Fim à negligência dos problemas da mulher Negra

Claudia Jones

Junho de 1949


Primeira publicação: Political Affairs, National Women’s Comission (CPUSA), junho de 1949.

Fonte para a tradução: Jones, Claudia, "An end to the neglect of the problems of the Negro woman!" (1949). PRISM: Political & Rights Issues & Social Movements. 467.

Tradução: Jorge Fonseca de Almeida.

HTML: Lucas Schweppenstette.


Um aspeto notável do estádio atual do movimento de libertação Negro é o crescimento da participação militante de mulheres Negras em todas as frentes da luta pela Paz, pelos direitos civis, e pela segurança económica. Sintomática desta nova militância é o facto de que as mulheres Negras se terem tornado símbolos de muitas lutas atuais do povo Negro. Este crescimento da militância das mulheres Negras tem um significado profundo, tanto para o movimento de libertação Negro como para a coligação antifascista e anti-imperialista emergente.

Perceber corretamente esta militância, para aprofundar e ampliar o papel das mulheres Negras na luta pela Paz e por todos os interesses da classe operária e do povo Negro, significa em primeiro lugar ultrapassar a grosseira negligência dos problemas específicos da mulher Negra. Esta negligência tem permeado, há demasiado tempo, as fileiras do movimento sindical em geral, da Esquerda-progressista, e também do Partido Comunista. Uma rigorosa avaliação deste falhanço dos progressistas, especialmente dos marxistas-leninistas, é absolutamente necessária se queremos acelerar este desenvolvimento e integrar as mulheres Negras no movimento sindical progressista e no nosso próprio Partido.

A burguesia tem medo da militância das Mulheres Negras, e com boas razões para isso. Os capitalistas sabem, muito melhor do que muitos progressistas parecem saber, que uma vez que as Mulheres Negras se lancem na luta, a militância de todo o povo Negro será fortemente reforçada e, por essa via, reforçada a militância da coligação anti-imperialista,

Historicamente a Mulher Negra tem sido a guardiã, a protetora da família Negra. Desde os dias dos traficantes de pessoas escravizadas até ao presente, a mulher Negra tem tido a responsabilidade de, numa atmosfera de terror, de linchamentos, de segregação e de brutalidade policial, cuidar das necessidades da família, de a proteger militantemente dos golpes e dos insultos do regime de Jim-Crow(1), de cuidar das crianças e de lutar pela educação dos filhos. A intensificação da opressão dos Negros, que tem sido a marca da ofensiva reacionária no pós-guerra, não pode deixar de levar à aceleração da militância das mulheres Negras. A mulher Negra, como mãe, como Negra, como operária, luta contra a aniquilação da família Negra, contra a vida nos guetos do regime de Jim-Crow que destroem a saúde, a moral, e a própria vida de milhões das suas irmãs, irmãos e crianças.

Visto a esta luz, não é de estranhar que a burguesia americana tenha intensificado a sua opressão, não apenas dos Negros em geral, mas das Mulheres Negras em particular. Nada desmascara melhor o impulso na direção de uma fascização da nação do que a insensível atitude que a burguesia demonstra e cultiva em relação às Mulheres Negras. A ostentação vangloriosa dos ideólogos dos Grandes Negócios de que a Mulher americana goza “da maior igualdade” do mundo fica desmascarada em toda a sua hipocrisia quando vemos em muitas partes do mundo, particularmente na União Soviética, nas Novas Democracias, e nas terras anteriormente oprimidas da China que as mulheres estão a atingir novos cumes em termos de igualdade. Mas acima de tudo as gabarolices de Wall Street não vão longe no que se refere às mulheres Negras e às mulheres da classe operária. Nenhuma igualdade mas antes aviltamento e superexploração: tal é a verdadeira sorte das mulheres Negras.

Atentemos na hipocrisia da Administração Truman, que se gaba de “exportar a democracia pelo mundo” enquanto o Estado da Geórgia mantém uma mulher Negra viúva, mãe de doze filhos, presa com ferrolhos. O seu crime? Defender – ajudada por dois dos seus filhos –a sua vida e a sua dignidade dos ataques dos “supremacistas brancos”. Ou consideremos o mudo silêncio do Departamento de Estado relativamente à Sra. Amy Mallard, viúva de um professor Negro linchado na Geórgia porque comprou um Cadillac

Novo o que na opinião dos supremacistas brancos o tornou “demasiado insolente”. Contrastem estas atitudes com as lagrimas de crocodilo vertidas pela delegação americana às Nações Unidas pelo Cardeal Mindszenty, colaborador dos inimigos da República Popular Húngara que pretendiam entravar a marcha dos, anteriormente oprimidos, operários e camponeses da Hungria em direção a uma democracia mais ampla. Muito recentemente, o Presidente Truman falou solicitamente na Proclamação do Dia da Mãe sobre o nosso “amor e reverência” para com todas as mães da nação. O denominado “amor e reverência” pelas mães da nação de não inclui, de nehuma forma, as mulheres Negras que ousam lutar resistir aos linchamentos e à violência dos supremacistas brancos, como Rosa Lee Ingram, como as mulheres dos Seis de Trenton(2), ou como muitas outras incontáveis vitimas.

DIFICULDADES ECONOMICAS

Muito pelo contrário, as mulheres Negras – como operárias, como Negras e como mulheres – são o extrato mais oprimido de toda a população.

Em 1940, duas em cada cinco mulheres Negras, contrastando com duas em oito mulheres brancas, trabalhavam para sobreviver. Em virtude do seu estatuto maioritário entre o povo Negro, as mulheres Negras não só constituem a maior percentagem de mulheres chefe de família, como são o principal sustento das famílias Negras. A grande proporção de mulheres Negras no mercado de trabalho é consequência dos baixos salários dos homens Negros. Esta desproporção também tem origem no tratamento e na posição das mulheres Negras ao longo dos séculos.

