movimento em exercê-la. Diante da necessidade de autodefesa, muitas atividades devem ser desenvolvidas e organizadas. A começar pela participação de todos na defesa de nossa organização, das massas e de nossas lideranças, que são o alvo principal de eliminação por parte do inimigo.
A vigilância permanente contra a infiltração do inimigo, a vigilância sobre a movimentação do inimigo, a obtenção de informações permanente do inimigo e a contra-informação são atividades imprescindíveis para nossa proteção e das quais todos devem participar. A proteção da identidade dos companheiros mais expostos também é importante e necessário. Nos atos que conduzem ao enfrentamento deve-se estar minimamente preparado para não facilitar a ação bandida e criminosa do inimigo. Nos enfrentamentos necessários à conquista de nossos objetivos, nas tomadas de terra e ocupação de órgãos da administração do velho Estado, é necessário a utilização de recursos de camuflagem e cobertura do rosto para proteger a identidade de nossos companheiros.
Educar as massas sobre a experiência histórica da luta dos povos e do nosso povo brasileiro, cujas conquistas, sejam elas quais forem, só foram possíveis a vitória através da luta violenta. Educar as massas a respeito de que o inimigo exerce permanentemente a violência criminosa contra o povo e que o povo tem o direito sagrado de defender-se lançando mão da violência justa. Levantar a palavra-de-ordem: “A rebelião se justifica”.
Artigo 1º — Para garantir o adequado funcionamento das diferentes relações no interior dos acampamentos e demais áreas é necessário o estabelecimento de normas disciplinares baseadas em direitos e deveres a que todos, sem nenhuma exceção, estão obrigados;
Artigo 2º — A instância de decisão suprema da coletividade é sua Assembleia Geral. O funcionamento desses órgãos é baseado no centralismo democrático, ou seja, todos participam das discussões e decisões, aprovadas por unanimidade ou por maioria. Após tomadas as decisões todos estão obrigados a colocá-las em prática. A prática fratema da crítica e autocrítica é o meio para buscar a superação de falhas e erros;
Artigo 3º — São direitos de todos os membros de acampamentos e áreas, bem como de núcleos de preparação para novas tomadas, participar das definições dos rumos da luta e da vida da coletividade, de eleger e ser eleito para as distintas instâncias de direção, de criticar em público ou não os dirigentes e quaisquer membros da coletividade;
Artigo 4º — São deveres de todos, sem nenhuma exceção, defender a unidade da coletividade, zelar e ser vigilante contra os desagregadores, cumprir as tarefas para as quais foi eleito prestando contas periodicamente ao movimento e a todos interessados, de ajudar na construção política e material do movimento, guardar segredos do movimento e pagar contribuições definidas democraticamente pela assembleia da coletividade;
Artigo 5º — Estarão impedidos do exercício do direito de eleger e ser eleito para instâncias dirigentes todo aquele que estiver sob sanção por atos de indisciplina e violação das normas;
Artigo 6º — É expressamente proibido o porte, uso e comércio de bebidas alcoólicas e qualquer tipo de droga no interior do acampamento. Nas áreas é proibido o porte e uso de drogas bem como o comércio destas e de bebidas alcóolicas;
Artigo 7º — É expressamente proibida a prática ou apologia de discriminação por motivo de raça, religião e gênero (sexo);
Artigo 8º — É expressamente proibida a prática e apologia de prostituição, jogos de azar e outras formas de corrupção moral;
Artigo 9º — É terminantemente proibida a venda ou negócio que envolva direito de posse, lote, terreno ou qualquer objeto relativo à conquista da luta coletiva;
Artigo 10º — É terminantemente proibido fornecer informações da vida interna da organização e da coletividade para estranhos, agentes dos latifundiários e do Estado;
Artigo 11º — São consideradas violações graves o descumprimento dos artigos 6º, 7º, 8º, 9º e 10º, que serão sancionadas com punições especiais definidas por Tribunal Popular formado pela Assembleia Geral da coletividade;
Artigo 12º — As demais violações serão sancionadas com base nas Medidas Disciplinares referidas no Artigo 13º, aplicadas pela organização a que esteja ligado (comissão, grupo de trabalho, etc.);
Artigo 13º — De acordo com a gravidade das violações, as medidas vão desde a simples advertência e crítica formalizada e pública à coletividade, afastamento das funções e perda de direitos de eleger, ser eleito e de receber informações sobre o rumo do movimento por tempo determinado; expulsão do movimento, expulsão da coletividade;
Artigo 14º — São considerados atos de traição toda e qualquer forma de colaboração com o inimigo e delação;
Artigo 15º — Os atos considerados de traição serão sancionados de imediato, a partir de sua comprovação, com a expulsão desonrosa do movimento e da coletividade;
Artigo 16º — Todos os acusados de violações terão direito de ampla defesa, perante as comissões de investigação e da instância responsável por encaminhar o processo.
As LCP têm como base os camponeses organizados:
Em cada um destes locais, o órgão máximo de decisão são as assembleias, onde todos os companheiros e companheiras têm o direito de participar, de votar nas propostas que forem apresentadas, de eleger e de ser eleito para as comissões que forem constituídas.
As tarefas a serem cumpridas devem ser sempre de responsabilidade de uma comissão de companheiros e companheiras, buscando-se sempre a participação de novas pessoas no trabalho. Com isto evita-se a centralização excessiva e possibilita-se o desenvolvimento de novas lideranças.
