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Primeira edição: Publicado em 24(11) de maio de 1917 no jornal Soldatskaia Pravda, nº 19. V. I. Lênin, Obras, 4.ª ed. em russo, t. 24, págs. 335/339
Fonte: A aliança operário-camponesa, Editorial Vitória, Rio de Janeiro, Edição anterior a 1966 - págs. 332-336
Tradução: Renato Guimarães, Fausto Cupertino Regina Maria Mello e Helga Hoffman de "La Alianza de la Clase Obrera y el Campesinado", publicado por Ediciones en Lenguas Extranjeiras, Moscou, 1957, que por sua vez foi traduzido da edição soviética em russo, preparada pelo Instituto de Marxismo-Leninismo adjunto ao CC do PCUS, Editorial Política do Estado, 1954. Capa e apresentação gráfica de Mauro Vinhas de Queiroz
HTML: Fernando Araújo.
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Camaradas deputados camponeses:
O Comitê Central do Partido Operário Social-Democrata (bolchevique) da Rússia, ao qual tenho a honra de pertencer, queria enviar-me como representante de nosso Partido no congresso camponês. Impossibilitado no momento de cumprir este mandato em virtude de meu estado de saúde, permito-me dirigir-lhes esta carta aberta para saudar a união do campesinato de toda a Rússia e assinalar brevemente as profundas divergências que separam nosso Partido do partido dos «socialistas revolucionários» e dos «social-democratas mencheviques».
Estas profundas divergências referem-se aos três problemas mais importantes: a terra, a guerra e a reforma de governo.
Toda a terra deve pertencer ao povo. Todas as terras dos latifundiários devem passar sem indenização aos camponeses. Isto é claro. A divergência gira em torno da questão de se os camponeses devem ou não tomar imediatamente, em cada lugar, toda a terra, sem pagar renda alguma aos latifundiários e sem esperar a Assembleia Constituinte.
Nosso Partido considera que os camponeses devem fazê-lo e lhes aconselha que, nas diferentes localidades, tomem imediatamente toda a terra, o mais organizadamente possível, sem permitir de modo algum a deterioração dos bens e fazendo todos os esforços para aumentar a produção de trigo e de carne, pois os soldados que se encontram na frente passam horríveis privações. A Assembleia Constituinte estabelecerá de maneira definitiva quem deve dispor da terra: mas, de qualquer maneira, agora, imediatamente, para a semeadura da primavera, só podem dispor dela as instituições locais, pois nosso governo provisório, o governo dos latifundiários e dos capitalistas, atrasa a convocação da Assembleia Constituinte e até agora não fixou sequer sua data.
Somente as instituições locais podem dispor previamente da terra. É indispensável semear. A maioria dos camponeses, em cada lugar, saberá perfeitamente dispor organizadamente da terra, arar e semear toda a terra. Isto é necessário para melhorar a alimentação dos soldados na frente. Por isso é intolerável esperar a Assembleia Constituinte. Não negamos — de maneira alguma — o direito da Assembleia Constituinte a estabelecer de maneira definitiva a propriedade de todo o povo sobre a terra, e as condições para dispor dela. Mas, como medida prévia, os próprios camponeses devem dispor da terra, em toda parte e agora, nesta primavera. Os soldados que se encontram na frente podem e devem enviar delegados ao campo.
Prossigamos. Para que toda a terra passe para as mãos dos trabalhadores é necessário a estreita aliança entre os operários urbanos e os camponeses pobres (semiproletários). Sem esta aliança, é impossível vencer os capitalistas. É se estes não são vencidos, nenhuma transferência da terra para as mãos do povo o livrará da miséria. Não se pode comer terra, e sem dinheiro, sem capital, é impossível conseguir instrumentos agrícolas, gado e sementes. Os camponeses não devem confiar nos capitalistas, nem nos mujiques ricos (que são também capitalistas), mas somente nos operários da cidade. Unicamente em aliança com estes, os camponeses pobres conseguirão que a terra, as estradas de ferro, os bancos e as fábricas passem a ser propriedade de todos os trabalhadores; sem isso, a simples transferência da terra para o povo não eliminará a necessidade e a miséria.
Os operários de algumas regiões da Rússia já começam a estabelecer a fiscalização (controle) operária nas fábricas. este controle dos operários beneficia os camponeses, pois terá como resultado o aumento da produção e o barateamento dos produtos. Os camponeses devem apoiar com todas as suas forças esta iniciativa dos operários e não acreditar nas calúnias que os capitalistas lançam contra eles.
O segundo problema é o da guerra.
Esta guerra é de rapina. Ela é feita pelos capitalistas de todos os países em benefício de seus objetivos de pilhagem, Pelo aumento de seus lucros. Esta guerra não proporciona ao Povo trabalhador, nem pode proporcionar, senão desastres, horrores, a desolação e a selvageria. Por isso, nosso Partido, o partido dos operários conscientes, o partido dos camponeses Pobres, condena resoluta e incondicionalmente esta guerra, nega-se a justificar os capitalistas de um país perante os capitalistas de outro, nega-se a apoiar os capitalistas de um país, qualquer que seja, e procura conseguir o término mais rápido possível da guerra mediante a derrubada dos capitalistas de todos os países, mediante a revolução operária em todos os países.