Depois da emancipação, e até aos nossos dias, uma grande percentagem das Mulheres Negras – quer solteiras quer casadas – foram forçadas a trabalhar para sobreviver. E apesar das mudanças dos empregos rurais para os urbanos as Mulheres Negras estão na generalidade confinadas aos empregos com os salários mais baixos. O secretariado das Mulheres do Departamento do Trabalho dos Estados Unidos na sua publicação Manual de Factos sobre o Emprego das Mulheres(3) (1948, Boletim número 225) mostra que as trabalhadoras brancas têm um rendimento mediano mais de duas vezes superior ao das mulheres não-brancas (maioritariamente Negras) e que as trabalhadoras não-brancas ganham menos de $500 por ano! No sul rural as Mulheres Negras ganham ainda menos. Em três comunidades industriais do Norte o rendimento mediano das famílias brancas ($1.720) é quase 60% superior ao das famílias Negras ($1.095). A super-exploração da mulher Negra revela-se não apenas por ela receber menos, enquanto mulher, menos do que o mesmo salário do que os homens, mas também porque a grande maioria das mulheres Negras recebem menos de metade do que as mulheres brancas. Não admira, assim, que nas comunidades Negras as condições de vida nos guetos – baixos salários, rendas elevadas, elevado custo de vida – se transformem numa cortina de ferro confinando as vidas das crianças Negras e minando a sua saúde e o seu espírito. Não admira que a taxa de mortalidade das mulheres Negras no parto seja três vezes maior do que a das Mulheres brancas! Não admira que uma em cada 10 crianças Negras não atinja a idade adulta!

Os baixos salários da Mulher Negra são o resultado da sua exclusão de praticamente todos os tipos de trabalho com exceção dos mais servis e mais mal pagos, nomeadamente o serviço doméstico. Reveladores são os seguintes dados publicados no relatório de 1945 Mulheres Negras nas Industrias de Guerra(4) (Secretariado das Mulheres do Departamento do Trabalho, Boletim 205): de um total de 7 milhões e meio de mulheres Negras mais de um milhão estão no serviço doméstico ou nos serviços pessoais. A grande maioria destas mulheres – cerca de 918.000 – são empregadas de famílias privadas e cerca de 98.000 trabalham como cozinheiras, empregadas de mesa, e serviços similares fora do serviço doméstico. Das restantes, 60.0000 mulheres Negras trabalham numa miscelânea de ocupações de serviços pessoais (esteticistas, empregadas de hotéis e estalagens, empregadas da limpeza de empresas e instituições, assistentes de enfermagem, operadoras de elevadores, etc.).

A segunda grande categoria de empregos das mulheres Negras é na agricultura. Em 1940 existiam cerca de 245.000 trabalhadoras agrícolas. Das quais 128.000 em trabalho familiar rural não pago.

Operárias e outras trabalhadoras somam mais de 96.000 das mulheres Negras incluídas no relatório. Trinta e seis mil destas mulheres trabalhavam na indústria, sendo o grupo principal constituído por 11.300 mulheres na indústria do vestuário e na produção de outros produtos têxteis, 11.000 nas indústrias tabaqueiras e 5.600 nas indústrias agroalimentares.

Nos trabalhos de escritório e similares totalizavam apenas 13.000. Existiam apenas 8.300 mulheres Negras como funcionárias públicas.

As restantes mulheres Negras que trabalham para viver distribuíam-se ao longo das seguintes linhas: professoras, 50.000; enfermeiras e aprendizes de enfermeira, 6.700; assistentes sociais e da segurança social, 1.700; dentistas, farmacêuticas e veterinárias, 120; médicas e cirurgiãs, 129; atrizes, 200; autoras, editoras e repórteres, 100; advogadas e juízes, 39; bibliotecárias, 400; e outras categorias que como estas ilustram a exclusão em larga-escala das mulheres Negras das Profissões Liberais.

Durante a guerra contra o Eixo, as mulheres Negras, pela primeira vez na História, tiveram uma oportunidade de usar as suas capacidades e talentos em atividades para além do serviço doméstico. Elas tornaram-se pioneiras em muitos campos. Contudo, desde o fim da guerra, esta situação deu lugar ao desemprego crescente, com o despedimento massivo das mulheres Negras especialmente nas indústrias de base.

Este processo foi intensificado com o desenvolvimento da atual crise económica. Hoje as mulheres Negras estão a ser forçadas, em massa, a regressar ao trabalho doméstico. No Estado de Nova York, por exemplo, esta tendência foi recentemente oficialmente confirmada quando Edward Corsi, Comissário do Departamento de Estado do Trabalho, revelou que pela primeira vez desde a guerra existem empregadas domésticas facilmente disponíveis. De facto Corsi admitiu que as mulheres Negras não estão a deixar voluntariamente os seus empregos, mas pelo contrário estão a ser, de forma sistemática, empurradas para fora da indústria. O desemprego, que sempre atingiu a mulher Negra em primeiro lugar e com maior intensidade, e o elevado custo de vida são os fatores que estão hoje a empurrar as mulheres Negras a voltar ao trabalho de empregadas domésticas. A acompanhar esta tendência existe uma campanha ideológica que procura apresentar o serviço doméstico como apetecível. Todos os dias surgem anúncios que que propagandeiam o argumento de que a maioria das empregadas domésticas que se oferecem para este trabalho através da U.S.E.S (Serviço de Emprego dos Estados Unidos) “preferem este tipo de emprego, ao trabalho na indústria” e promovem as “virtudes” do trabalho doméstico, especialmente o das empregadas internas.

