Vamos analisar ainda a diferença fundamental entre dedução de categorias em O Capital e a dedução lógico-formal, isto é, a essência concreta do método de ascensão do abstrato ao concreto.
Estabelecemos que o conceito ricardiano de valor, isto é, uma categoria universal do sistema de uma ciência, é uma abstração, uma abstração formal e incompleta, e, portanto, também incorreta. Ricardo considerou o valor como um conceito expressando as características gerais abstratas inerentes em cada uma das categorias desenvolvidas, cada um dos fenômenos concretos ao qual valor se aplica, e ele, portanto, não estuda valor especificamente, na abstração mais estrita de todas as outras categorias.
Assim, as definições teóricas da categoria universal básica e os métodos de sua definição já contém, como em um embrião, toda a diferença entre a dedução de categorias pelo metafísico Ricardo e o método de ascensão do abstrato ao concreto usado pelo dialético Marx.
Bastante consciente, Marx constrói as definições teóricas do valor por uma análise concreta mais aprofundada da troca simples de mercadoria, deixando de lado, como irrelevante, um conjunto de fenômenos que se desenvolveram nesta base e as categorias que expressam esses fenômenos. Isto é, por um lado, abstração realmente completa, e por outro, abstração realmente significativa, ao invés de abstração formal (“genérica”).
Somente essa concepção, assumindo uma abordagem histórica concreta das coisas, torna possível uma análise específica da forma do valor, uma investigação específica no conteúdo concreto da categoria universal – análise do valor como uma realidade concreta sensorialmente determinada, como uma concreticidade elementarmente econômica, e não como um conceito.
Valor não é analisado como uma abstração mental do geral, mas sim como uma realidade econômica plenamente específica na verdade se desvelando perante o observador e, portanto, capaz de ser estudada especificamente, como uma realidade possuindo seu próprio conteúdo histórico concreto, a descrição teórica que é idêntica com a elaboração de definições do conceito de valor.
Marx mostra que o conteúdo real da forma do valor não é, como Ricardo acreditava, simples identidade quantitativa abstrata de porções do trabalho, mas sim uma identidade contraditória dialética dos opostos das formas relativa e equivalente da expressão do valor de cada mercadoria entrando na relação de troca. O ponto onde o modo dialético de Marx opõe o modo metafísico de Ricardo de raciocínio é o fato de que Marx revelou a contradição interna da forma simples da mercadoria.
Para colocar a questão diferentemente, o conteúdo da categoria universal, do conceito concreto de valor, não é elaborado por Marx com base no princípio de identidade abstrata, mas sim com base no princípio dialético da identidade de polos mutuamente pressupostos, de definições mutuamente exclusivas.
Isso significa que o conteúdo da categoria valor é revelado através do estabelecimento de contradições internas da forma elementar do valor realizada como troca de uma mercadoria por outra mercadoria. Marx apresenta a mercadoria como uma contradição viva da realidade denotada por esse termo, como um antagonismo não resolvido vivo dentro dessa realidade. Uma mercadoria contém uma contradição dentro de si mesma, em suas definições econômicas imanentes.
Vamos observar que a dicotomia interna em momentos mutuamente exclusivos e, ao mesmo tempo, mutuamente pressupostos é característico, como mostra Marx, de cada uma das duas mercadorias participando no ato de troca.
Cada uma delas engloba em si mesma a forma econômica do valor como sua determinidade econômica imanente. Em uma troca, no ato de substituição de uma mercadoria por outro, essa determinidade econômica interna de cada uma das mercadorias é meramente manifestada ou expressa e não é, de forma alguma, criada.
Esse é o ponto principal, o entendimento do que determina não somente o problema do valor, mas também o problema lógico do conceito concreto como uma unidade de definições mutuamente exclusivas e, ao mesmo tempo, mutuamente pressupostas.
O fenômeno da verdadeira troca apresenta o seguinte retrato: uma mercadoria é trocada nas mãos do proprietário da mercadoria por outra, e essa substituição é recíproca. A substituição só pode ocorrer quando ambas as mercadorias mutuamente substituíveis são igualadas como valores. Surge, portanto, a questão desta forma: o que é valor?
Qual é a natureza da realidade econômica que é revelada em uma troca? Como é expressa em um conceito? A verdadeira troca mostra que cada uma das mercadorias é, vis-à-vis seu proprietário, somente valor de troca, e não é, de forma alguma, valor de uso. Nas mãos de outros proprietários, cada um dos participantes na troca só vê valor de uso, isto é, uma coisa que pode satisfazer suas necessidades. Essa é a razão porque ele se esforça em possuí-la. E essa relação é absolutamente idêntica para ambos os lados.
A partir do ponto de vista de um proprietário de mercadoria, cada uma das mercadorias aparece em formas diferentes, e nomeadamente formas diretamente opostas: a mercadoria que ele possui (linho) é somente valor de troca e não é, de forma alguma, valor de uso – caso contrário ele não a alienaria, isto é, a trocaria. A outra mercadoria (o casaco) é, pelo contrário, somente um valor de uso para ele, em consideração a ele, somente um equivalente de sua própria mercadoria.
O significado da verdadeira troca reside na substituição mútua dos valores de troca e valores de uso, das formas relativa e equivalente.
Essa substituição mútua, transformação mútua das formas polares, mutuamente exclusivas e economicamente opostas do produto do trabalho é uma transformação fatual e verdadeira, ocorrendo fora da cabeça do teórico e completamente independente dela.
Valor é realizado e implementado nessa transformação mútua de opostos. Troca surge como a única forma possível na qual a natureza do valor de cada uma das mercadorias é manifestada e expressa em um fenômeno.
É factualmente óbvio que essa natureza misteriosa pode somente ser manifestada ou revelada através da conversão mútua dos opostos – valores de troca e valores de uso, através da substituição mútua das formas relativa e equivalente. Em outras palavras, a única forma é essa: uma mercadoria (linho) aparece como valor de troca, enquanto outra (casaco), como valor de uso; uma delas assume a forma relativa da expressão de valor, e a outra, o oposto, a forma equivalente. Ambas essas formas não podem ser combinadas em uma mercadoria, pois neste caso a necessidade de troca desaparece. Somente isso é alienado através da troca, que não constitui um valor de uso direto, mas somente um valor de troca.
Marx fornece uma expressão teórica para esse estado real de coisas:
A mesma mercadoria não pode, portanto, aparecer simultaneamente em ambas as formas na mesma expressão do valor. Essas formas se excluem, antes, como polos opostos (Marx, 2013, p. 126)Referência 1.
O metafísico estará, sem dúvidas, radiante ao ler essa proposição. Duas definições mutuamente exclusivas não podem, na realidade, ser combinadas em uma mercadoria! Uma mercadoria só pode assumir uma das formas econômicas mutuamente exclusivas e não, de forma alguma, ambas simultaneamente!
Isso significa que o dialético Marx rejeita a possibilidade de combinar definições polares em um conceito? À primeira vista, parece que sim.
Entretanto, uma análise mais de perto do movimento do pensamento de Marx mostra que a questão não é tão simples. A questão aqui é que a passagem citada aqui coroa uma análise da forma empírica de manifestação do valor e meramente leva ao problema do valor como conteúdo imanente de cada uma das mercadorias. A tarefa de elaborar um conceito expressando este último ainda está à frente. O raciocínio, que de longe registra a mera forma da manifestação empírica do valor, ao invés do conteúdo interno dessa categoria, indica o fato de que cada uma das mercadorias pode assumir, nessa manifestação do valor, somente uma de suas formas polares e não ambas simultaneamente.
Mas, a forma assumida por cada uma das mercadorias confrontando uma a outra não é valor, mas meramente manifestação unilateral abstrata da última. Valor em si mesmo, o conceito que ainda é para ser estabelecido, é uma terceira quantidade, algo que não coincide nem com as formas polares tomadas separadamente, nem com sua combinação mecânica.
Uma consideração mais de perto da troca mostra que a impossibilidade acima mencionada de coincidência em uma mercadoria de duas características econômicas mutuamente exclusivas polares é nada que não uma forma de manifestação necessária do valor sobre a superfície dos fenômenos.
A oposição interna entre valor de uso e valor, contida na mercadoria, é representada, assim, por meio de uma oposição externa, isto é, pela relação entre duas mercadorias, sendo a primeira – cujo valor deve ser expresso – considerada imediata e exclusivamente valor de uso, e a segunda – na qual o valor é expresso – imediata e exclusivamente como valor de troca. A forma de valor simples de uma mercadoria é, portanto, a forma simples de manifestação da oposição nela contida entre valor de uso e valor (Marx, 2013, p. 137)Referência 2.
