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Primeira Edição: Publicado pela primeira vez na revista Die Neue Zeit, 2, n.° 15, 1902..
Fonte: Obras Escolhidas em três tomos, Editorial "Avante!"
Tradução: José BARATA-MOURA (Publicado segundo o manuscrito.Traduzido do alemão.)
Transcrição e HTML: Fernando A. S. Araújo, Setembro 2008.
Direitos de Reprodução: © Direitos de tradução em língua portuguesa reservados por Editorial
"Avante!" - Edições Progresso Lisboa - Moscovo, 1982.
Muito tempo antes da fundação do Égalité[N116], esta proposta foi repetidamente introduzida no próprio Conselho Geral por um ou dois dos seus membros ingleses. Porém, foi sempre rejeitada quase unanimemente.
Apesar da iniciativa revolucionária vir verosimilmente de França, somente a Inglaterra pode servir de alavanca para uma revolução económica séria. É o único país onde já não há mais nenhuns camponeses e onde a propriedade fundiária está concentrada em poucas mãos. É o único país onde a forma capitalista — quer dizer: o trabalho combinado em grande escala sob empresários capitalistas — se apoderou de quase toda a produção. É o único país em que a grande maioria da população consiste em trabalhadores assalariados (wages labourers). É o único país onde a luta de classes e a organização da classe operária pelas Trade Unions(1*) alcançou um certo grau de maturidade e de universalidade. Graças à sua dominação sobre o mercado mundial, a Inglaterra é o único país em que toda a revolução nas relações económicas tem imediatamente de se repercutir sobre o mundo inteiro. Se o sistema de senhores da terra [Landlordismus] e o capitalismo têm neste país a sua sede clássica, também, por outro lado, as condições materiais da sua aniquilação estão ao máximo amadurecidas. O Conselho Geral está agora na feliz situação de ter directamente a mão nesta grande alavanca da revolução proletária; que loucura, sim, quase que se podia dizer: que crime não seria deixá-la apenas em mãos inglesas!
Os ingleses dispõem de todos os pressupostos materiais necessários para uma revolução social. Aquilo que lhes falta é o espírito de generalização e a paixão revolucionária. A isto só o Conselho Geral pode remediar e, com isso, acelerar um verdadeiro movimento revolucionário neste país e, consequentemente, por toda a parte. Os grandes sucessos que, sob este aspecto, já alcançámos são atestados pelos jornais mais inteligentes e mais considerados das classes dominantes, como, por exemplo, pela Pall Mall Gazette, a Saturday Review, o Spectator e a Fortnightly Review[N117], sem contar com os chamados membros radicais da Câmara Baixa e da Câmara Alta que ainda até há pouco exerciam uma grande influência sobre os dirigentes dos operários ingleses. Acusam-nos abertamente de termos envenenado e quase asfixiado o espírito inglês da classe operária e de a termos impelido para o socialismo revolucionário.
O único método de alcançar esta transformação consiste em que nós actuemos como Conselho Geral da Associação Internacional. Como Conselho Geral podemos suscitar medidas (como, por exemplo, a fundação da Land and Labour League[N118]) que, então, mais tarde, aquando da sua execução, aparecerão perante o público como movimentos espontâneos da classe operária inglesa.
Se se formasse um Conselho Federal fora do Conselho Geral, que efeitos imediatos teria isso? O Conselho Federal encontrar-se-ia entre o Conselho Geral da Internacional e o Conselho Geral das Trade Unions e não teria nenhuma autoridade. Por outro lado, o Conselho Geral da Internacional largaria das mãos esta grande alavanca. Se preferíssemos a alta gritaria na praça ao trabalho sério e invisível, cometeríamos talvez o erro de responder publicamente à pergunta do Égalité de por que é que «o Conselho Geral se resigna a essa tão embaraçosa acumulação de funções».
A Inglaterra não deve ser posta simplesmente no mesmo plano dos outros países. Temos de a considerar como a metrópole do capital.