A opressão especial que a mulher Negra enfrenta como Mulher, como Negra e como Trabalhadora está inseparavelmente associada à questão das suas oportunidades laborais. Ela é vítima do chauvinismo branco nomeadamente dos estereótipos sobre que posição deve ocupar. Nos filmes, na rádio, na imprensa a mulher Negra não é apresentada no seu verdadeiro papel de sustento da família, de mãe e protetora da família, mas como a tradicional “amazinha”(5) que coloca o cuidado e atenção das crianças de terceiros acima do das suas próprias crianças. Este estereótipo tradicional da mãe escrava Negra, que até hoje surge nos anúncios comerciais, deve ser rejeitado e combatido como uma forma do imperialistas perpetuarem a ideologia chauvinista branca da mulher Negra como “atrasada”, “inferior” e como uma “escrava natural” dos outros.

ASPECTOS HISTÓRICOS

Na realidade, a história da mulher Negra mostra que sob a escravatura a mãe Negra tinha a posição-chave e o papel dominante no seu agrupamento familiar. Isto deveu-se principalmente a dois fatores: as condições da escravatura, sob as quais o casamento como tal não existia levando a que o estatuto social dos Negros fosse devido à posição da mãe e não à do pai; e no facto de que a maioria dos Negros trazidos para estas costas pelos esclavagistas vinha da África Ocidental onde a posição da Mulher, baseada na sua participação ativa no controlo da propriedade, era relativamente mais importante no seio da família do que o da mulher branca.

Os primeiros historiadores do trafego esclavagista relembram o testemunho de viajantes indicando que o amor das mães africanas pelos seus filhos era inultrapassável em nenhuma outra parte do mundo. Existem numerosas histórias que atestam o autossacrifício de muitas mães que se ofereceram para serem levadas pelos esclavagistas para salvarem os seus filhos; durante os períodos de fome as mulheres Hottentot recusavam-se a comer antes dos seus filhos serem alimentados.

É impossível, no âmbito deste artigo, relatar os sofrimentos terríveis e a humilhação por que passaram as Mães Negras e em geral as mulheres Negras sob o regime da escravatura. Sujeitas a violações legais por parte dos donos de escravos, confinadas nas conchas de escravos(6), forçadas a caminhar entre oito a catorze horas por dia com cargas às costas, obrigadas a fazer trabalhos pesados durante a gravidez, as mulheres Negras desenvolveram um ódio ardente contra a escravatura e carregaram uma grande parte da responsabilidade da defesa e do acalento da família Negra.

A mulher Negra era senhora na cabana da escravatura e, apesar da interferência do senhor e do capataz, a sua vontade no que se refere ao acasalamento e aos assuntos de família eram soberanos. Durante e depois da escravatura as mulheres Negras tiveram de se suportar a si próprias e aos seus filhos. Tendo um papel importante na vida económica e social do seu povo, a mulher Negra teve necessariamente de se tornar autodidata em independência, coragem e altruísmo(7).

Existem provas documentais, de grande interesse, de que a vida familiar e social e a consciência política dos homens e mulheres Negros sofreu importantes transformações depois da emancipação. Um libertado observou, durante a Guerra Civil, que muitos homens se tornaram excessivamente zelosos da sua recentemente adquirida autoridade em assuntos familiares e que insistiam no reconhecimento da sua superioridade em relação às mulheres. Depois da guerra civil as acomodações coletivas de escravos foram abolidas e as casas dos rendeiros espalharam-se pelas antigas plantações para que cada família pudesse ter uma existência independente. O movo arranjo económico, a alteração do modo de produção, colocou o homem Negro numa posição de autoridade em relação à sua família. A compra de herdades também ajudou a consolidar a autoridade masculina.

Assim, um antigo escravo, que começou a vida de pessoa livre numa quinta de “um cavalo”, com a mulher a trabalhar como lavadeira e que mais tarde arrendou terra e contratou dois homens recorda o orgulho que sentiu do seu novo estatuto: “No meu modesto palácio na colina do bosque, sob a sombra dos pinheiros altos e dos robustos carvalhos, senti-me como um rei cujo comando supremo, era como”a Lei e Bíblia” para os meus súbditos”.

Devemos ver aqui em ação um duplo motivo. Relativamente à sua mulher e filhos, o Homem Negro era agora capaz de assumir autoridade económica e outros tipos de autoridade sobre a família; mas ele podia também lutar contra a violação das mulheres do seu grupo quando antes estava impotente para o fazer.

A fundação da Igreja Negra, que desde o início ficou sob o domínio dos homens, também ajudou a confirmar a autoridade dos homens no seio da família. A bíblia sancionava a ascendência do homem, o que para muitos era a autoridade suprema nestas questões.

Através destes e de outros métodos a subordinação da mulher Negra foi-se desenvolvendo. Em alguns casos em vez de emancipar a sua mulher e os seus filhos, o marido consentia em manter o estatuto de escravos destes. Em muitos casos a Lei do Estado proibia o escravo emancipado depois de certa data de permanecer no Estado. Assim a única possibilidade para muitas mulheres e crianças de se manterem nas suas casas era continuando com estatuto de “escravas” dos seus familiares.

Em alguns casos as mulheres Negras recusaram-se a tornar-se subordinadas da autoridade dos homens. Desafiando a autoridade dos seus maridos que queriam continuar a viver nas plantações dos seus antigos donos, muitas mulheres Negras pegaram nos seus filhos e foram-se embora.