A questão se mostra bastante diferente, entretanto, quando não estamos lidando com a forma externa de manifestação do valor, mas com o valor enquanto tal, como uma realidade econômica objetiva oculta em cada uma das mercadorias confrontando uma a outra em uma troca e constituindo a natureza interna, escondida, de cada uma delas.
O princípio proibindo a coincidência direta de formas mutuamente exclusivas do ser na mesma coisa e ao mesmo tempo (e, consequentemente, na expressão teórica dessa coisa) se aplica, ao que parece, à forma empírica externa de manifestação da realidade analisada (valor, neste caso), mas é rejeitada diretamente no que diz respeito ao conteúdo interno dessa realidade, às definições teóricas do valor enquanto tal.
A natureza interna do valor é expressa teoricamente somente no conceito de valor. A característica distintiva do conceito marxiano de valor é que ele é revelado através da identidade das definições teóricas mutuamente exclusivas.
O conceito de valor expressa a relação interna da forma mercadoria e não a relação externa de uma mercadoria com outra (na última a contradição interna não é manifestada diretamente, mas dividida em contradições “em relações diferentes”: em uma relação, na relação do proprietário, a mercadoria aparece somente como valor de troca; em outra, na relação do proprietário da outra mercadoria, aparece como valor de uso, embora objetivamente exista uma, e não duas relações, aqui). Colocando isso diferentemente, uma mercadoria é aqui considerada não em relação com outra mercadoria, mas em relação com si mesma refletida através da relação com outra mercadoria.
Este ponto contém o mistério da dialética marxiana, e é impossível entender qualquer coisa tanto em O Capital ou em sua lógica a não ser que este ponto, este núcleo da lógica de O Capital, seja apropriadamente entendido.
Valor, a essência interna de cada mercadoria, é somente manifestada ou revelada (refletida) na relação com outra mercadoria. Esse valor, essa realidade econômica objetiva, não é criada ou não nasce na troca, mas somente é manifestada nela, sendo refletida unilateralmente em outra mercadoria como em um espelho que só é capaz de refletir aquele lado para o qual está virado. Da mesma maneira, o espelho real reflete somente o rosto do homem, embora ele também tenha a parte de trás da cabeça.
Sendo refletido para fora, o valor aparece na forma de opostos externos que não coincidem em uma mercadoria – como valores de troca e valores de uso, as formas relativa e equivalente da expressão.
Entretanto, cada uma das mercadorias, na medida em que ela é um valor, é uma unidade direta de formas mutuamente exclusivas e, ao mesmo tempo, mutuamente pressupostos econômicos. No fenômeno (no ato de troca) e em sua expressão teórica, essa natureza econômica dual concreta sempre aparece dividida, por assim dizer, em dois momentos abstratos confrontando um ao outro, cada um mutuamente excluindo o outro e, ao mesmo tempo, assumindo-o como uma condição necessária de sua existência, uma condição que não está dentro, mas fora dele.
No conceito de valor, esses opostos, confrontando abstratamente um ao outro no fenômeno, são unidos novamente, embora não em uma forma mecânica, mas exatamente na forma que eles são unidos na realidade econômica da própria mercadoria – como formas vivas mutuamente exclusivas e, ao mesmo tempo, mutuamente pressupostos econômicos de existência de cada mercadoria, de seu conteúdo imanente – valor.
Para dizer isso diferentemente, o conceito de valor registra a agitação interna da forma mercadoria, o estímulo interno de seu movimento, seu autodesenvolvimento – o conteúdo econômico que é inerente em uma mercadoria antes de qualquer troca e em nenhuma relação com outras mercadorias.
Procedendo de um conceito estabelecido de valor como uma coincidência viva dialeticamente contraditória de opostos dentro de cada mercadoria separada, Marx confidentemente e claramente revela a evolução da forma elementarmente mercadoria para a forma dinheiro, o processo de geração de dinheiro pelo movimento do mercado elementar de mercadorias.
Qual é o cerne da questão aqui, onde Marx vê a necessidade pela transição de uma troca simples, direta, de uma mercadoria por outro sem dinheiro para a troca mediada pelo dinheiro?
A necessidade por tal transição é deduzida diretamente da impossibilidade de resolver a contradição da forma elementar de valor, enquanto permanecendo dentro da estrutura dessa forma elementar.
A questão é que cada uma das mercadorias entrando em uma relação de troca é uma antinomia viva. Mercadoria A pode estar somente em uma forma de valor e não simultaneamente em duas. Mas se a troca é realizada na realidade, isso significa que cada uma das duas mercadorias assume na outra a própria forma que a última não pode assumir, porque ela já tem a forma oposta. Afinal, o outro proprietário de mercadoria não trouxe sua mercadoria ao mercado para que alguém meça ela pelo valor de sua mercadoria. Ele mesmo deve, e quer isso, medir o valor de sua própria mercadoria a partir de outra mercadoria, isto é, ele deve considerar a mercadoria oposta como um equivalente. Mas, ela não pode ser um equivalente, porque já possui a forma relativa.
Essa relação é absolutamente idêntica em ambos os lados. O proprietário do linho considera a mercadoria – o casaco – somente como um equivalente, e sua própria mercadoria como uma forma relativa. Mas o proprietário do casaco raciocina exatamente da forma contrária: para ele o linho é um equivalente, e o casaco somente um valor de troca, somente a forma relativa. E se a troca não ocorre, isso significa (para expressar o fato da troca teoricamente) que ambas as mercadorias medem mutuamente seus valores e somente como servem mutuamente como o material no qual o valor é medido. Em outras palavras, tanto casaco quanto linho postulam um ao outro como a própria forma de expressão do valor que eles não podem assumir, exatamente pela razão de que eles já assumiram a outra forma.
O linho mede seu valor no casaco (isto é, torna ele um equivalente), enquanto o casaco mede seu valor no linho (isto é, torna ele um equivalente, também). Entretanto, como tanto linho quanto casaco já assumiram a forma relativa de valor, como ambos medem seus valores no outro, eles não podem assumir o papel de equivalente. Mas, se a troca realmente ocorreu, isso significa que ambas as mercadorias mediam mutuamente seus valores um no outro, eles reconheceram mutuamente cada um como sendo valores equivalentes, apesar do fato de que ambos já estavam antes na forma relativa, que exclui a possibilidade de assumir o oposto, a forma equivalente. Assim, a troca real é uma coincidência real, ocorrendo realmente, de duas formas polares e mutuamente exclusivas de expressão do valor em cada uma das mercadorias.
Mas isso não pode ser, dirá o metafísico: parece que Marx contradiz si mesmo! Agora ele diz que uma mercadoria não pode assumir ambas as formas polares de valor, e então novamente ele diz que na troca real ela é compelida a ser as duas ao mesmo tempo!
Marx responde que isso pode e realmente ocorre. Essa é uma expressão teórica do fato de que a troca direta de mercadoria não pode servir como uma forma de troca social de matéria que procederia suavemente, sem fricção, obstáculos, conflitos ou contradições. Isso nada mais é que a expressão teórica da impossibilidade real contra a qual o próprio movimento do mercado de mercadoria chega – a impossibilidade do estabelecimento preciso das proporções nas quais o trabalho socialmente necessário é gasto em diversos ramos do trabalho socialmente dividido conectado somente através do mercado de mercadorias, isto é, a impossibilidade da expressão precisa do valor.
A troca direta de mercadoria por mercadoria não pode expressar a medida socialmente necessária do custo do trabalho em várias esferas da produção social. A antinomia do valor na estrutura da forma mercadoria elementar, portanto, permanece não resolvida e insolúvel. Aqui a mercadoria tanto deve quando não pode assumir ambas as formas econômicas mutuamente exclusivas. Caso contrário, troca de acordo com o valor é impossível. Mas, ela não pode estar simultaneamente em duas formas. Essa é a antinomia sem esperança que não pode ser resolvida na estrutura da forma elementar de valor.
A genialidade dialética de Marx se mostrou no fato de que agarrou essa antinomia e a expressou enquanto tal.
Mas, na medida em que a troca de acordo com o valor ainda precisa ocorrer de alguma forma, a antinomia do valor precisa ser resolvida de algum jeito em uma forma relativa.
A solução é encontrada pelo próprio movimento do mercado simples de mercadoria, gerando dinheiro, a forma dinheiro de expressão do valor. Dinheiro na análise de Marx surge como a forma natural na qual o movimento do próprio mercado encontra um meio para a solução da contradição da forma elementar de valor, da troca direta de uma mercadoria por outra.
Este é um ponto onde a diferença fundamental é mais graficamente demonstrada entre o modo materialista dialético de resolver contradições e todos aqueles métodos que são conhecidos do pensamento metafísico.