Se a Inglaterra é o bastião do sistema de senhores da terra e do capitalismo europeus, a Irlanda é o único ponto em que se pode desferir o grande golpe contra a Inglaterra oficial.
Em primeiro lugar, a Irlanda é o bastião do sistema de senhores da terra inglês. Se ele cair na Irlanda, também cairá na Inglaterra. Na Irlanda, isto pode ser alcançado cem vezes mais facilmente, porque lá a luta económica se concentra exclusivamente sobre a propriedade fundiária, porque lá esta luta é, ao mesmo tempo, uma luta nacional e porque lá o povo é mais revolucionário e está mais exasperado do que na Inglaterra. O sistema de senhores da terra na Irlanda é mantido exclusivamente pelo exército inglês. No momento em que a união coerciva[N119] entre os dois países cessar, rebentará na Irlanda uma revolução social, ainda que segundo formas antiquadas. O sistema de senhores da terra inglês não apenas perderá uma fonte significativa das suas riquezas como também a sua maior força moral — a força de representar a dominação da Inglaterra sobre a Irlanda. Por outro lado, enquanto mantiver o poder daquele na Irlanda, o proletariado inglês torna os seus landlords(2*) invulneráveis na própria Inglaterra.
Em segundo lugar, a burguesia inglesa não só tirou proveito da miséria irlandesa, a fim de piorar a situação da classe operária na Inglaterra pela imigração forçada dos irlandeses pobres, como ainda por cima dividiu o proletariado em dois campos inimigos. O fogo revolucionário do operário celta não liga com a natureza sólida, mas vagarosa, do operário anglo-saxão. Pelo contrário, reina em todos os grandes centros industriais da Inglaterra um profundo antagonismo entre o proletário irlandês e inglês. O operário inglês vulgar odeia o irlandês como um concorrente que faz baixar os salários e o Standard of life(3*). Tem por ele antipatias nacionais e religiosas. Considera-o quase com os mesmos olhos com que os poor whites(4*) dos Estados do Sul da América do Norte consideravam os escravos negros. Este antagonismo entre os proletários na própria Inglaterra é atiçado e mantido desperto artificialmente pela burguesia. Ela sabe que esta cisão é o verdadeiro segredo da conservação do seu poder.
Este antagonismo repete-se também do outro lado do Atlântico. Os irlandeses, expulsos da sua terra natal por bois e carneiros, reencontram-se nos Estados Unidos, onde formam uma parte considerável e sempre crescente da população. O seu único pensamento, a sua única paixão, é o ódio à Inglaterra. O governo inglês e o americano — quer dizer: as classes que eles representam — alimentam estas paixões para perpetuarem a luta entre as nações que impede qualquer aliança séria e sincera entre as classes operárias de ambos os lados do Atlântico e, consequentemente, a sua emancipação conjunta.
A Irlanda é o único pretexto do governo inglês para manter um grande exército permanente que, em caso de necessidade, como já se viu, é largado contra os operários ingleses, depois de eles terem sido convertidos em soldadesca na Irlanda. Finalmente, repete-se na Inglaterra dos nossos dias aquilo que a Roma Antiga nos havia mostrado numa medida inaudita. O povo que subjuga um outro povo forja as suas próprias cadeias.
O ponto de vista da Associação Internacional sobre a questão irlandesa é, portanto, completamente claro. A sua primeira tarefa é acelerar a revolução social na Inglaterra. Para este fim tem de se vibrar o golpe decisivo na Irlanda.
A resolução do Conselho Geral sobre a amnistia irlandesa[N120] só deve servir para introduzir outras resoluções em que seja tornado expresso que, abstraindo de qualquer justiça internacional, uma condição prévia para a emancipação da classe operária inglesa é transformar a união coerciva existente — quer dizer: a escravização da Irlanda — numa confederação livre e igual, se isso for possível, ou forçar uma separação completa, se tiver de ser.