As decisões tomadas e os compromissos assumidos têm que ser cobrados pelo coletivo. Quem assumiu tarefa tem que prestar conta ao coletivo do trabalho realizado.
Várias tarefas surgem na organização e mobilização dos acampamentos e áreas:
Para execução destas tarefas, é importante a formação de comissões ou setores, buscando envolver o máximo de pessoas nas tarefas. Os membros de cada comissão ou setor devem eleger um coordenador para dirigir os trabalhos.
A coordenação deve ser eleita na assembleia dos acampados e membros das Áreas. Ela deverá se reunir regularmente para discutir os problemas que surgem e acompanhar e coordenar o trabalho das comissões ou setores. A coordenação é um órgão de direção colegiada onde deve sempre se fortalecer o coletivo, combatendo os desvios do individualismo, do mandonismo, do carreirismo e do personalismo.
A coordenação e as comissões (ou setores) devem estar sempre em condições de prestar contas de seus trabalhos e de seus atos nas Assembleias e reuniões com as bases. Deve-se dar particular atenção às prestações de contas das atividades de finanças (arrecadação e gastos) e do controle da utilização do patrimônio coletivo. A administração dos recursos e do patrimônio do movimento será sempre feita pela Comissão de Finanças nunca, portanto, por uma só pessoa.
A Coordenação Regional é eleita nos Encontros da LCP da Região (uma região está composta por partes de estados — da divisão política oficial) onde participam os delegados escolhidos nos diversos acampamentos e áreas dirigidos pelo movimento.
Na Coordenação Regional também deverão ser organizadas comissões e setores que auxiliarão o desenvolvimento das mesmas comissões e setores nos acampamentos e áreas. Em nível Regional será organizada uma comissão de imprensa que cuidará da elaboração de notas, panfletos e jornais das LCP.
O Conselho de Representantes será formado por um ou mais membros de cada acampamento ou área ao nível de Região. Seu caráter é de órgão consultivo, podendo convocar o Encontro de Delegados ou reuniões extraordinárias da Coordenação, por decisão de 2/3 de seus componentes.
O Congresso é uma instância de massas de caráter emulativo e de coesão do movimento, aberto à participação das bases que devem organizar sua participação por acampamento e área. O Congresso referenda ou não as decisões tomadas pelos Encontros de Delegados (Regionais).
Os dirigentes das LCP, em qualquer nível, devem ser exemplos de disciplina, de seriedade, de retidão moral e de responsabilidade no cumprimento das tarefas. Devem ser exemplo de combatividade, de solidariedade e de compromisso com os objetivos e programa do movimento. Devem ser firmes no enfrentamento com o inimigo, estando sempre atentos em preparar as massas para enfrentar a violência que o latifúndio e o velho Estado praticam contra elas.
O dirigente não pode deixar-se iludir com a bajulação que às vezes o governo, a imprensa, os latifundiários e os políticos fazem com as lideranças do povo. Isto é sempre para comprá-las, para tirá-las da luta. O companheiro ou companheira que assume a função de direção deve ter a consciência de que a cobrança sobre eles será sempre maior, que deve ser sempre a primeira pessoa a cumprir as decisões das bases e que todos estarão vigilantes sobre sua conduta política e moral.
O dirigente não pode nunca usar sua condição de membro da direção para tirar vantagem própria ou para projetos pessoais. Ninguém é obrigado a aceitar a função de direção; mas se aceitou, sabe que suas responsabilidades são maiores; se acha que não tem condições de assumi-las, que renuncie.
O dirigente deve ser atencioso, paciente, simples e humilde no trato com as massas, servi-las de todo o coração. Deve estar sempre preocupado em se desenvolver, em estudar, em participar de cursos e atividades de formação organizadas pelo movimento.
A direção deve ter uma atenção particular em sempre apoiar e estimular a participação da mulher. Sem a participação e a presença organizada da mulher, nosso movimento não tem chances de vitória em seus objetivos.
Nossa luta será penosa e longa. Por isso é também importante integrar os jovens e crianças na luta. Estimular o estudo, o esporte, a cultura, desenvolver neles o amor pela terra e incorporá-los cedo na luta contra o latifúndio.
Agora nós vamos pra luta
A terra que é nossa ocupar
A terra é de quem trabalha
A história não falha, nós vamos ganhar.
Já chega de tanto sofrer
Já chega de tanto esperar
A luta vai ser tão difícil
Por mais que demore, vamos triunfar.
(Bis)
Quem gosta de nós somos nós
e aqueles que vêm nos ajudar
Por isso confia em quem luta
A história não falha, nós vamos ganhar.
Já chega de tanto sofrer
Já chega de tanto esperar
A luta vai ser tão difícil
Por mais que demore, vamos triunfar.
Se a gente morrer nessa luta
O sangue será uma semente
Justiça vamos conquistar
A história não falha, nós vamos ganhar.
Já chega de tanto sofrer
Já chega de tanto esperar
A luta vai ser tão difícil
Por mais que demore, vamos triunfar.
Já somos uns 30 milhões
O povo sem terra e sem pão
O jeito é lutar por nosso chão
A história não falha, nós vamos ganhar.
Já chega de tanto sofrer
Já chega de tanto esperar
A luta vai ser tão difícil
Por mais que demore, vamos triunfar.