Qual o procedimento do metafísico quando uma contradição surge na definição de uma expressão teórica de uma certa realidade? Ele sempre se esforça em resolvê-la criando conceitos mais precisos, delimitando limites mais estreitos sobre os termos etc.; ele tentará sempre construí-la como uma contradição externa, ao invés de uma interna, como uma contradição em relações diferentes, com a qual a metafísica está bastante reconciliada. Em outras palavras, tudo que ele faz é mudar a expressão da realidade na qual a contradição surgiu.
Marx age bastante diferentemente em um caso como ele. Ele procede da suposição de que na estrutura da forma elementar do valor, a antinomia estabelecida nas definições não é resolvida e não pode ser resolvida objetivamente. Portanto, não é preciso buscar sua solução na consideração da forma elementar do valor. Essa antinomia é insolúvel na troca direta de mercadoria por mercadoria, seja objetivamente (isto é, pelo movimento do próprio mercado de mercadoria), seja subjetivamente (isto é, na teoria). Sua solução, portanto, não deve ser procurada em posterior reflexo sobre a forma elementar do valor, mas em delinear a necessidade espontânea objetiva com a qual o mercado de mercadoria se encontra, cria ou elabora os meios reais de sua resolução relativa.
O método materialista dialético de resolução das contradições nas definições teóricas, consiste assim em delinear o processo pelo qual o movimento da própria realidade as resolve em uma nova forma de expressão. Expresso objetivamente, o objetivo reside em delinear, através de análise dos novos materiais empíricos, o surgimento da realidade na qual uma contradição anteriormente estabelecida encontra sua resolução relativa em uma nova forma objetiva de sua realização.
Esse é o procedimento de Marx na análise do dinheiro. Dinheiro é o meio natural pelo qual o valor de uso começa a se transformar em valor de troca, e vice-versa.
Antes do dinheiro aparecer, cada uma das mercadorias se reunindo em uma troca precisavam desempenhar simultaneamente, dentro da mesma relação individual, ambas as metamorfoses mutuamente exclusivas (a partir do valor de uso em valor de troca e, no mesmo momento, dentro da mesma ação, desempenhar a transfiguração contrária). Agora tudo parece diferente. Agora a transformação dual não é realizada como coincidência direta de duas formas mutuamente exclusivas, mas como uma ação mediada – através da transformação em dinheiro, o equivalente universal.
A transformação do valor de uso em valor não mais coincide diretamente com a transformação oposta de valor em valor de uso. A troca da mercadoria por outra mercadoria se divide em duas ações diferentes e opostas de transformação não mais coincidindo em um ponto do espaço e tempo. A mercadoria é transformada em dinheiro, não outra mercadoria. Um valor de uso se torna um valor de troca, não mais, e em algum lugar em outro ponto do mercado, possivelmente em um tempo diferente, o dinheiro se torna uma mercadoria, valor se torna valor de uso, é substituído por ele.
A coincidência das duas transformações em duas direções diametralmente opostas agora cai, na realidade da própria troca, em duas transformações diferentes não mais coincidindo em tempo ou espaço – a ação de vender (transformação de valor de uso em valor) e a ação de comprar (transformação de valor em valor de uso).
O dinheiro monopoliza plenamente a forma econômica de equivalente, se tornando uma encarnação pura do valor enquanto tal, enquanto todas as outras mercadorias assumem a forma de valor relativo. Elas confrontam o dinheiro como valores de uso somente.
A antinomia na expressão teórica da troca de mercadoria foi aparentemente resolvida: a contradição (como coincidência direta de dois opostos mutuamente exclusivos polares de forma econômica) agora surge dividido, por assim dizer, entre duas coisas diferentes, entre mercadoria e dinheiro.
Na verdade, com o surgimento da forma dinheiro de valor, a contradição do valor não desapareceu ou evaporou – ela meramente assumiu uma nova forma de expressão. Ela continua sendo (embora somente implicitamente) uma contradição interna permeando tanto dinheiro quando mercadoria e, consequentemente, suas definições teóricas.
De fato, uma mercadoria confrontando o dinheiro aparentemente se tornou somente um valor de uso, e dinheiro, uma expressão pura de valor de troca. Mas, por outro lado, cada mercadoria aparece somente como valor de troca na relação com o dinheiro. Ela é vendida por dinheiro precisamente pela razão de que não é valor de uso para seu proprietário. E o dinheiro desempenha o papel de um equivalente precisamente porque ele confronta qualquer mercadoria como a imagem universal do valor de uso. Toda a importância da forma equivalente reside em que ela expressa o valor de troca de outra mercadoria como valor de uso.
A antinomia originalmente estabelecida da troca elementar de mercadoria foi assim retida tanto no dinheiro quanto nas mercadorias, ela ainda constitui a essência elementar de um e do outro, embora na superfície dos eventos, essa contradição interna de ambas as formas, dinheiro e mercadoria, provou ser extinta.
Vimos [diz Marx] que o processo de troca das mercadorias inclui relações contraditórias e mutuamente excludentes. O desenvolvimento da mercadoria não elimina essas contradições, porém cria a forma em que elas podem se mover. Esse é, em geral, o método com que se solucionam contradições reais. É, por exemplo, uma contradição o fato de que um corpo seja atraído por outro e, ao mesmo tempo, afaste-se dele constantemente. A elipse é uma das formas de movimento em que essa contradição tanto se realiza como se resolve (Marx, 2013, p. 178)Referência 3.
A partir da contradição externa do valor de uso e valor de troca, Marx procedeu à fixação da contradição interna contida em cada uma das duas mercadorias. O fato de que a contradição primeiro surge como contradição em relações diferentes (valor de troca em relação a um dos proprietários de mercadoria e valor de uso em relação ao outro) é para ele uma indicação de abstraticidade, de completude e concreticidade insuficiente do conhecimento. A concreticidade do conhecimento é manifestada na compreensão dessa contradição externa como um modo superficial de revelação de algo bastante diferente, nomeadamente, uma contradição interna, uma coincidência de definições teóricas mutuamente exclusivas no conceito concreto de valor.
Sua importância pode ser explicada, por exemplo, comparando a análise de Marx do valor com um discurso sobre valor em uma obra do empirista inglês Bailey.
O último tomou a forma externa de manifestação do valor em troca de sua genuína e única realidade econômica, acreditando tudo que se falava sobre valor como tais escolásticos dialéticos abstratos; ele declarou: “Valor é nada intrínseco e absoluto”. Sua fundamentação dessa afirmativa era essa: “É impossível designar ou expressar o valor de uma mercadoria, exceto pela quantidade de alguma outra mercadoria”. A isso Marx respondeu: “Tão impossível quanto ‘designar’ ou ‘expressar’ um pensamento, exceto por uma quantidade de sílabas. Por isso Bailey conclui que um pensamento é – sílabas” (Marx, 1975a, p. 146)Referência 4.
Neste caso, Bailey procurou apresentar o valor como uma relação de uma mercadoria com outra, como uma forma externa de uma coisa postulada por sua relação com outra coisa, enquanto que Ricardo e Marx se esforçaram em procurar uma expressão do valor como um conteúdo interno de cada coisa trocada, de cada coisa entrando a relação de troca. O valor imanente apropriado de uma coisa é somente manifestado, de forma alguma criado, na forma de uma relação de uma coisa com outra.
Bailey, sendo um empirista, tenta apresentar a relação interna de uma coisa dentro de si mesma como uma relação externa de uma coisa com outra.
Ricardo e Marx se esforçaram (e aí reside a natureza teórica da abordagem deles) em ver através da relação de uma coisa com outra na relação interna de uma coisa com si mesma – valor como a essência de uma mercadoria, que é somente manifestado em uma troca através de uma relação externa dessa mercadoria com outra.
O metafísico sempre tenta reduzir uma contradição interna de uma coisa a uma contradição externa dessa coisa para outra coisa, a uma contradição em relações diferentes, isto é, para uma forma de expressão na qual essa contradição é eliminada do conceito da coisa. Marx, pelo contrário, sempre se esforçou em discernir na contradição externa somente uma manifestação superficial de uma contradição interna imanentemente inerente em cada coisa confrontando sua contraparte na relação da contradição externa. Aí reside a diferença entre uma abordagem genuinamente teórica e uma descrição empírica dos fenômenos.
A dialética consiste exatamente na habilidade de discernir a contradição interna de uma coisa, o estímulo de seu autodesenvolvimento, onde o metafísico vê somente uma contradição externa resultante de uma colisão mais ou menos acidental de duas coisas internamente não-contraditórias.