Notas de rodapé:
(1*) Em inglês no texto: sindicatos. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)
(2*) Em inglês no texto: senhores da terra. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)
(3*) Em inglês no texto: nível de vida. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)
(4*) Em ingês no texto: brancos pobres. (Nota da edição portuguesa.) (retornar ao texto)
Notas de fim de tomo:
[N115] Uma Participação Confidencial foi escrita por Marx por volta de 28 de
Março de 1870, no quadro da agudização da luta dos partidários de Bakúnine dentro
da Internacional contra o Conselho Geral, Marx e os seus partidários. Já em 1 de
Janeiro de 1870 o Conselho Geral aprovara, numa reunião extraordinária, uma carta-circular secreta sobre esta questão escrita por Marx ao Conselho Federal da Suíça
Romanda, onde a influência bakuninista era particularmente forte. O texto desta
carta foi depois comunicado à Bélgica e à França. A carta-circular foi incluída na sua
totalidade na Participação Confidencial enviada por Marx, na sua qualidade de secretário correspondente para a Alemanha, ao Comité do Partido Social-Democrata
alemão.
A presente edição compreende os quarto e quinto pontos da Participação Confidencial que explicam a posição do Conselho Geral em relação ao movimento operário inglês e ao movimento de libertação nacional da Irlanda, que era especialmente atacada pelos bakuninistas.
Partindo da importância que nessa época tinha o movimento operário inglês na luta geral do proletariado internacional e da correspondente necessidade de o Conselho Geral o dirigir directamente, Marx explica no ponto quarto por que é que não era oportuno criar em Inglaterra, a exemplo de outros países, um Conselho Federal da Internacional.
No ponto quinto, Marx mostra, com base no exemplo da Irlanda e da Inglaterra, a ligação entre a luta de libertação dos povos oprimidos e a revolução proletária, o papel das nacionalidades subjugadas como aliadas naturais do proletariado. (retornar ao texto)
[N116] L’Egalité (A Igualdade): semanário suíço, órgão da Federação Romanda da Internacional. Publicou-se em Genebra, em francês, de Dezembro de 1868 a Dezembro de 1872. O jornal esteve durante um certo tempo sob a influência de Bakúnine. Em Janeiro de 1870, o Conselho Federal Romando conseguiu que os bakuninistas saíssem da redacção, após o que o jornal passou a apoiar a linha do Conselho Geral. (retornar ao texto)
[N117] The Pall Mall Gazette (A Gazeta de Pall Mall): jornal diário. Publicou-se em Londres de 1865 a 1920. Nos anos 60-70 seguiu uma orientação conservadora. Marx e Engels colaboraram nele de Julho de 1870 a Junho de 1871. The Saturday Review of Politics, Literature, Science and Art (A Revista de Sábado de Política, Literatura, Ciência e Arte): semanário conservador britânico, que se publicou em Londres de 1885 a 1938. . The Spectator (O Espectador): semanário inglês de tendência liberal, publicado em Londres desde 1828. The Fortnightly Review (A Revista Quinzenal): revista inglesa sobre questões de História, Filosofia e Literatura, de tendência burguesa liberal. Publicou-se em Londres com este título de 1865 a 1934. (retornar ao texto)
[N118] A Liga da Terra e do Trabalho foi fundada em Londres, em Outubro de 1869 com a participação do Conselho Geral. O seu programa compreendia as seguintes reivindicações: nacionalização da terra, redução da jornada de trabalho, sufrágio universal e criação de colónias agrícolas. No entanto, logo no Outono de 1869 a influência dos elementos burgueses na Liga aumentou e, por volta de 1872, ela perdeu toda a ligação com a Internacional. (retornar ao texto)
[N119] Trata-se da British-Irish Union (União Britânico-Irlandesa), instituída em 1 de Janeiro de 1801. A União suprimiu os últimos vestígios da autonomia da Irlanda, aboliu o parlamento irlandês e levou à sujeição total da Irlanda à Inglaterra. (retornar ao texto)
[N120] Trata-se do apoio do Conselho Geral ao movimento pela amnistia dos participantes na luta de libertação presos, que se desenvolveu no Verão e no Outono de 1869. (retornar ao texto)
Inclusão | 29/09/2008 |