MIA> Biblioteca> Vladimir Ilitch Lênin > Novidades
Primeira edição: Publicado no livro Atas do Congresso de Unificação do POSDR, Realizado em Estocolmo, em 1906, Moscou, 1907. V. I. Lênin. Obras, 4ª ed. em russo, t. 10, págs. 253/262
Fonte: A aliança operário-camponesa, Editorial Vitória, Rio de Janeiro, Edição anterior a 1966 - págs. 254-262
Tradução: Renato Guimarães, Fausto Cupertino Regina Maria Mello e Helga Hoffman de "La Alianza de la Clase Obrera y el Campesinado", publicado por Ediciones en Lenguas Extranjeiras, Moscou, 1957, que por sua vez foi traduzido da edição soviética em russo, preparada pelo Instituto de Marxismo-Leninismo adjunto ao CC do PCUS, Editorial Política do Estado, 1954. Capa e apresentação gráfica de Mauro Vinhas de Queiroz
HTML: Fernando Araújo.
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Apresento duas teses fundamentais:
Ao desenvolver estas teses, ocupar-me-ei primeiramente das objeções mais sérias contra a nacionalização. Uma dessas objeções mais sérias é, sem dúvida, a feita pelo camarada Plekhanov. O camarada Plekhanov, de cujas palavras tomei nota, diz textualmente: «não podemos de modo algum ser partidários da nacionalização». Isto é um erro. Atrevo-me a afirmar que, se em nosso país se realizar verdadeiramente uma revolução camponesa e se as transformações políticas que a acompanharem chegarem até a proclamação de uma república efetivamente democrática, o camarada Plekhanov considerará possível ser partidário da nacionalização. E se na futura revolução na Rússia se instaurasse de verdade uma república democrática, toda a situação do movimento, não só russo, mas internacional, impulsionaria à nacionalização. Se não se dá esta premissa, então a própria municipalização será uma ficção, só se poderá realizar como uma nova forma de resgate. O camarada John(1) usa o termo alienação e não confisco, e, como prova seu discurso, não o escolheu casualmente. Entretanto, este termo é simplesmente democrata-constitucionalista, pressupõe tudo o que se quiser, e com ele se acomoda às mil maravilhas o resgate que projetam os democratas constitucionalistas. Prossigamos. Onde está a garantia contra a restauração?, pergunta o camarada Plekhanov. Não creio que esta pergunta se relacione estreita e indissoluvelmente ao programa que examinamos; mas, posto que foi feita, é preciso dar-lhe uma resposta completamente definida e inequívoca. Se se fala de uma garantia econômica verdadeira, plenamente eficaz contra a restauração, isto é, de uma garantia que crie condições econômicas capazes de excluir a restauração, ter-se-á que dizer: a única garantia contra a restauração é a revolução socialista no Ocidente; não pode existir qualquer outra garantia, no sentido verdadeiro e completo da palavra. Fora desta premissa, com qualquer outra solução do problema (municipalização, repartição, etc.), a restauração não só é possível, como absolutamente inevitável. Eu formularia esta tese com as seguintes palavras: a revolução russa pode triunfar com suas próprias forças, mas não pode de modo algum manter e consolidar suas conquistas com suas próprias mãos. Não pode conseguir isto se não produz a revolução socialista no Ocidente; sem esta condição, a restauração é inevitável com a municipalização, com a repartição e com a nacionalização, pois o pequeno proprietário, em todas e cada uma das formas de posse e propriedade, constituirá o ponto de apoio da restauração. Depois da vitória completa da revolução democrática, o pequeno proprietário se voltará de modo irremissível contra o proletariado, e o fará tanto mais rapidamente quanto maior for a rapidez com que jogue por terra todos os inimigos comuns do proletariado e do pequeno proprietário, ou seja: os capitalistas, os latifundiários, a burguesia financeira, etc. Nossa república democrática não tem outra reserva senão o proletariado socialista do Ocidente, e neste sentido não se pode perder de vista que a revolução burguesa clássica na Europa, a grande revolução francesa do século XVIII, teve lugar numa situação internacional completamente distinta daquela em que transcorre a revolução russa. A França dos fins do século XVIII estava rodeada de Estados feudais e semifeudais. A Rússia do século XX, que leva a cabo a revolução burguesa, está rodeada de países nos quais o proletariado socialista se encontra plenamente apetrechado às vésperas da contenda final com a burguesia. Se fenômenos relativamente tão insignificantes como a promessa de liberdade para a Rússia feita pelo tsar a 17 de outubro já deram um grande impulso ao movimento proletário na Europa ocidental, se bastou que os operários austríacos receberem um telegrama de Petersburgo sobre o tristemente célebre manifesto constitucional para que se lançassem imediatamente à rua e se registrasse uma série de manifestações e choques armados nas cidades industriais mais importantes da Áustria, é fácil compreender como se conduziria o proletariado socialista internacional se as notícias da Rússia lhe levassem, não uma promessa de liberdade, mas sua verdadeira realização e o triunfo completo do campesinato revolucionário.