A dialética requer neste caso que a contradição externa de duas coisas seja interpretada como uma manifestação mutuamente necessária da contradição interna de cada uma delas. A contradição externa surge como uma identidade interna de momentos mutuamente exclusivos mediados através de uma relação para com alguma outra coisa e refletida através de alguma outra coisa, como uma relação internamente contraditória de uma coisa com si mesma, isto é, como uma contradição em uma relação e no mesmo momento de tempo. Marx procede de uma manifestação externa de uma contradição para estabelecer a base interna dessa contradição, a partir da aparência para a essência dessa contradição, enquanto que o metafísico sempre tenta agir em uma maneira exatamente contrária, refutando a expressão teórica da essência da coisa a partir da perspectiva da aparência externa, que ele acreditar ser a única realidade.
Esse é o modo de raciocínio de Bailey acima. Esse é o modo de raciocínio de um metafísico, que sempre assume que a interpretação verdadeira de uma contradição é sua interpretação como uma contradição em relações diferentes. E isso sempre leva a destruição da abordagem teórica elementar das coisas.
Marx considera o valor como a relação de uma mercadoria com si mesma, ao invés de outra mercadoria, e é por isso que ela surge como uma contradição interna não resolvida e insolúvel viva. Essa contradição não é resolvida porque sobre a superfície dos fenômenos ela aparece como uma contradição em duas relações diferentes, como duas transformações diferentes – como compra e venda. Toda a importância da análise de Marx consiste em mostrar que a contradição do valor é insolúvel em princípio dentro da estrutura da troca elementar de mercadoria, e que o valor inevitavelmente aparece aqui como uma antinomia viva em si mesma, não importa quanto se especifique os conceitos, ou quão profundo se examine, ou se reflita sobre o valor.
Uma mercadoria como uma encarnação de valor não pode simultaneamente assumir ambas as formas mutuamente exclusivas do valor; ainda assim, ela na verdade assume ambas essas formas simultaneamente quando a troca de acordo com o valor é desempenhada.
Essa antinomia teórica expressa a real impossibilidade que o movimento do mercado simples de mercadoria continuamente encontra. Uma impossibilidade é uma impossibilidade. Ela não desaparece se está presente na teoria como uma possibilidade, como algo não-contraditório.
O movimento do mercado real deixa para trás a forma da troca direta de uma mercadoria por outra mercadoria. Ao considerar dados empíricos extensivos expressando esse movimento, Marx procede para a análise teórica daquelas formas mais complexas pelas quais o mercado realiza e, ao mesmo tempo, resolve essa contradição. Aí reside a necessidade da transição para o dinheiro.
Olhando para essa questão a partir do ponto de vista filosófico, devemos ver que essa é uma expressão da natureza materialista do método de Marx de resolver contradições na expressão teórica da realidade objetiva. Nesse método, a contradição não é resolve por sua eliminação da teoria. Pelo contrário, esse método é baseado na suposição de que a contradição no próprio objeto não pode ser e nunca é resolvida de nenhuma outra forma que não pelo desenvolvimento da realidade carregada com essa contradição em outra realidade, superior e mais avançada.
A antinomia do valor encontra sua resolução relativa no dinheiro. Mas, novamente, o dinheiro não elimina a antinomia do valor – meramente cria uma forma na qual essa antinomia é realizada e expressa como antes. Esse modo de apresentação teórica de um processo real é a única forma lógica adequada na qual o desenvolvimento dialético do objeto, seu autodesenvolvimento através das contradições, pode ser expresso na teoria.
A natureza materialista do método pelo qual Marx resolveu as contradições teóricas na definição do objeto, foi bem expressa por Engels em seu comentário.
Com este método, partimos sempre da relação primeira e mais simples que existe historicamente, de fato; [...]Encontramo-nos com contradições que exigem uma solução. Porém, como aqui não seguimos um processo de reflexão abstrato, que se desenvolve exclusivamente em nossas cabeças, mas uma sucessão real de fatos, ocorridos real e efetivamente em algum tempo ou que continuam ocorrendo, essas contradições também estarão determinadas na prática, onde, provavelmente, também será encontrada sua solução. E, se estudarmos o caráter dessa solução, veremos que se consegue criando uma nova relação, cujos dois lados opostos teremos agora que desenvolver, e assim sucessivamente (Engels, 2008a, p. 283)Referência 5.
É a impossibilidade objetiva de resolver a contradição entre a natureza social do trabalho e a forma privada de apropriação de seu produto através da troca direta de uma mercadoria por outra sem dinheiro que é expresso teoricamente como uma antinomia, como uma contradição insolúvel da forma elementar do valor, como uma contradição insolúvel de suas definições teóricas. É por isso que Marx nem ao mesmo tentou se livrar da contradição na definição do valor. Valor permanece uma antinomia, uma contradição não resolvida e insolúvel, uma coincidência direta de definições teóricas mutuamente exclusivas. O único método real de resolução dessa antinomia é uma revolução socialista eliminando a natureza privada de apropriação do produto do trabalho social, apropriação através do mercado de mercadoria.
A impossibilidade objetiva de resolver a contradição entre a natureza social do trabalho e a forma privada de apropriação de seus produtos, dada a necessidade diária de realização da troca social de matéria através do mercado de mercadoria, estimula a busca por meios e métodos naturais de fazê-lo. É esse fator que, em última análise, leva ao surgimento do dinheiro.
Da mesma forma, o dinheiro surge no movimento real do mercado de mercadoria como um meio natural de resolver as contradições da troca direta de mercadoria, as definições teóricas de dinheiro em O Capital são elaboradas como um meio de resolver a contradição na definição de valor. Aqui estamos lidando com o elemento mais importante do método dialético de Marx de ascensão do abstrato ao concreto, com a dedução materialista dialética de categorias. O estímulo do desenvolvimento teórico, a força motivo por trás do desvelamento de um sistema de definições teóricas de uma coisa, é a contradição interna da teoria. Ela desempenha essa função precisamente porque e precisamente naqueles casos quando ela reflete diretamente a contradição interna do objeto que é o estimulo interno de seu desenvolvimento, do crescimento de sua complexidade e desenvolvimento de suas formas de existência. A expressão teórica desse estímulo no conceito é naturalmente precedida por trabalho extensivo e minucioso sobre a seleção e análise de dados empíricos caracterizando o desenvolvimento dessas formas.
A partir deste ponto de vista, toda a estrutura lógica de O Capital surge em uma nova que é de fundamental interesse: todo o movimento do pensamento teórico em O Capital prova estar trancado entre dois polos originalmente estabelecidos da expressão do valor.
A primeira categoria concreta seguindo valor, dinheiro, surge como um método real de transformação mútua dos polos da expressão do valor, como aquela metamorfose através da qual dois polos do valor, gravitando um em direção ao outro e, ao mesmo tempo, excluindo mutuamente um ao outro, deve passar no processo de transformação mútua deles.
Essa abordagem orienta objetivamente o raciocínio, quando ele se depara com a tarefa de estabelecer as definições teóricas necessárias e universais do dinheiro: ao considerar a plena totalidade dos dados sensoriais concretos, empíricos, somente aquelas características são isoladas e registras que são necessariamente postuladas pela transformação do valor em valor de uso e vice-versa, enquanto que todas as características empíricas da forma dinheiro que não necessariamente seguem dessa conversão mútuas ou não podem ser deduzidas dela, são deixadas de lado.
A diferença fundamental entre a dedução materialista dialética de categorias e a dedução intelectual abstrata vem à luz aqui.
A última é baseada em um conceito genérico ou geral abstrato. Um fenômeno particular é subsumido sob ele, e ao considerar esse fenômeno, os traços são discernidos que constituem as características distintivas das espécies determinadas. O resultado é mera aparência de dedução. Por exemplo, a raça trotadora Orlov está incluída na abstração “cavalo em geral”. A definição dessa raça particular inclui aquelas características que permitem distinguir um trotador Orlov de qualquer outra raça de cavalos. É bastante claro, entretanto, que as características específicas de um trotador Orlov não estão, de forma alguma, incluídas na abstração “cavalo em geral”, e elas, portanto, não podem ser deduzidas dela. Elas são anexadas às definições de “cavalo em geral” de forma puramente mecânica. Por causa disso, a dedução formal não oferece garantias de que essas diferenças específicas são discernidas corretamente, que elas necessariamente pertencem à raça em questão. Pode muito bem ser que esses traços específicos de um trotador Orlov são encontrados em alguma coisa que ele tem em comum com um trotador do estado de Oklahoma.