AS MULHERES NEGRAS NAS ORGANIZAÇÕES DE MASSAS

Este breve relato de alguns aspetos da História das Mulheres Negras, visto à luz do facto de que uma elevada percentagem de mulheres Negra ser hoje obrigada a ganhar parte ou a totalidade do sustento familiar, ajuda-nos a perceber porque é que a mulher Negra tem o papel mais ativo na vida económica, social e política da comunidade Negra de hoje. Aproximadamente 2.500.000 Mulheres Negras estão organizadas em fraternidades e organizações sociais e políticas. As mais proeminentes organizações são a Associação Nacional das Mulheres Negras, o Conselho Nacional das Mulheres Negras, a Federação Nacional dos Clubes de Mulheres, a Divisão Feminina do Comité das Liberdades Civis do Elk, a Associação das Esteticistas de Cor, a Liga Nacional das Empresarias Negras e a Associação Nacional das Enfermeiras Graduadas de Cor. A Associação Nacional das Mulheres Negras, com 75.000 membros é a organização com maior número de associados. Há inúmeras irmandades e inúmeros comités de mulheres das igrejas de todas as denominações, bem como organizações das mulheres descendentes das caraíbas. Em algumas áreas as organizações locais do NAACP(8) têm Divisões de Mulheres e recentemente a Liga Urbana Nacional criou, pela primeira vez na História, uma Divisão de Mulheres.

As mulheres Negras são a verdadeira força ativa – as dirigentes e as militantes – de todas as organizações e instituições do povo Negro. Estas organizações têm um papel diversificado preocupando-se com todas as questões relativas à vida económica, social e política do povo Negro e particularmente da família Negra. Muitas destas organizações estão intimamente preocupadas com os problemas da juventude Negra, providenciando e gerindo bolsas de estudo, dando apoio às escolas e a outras instituições e oferecendo serviços comunitários. A luta pela educação superior, com vista a quebrar o regime de Jim Crow nas universidades e escolas superiores, foi simbolizada o ano passado pela brilhante estudante Negra Ada Lois Sipuel(9) do Oklahoma.

As opiniões desdenhosas, expressas por vezes” de que as organizações de Mulheres Negras se preocupam apenas com a “caridade” devem ser denunciadas como expressões chauvinistas, embora subtis, não só porque o mesmo se poderia dizer de muitas organizações feministas de mulheres brancas, mas essencialmente porque tais atitudes não reconhecem o caracter especial das organizações das mulheres Negras. Essa abordagem não reconhece o papel fundamental que as Mulheres Negras têm nestas organizações, que para lá das suas funções específicas, procuram prestar o apoio social que, como resultado do sistema de Linchamentos e de leis de Jim Crow, é negados aos jovens Negros nos Estados Unidos.

A MULHER NEGRA TRABALHADORA

A pequena participação da mulher Negra nos círculos sindicais e progressistas é, assim, ainda mais surpreendente. Em sindicato atrás de sindicato, mesmo naqueles sindicatos em que existe uma grande concentração de mulheres Negras, encontramos muito poucas mulheres Negras como dirigentes sindicais ou como trabalhadoras ativas sindicalmente. As grandes exceções a esta situação são o Sindicato dos Trabalhadores da Alimentação e Tabaco e o Sindicato dos Empregados de Escritório.

Por que é que estes dois casos devem ser exceções? As mulheres Negras estão entre as mais ativas sindicalistas. As greves dos trabalhadores rurais dos anos 30 foram lideradas e inspiradas por mulheres Negras. Sujeitas ao terror dos donos das terras e dos supremacistas brancos elas travaram lutas magníficas ao lado dos homens Negros e dos progressistas brancos nessa grande tradição de luta liderada pelo Partido Comunista. Na época anterior à fundação do CIO(10) as mulheres Negras tiveram um papel magnífico, quer como operárias quer como mulheres dos operários, nas greves e nas lutas pelo reconhecimento do direito à sindicalização em setores como a indústria a automóvel, a siderurgia, embalagens, etc.. Mais recentemente a militância sindical das mulheres Negras revelou-se na greve dos matadouros e, ainda mais, na greve dos trabalhadores dos tabacos – nas quais lideres como Moranda Smith(11) e Velma Hopkins(12) emergiram como sindicalistas excecionais. A luta dos operários da indústria dos tabacos liderada por mulheres Negras fundiu-se mais tarde com a ação política dos Negros e dos brancos que levou à eleição do primeiro Negro no Sul desde a época da Reconstrução (em Winston-Saleem, Carolina do Norte).

É obrigação dos sindicalistas progressistas perceber que na luta por direitos iguais para os trabalhadores Negros, é necessário ter uma abordagem especial dirigida às mulheres Negras, as quais são o sustento das suas famílias, em maior proporção do que as outras mulheres trabalhadoras. A luta por manter a mulher Negra na indústria e pela elevação do seu estatuto na profissão é uma forma essencial de luta pelos interesses básicos e específicos da mulher Negra trabalhadora. Não reconhecer este facto é não ver os aspetos específicos da crescente crise económica que está a penalizar com redobrada severidade os trabalhadores Negros, particularmente as mulheres Negras trabalhadoras.

TRABALHADORA DOMÉSTICA

Uma das mais grosseiras manifestações da negligência dos sindicatos relativamente aos problemas da mulher Negra trabalhadora tem sido a sua demissão, não só de lutar contra o rebaixamento da mulher Negra para o trabalho doméstico e para outros trabalhos servis, mas também o de não organizar sindicalmente o trabalho doméstico. É completa hipocrisia dos sindicalistas progressistas falarem em organizar os trabalhadores não organizados sem olharem para a condição dramática das trabalhadoras domésticas, as quais, sem proteção de um contrato coletivo, também estão excluídas de toda a legislação laboral e social. Apenas uma em cada dez mulheres Negras trabalhadoras domésticas está abrangida pela atual legislação relativa ao salário apesar de cerca de um quarto destas mulheres se encontrem em Estados que possuem legislação relativa ao salário mínimo. Todos os argumentos até agora apresentados sobre a dificuldade de organizar as trabalhadoras domésticas – tais como a natureza “informal” do seu trabalho, a dificuldade de organizar trabalhadoras a dias, o problema de organizar pessoas que são internas, etc. – devem ser ultrapassados sem demora. Se os progressistas não agirem com rapidez, existe o perigo de que as forças Social-democratas possam entrar neste campo, fazendo o seu trabalho de espalhar a divisão e a demagogia.