Se colocamos a questão das garantias contra a restauração sobre outra base, isto é, se faiamos de uma garantia relativa e condicional contra a restauração, então se terá que dizer o seguinte: a garantia condicional e relativa contra a restauração consiste unicamente em que a revolução seja realizada com a maior decisão possível, em que seja feita diretamente pela classe revolucionária com a menor intervenção possível de intermediários, conciliadores e apaziguadores de toda laia, em que esta revolução seja levada verdadeiramente até o seu termo; e meu projeto dá o máximo de garantias relativas contra a restauração.
Os comitês de camponeses são apresentados em meu projeto como a alavanca direta do movimento camponês revolucionário, como sua forma mais desejável. Se traduzirmos em linguagem simples, os comitês de camponeses significam uma conclamação a que os próprios camponeses ajustem as contas imediata e diretamente com os funcionários e latifundiários com a maior decisão. Os comitês de camponeses significam uma conclamação para que o povo, oprimido pelos restos da servidão e pelo regime policial, se desembarace destes restos, como dizia Marx, «à plebeia». Esta premissa de uma revolução levada até o seu termo e que estabelece a eleição dos funcionários pelo povo, recordou ao camarada Plekhanov o anarquismo, tão desagradável para ele como, naturalmente, para todos nós; mas é extremamente estranho que a eleição dos funcionários possa recordar o anarquismo; é extremamente estranho que, num momento como o atual, a questão de que os funcionários sejam eleitos pelo povo suscite ou possa suscitar sorrisos num social-democrata, qualquer que seja ele, com exceção, talvez, de Bernstein. Justamente agora vivemos um momento em que esta palavra-de-ordem — a eleição dos funcionários pelo povo — adquire enorme importância prática, a importância mais imediata. Toda a nossa atividade, propaganda e agitação entre as massas camponesas deve consistir, em grau considerável, em propagar, difundir e explicar precisamente esta palavra-de-ordem. Pregar a revolução camponesa, falar da revolução agrária, por pouco que seja, no sentido sério da palavra, e não falar ao mesmo tempo na necessidade de um verdadeiro democratismo, isto é, entre outras coisas, na eleição dos funcionários pelo povo, constitui uma contradição flagrante. A censura de anarquismo com base neste motivo lembra-me apenas os bernsteinianos alemães que, há pouco, polemizando com Kautsky, o acusavam de anarquismo.
Devemos dizer aberta e claramente ao camponês: se queres levar até o fim a revolução agrária, deves também levar até o fim a revolução política; sem esta, a revolução agrária não se realizará de maneira alguma, ou carecerá de qualquer consistência. Sem uma revolução democrática completa, sem a eleição dos funcionários pelo povo, teremos ou motins camponeses, ou reformas agrárias democratas-constitucionalistas em nosso país. Não teremos nada que mereça a grande palavra empregada por Plekhanov: revolução camponesa. Prossigamos. A municipalização abre amplo caminho para a luta de classes, diz Plekhanov; procurei reproduzir esta sua afirmação o mais literalmente possível e devo declarar com decisão que semelhante asserção é falsa; é falsa tanto do ponto-de-vista político, como do econômico. Em igualdade de condições, o município e a propriedade municipal da terra representam, sem dúvida, um campo mais estreito para a luta de classes do que toda a nação, do que a nacionalização da terra. Com a república democrática, a nacionalização da terra cria, indubitavelmente, o mais amplo campo de ação para a luta de classes, o mais amplo campo possível e concebível em geral nas condições do capitalismo. A nacionalização significa abolir a renda absoluta, baixar os preços dos cereais, garantir a máxima liberdade de concorrência e a liberdade de penetração do capital na agricultura. A municipalização, pelo contrário, restringe a luta de classes de toda a nação, sem depurar da renda absoluta todas as relações de produção na agricultura e fracionando nossa reivindicação geral em reivindicações parciais; em todo caso, a municipalização disfarça a luta de classes. Deste ponto-de-vista, o problema colocado por Plekhanov só pode ser resolvido num sentido. Deste ponto-de-vista, a municipalização não resiste, inegavelmente, à crítica. A municipalização significa restringir e disfarçar a luta de classes.