O caso é o mesmo, como vimos, com as definições teóricas de dinheiro de Ricardo. Em sua concepção, as diferenças específicas da forma dinheiro não são, de forma alguma, deduzidas do valor. É por essa razão que ele não pode distinguir entre as características econômicas realmente necessárias do dinheiro enquanto tal e aquelas propriedades que o dinheiro empiricamente observado possui por causa do fato de que ele encarna o movimento do capital. E é por essa razão que ele vê as definições específicas do dinheiro nas características de um fenômeno bastante diferente – o processo de circulação do capital.
A abordagem de Marx foi bastante diferente. O fato de em sua teoria o valor foi entendido no movimento de opostos, e que a definição teórica do valor em geral contém uma contradição, permitiu a ele discernir nos fenômenos empiricamente observados da circulação de dinheiro exatamente aquelas e somente aquelas características que são necessariamente inerentes no dinheiro enquanto dinheiro e exaustivamente define dinheiro como uma forma específica do movimento do valor.
Marx inclui na definição teórica do dinheiro somente aquelas características da circulação de dinheiro que são necessariamente deduzidas das contradições do valor, sendo necessariamente geradas pelo movimento da troca elementar de mercadoria.
É isso que Marx chama dedução. É fácil afirmar aqui que este tipo de dedução se torna possível somente se sua maior premissa não é um conceito geral abstrato, mas um conceito universal concreto interpretado como unidade ou identidade de opostos mutuamente se transformando, como um conceito refletindo a contradição real no objeto.
Deve-se enfatizar repetidamente que essa dedução teórica é baseada em uma consideração multilateral e mais detalhada de um sistema de fatos e fenômenos empíricos constituindo a realidade econômica que é o objeto da teoria.
Essa foi a única forma na qual as abstrações genuinamente completas e significativas, ao invés de formais, poderiam ser obtidas que revelam a essência específica da forma dinheiro. Marx obteve as definições teóricas do dinheiro ao considerar o processo de circulação abstratamente, “isto é, prescindindo das circunstâncias que não decorrem imediatamente das leis imanentes da circulação simples de mercadorias” (Marx, 2013, p. 233, itálicos de Ilienkov)Referência 6.
As circunstâncias fluindo das leis imanentes da circulação simples de mercadoria são precisamente os produtos da contradição interna do valor enquanto tal, da forma simples de valor.
A dialética do abstrato e do concreto é aqui manifestada em uma forma mais aparente e gráfica: precisamente porque o dinheiro é considerado no abstrato, definições teóricas concretas são obtidas expressando a natureza histórica concreta do dinheiro como um fenômeno particular.
Uma bola de futebol, o planeta Marte, um rolamento, podem ser facilmente incluídos no conceito geral abstrato do esférico, mas nenhum esforço do pensamento lógico irá deduzir a forma de uma bola de futebol, do planeta Marte ou de um rolamento a partir do conceito do esférico em geral, pois nenhuma dessas formas originou na realidade refletida no conceito de esférico em geral, isto é, na similaridade ou identidade real de todos os corpos esféricos.
Mas, a forma econômica do dinheiro é deduzida, em uma maneira mais rigorosa, a partir do conceito de valor (em sua interpretação marxiana), exatamente porque a realidade econômica objetiva refletida na categoria de valor em geral contém uma necessidade objetiva real da geração de dinheiro.
Essa necessidade é a contradição interna do valor, insolúvel na estrutura da troca simples de uma mercadoria por outra. A categoria de valor de Marx é uma categoria universal concreta exatamente porque engloba em suas definições uma contradição interna, sendo uma unidade, uma identidade de definições mutuamente exclusivas e, ao mesmo tempo, definições teóricas mutuamente pressupostas.
A concreticidade do conceito universal está, na abordagem de Marx, intimamente vinculada com a contradição em sua definição. A concreticidade é, em geral, identidade dos opostos, enquanto que o geral abstrato é obtido de acordo com o princípio da identidade nua, identidade sem contradição.
Se se considera intimamente o movimento do pensamento de Marx a partir da mercadoria e valor em geral ao dinheiro, comparando-o ao movimento similar do pensamento de Ricardo, o resultado será um retrato claro da diferença entre dialética e metafísica sobre a questão das forças motivas do desvelamento de um sistema de categorias.
Ricardo é estimulado em seu progresso pela contradição entre a incompletude, pobreza e unilateralidade da abstração universal (valor em geral) e a riqueza, plenitude e variedade de aspectos dos fenômenos da circulação de dinheiro. Incluindo o dinheiro (assim como todas as outras categorias) na esfera de aplicação da fórmula universal da lei do valor, Ricardo vê que o dinheiro é, por um lado, incluído nesta esfera (dinheiro é também uma mercadoria), mas, por outro lado, ele possui muitas outras propriedades que não são expressas na abstração do valor em geral. Resumindo, ele vê que o dinheiro, à parte das características gerais registradas na categoria de valor, possui distinções específicas que ele procede em estabelecer. Desta forma ele lida com todas as categorias desenvolvidas. Já vimos o que isso implica: dados empíricos são assimilados em uma forma teoricamente indigesta.
Os resultados de Marx são diferentes. Em O Capital, o progresso do pensamento para novas definições não é estimulado por qualquer contradição entre “abstração incompleta” e “plenitude da imagem sensorialmente concreta” da realidade. Tal concepção da contradição motivacional da teoria não nos um único passo para além da compreensão lockeana da interpretação teórica da realidade, identificando totalmente o método de Marx e de Ricardo. O desenvolvimento teórico das categorias em O Capital é baseado em um entendimento mais concreto da contradição estimulando o progresso do pensamento. O raciocínio é aqui guiado pelo seguinte princípio: uma contradição objetiva é refletida como uma contradição subjetiva, teórica ou lógica, e representa nesta forma um problema teórico ou tarefa lógica do raciocínio, que pode somente ser resolvido através de posterior estudo de fatos empíricos, de dados sensoriais.
Essa consideração posterior de fatos empíricos não é feita cegamente, mas à luz de uma tarefa ou problema teórico rigorosamente e concretamente formulado, o último sendo formulado cada vez como uma contradição lógica, isto é, formalmente insolúvel.
Já analisamos a transição da consideração do valor para a consideração do dinheiro, estabelecendo que nos fenômenos reais empiricamente determinados da circulação de dinheiro desenvolvida, Marx isolada somente aquelas e exatamente aquelas definições que tornam o dinheiro entendível como um meio de resolução relativa da contradição interna da troca de mercadoria. Então o pensamento se depara com uma nova contradição teórica, um novo problema teórico: a análise da circulação de dinheiro-mercadoria mostra que essa esfera não engloba em si mesma quaisquer condições sob as quais a circulação do valor poderia gerar novo valor, mais-valor.
Pode-se virar e revirar como se queira, e o resultado será o mesmo. Da troca de equivalentes não resulta mais-valor, e tampouco da troca de não equivalentes resulta mais-valor (Marx, 2013, p. 238)Referência 7.
Essa generalização, entretanto, está em relação de contradição mutuamente exclusiva com outro fato não menos óbvio – nomeadamente, que o dinheiro colocado em circulação busca lucro. Isso também permanece um fato, “pode-se virar e revirar como se queira”, e um fato bastante antigo, da mesma idade do empréstimo de dinheiro, e o último é tão velho quanto o próprio dinheiro. Em outras palavras, a análise da esfera dinheiro-mercadoria resultou na conclusão de que o capital usurário é impossível. Mas, longe de ser impossível, permanece um fato penetrante não somente sob o capitalismo, mas também em todos os sistemas anteriores – sob o sistema escravocrata e o feudalismo.
Essa nova antinomia, a contradição do pensamento teórico com si mesmo, contido na formulação do problema, da tarefa teórica que Marx foi capaz de resolver, pela primeira vez na história do pensamento econômico, exatamente porque ele foi o primeiro a formular o problema corretamente.
Aquele que formulou o problema corretamente possui metade da resposta dele. A velha lógica, como é bem conhecido, em geral não estudou a questão como uma forma lógica, como a forma necessária do processo lógico. O idealismo habilmente especulou sobre essa desvantagem da velha lógica. Assim, Kant afirmou que a natureza responde somente aquelas questões que perguntamos, tornando esse um argumento em favor de sua concepção a priori da cognição teórica: a resposta para a questão depende essencialmente da maneira de formulá-la, e a formulação é feita pelo sujeito.
A habilidade de perguntar a questão certa e de formular o problema corretamente é uma das tarefas mais importantes da lógica materialista dialética. Marx mostrou concretamente em O Capital o que significava formular uma questão concreta e como encontrar uma resposta concreta para ela.
A lógica de Marx é posta em relevo na forma que ele formulou e respondeu a questão da origem do mais-valor. A questão é formulada aqui não arbitrariamente, mas com base em uma análise objetiva das leis da circulação de dinheiro-mercadoria-, e em uma forma que coloca o estudo das leis imanentes da circulação de dinheiro-mercadoria em uma contradição teórica.