Em nosso novo governo provisório há 10 ministros que pertencem aos partidos dos latifundiários e dos capitalistas e 6 que pertencem aos partidos «populista» («socialistas revolucionários») e «social-democrata menchevique». A nosso ver, os populistas e os mencheviques cometem um erro profundo e fatal ao tomar parte no governo dos capitalistas e, em geral, ao conceder-lhe seu apoio. Homens como Tsereteli e Tchernov têm a esperança de levar os capitalistas a terminar mais rapidamente e de modo mais honroso esta guerra de rapina. Mas estes chefes dos partidos populista e menchevique enganam-se: na realidade, ajudam os capitalistas a preparar a ofensiva das tropas russas contra a Alemanha, isto é, a prolongar a guerra, a aumentar os sacrifícios, excepcionalmente duros, que a guerra ocasiona para o povo russo.
Estamos convencidos de que os capitalistas de todos os países enganam o povo, prometendo-lhe uma paz rápida e justa, mas, na prática, prolongando a guerra de rapina. Os capitalistas russos, que tinham em suas mãos o antigo governo provisório e que continuam tendo em suas mãos o novo governo, não quiseram sequer publicar os extorsivos tratados secretos concluídos pelo ex-tsar Nicolau Romanov com os capitalistas da Inglaterra, da França e de outros países, com o propósito de tomar Constantinopla aos turcos, arrancar a Galícia aos austríacos, a Armênia aos turcos, etc. O governo provisório ratificou e ratifica estes tratados.
Nosso Partido considera que estes tratados são tão criminosos e extorsivos como os concluídos com seus aliados pelos bandidos capitalistas alemães e por seu imperador-bandido Guilherme.
O sangue dos operários e dos camponeses não deve ser derramado para que os capitalistas alcancem estes objetivos de rapina.
É preciso acabar rapidamente com esta guerra criminosa, e não por meio de uma paz em separado com a Alemanha, mas por meio de uma paz universal, não por meio de uma paz dos capitalistas, mas por meio de uma paz das massas trabalhadoras contra os capitalistas. Para isso há somente um caminho: a passagem completa de todo o poder do Estado aos sovietes de deputados operários, soldados e camponeses tanto na Rússia como em outros países. Somente estes sovietes estão em condições de impedir praticamente que os capitalistas enganem os povos, de impedir que os capitalistas prolonguem a guerra.
Chego assim ao terceiro e último dos problemas assinalados por mim: o da forma de governo.
A Rússia deve ser uma república democrática. Com isso está de acordo inclusive a maioria dos latifundiários e capitalistas, que sempre foram partidários da monarquia, mas que agora se convenceram de que o povo não permitirá, de modo algum, o restabelecimento da monarquia em nosso país. Os capitalistas orientam agora todos os seus esforços para conseguir que a república na Rússia se pareça o mais possível com a monarquia e possa transformar-se de novo nela com a maior facilidade (exemplo disto ocorreu repetidas vezes em muitos países). Com este propósito, os capitalistas querem conservar o aparelho burocrático colocado acima do povo, querem conservar a polícia e o exército permanente, separado do povo e comandado por generais e oficiais nomeados sem eleição. É os generais e oficiais, se não são eleitos, serão quase sempre recrutados entre os latifundiários e os capitalistas. Isto é conhecido inclusive pela experiência de todas as repúblicas do mundo.
Por isso, nosso Partido, o partido dos operários conscientes e dos camponeses pobres, trata de conseguir outro tipo de república democrática. Queremos uma república na qual não exista uma polícia que despreze o povo; na qual todos os funcionários, de cima a baixo, sejam exclusivamente eleitos pelo povo e demitidos a qualquer momento a pedido do povo, na qual o soldo não seja superior ao salário de um bom operário; na qual os postos de comando do exército sejam igualmente eletivos, e o exército permanente separado do povo e formado por classes alheias a este seja substituído pelo armamento geral do povo, pela milícia de todo o povo.
Queremos uma república na qual todo o poder do Estado, de baixo a cima, pertença integral e exclusivamente aos sovietes de deputados operários, soldados e camponeses, etc.
Os operários e os camponeses formam a maioria da população. O poder deve pertencer a eles, e não aos latifundiários e capitalistas.
Os operários e os camponeses formam a maioria da população. O poder e a administração do país devem ser exercidos pelos seus sovietes, e não pelos funcionários.
Estes são nossos pontos-de-vista, camaradas deputados. Estamos firmemente convencidos de que a experiência mostrará logo às grandes massas do povo o caráter errôneo da política dos populistas e dos mencheviques. A experiência mostrará logo às massas que não se pode salvar a Rússia — que se encontra, do mesmo modo que a Alemanha e outros países, à beira do desastre — que não se podem salvar os povos extenuados pela guerra por meio da conciliação «om os capitalistas. Somente a passagem de todo o poder do Estado diretamente às mãos da maioria da população pode salvar todos os povos.
Petrogrado, 7 de maio de 1917
N. Lênin