Outra objeção de Plekhanov refere-se à conquista do poder. Plekhanov viu em meu projeto de programa agrário a conquista do poder, e devo dizer que, de fato, meu projeto de programa agrário contém a ideia da conquista do poder pelo campesinato revolucionário; mas constitui o maior erro político identificar esta ideia com a que tinham da conquista do poder os partidários da Vontade do Povo. Nas décadas de 70 e 80, quando estes últimos cultivavam a ideia da conquista do poder, representavam um grupo de intelectuais, mas na realidade não existia qualquer movimento revolucionário amplo, verdadeiramente de massas. A conquista do poder era um desejo ou uma frase de um punhado de intelectuais, mas não o passo seguinte inevitável do movimento de massas, já então em desenvolvimento. Agora, depois de outubro, novembro e dezembro de 1905, depois que as amplas massas da classe operária, dos elementos semiproletários e do campesinato mostraram ao mundo formas do movimento revolucionário há tempos não vistas; agora, depois que a luta do povo revolucionário pelo poder arrebentou em Moscou, no Sul e nos territórios do Báltico, apresentar como ideia de Vontade do Povo a conquista do poder político pelo povo revolucionário significa atrasar-se 25 anos, significa apagar da história da Rússia todo um longo período. Plekhanov dizia: não se deve temer a revolução agrária. Precisamente este temor à conquista do poder pelo campesinato revolucionário significa temer a revolução agrária. A revolução agrária é uma frase vazia se sua vitória não pressupõe a conquista do poder pelo povo revolucionário. Sem esta última condição, não haverá revolução agrária, e sim uma revolta camponesa, ou reformas agrárias democrata-constitucionalistas. Para terminar o exame deste ponto, recordarei unicamente que a própria resolução dos camaradas da minoria, publicada no nº 2 de Partiinie Izvestia, diz que ante nós se coloca já agora a tarefa de arrancar o poder das mãos do governo.
A expressão «trabalho criador do povo» que, segundo me parece, não existe em nossas resoluções, mas que, a se confiar na memória do camarada Plekhanov, empreguei em meu discurso, parece-lhe uma recordação dos velhos conhecidos da Vontade do Povo e socialistas revolucionários. Esta recordação do camarada Plekhanov está também atrasada, a meu ver, 25 anos. Recordemos o que se passou na Rússia no último trimestre de 1905: greves, sovietes de deputados operários, insurreições, comitês de camponeses, comitês ferroviários, etc.; tudo isto prova exatamente a passagem do movimento popular à forma da insurreição; tudo isto mostra os germes indubitáveis dos órgãos do poder revolucionário. E minhas palavras sobre o trabalho criador do povo tinham um conteúdo absolutamente determinado e concreto; referiam-se exatamente a estes dias históricos da revolução russa, caracterizavam exatamente este método de luta não só contra o velho poder, e sim de luta por meio do poder revolucionário, método que empregaram pela primeira vez as grandes massas de operários e camponeses russos nas memoráveis jornadas de outubro e de dezembro. Se nossa revolução foi enterrada, então foram enterradas também estas formas embrionárias de poder revolucionário dos camponeses e dos operários; mas se vossas palavras sobre a revolução camponesa não são mera fraseologia, se em nosso país se realiza uma autêntica revolução agrária no verdadeiro sentido da expressão, então veremos, sem dúvida alguma, a repetição dos acontecimentos de outubro e de dezembro em proporções incomensuravelmente mais amplas. O poder revolucionário não dos intelectuais, não de um grupo de conspiradores, e sim dos operários e dos camponeses já existiu na Rússia, tornou-se realidade no curso de nossa revolução. Foi esmagado pela vitória da reação, mas se temos fundamento efetivo para nos convencermos do ascenso da revolução, deveremos esperar também inelutavelmente o ascenso, o desenvolvimento e o êxito de novos órgãos de poder revolucionário, ainda mais enérgicos e mais ligados ao campesinato e ao proletariado. Por conseguinte, com o murcho e ridículo espantalho da Vontade do Povo, Plekhanov não fez senão eludir a análise das formas do movimento empregadas em outubro, novembro e dezembro.