Portanto, o capital não pode ter origem na circulação, tampouco pode não ter origem [na] circulação. Ele tem de ter origem nela e, ao mesmo tempo, não ter origem nela (Marx, 2013, p. 240). Essas são as condições do problema. Hic Rhodus, hic salta! (Marx, 2013, p. 241)Referência 8.
Essa formulação do problema por Marx não é acidental e não é, de forma alguma, somente um dispositivo retórico externo. Ela está vinculada com a própria essência da dialética como um método de análise concreta, como um método que segue a realidade analisada enquanto ela se desenvolve através de contradições.
Como o desenvolvimento da realidade ocorre através do surgimento de contradições e sua resolução, assim o pensamento ocorre enquanto ele reproduz esse desenvolvimento. Essa característica do método dialético torna possível não somente perguntar a questão correta, mas também encontrar sua solução teórica.
Uma investigação objetiva na circulação de dinheiro-mercadoria mostrou que essa esfera não contém nela quaisquer condições sob as quais um fato econômico óbvio, inquestionáveis e omnipresente seja possível, ou melhor, necessário: o crescimento espontâneo do valor: O pensamento é assim direcionado a definir que a condição economicamente necessária na presença da qual a circulação de dinheiro-mercadoria se torna circulação capitalista de mercadorias.
Esse resultado que precisamos deve satisfazer um número de condições rigorosas, deve ser correlacionado com elas. Essas condições da tarefa teórica são estabelecidas pelo estudo da circulação de dinheiro-mercadoria como a base universal do sistema capitalista de mercadorias. A este respeito, o pensamento se move dedutivamente no sentido pleno do termo – do universal ao particular, do abstrato ao concreto, o que o torna direcionado a um objetivo.
Marx formulou a tarefa da seguinte forma: a única condição sobre a qual o mais-valor é possível sem violar a lei do valor é “descobrir no mercado, no interior da esfera da circulação, uma mercadoria cujo próprio valor de uso possuísse a característica peculiar de ser fonte de valor, cujo próprio consumo fosse, portanto, objetivação de trabalho e, por conseguinte, criação de valor” (Marx, 2013, p. 242)Referência 9.
Esse ponto marca nitidamente a oposição fundamental entre a dialética de Marx, isto é, dialética materialista, e a dialética idealista especulativa de Hegel, seu método de construção da realidade a partir de um conceito.
O princípio axiomático e inquestionável da dialética hegeliana é que todo o sistema de categorias deve ser desenvolvimento a partir das contradições imanentes do conceito básico. Se o desenvolvimento da circulação de dinheiro-mercadoria em circulação capitalista de mercadoria foi apresentado por um seguidor ortodoxo da lógica hegeliana, ele teria que provar, no espírito dessa lógica, que as contradições imanentes da esfera da mercadoria geraram por si mesmas todas as condições sob as quais o valor se torna valor crescente espontaneamente.
Marx adotou o procedimento contrário: ele mostra que a circulação de dinheiro-mercadoria, por mais tempo que possa continuar dentro de si mesma, não pode aumentar o valor global das mercadorias sendo trocadas, não pode criar por seu movimento quaisquer condições sob as quais o dinheiro colocado em circulação necessariamente buscaria novo dinheiro.
Neste ponto decisivo na análise, o pensamento volta atrás novamente para o empírico do mercado capitalista de mercadoria. É no empírico que a realidade econômica é encontrada que transforma o movimento do mercado de dinheiro-mercadoria em produção e acumulação de mais-valor. Força de trabalho é a única mercadoria que, ao mesmo tempo, está incluída na esfera da aplicação da lei de valor e, sem qualquer violação dessa lei, cria mais-valor, que contradiz diretamente a lei do valor, ambas possíveis e necessárias.
Aqui novamente vemos a enorme importância teórica do fato de que a mercadoria foi revela por Marx como sendo uma unidade direta, uma identidade de opostos do valor e valor de uso.
A essência da força de trabalho como mercado também é revelada em O Capital como uma identidade direta de definições mutuamente exclusivas de valor e valor de uso: o valor de uso da força de trabalho, sua propriedade específica, consiste somente no fato de que ao longo de seu consumo, é transformando na sua contraparte – valor.
As definições econômicas da força de trabalho, dentro do sistema capitalista de mercadoria de condições de produção, deriva dessa unidade de opostos mutuamente excludentes, da combinação antinômica deles em uma mesma mercadoria, o valor de uso que consiste exclusivamente em sua habilidade de ser transformado em valor no ato do próprio consumo.
Quando a força de trabalho figura como valor de uso (o ato de seu consumo pelo capitalista), ela surge, ao mesmo tempo, como valor materializado no produto do trabalho. Essa é novamente uma contradição na mesma relação – em relação ao processo de produção e acumulação de mais-valor, uma contradição interna do processo capitalista.
A partir do ponto de vista lógico, uma circunstância mais significante deve ser observada aqui: qualquer categoria concreta de O Capital surge como uma das formas de transformação mútua de valor e valor de uso, isto é, daqueles dois polos mutuamente exclusivos que foram estabelecidos no começo da pesquisa, na análise da “célula” do organismo sob estudo, daqueles dois polos que em sua unidade antagônica constituem o conteúdo da categoria universal fundamentando toda a dedução subsequente de categorias. Toda a dedução de categorias surge a partir deste ângulo como uma complicação da cadeia de elos de mediação através dos quais ambos os polos de valor devem passar em sua transformação um no outro.
A formação do organismo capitalista surge como o processo de crescente tensão entre os dois polos da categoria original. A transformação dos opostos de valor de valor de uso um no outro se torna muito mais complicado. Na troca simples de uma mercadoria por outra, a transformação mútua de valor e valor de uso é desempenhada como uma ação direta, enquanto que com o surgimento do dinheiro, cada um dos polos deve primeiro se tornar dinheiro e somente depois sua própria contrapartida. A força de trabalho surge como um novo elo de mediação da transformação mútua das formas de valor, como uma nova forma de sua realização.
Os polos do valor gravitando um em direção ao outro, permanecem dois pontos extremos entre os quais novas formas econômicas surgem. Qualquer nova realidade econômica assume um significado e importância somente se serve à transformação mútua de valor e valor de uso, se se torna uma forma de realização de valor como uma unidade antagônica viva de seus opostos internos.
O valor se torna o juiz supremo de todos os destinos econômicos, o critério superior da necessidade econômica de qualquer fenômeno envolvido em seu movimento. O próprio homem, o sujeito do processo de produção, se torna um brinquedo passivo, um “objeto” de valor, o último transformando-se no “sujeito automático do processo” sendo o “sujeito usurpador de tal processo” (Marx, 2013, p. 230)Referência 10.
“Se na circulação simples o valor das mercadorias atinge no máximo uma forma independente em relação a seus valores de uso, aqui ele se apresenta, de repente, como uma substância em processo, que move a si mesma e para a qual mercadorias e dinheiro não são mais do que meras formas” (Marx, 2013, p. 230)Referência 11 – é isso que Marx diz do papel do valor no modo mercantil capitalista de produção.
Não é difícil discernir aqui uma polêmica oculta com a própria essência da filosofia hegeliana, sua fundamentação principal em A Fenomenologia do Espírito. Nesta obra, contendo todo o segredo da filosofia hegeliana, o dialético idealista apresenta este requisito para ser imposto sobre a ciência: “para conceber e para expressar a verdade não como substância, mas no mesmo grau como um sujeito” (Hegel, 1921, S. 12-13)Referência 12.
Para Hegel, o sujeito é equivalente à realidade se desenvolvendo através das contradições, à realidade se autodesenvolvendo. A questão principal é, entretanto, que Hegel não reconheceu isso como uma propriedade da realidade objetiva existindo fora do espírito e independentemente dele. Para Hegel, a única substância se autodesenvolvendo é a ideia lógica, e é, portanto, assumido e fundamentado que o requisito para conceber e expressar a verdade não como substância, mas no mesmo grau como um sujeito, só pode ser realizado na ciência do pensamento, somente na filosofia e na filosofia idealista objetiva.
Usando a terminologia de Hegel em O Capital, Marx enfatiza desse modo a oposição fundamental de sua perspectiva filosófica para aquela do hegelianismo, demonstrando um modelo de dialética materialista como a ciência do desenvolvimento através das contradições internas.