A maioria das trabalhadoras domésticas vive em condições de miséria insuportável. Normalmente não existe uma definição das tarefas que tem de executar na casa onde trabalha. Às trabalhadoras para além das tarefas de limpar e de esfregar podem-lhe ser exigidas outras tarefas como lavar as janelas, cuidar das crianças, cozinhar, etc, etc. e tudo pelo mais baixo salário. Em alguns lugares, a trabalhadora doméstica mulher Negra deve ainda sofrer a indignidade adicional de ter de procurar emprego nos mercados de rua, autênticos “mercados de escravatura”, onde as licitações são feitas, como nos leilões de pessoas escravizadas, pelas trabalhadoras mais árduas. Muitas trabalhadoras domésticas quando regressam a casa devem recomeçar o trabalho doméstico para manter a sua casa de família.

Quem não ficou furioso quando se soube que na Califórnia que uma mulher Negra foi escravizada por mais de quarenta anos, no hediondo caso de Dora Jones? Isto na América “civilizada”. O seu “patrão” foi condenado a uma sentença mínima de alguns anos de cadeia e mesmo assim queixou-se que era uma pena por “um tão longo período de tempo”. Mas poderá Dora Jones, a mulher Negra trabalhadora doméstica, ser alguma vez ressarcida pelos de quarenta anos da sua vida vividos sob tais condições de exploração e de aviltamento? E, em diversos graus, quantos casos semelhantes ao de Dora Jones são ainda tolerados pelos próprios progressistas?

Ainda recentemente foram feitas propostas na Camara Legislativa do Estado de Nova Iorque para “tirar” as impressões digitais às empregadas domésticas. A Lei Martinez não chegou a ver a luz do dia porque os reacionários se estavam a concentrar noutras medidas legislativas repressivas; mas vemos aqui a marca do sistema de “passes” implementado pelo Imperialismo Britânico em África (e pelo Reich Alemão relativamente aos judeus), a tentar ser usado contra as empregadas domésticas.

É obrigação dos sindicalistas ajudar de todas as formas possíveis o Sindicato das Empregadas Domésticas a levar a cabo a sua tarefa de organizar as empregadas domésticas exploradas, a maioria das quais são mulheres Negras. Simultaneamente, é vitalmente urgente e necessária, uma luta por incluir as empregadas domésticas nos benefícios da Segurança Social. Também aqui as questões recorrentes sobre os “problemas administrativos” da aplicação da lei às empregadas domésticas devem ser desafiadas e combatidas e encontradas soluções.

O contínuo rebaixamento das mulheres Negras para o trabalho doméstico tem ajudado a perpetuar e a intensificar o chauvinismo dirigido contra todas as mulheres Negras. Mesmo quando já são avós ou mães, o termo chauvinista “menina” é a expressão comummente usada para designar as mulheres Negras adultas. A própria relação económica entre as mulheres Negras e as mulheres brancas, que perpétua as relações “senhora-criada”, alimenta as relações chauvinistas e torna necessário que as mulheres brancas progressistas, particularmente as comunistas, lutem conscientemente contra todo o chauvinismo branco quer ele seja descarado ou subtil.

O chauvinismo por parte das mulheres brancas progressistas expressa-se muitas vezes pela incapacidade de manter fortes laços de amizade com mulheres Negras e pela incapacidade de perceber que a luta pela igualdade da mulher Negra é do seu próprio interesse, mais não seja porque a superexploração e opressão da mulher Negra tende a reduzir os padrões para todas as mulheres. Demasiadas progressistas, e até algumas comunistas, são também culpadas de explorar as Mulheres Negras empregadas domésticas recusando-se a contratá-las através do Sindicato das Empregadas Domésticas (ou recusando-se a ajuda-lo a expandir-se para as áreas onde ainda não existe). Genericamente são também culpadas de contribuir para caluniar as “empregadas” quando falam com as suas vizinhas burguesas ou com as suas próprias famílias. E, depois, exprimem a “preocupação” que a empregada Negra explorada não “fala”, ou que não é “amigável”, com a sua patroa, e têm o hábito de assumir que o dever da patroa progressista é o de “informar” a mulher Negra da sua condição de explorada e oprimida, condição que ela indubitavelmente conhece intimamente. Se queremos derrubar a compreensível desconfiança das mulheres Negras que são repelidas pelo chauvinismo branco que encontram, muitas vezes, entre os círculos progressistas, é absolutamente necessário desafiar, de forma persistente, todos os comentários chauvinistas relativamente às mulheres Negras,

MANIFESTAÇÕES DO CHAUVINISMO BRANCO

Podemos, muitas vezes, encontrar algumas das mais grosseiras expressões de chauvinismo nas relações mundanas em situações em que que homens brancos, mulheres brancas e homens Negros dançam uns com os outros mas as mulheres Negras são postas de parte. A aceitação dos padrões da classe dominante branca sobre a “desejabilidade” das mulheres (tais como pele clara), a não extensão da cortesia às mulheres Negras, bem como a incapacidade de integrar as mulheres Negras na liderança organizacional são outras formas de chauvinismo.

Outro odioso aspeto da opressão Jim-Crow das Mulheres Negras expressa-se nas numerosas Leis que são dirigidas contra ela relativamente aos direitos de propriedade, intercasamento (originalmente criadas para impedir os homens brancos de casar com mulheres Negras no Sul) - e leis que dificultam ou impedem o direito de escolha não só das mulheres Negras mas também dos homens Negros e dos homens e mulheres brancas.