Examinemos, finalmente, a questão da flexibilidade e da firmeza da argumentação de meu programa. Considero que, também neste sentido, meu programa agrário é o mais satisfatório em comparação com todos os precedentes. Que fazer se as coisas marcham mal para a revolução? Que fazer caso não se possa falar em levar até seu termo nossa revolução democrática e não se convertam em realidade todos os «se» que meu projeto contém? Então, naturalmente, se terá que levar em conta as condições já existentes hoje de exploração camponesa e de usufruto camponês da terra. Neste sentido, me reportarei a um fenômeno importantíssimo como o é o arrendamento. Com efeito, se falamos que as coisas podem marchar mal para a revolução, que esta pode não chegar ao seu termo, neste caso ter-se-á que levar em conta, sem dúvida, a existência e a insuperabilidade deste fenômeno. E, neste caso adverso, caso faltem todos os «se» supostamente utópicos, em meu projeto de programa são previstas as tarefas do Partido com maior plenitude e exatidão e muito mais sensatamente do que no do camarada Maslov. Assim, pois, meu programa contém palavras-de-ordem práticas tanto para as condições atuais da exploração camponesa e do usufruto camponês da terra, como para as melhores perspectivas de desenvolvimento ulterior do capitalismo. O camarada John procurou ironizar, dizendo que em meu programa há programas demais, que nele figuram o confisco e o arrendamento, que se excluem mutuamente; mas a ironia não deu resultado, porque o confisco das terras dos latifundiários não exclui o arrendamento, que tem lugar também nas terras dos camponeses. Por conseguinte, o camarada Plekhanov carecia de toda razão quando, para fazer efeito, esgrimia contra mim seu argumento. Não é difícil, disse ele, escrever um programa para um caso em que tudo saia às mil maravilhas. Qualquer um pode escrever um programa assim; em troca, experimente-se escrever um programa no caso em que não existam as melhores condições. E em resposta a esta argumentação, afirmo que, exatamente no caso do pior desenvolvimento e desenlace possíveis de nossa revolução, meu programa, que fala do confisco das terras dos latifundiários e que prevê questões como o arrendamento, é particularmente sensato e consistente. Em troca, o projeto do camarada John, por não dizer uma palavra sobre as piores condições, isto é, sobre a ausência de democracia política efetiva, nos oferece unicamente a municipalização, apesar de que esta, sem a eleição dos funcionários pelo povo, sem a abolição do exército permanente, etc., acarreta o mesmo perigo, e mesmo maior, do que a nacionalização. Daí que eu insista na colocação destes «se», tão injustamente condenados por Plekhanov.
Assim, pois, os camponeses não aceitarão a municipalização. O camarada Kartvelov dizia que os camponeses do Cáucaso estão completamente de acordo com os socialistas revolucionários, mas perguntam se terão direito a vender a terra que lhes couber durante a repartição ou a socialização. Isso mesmo, camarada Kartvelov! Sua observação corresponde integralmente aos interesses camponeses em geral e à noção que os camponeses têm de seus interesses; mas justamente porque os camponeses julgam toda transformação agrária do ponto-de-vista de se terão direito a vender a terra suplementar que corresponderá a eles, justamente por isto, os camponeses estarão de forma indubitável contra a municipalização, contra a «zemstvolização». Os camponeses continuam confundindo até agora os zemstvos com os «zemskie natchalniki», e têm para isto fundamentos muito mais profundos do que supõem os majestosos professores de Direito democrata-constitucionalistas, que zombam da ignorância camponesa. Por isso, antes de falar na municipalização, é imprescindível, absolutamente imprescindível, que se fale na eleição dos funcionários pelo povo. Agora, enquanto não foi satisfeita ainda esta reivindicação democrática, é oportuno falar unicamente em confisco em geral ou em repartição. Eis por que, a fim de simplificar a questão fundamental para o congresso, procedo da seguinte forma: como o programa do camarada Borisov tem uma série de traços comuns com o meu e se baseia exatamente na repartição e não na nacionalização, retiro meu programa e deixo ao congresso que decida a questão sobre repartição ou municipalização. Se for rechaçada a repartição — ou talvez seja melhor dizer «quando» for rechaçada a repartição — então, naturalmente, terei que retirar meu projeto de maneira definitiva, por não existir a possibilidade de que seja aceito; mas se for aceita a repartição, apresentarei meu programa integral como emenda ao projeto do camarada Borisov. Em resposta à crítica de que imponho aos camponeses a nacionalização, recordarei, também, que em meu programa existe a «variante A», na qual se fala de modo especial em eliminar todo pensamento de impor qualquer coisa aos camponeses contra a sua vontade. Portanto, a substituição de meu projeto pelo de Borisov durante a votação inicial não mudará absolutamente em nada a essência da questão e apenas facilitará e simplificará a tarefa de esclarecer a autêntica vontade do congresso. A meu ver, a municipalização é errônea e daninha; a repartição é errônea, mas não daninha.