A essência da reviravolta marxiana na economia política pode ser expressa em termos filosóficos da seguinte maneira: na teoria de Marx, não somente a substância do valor, trabalho, foi entendida (Ricardo também atingiu esse entendimento), mas, pela primeira vez, o valor foi simultaneamente entendido como o sujeito de todo o desenvolvimento, isto é, como uma realidade se desenvolvendo através de suas contradições internas em um sistema total de formas econômicas. Ricardo falhou em entender esse último ponto. Para obter tal entendimento, é preciso tomar a perspectiva da dialética materialista consciente.
Somente com base nessa concepção das leis objetivas do desenvolvimento como desenvolvimento através de contradições, pode-se entender a essência da lógica da investigação aplicada em O Capital, a essência do método de ascensão do abstrato ao concreto.
À primeira vista, vista de uma forma externa, isso é pura dedução, movimento de uma categoria universal (valor) para categorias particulares (dinheiro, mais-valor, lucro, salários etc.). O movimento externo do pensamento lembra muito a dedução tradicional – dinheiro (e, subsequentemente, mais-valor e outras categorias) aparece como uma imagem mais concreta do valor em geral, como ser específico do valor. À primeira vista, o valor pode parecer ser o conceito genérico, o geral abstrato, enquanto dinheiro e o resto, espécies do valor.
A análise revela, entretanto, que não existe relação gênero-para-espécies aqui. De fato, o conteúdo do “valor em geral” é revelado como uma unidade diretamente contraditória de valor e valor de uso. Já para o dinheiro e, particular papel moeda, não existe valor de uso, realizando em sua função econômica somente uma das duas definições de valor em geral – aquela do equivalente universal. O valor em geral prova ser mais rico em conteúdo do que sua própria espécie, dinheiro. A categoria universal possui uma característica que não está presente na categoria particular. O dinheiro assim realiza da natureza dupla do valor somente em uma forma unilateral (abstrata). Contudo, o dinheiro é um fenômeno econômico mais concreto, mais complexo, historicamente derivado do que o valor. A partir da perspectiva da concepção tradicional de dedução isso é um paradoxo, não dedução, mas alguma outra coisa.
De fato, isso não é dedução no sentido da velha lógica, mas sim um movimento do pensamento que combina de forma integral ambas a transição do universal ao particular e vice-versa, do particular ao universal, o movimento do abstrato ao concreto e do concreto ao abstrato.
Todas as realidades econômicas refletidas nas categorias de O Capital (mercadoria, dinheiro, força de trabalho, mais-valor, renda) representam tanto o concreto quanto o abstrato – objetivamente, independentemente da interpretação teórica deles. Cada uma dessas categorias reflete uma formação ou fenômeno econômico bastante concreto, e, ao mesmo tempo, cada uma delas reflete uma realidade que é meramente uma implementação unilateral (abstrata) daquele todo do qual é uma parte integral, sendo um momento em desaparecimento no movimento desse todo, sua manifestação abstrata.
A dedução reproduz o processo real de formação de cada uma dessas categorias (isto é, de cada formação econômica real) assim como de todo o sistema delas como um todo, desvelando os elos genéticos reais, unidade genética, onde sobre a superfície aparece um número de fenômenos aparentemente desconectados e até mesmo aqueles que contradizem um ao outro.
Disso a diferença fundamental entre a dedução silogística, lógica-formal e o método de ascensão do abstrato ao concreto.
A base ou a maior premissa do primeiro é um conceito genérico, geral abstrato, o menos significativo em conteúdo e o mais amplo em extensão. Esse conceito se aplica somente aqueles fenômenos particular que não contêm uma característica contradizendo as propriedades do conceito universal. À parte disso, esse conceito não se aplica aos fenômenos nos quais pelo menos uma característica incluída na definição do conteúdo do conceito universal está ausente. Esse fenômeno será avaliado a partir da perspectiva da velha lógica como pertencendo a algum outro sistema, a outro gênero de fenômenos.
O axioma da velha dedução diz: cada um dos fenômenos particulares aos quais um conceito geral abstrato pode se aplicar deve possuir todas as características contidas na definição de conceito universal, e não devem possui quaisquer características contradizendo as características do conceito universal. Somente fenômenos consistentes com esse requisito são reconhecidos na velha dedução como pertencentes ao gênero de fenômenos definido pelo conceito universal. O conceito universal aqui funciona como um critério para selecionar fenômenos que deveriam ser levados em conta ao considerar um certo tipo de fenômeno e, no jargão lógico, predeterminar a partir do início o plano de abstração, o ângulo a partir do qual as coisas são vistas. Mas, tão logo aplicamos esse axioma às categorias da economia política, vemos claramente sua natureza artificial e subjetiva.
Assim, o dinheiro não possui um atributo do valor em geral – valor de uso. A circulação capitalista de mercadoria engloba em si mesma uma característica que contradiz diretamente a lei do valor, a lei da troca de equivalentes – a habilidade de criar mais-valor, a qual a categoria de valor não pode ser aplicada sem uma contradição. Mais-valor, portanto, começa a parecer um fenômeno de algum outro mundo, não a esfera do movimento do valor.
Paradoxos como esse confundiram os economistas burgueses, que não reconheciam qualquer lógica que não a lógica formal ou qualquer dedução que não a dedução silogística.
A tarefa teórica colocada pelo desenvolvimento da economia política pré-marxiana era essa – mostrar que os fenômenos contradizendo diretamente a teoria do valor-trabalho se tornar não somente possível, mas também necessários com base na lei do valor e sem quaisquer violações dela.
Já mostramos em detalhes suficientes que essa tarefa é absolutamente insolúvel enquanto valor for entendido como um conceito genérico, geral abstrato e que pode ser resolvida racionalmente se o valor é interpretado como uma categoria universal concreta refletindo uma realidade econômica bastante concreta (troca direta de uma mercadoria por outra) contendo uma contradição.
Essa concepção de valor deu a Marx uma chave para a solução de todas as dificuldades teóricas que sempre apresentam um obstáculo para a análise teórica da realidade viva se desenvolvendo através das contradições.
A análise de Marx descobre no próprio valor, na categoria básica do desenvolvimento teórico, a possibilidade daquelas contradições que surgem em uma forma explícita sobre a superfície do capitalismo desenvolvimento como crises destrutivas de superprodução, como um antagonismo muito agudo entre excesso de riqueza em um polo da sociedade e insuportável pobreza, no outro, como luta de classe direta resolvida, em última análise, somente através da revolução.
Teoricamente apresentada, ela surge como o resultado inevitável do desenvolvimento daquela mesma contradição que está contida na troca simples de mercadoria, na “célula” de todo o sistema – valor, como em um embrião ou núcleo.
Agora se torna claro porque o valor, ao longo do desenvolvimento teórico das categorias da economia capitalista, prova ser uma diretriz rigorosa permitindo isolar abstratamente somente aquelas características da realidade analisada que estão vinculadas com ela como seus atributos, sendo formas universais e necessárias de existência do sistema capitalista. A apresentação teórica desse sistema incorpora somente aquelas generalizações para as quais as definições de valor podem ser aplicadas. Entretanto, essa inclusão das categorias na esfera do valor, como é desempenhada em O Capital, é essencialmente estranha à subsunção formal dos conceitos sob outros conceitos. Força de trabalho, por exemplo, está incluída na categoria de valor, mas isso reflete diretamente a verdadeira formação do sistema capitalista de relações.
A análise desse sistema mostrou que a circulação de dinheiro-mercadoria forma a base universal, a condição elementar universal e necessária sem a qual o capitalismo não pode surgir, existir ou se desenvolver. As definições teóricas da circulação de dinheiro-mercadoria são, assim, mostradas como sendo reflexos daquelas condições universais objetivas que devem ser satisfeitas por qualquer fenômeno para ser incluído a qualquer hora no movimento do organismo capitalista de mercadoria.
Se um fenômeno não satisfaz as condições ditadas pelas leis da circulação de dinheiro-mercadoria, isso significa que não poderia e, em geral, não pode ser incluído nesse processo, não pode se tornar uma forma do metabolismo capitalista de mercadoria da sociedade.
Definições de valor assim se tornam, para o pensamento teórico, um critério rigoroso de discernimento e seleção daqueles fenômenos e formas econômicas que são inerentes ao capitalismo.
Somente aquele que realmente, independentemente do pensamento, satisfaz as condições ditadas pelas leis imanentes da esfera dinheiro-mercadoria, somente aquele que pode ser assimilado por essa esfera e pode assumir a forma econômica de valor, pode se tornar uma forma de movimento do sistema capitalista. Portanto, o raciocínio, que abstrai do oceano infinito de fatos empíricos somente aquela determinidade histórica concreta desses fatos, que eles devem ao capitalismo como um sistema econômico, é justificado ao abstrair somente aquelas características da realidade analisada que estão incluídas nas definições de valor.