Para os homens e mulheres progressistas brancos, especialmente para os comunistas, as questões do relacionamento mundano com os homens e Mulheres Negros é uma questão de estrita adesão ao princípio da igualdade social. Isto significa libertarmo-nos das posições que, algumas vezes, levam certos progressistas e Comunistas a lutar por assuntos económicos e sociais que afetam o povo Negro mas a “traçar uma linha” no que respeita ao relacionamento pessoal e ao casamento inter-racial. Quando estes temas surgem colocar a questão como “pessoal” e não como política é ser-se culpado do pior tipo de Social-democratismo e de pensamento liberal burguês relativamente à questão Negra na vida americana; é ser-se culpado de absorver as venenosas “teorias” chauvinistas brancas de um Bilbo(13) ou de um Rankin(14). O mesmo se passa com a garantia da “segurança” das crianças. Esta segurança só pode ser melhorada através da luta pela libertação e igualdade de todas as nações e povos, e não através de esconder das crianças o conhecimento sobre estas lutas. Isto significa libertarmo-nos das atitudes liberais-burguesas que “permite” que as crianças brancas e Negras brinquem juntas nos acampamentos mas traça um limite quando as crianças atingem a adolescência e começam a estabelecer relações rapaz-rapariga.

Certamente que, os ideólogos burgueses não se esqueceram de desenvolver uma ofensiva ideológica especifica para rebaixar as mulheres Negras integrada na ofensiva ideológica reacionária mais geral contra as mulheres baseada na ideia de “cozinha, crianças e igreja”. Contudo, eles não podem com equanimidade e credibilidade dizer que o “lugar” da mulher Negra seja no lar já que as mulheres Negras estão nas cozinhas de outras pessoas. Daí que a sua tarefa tenha sido de intensificar as suas teorias da superioridade masculina relativamente à mulher Negra desenvolvendo atitudes introspetivas que coincidem com a “nova escola” da “inferioridade psicológica” das mulheres. A intensão de todo um conjunto de artigos, livros, etc. tem sido o de obscurecer a responsabilidade principal pela opressão da mulher Negra espalhando a apodrecida noção burguesa sobre “a guerra dos sexos” e “ignorando” a luta conjunta dos homens e mulheres Negros – a totalidade do povo Negro – contra o seu opressor comum, a classe dominante branca.

As expressões do chauvinismo também incluem a surpresa paternalista quando descobrem que os Negros também ocupam profissões liberais. As mulheres Negras profissionais confrontam-se, muitas vezes, com observações do tipo “A sua família deve estar orgulhosa de si”. E existe também a prática oposta de perguntar à mulher Negra profissional se “tem alguém na família” que precise de um emprego de empregada doméstica.

A responsabilidade conjunta por ultrapassar estas formas específicas de chauvinismo branco recai unicamente sobre os ombros dos homens e mulheres brancas e não, como é tantas vezes referido, sobre a “subjetividade” da mulher Negra. Os homens Negros tem uma especial responsabilidade em estripar atitudes de supremacia masculina relativamente às mulheres em geral. É necessário de remover todas as atitudes “humanistas” e paternalistas em relação às mulheres Negras. Numa comunidade, a dirigente sindicalista Negra, tesoureira da sessão do seu Partido, é-lhe sempre dito por uma mulher progressista branca “Dá-me o dinheiro, porque pode-te acontecer alguma coisa”. Noutra circunstância, a uma mulher Negra empregada doméstica que queria aderir ao Partido a patroa, uma Comunista, disse-lhe que era “demasiado atrasada” e que “não estava preparada” para aderir ao Partido. Ainda noutra comunidade, que desde o fim da guerra é habitada por 60% de Negros e 40% de brancos, as mães progressistas brancas manobraram de forma a tirar os seus filhos da escola local. Graças à iniciativa da responsável da sessão local do Partido, uma Mulher Negra iniciou-se uma luta que impediu que os arranjos que o diretor da escola, vergado aos preconceitos das mães e dele próprio, tinha estabelecido. Esses arranjos consistiam em criar uma turma especial em que algumas crianças brancas eram isoladas com alguns miúdos Negros selecionados e que fora designada como “turma experimental em relações raciais”.

Estas atitudes chauvinistas, particularmente as dirigidas à mulher Negra, são indubitavelmente uma causa importante da manifestamente insuficiente participação da mulher Negra em organizações progressistas e no nosso Partido quer como membros quer como dirigentes.

Devemos recordar-nos que a burguesia americana está consciente do papel, atual e potencial, das massas de Mulheres Negras e, por isso não hesita em premiar os Negros que traem o seu povo e que fazem a apologia do imperialismo.

Confrontada com a sua atitude insensível perante a mulher Negra, confrontada com os crescentes protestos contra os linchamentos impunes, e contra os linchamentos legais ao “estilo nortenho”, a Wall Street tem dado algumas posições simbólicas a um número reduzido de mulheres Negras. Assim, Anna Arnold Hedgeman(15), que teve um papel chave no Comité Nacional Democrático Negro para a Eleger Truman, foi recompensada com a nomeação como Assistente do Administrador de Segurança Federal Ewing. Assim, também o Governador Dewey nomeou Irene Diggs(16) para um alto cargo na Administração Pública do Estado de Nova Iorque.

Outro sinal demonstrativo das tentativas de esmorecer a militância das mulheres Negras foi o convite do Departamento de Estado ao Conselho Nacional das Mulheres Negras – a única organização Negra assim designada – para que uma representante sua fosse assistir à assinatura do Pacto Atlântico(17).

TEMAS CENTRAIS DA LUTA

As Mulheres Negras confrontam-se com muitos assuntos importantes em torno dos quais se podem e devem travar lutas.