Analisarei brevemente esta diferença: os defensores da repartição interpretam justamente os fatos, mas não recordam as palavras de Marx sobre o velho materialismo: «os filósofos não fizeram mais do que interpretar de diversas maneiras o mundo, mas o de que se trata é de transformá-lo», O camponês diz: «a terra não é de Deus, a terra é do povo, a terra não é de ninguém». Os defensores da repartição nos explicam que o camponês diz isto inconscientemente, que diz uma coisa e pensa outra. As verdadeiras aspirações dos camponeses, dizem, consistem plena e exclusivamente em dar mais terra aos camponeses, em aumentar a pequena exploração, e nada mais. Tudo isto é inteiramente justo. Mas nossa divergência com os defensores da repartição não termina aqui, pelo contrário, é aqui que começa. Exatamente estas palavras dos camponeses, apesar de toda a sua inconsistência ou insubstancialidade econômica, devem ser aproveitadas por nós como instrumento para propaganda. Dizem que todos devem desfrutar da terra? Querem entregar a terra ao povo? Magnífico, mas que significa entregar a terra ao povo? Quem dispõe do patrimônio e dos bens do povo? Os funcionários, os Trepov. Querem entregar a terra a Trepov e aos funcionários? Não. Todo camponês dirá que não quer dar a terra a eles. Querem entregar a terra aos Petrunkevitch e aos Roditchev, que farão parte da administração municipal autônoma? Não. O camponês seguramente não quererá entregar a terra a estes senhores. Portanto — nós explicaremos aos camponeses —, para que a terra possa ser entregue a todo o povo com proveito para os camponeses, é necessário que seja garantida a eleição de todos os funcionários, sem exceção, pelo povo. Por conseguinte, meu projeto de nacionalização, condicionada pela garantia completa da república democrática, oferece exatamente a linha de conduta acertada a nossos propagandistas e agitadores, mostrando-lhes com clareza e eloquência que a análise das reivindicações agrárias apresentada pelos camponeses deve servir de base para a propaganda política e, em particular, para a propaganda republicana. O camponês Michin, por exemplo, que foi eleito deputado à Duma representando os camponeses de Stravopol, trouxe um mandato dos seus eleitores, que foi publicado na íntegra no jornal Russkoe Gusodarstvo. Neste mandato se exige a supressão dos funcionários dos zemstvos, a construção de silos e a entrega de toda a terra ao Tesouro. A reivindicação desta entrega é, sem dúvida alguma, um preconceito reacionário, pois o Tesouro da Rússia de hoje e da Rússia constitucional de amanhã é o Tesouro do despotismo policial e militar; mas não devemos rechaçar meramente esta reivindicação como preconceito nocivo, e sim devemos «nos agarrar» a ela para explicar a Michin e seus semelhantes qual é a realidade das coisas. Temos de dizer a Michin e seus semelhantes que a reivindicação de entregar a terra ao Tesouro expressa, embora muito mal, uma ideia extraordinariamente importante e útil para os camponeses. A entrega da terra ao Tesouro pode ser e será muito útil aos camponeses apenas quando o Estado se converter numa república verdadeiramente democrática, quando se aplicar por completo o caráter eletivo dos funcionários, quando for abolido o exército permanente, etc. Por todos estes motivos, penso que se a nacionalização for rechaçada pelo congresso, isto originará inevitavelmente os mesmos erros de nossos militantes dedicados ao trabalho prático, propagandistas e agitadores, suscitados por nosso programa errôneo de 1903 com seu artigo sobre as parcelas. Da mesma forma com que então foi interpretado nosso artigo sobre as parcelas com um critério mais estreito do que o que possuíam os autores deste ponto, negar agora a nacionalização e substituí-la pela repartição, sem falar na municipalização, completamente confusa, conduzirá a tal série de erros de nossos militantes dedicados ao trabalho prático, propagandistas e agitadores, que muito logo teremos que lamentar o fato de ter adotado o programa «reparticionista» ou municipalizador.
Termino repetindo uma vez mais minhas duas teses fundamentais: primeira, os camponeses jamais quererão a municipalização; segunda, sem a república democrática, sem a eleição dos funcionários pelo povo, a municipalização é prejudicial.
Notas de fim de tomo:
(1) John: pseudônimo do menchevique F. Maslov. (retornar ao texto)