Derrotas Desmoralizadoras e Derrotas Fecundas

Andreu Nin

16 de Fevereiro de 1935


Primeira edição: L’Estrella Roja, 16 febrero 1935.
Fonte: La Bataille Socialiste.
HTML: Fernando Araújo.
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É evidente que no mês de outubro passado, o proletariado espanhol se lançou à luta em condições que eram favoráveis à revolução triunfante, mas que ainda não estavam maduras. A própria classe trabalhadora não via ainda seus fins com bastante clareza. Precisamente por isso, a reação provocou o movimento com a intenção de fazê-lo abortar. Sabia bem que uns quantos meses mais tarde haveria sido irresistível.

Isto quer dizer que a classe trabalhadora não devia ter se lançado às ruas? Não. Haveria sido um erro gravíssimo, cujas consequências teriam sido funestas. O ideal consiste, naturalmente, em poder escolher o momento do ataque, mas nem sempre se pode fazê-lo. Há circunstâncias históricas em que apesar das probabilidades e inclusive da certeza do fracasso, é necessário aceitar a batalha.

Em 18 de Março de 1871, o proletariado parisiense se insurgiu e proclamou a “Commune”. Por toda uma série de circunstâncias, aquela audaz empresa não podia triunfar.  E a “Commune” foi afogada, mas a heroica façanha dos trabalhadores parisienses abriu uma nova etapa no movimento operário internacional e lhe enriqueceu de uma experiência incalculável, sem a qual não haveria sido possível a Revolução Russa. Eis aqui um exemplo de derrota fecunda que Marx caracterizou brilhantemente nas linhas seguintes:

“a canalha burguesa de Versalles propôs esta alternativa aos parisienses: aceitar o duelo e lançar-se à luta ou retirar-se sem combate. No segundo caso, a desmoralização da classe operária haveria sido um infortúnio muito mais grave que a perda de um determinado número de ‘combatentes’.”

No ano de 1905, o proletariado russo se lançou à insurreição. O movimento foi vencido, afogado em sangue, e se abriu um período de negra reação.

“O que o proletariado deveria ter feito [disse Plekhanov] era não haver tomado as armas”.

A classe trabalhadora russa foi derrotada, mas não vencida. O levantamento de 1905 foi, segundo a frase de Lenin, o “ensaio geral” da revolução de 1917. O proletariado russo se repôs rapidamente, e a derrota se converteu, doze anos mais tarde, em uma esplêndida vitória. Eis aqui um exemplo de vitória fecunda.

O proletariado alemão, no mês de Janeiro de 1932, permitiu, sem a menor tentativa de rebelião, que Hitler tomasse tranquilamente o poder. A obra de umas quantas décadas viu-se destruída de repente, das organizações operárias não resta nem o rastro, e sobre a classe trabalhadora se manifesta a reação mais sangrenta e implacável. Se a classe trabalhadora tivesse se lançado à insurreição, inclusive em condições desfavoráveis, o resultado, desde o ponto de vista da repressão, haveria sido idêntico; mas teria realizado uma experiência proveitosa, o desespero não teria se apoderado do seu espírito e não ofereceria o espetáculo deprimente que hoje oferece. Eis um exemplo de derrota desmoralizadora.

Na Áustria as condições amadureciam para um ataque da reação à classe operária. Se esta houvesse estado dirigida por um partido revolucionário e não pela social democracia oportunista, ao invés de deixar-se adormecer pelas ilusões democráticas haveria empreendido a ofensiva a tempo e teria vencido muito provavelmente. Dolfus a atacou em condições desfavoráveis para ela; provocou-a, e a classe operária aceitou o desafio e se lançou a uma luta desesperada e heroica. O proletariado foi vencido, mas não esmagado, aprendeu mais nos dias de insurreição do que durante anos de atuação legal e pacífica; a reação não chega a afogar o movimento revolucionário, apesar das prisões, fuzilamentos e forcas, e os vencidos de ontem se preparam para novos e vitoriosos combates que, tudo parece indicar, não se farão esperar. Eis um exemplo de derrota fecunda.

É necessário  assinalar que nossa derrota de outubro pertence a esta categoria?

A classe trabalhadora espanhola tinha que tomar as armas. A eleição foi proveitosa. Não estamos nem abatidos, nem desmoralizados. A aflição e a inquietude das classes dominantes são a melhor prova disso. Da derrota de hoje surgirá a vitória de amanhã.

Se na época relativamente tranquila de antes da guerra, para o proletariado russo foram suficientes doze anos para triunfar depois de uma derrota sangrenta, numa época revolucionária como a que vivemos, cujos acontecimentos se desenvolvem com uma rapidez extraordinária, nossa desforra se fará esperar muito menos. E o sacrifício dos combatentes caídos nas jornadas de outubro não haverá sido inútil. 


Inclusão 13/09/2015