A inspiradora de Luiz Carlos Prestes

Figueiredo Pimentel


V. Paixão rubra


capa

Venâncio mandou no dia seguinte lindas flores a Taciana, agradecendo o amável convite e participando que estava ultimando seus negócios urgentes e em breves dias lá estaria para pintar o retrato da “princesa dos pampas”.

Em verdade ele não tinha negócio algum a tratar no Rio Grande do Sul. Lá estava em visita a um velho amigo. De volta da Europa saltara na Argentina onde estivera uns dias, passando-se ao Uruguai, para entrar no Rio Grande do Sul. Há muito projetava fazer essa excursão e só a saudade de seu velho amigo o dispusera a executá-la. Quando encontrara Taciana banhando-se nas águas da cascata sombria, Venâncio Jardim, já estava com as passagens compradas para o Rio de Janeiro. Mas a tentação daquele corpo escultural, a beleza impressionante da mulher perturbadoramente linda fizera-o demorar-se na terra dos pampas.

Não partira ainda para a casa de Taciana por uma questão de elegância. Estava esperando passar uns dias, ansioso para rever a moça por quem se apaixonara.

Taciana tivera ótima impressão e ficara mesmo simpatizando com o artista, que lhe seria uma ótima companhia naquele ambiente nostálgico.

★ ★ ★

Quando Venâncio voltou à fazenda do Coronel Hilpert estava em condições de fazer uma série de quadros. Mas o único que desejava fazer era a reprodução do banho de Taciana. Era um tormento o seu contato com a moça. Sentia arrepios quando por acaso dela se aproximava, quando apertava sua mão macia como a pétala de rosa.

Taciana distraia-se mais agora com a presença de seu amável hospede. À noite tocava piano, lia, cantava ou dançava com ele. Durante o dia saiam a passeio a cavalo ou de automóvel. Às vezes assistia o trabalho de pintura e apontava ao artista os quadros mais belos da natureza. Venâncio fazia grande esforço para manter a sua linha de cavalheiro, esperando conquistar o coração da moça. Tinha ímpetos de beijar-lhe a boca, essa boca que pedia beijos ardentes e apaixonados. Queria sorver esses lábios vermelhos de febre do desejo e trêmulos e quentes como seios voluptuosos.

Ao fim de uma semana de convivência diária com Taciana sentia que estava loucamente apaixonado. Era com dificuldade que fazia o seu retrato. Suas mãos tremiam diante do modelo. Certa vez ajeitando a pose da moça, para melhor efeito, Venâncio beijou-lhe a cabeça de ouro. Taciana o fitou com tal serenidade, com tal expressão que ele sentiu-se envergonhado e humilhado.

No dia seguinte, não a viu durante a manhã e a tarde.

À noite o artista confessou o seu ardente amor, o seu estado d’alma. Falou nervosamente, como um colegial, num impeto, segurando as mãos de Taciana, como se ela fosse partir naquele momento. Confessou o seu amor, a perturbação que sentia desde que a encontrou pela primeira vez. Falava com sinceridade. Sentia-se perturbado e confessou que sem ela não poderia mais viver.

Taciana, que já esperava por isso, recebeu a declaração de amor com indiferença. Limitou-se a sorrir amargamente. Depois de muita insistência, prometeu dar-lhe uma resposta dentro de poucos dias.

Intimamente sentia-se triste, porque não tinha por ele o menor sentimento amoroso. Aos olhos de Venâncio parecia uma mulher sem paixões; no entanto, seu coração ansiava pelo seu grande amor.

O pensamento único dessa mulher misteriosa estava sempre longe, à procura do seu amado. O homem por quem vivia suspirando afastou-se dela para nunca mais voltar. A causa da sua grande tristeza, da sua grande magoa era esse amor martirizado. Era o abandono. O amor sem esperança.


Inclusão: 30/03/2024