Contudo, nenhum outro caso simboliza de forma tão dramática o estatuto de oprimida da Mulher Negra, do que o caso de Rosa Lee Ingram, mulher negra, viúva e mãe de catorze filhos – dos quais dois já falecidos – que, na Geórgia, corre o risco de prisão perpétua por se ter defendido dos avanços indecentes de um “supremacista branco”. O caso Ingram ilustra o estatuto oprimido da família Negra na América, camponeses sem-terra sujeitos às leis do regime Jim-Crow. O caso ilumina particularmente o aviltamento da mulher Negra sob a democracia burguesa americana que se vai movendo em direção ao fascismo e à guerra. Reflete os insultos diários a que as mulheres Negras estão sujeitas no espaço público, qualquer que seja a sua classe, estatuto ou posição. Expõe o alibi hipócrita dos linchadores de homens Negros que se têm escondido por trás das saias das mulheres brancas quando tentam encobrir os seus crimes com o “cavalheirismo” de proteger a virtude das mulheres brancas. Mas, hoje, as mulheres brancas, tal como as suas irmãs dos movimentos abolicionistas e sufragistas, devem estar à altura de desmascarar esta mentira e todo o sistema de opressão dos Negros.

A história americana está recheada de exemplos do custo – em termos dos direitos democráticos tanto dos homens tanto das mulheres – da recusa em travar esta luta. No início das suas lutas as sufragistas, quando eram presas foram, propositadamente, colocadas em celas juntamente com as prostitutas Negras para as “humilhar”. Elas tiveram a sabedoria de perceber que a intensão era a de criar uma situação tão dolorosa que nenhuma mulher se atrevesse a lutar pelos seus direitos se tivesse de enfrentar tais consequências. Mas foi a incapacidade histórica das líderes das mulheres sufragistas, saídas, como eram, predominantemente da burguesia e da pequena burguesia, que as levou a não fazer a ligação entre a sua luta e as lutas, pelos direitos democráticos plenos, travadas pelo povo Negro na sequência da emancipação.

Por isso, hoje, uma consciência progressista da questão da mulher não deve deixar de reconhecer que a questão Negra nos Estados Unidos é prévia, e não igual, à questão da mulher; e que apenas na medida em que lutamos contra o chauvinismo contra o povo Negro em todas as suas formas de expressão e ação e em que lutamos pela igualdade completa do povo Negro, é que podem as mulheres no seu conjunto fazer avançar a sua luta pela completa igualdade de direitos. Para o movimento progressista das mulheres, a mulher Negra, que agrega o seu estatuto de mulher, de Negra e de operária, é o elo essencial para esta consciência politica avançada. Mais, na medida em que a causa da mulher Negra Trabalhadora for promovida, ela poderá assumir o seu legítimo lugar na liderança proletária Negra do movimento de libertação nacional, e, pela sua participação ativa, contribuir para toda a classe operária americana, cuja missão histórica é a de construção da América Socialista – a última e completa garantia da emancipação da mulher.

A luta pela liberdade de Rosa Lee Ingram é um desafio a todas as mulheres brancas e a todas as forças progressistas que se devem interrogar: Por quanto tempo mais vamos permitir que este crime cobarde contra todas as mulheres, este crime contra os Negros, passe incolme? O caso de Rosa Lee Ingram, e o de todas as suas irmãs, também desafia todos os trabalhadores culturais progressistas a escrever e compor sobre a mulher Negra em toda a sua coragem e dignidade.

A recente criação do Comité Nacional para Libertar a Família Ingram, vem preencher uma necessidade à muito sentida desde o início do movimento que forçou a comutação da sentença inicial de pena de morte em pena de prisão perpétua. Este Comité Nacional, dirigido por Mary Church Terrell(18), uma das fundadoras da Associação Nacional das Mulheres de Cor, incluiu entre as suas líderes personalidades femininas proeminentes como Therese Robinson, Grande Diretora do Comité de Liberdades Civis dos Elks, Ada B. Jackson e a Dra Gene Weltfich(19).

Um dos primeiros passos do Comité consistiu em enviar uma delegação, composta de cidadãos Negros e brancos, visitar esta corajosa e militante mãe negra presa numa cela na Geórgia. O apoio a esta medida foi tão grande que as autoridades da Geórgia deixaram a delegação vê-la sem obstáculos. Contudo, a partir desse momento e em retaliação contra o movimento de massas em desenvolvimento as autoridades da Geórgia mudaram a Senhora Ingram, que sofre de problemas cardíacos, para uma penitenciária com piores condições em Reedsville.

Apoiar este comité tornou-se uma necessidade prioritária de todos os progressistas, especialmente das mulheres progressistas. O Presidente Truman tem de ser desmascarado da sua fingida posição de “não-sei-de-nada” sobre o caso Ingram. Para libertar os Ingram temos de congregar apoios para a campanha de recolha de um milhão de assinaturas para a petição e para a ação junto das Nações Unidas a apresentar em breve.

A luta pelo emprego para as mulheres Negras é um tema prioritário. A crescente crise económica, com o aumento do desemprego e dos cortes salariais e do número cada vez maior de despejos, está a recair pesadamente sobre as massas Negras. Nas comunidades Negras, umas atrás das outras, as Mulheres Negras, as últimas a serem contratadas e as primeiras a ser despedidas, são as que mais sofrem de desemprego. Devem desenvolver-se lutas pela contratação de Mulheres Negras nas indústrias de base, nas ocupações de colarinho branco, nas comunidades e nas empresas privadas de serviços públicos.

O sucesso da campanha do Partido Comunista na zona Leste de Nova Iorque pelo emprego de mulheres Negras nas lojas de conveniência levou à contratação de mulheres Negras em toda a cidade, mesmo nas comunidades predominantemente brancas. A campanha estendeu-se já à Nova Inglaterra e deve ser levada a outras localidades.

Perto de quinze agências governamentais não contratam Negros. Esta política dá um sancionamento oficial às políticas insidiosas do regime de Jim-Crow dos exploradores capitalistas, ao mesmo tempo que as encoraja ainda mais. Uma campanha para conquistar empregos para as Mulheres Negras nestas agências seria, então, um grande avanço da luta mais geral pelo emprego dos homens e das mulheres Negras. Esta campanha teria um forte efeito no desmascarar da hipocrisia do programa dos “Direitos Cívicos” da administração Truman.

Uma grande luta deve também ser travada contra a crescente prática do Serviço de Emprego dos Estados Unidos de desviar, apesar das suas qualificações para outros empregos, as mulheres Negras para o trabalho doméstico ou para os serviços pessoais.

Onde existe a consciência do papel especial da mulher Negra podem ser iniciadas lutas bem-sucedidas que terão o apoio dos trabalhadores brancos. Um exemplo recente é o da iniciativa tomada por trabalhadores comunistas brancos do setor do vestuário numa fábrica que emprega vinte e cinco mulheres Negras e onde havia três vagas para posições qualificadas. A questão de promoção de mulheres Negras tornou-se vital. Iniciou-se um movimento de boicote e as máquinas mantêm-se paradas até à altura em que escrevemos este texto, com os operários brancos a recusar a estrita antiguidade à custa das mulheres Negras. Entretanto continuam as negociações sobre este tema. Igualmente, numa fábrica da Packard em Detroit, a secção sindical local da U.A.W.(20) venceu recentemente uma luta pela manutenção de postos de trabalho para as mulheres nesta industria e pela promoção a postos mais qualificados de 750 mulheres, a maioria das quais Negras.

A LUTA PELA PAZ

Conquistar as mulheres Negras para a luta pela Paz é decisivo para todas as outras lutas. Mesmo durante a guerra contra o Eixo as mulheres Negras tiveram que chorar a morte dos seus filhos-soldados linchados no exército racista ao estilo Jim-Crow. Estarão elas, pois, desinteressadas da luta pela Paz?

As tentativas dos militaristas, de ambos os partidos, de obter o apoio das organizações de mulheres em geral influenciaram muitas organizações de mulheres Negras as quais, na sua última convenção, adotaram posições sobre política externa de apoio ao Plano Marshall e à Doutrina Truman.

Que existe um profundo sentimento a favor da Paz entre as mulheres Negras que pode ser mobilizado ficou demonstrado não só na magnífica participação nos encontros de Eslanda Goode Robeson(21), mas também pela posição anunciada pela mais antiga organização de mulheres Negras, sob a liderança da Sra. Christine C. Smith, de apelar à mobilização das mulheres Negras em apoio às Nações Unidas. A este propósito será muito frutuoso trazer ao nosso país uma maior consciência das magníficas lutas das mulheres do Norte de África, as quais, apesar de não terem acesso às mais elementares necessidades básicas, organizaram um forte movimento, e se mantém unidas com a Federação Democrática Internacional das Mulheres, que conta com 81 milhões de mulheres em 57 nações, na luta Paz e contra uma Terceira Guerra Mundial.

O nosso Partido, baseado nos princípios marxistas-leninistas, mantém-se solidamente a favor de um programa de completa igualdade económica, politica e social do povo Negro e de direitos iguais para as mulheres. Quem entre os que pertencem ao nosso Partido é mais explorado e oprimido do que as mulheres Negras? As mulheres Negras podem e devem dar um enorme contributo para a vida quotidiana e para o trabalho do Partido. Isto significa, concretamente, que a principal responsabilidade é dos camaradas masculinos e femininos brancos. Contudo, os homens Negros devem também participar nesta tarefa. As mulheres comunistas Negras devem assumir o seu legítimo lugar na liderança do Partido a todos os níveis.

As fortes capacidades, a militância e o talento organizativo das Mulheres Negras pode ser, se bem utilizado pelo nosso Partido, uma poderosa alavanca para trazer para a frente os operários Negros – homens e mulheres – como força liderante do movimento de libertação do Povo Negro, para cimentar a unidade entre brancos e Negros na luta contra o imperialismo de Wall Street, e para enraizar o Partido nas secções mais exploradas e oprimidas da classe operária e dos seus aliados.

Nas células do nosso Partido, devemos levar a cabo uma intensa discussão sobre o papel das mulheres Negras, de forma a equipar os nossos membros com uma compreensão clara para levar a cabo as necessárias lutas nas fábricas e nas comunidades. Devemos acabar com a prática, na qual muitas mulheres Negras que nas suas igrejas, comunidades e grupos fraternais são lideres das massas, possuindo uma incalculável experiência de massas que poderão por ao serviço do Partido, e quando aderem ao Partido são subitamente vistas nas nossas células não como líderes mas como pessoas que tem de organizacionalmente “começar pelo principio”. Devemos acabar com esta dificuldade e acabar nas nossas células com a atmosfera em que os novos recrutas – neste caso as mulheres Negras – são confrontados com a tentativa de silenciamento ou de os encaixar num estereotipo. Para além das implicações de chauvinismo branco destas abordagens estas práticas confundem a necessidade básica de uma consciência Marxista-leninista que o Partido dá a todos os operários, e que aumenta a sua compreensão política, com o desdém chauvinista pelos talentos organizacionais dos novos membros Negros e pela necessidade de os promover a posições de liderança.

Para conquistar as mulheres Negras para posições de plena participação na coligação anti-fascista e anti-imperialista, para elevar a sua militância e participação a novos cumes nas lutas atuais e futuras contra o imperialismo de Wall Street, os progressistas devem ganhar consciência relativamente ao seu especial estatuto de oprimida.

É com esta consciência, que se acelerou com as lutas, que convenceremos milhares de que apenas o Partido Comunista, como vanguarda da classe operária que tem com perspetiva última o Socialismo, pode alcançar a completa igualdade e dignidade de estatuto para a mulher Negra – e para a totalidade do povo Negro – numa sociedade socialista em que os contributos para a sociedade são avaliados, não pela origem nacional, ou pela cor, mas uma sociedade em que homens e mulheres contribuem de acordo com as suas capacidades e, finalmente, no Comunismo, recebem de acordo com as suas necessidades.