Se certo fato não satisfaz essas definições e requisitos estabelecidos na análise da esfera dinheiro-mercadoria e expresso teoricamente na categoria de valor, essa é uma indicação clara e categórica de que, objetivamente, ele não pertence ao tipo de fatos que a generalização que deve servir como base para construir uma teoria, um sistema de definições históricas concretas do capital. Tudo que não pode assumir a forma de valor, também não pode se tornar capital.
Toda a importância da categoria de valor na teoria de Marx está contida no fato de que ela reflete o elemento universal e necessário, uma “célula” do capital, constituindo a expressão universal e mais abstrata da natureza específica do capital, e, simultaneamente, um fato econômico bastante concreto – troca direta de uma mercadoria por outra mercadoria.
Extremamente indicativo nesta luz é a transição teórica da consideração da esfera dinheiro-mercadoria para a análise da produção de mais-valor.
Qual é a base para a necessidade estritamente lógica dessa transição?
É fundamentada, primeiro de tudo, no fato de que a análise da produção de mais-valor é abordada a partir das definições estabelecidas pela análise da esfera dinheiro-mercadoria. Segundo, o que é analiticamente estudado aqui é um fato real – o fato de que o dinheiro colocado na circulação capitalista, passando por toda sua metamorfose, traz um retorno – mais-valor. Então é preciso retornar para estabelecer as condições que tornam esse fato possível. Uma das condições dessa possibilidade, e uma condição absolutamente necessária, já é estabelecida pela análise da forma dinheiro-mercadoria. É a lei do valor, cuja consideração a ela mostrou que, por um lado, é uma lei absolutamente universal do todo analisado e, por outro, que não contém todas as condições necessárias sob as quais o mais-valor é objetivamente necessário.
Certa condição necessária do fato econômico analiticamente estudado ainda está faltando. O pensamento é então propositadamente direcionado a encontrar essa condição faltante, a condição necessária da possibilidade de mais-valor.
A tarefa é formulada dessa forma: a quantidade desconhecida deve ser encontrada não pela construção lógica, mas dentre um número de fatos econômicos reais, na realidade empírica do capitalismo desenvolvido. Ainda não sabemos o que esse fato é. Ao mesmo tempo, sabemos algo muito importante sobre ele. Ele deve ser em qualquer caso uma mercadoria, isto é, uma realidade econômica totalmente sujeita à lei do valor, aos seus requisitos inquestionáveis. Essa mercadoria, entretanto, deve possui uma característica específica: seu valor de uso deve consistir exatamente em sua habilidade de ser transformado em valor no ato do próprio consumo. Esse segundo requisito imposto sobre a quantidade desconhecida é, como é fácil de ver, uma condição analiticamente estabelecida da possibilidade de mais-valor, de capital.
A consideração empírica da circulação capitalista desenvolvida de mercadoria mostra que somente uma realidade econômica satisfaz essas condições, nomeadamente, força de trabalho. A questão logicamente e corretamente formulada aqui produz a única solução possível: a quantidade desconhecida satisfazer as condições teoricamente estabelecidas é força de trabalho.
Essa conclusão, essa generalização teórica dos fatos reais possui todos os méritos da mais perfeita indução, se a última é interpretada como generalização procedendo de fatos reais. Essa generalização, entretanto, satisfaz simultaneamente as demandas mais rígidas dos adeptos do caráter dedutivo do conhecimento teórico científico.
O modo de ascensão do abstrato ao concreto permite estabelecer estritamente e expressar abstratamente somente as condições absolutamente necessárias da possibilidade do objeto dado em contemplação. O Capital mostra em detalhes a necessidade com a qual o mais-valor é realizado, dada a circulação desenvolvida de dinheiro-mercadoria e força de trabalho livre.
A totalidade de todas as condições necessárias aparece neste método de análise como uma possibilidade real e concreta, enquanto a circulação desenvolvida de dinheiro-mercadoria é mostrada como uma possibilidade abstrata de mais-valor. Para o raciocínio lógico, entretanto, essa possibilidade abstrata aparece como impossibilidade: a análise da esfera dinheiro-mercadoria mostra que suas leis imanentes estão em contradição mutuamente exclusiva com o mais-valor. Da mesma forma, o estudo da natureza da força de trabalho enquanto tal, revela que ela não pode ser considerada como uma fonte de mais-valor. Trabalho em geral cria um produto, um valor de uso, e não valor.
A concepção teórica científica de mais-valor é, nesta estrutura metodológica, focada em descobrir as condições necessárias que tornam possível somente na interação histórica concreta delas. Cada uma delas, consideradas abstratamente, fora das interações concretas com outras, exclui, em princípio, a própria possibilidade de mais-valor. No pensamento, isso aparece como uma contradição mutuamente exclusiva entre a lei do valor (como uma possibilidade abstrata de um fato) e o próprio fato – mais-valor.
Somente a possibilidade concreta é real, somente a totalidade de todas as condições necessárias do ser de uma coisa no condicionamento mútuo histórico concreto delas. Uma solução real da contradição entre a lei universal e a forma empírica de sua realização, entre abstração e fato concreto, só pode ser encontrada através da revelação dessa totalidade concreta de condições. A lei universal abstratamente expressada inevitavelmente fica em relações de contradição mutuamente exclusiva ao fato sob estudo. A partir da perspectiva da lógica dialética, não existe qualquer coisa para temer aqui. Pelo contrário, a contradição lógica é, neste caso, somente uma indicação e característica do fato de que o objeto analisado é entendido abstratamente e não concretamente, que nem todas as condições necessárias de seu ser foram ainda descobertas. As contradições lógicas surgindo necessariamente na cognição são assim resolvidas no desvelamento do sistema concreto de categorias reproduzindo o objeto em toda a plenitude de suas características necessárias, das condições objetivas de seu ser.
Mas, o entendimento concreto não elimina completamente todas as contradições. Pelo contrário, mostra em detalhes que essas contradições são formas logicamente corretas de reflexo da realidade objetiva se desenvolvendo através das contradições. O conhecimento teórico concreto mostra a necessidade do fato de que os fenômenos contradizendo diretamente a lei universal surgem sobre sua base sem violar, mudar ou transformá-la de qualquer forma.
Nesse processo cognitivo, todas as condições necessárias da possibilidade do fenômeno analisado não são simplesmente listadas ou justapostas, mas concebidas na interação histórica concreta delas, nos elos genéticos entre elas.
A mera soma mecânica das condições do mais-valor (circulação desenvolvida de dinheiro-mercadoria e força de trabalho) ainda não constitui sua natureza concreta, real. Mais-valor é o produto da interação orgânica entre as duas, uma realidade econômica qualitativamente nova, e seu entendimento concreto não é simples invenção das características que poderiam ser obtidas a partir da consideração da circulação de dinheiro-mercadoria e força de trabalho. Força de trabalho se torna um fator na produção de mais-valor somente sobre a condição de que ela comece a funcionar naquela forma social que foi desenvolvida pelo movimento do mercado de dinheiro-mercadoria – na forma de uma mercadoria. Mas, a forma econômica da mercadoria também se torna uma forma de movimento do capital somente se domina o movimento da força de trabalho. A interação das leis da circulação de dinheiro-mercadoria e de força de trabalho dá à luz a uma certa realidade econômica nova não contida em qualquer uma delas tomadas separadamente, fora da interação concreta delas.
Portanto, o movimento de raciocínio lógico reproduzindo os momentos necessários do desenvolvimento do mais-valor não pode consistir na combinação ou síntese formal das definições teóricas obtidas na análise de seus componentes, isto é, das definições da esfera dinheiro-mercadoria, por um lado, e força de trabalho como uma mercadoria, por outro. Movimento posterior do pensamento no qual uma concepção de mais-valor é formada só pode proceder através de nova análise de novos fatos – aqueles do movimento do mais-valor como um fenômeno econômico específico que não pode, em princípio, ser reduzido a seus componentes.
Por outro lado, essa consideração teórica posterior do movimento do mais-valor não poderia ocorrer na ausência de categorias desenvolvidas no estudo das leis do movimento do mercado de dinheiro-mercadoria e das características específicas da força de trabalho como mercadoria. A não ser que essas categorias sejam previamente desenvolvidas, a análise teórica dos fatos empíricos do movimento do mais-valor é impossível. Neste caso, somente características abstratas da produção de mais-valor serão obtidas, refletindo meramente a aparência externa desse processo e não definições teóricas concretas.
Análise teórica coincidindo diretamente com a síntese teórica das definições abstratas do mais-valor estabelecidas anteriormente não expressam as formas superficiais abstratas de seu movimento, mas sim as mudanças necessárias que ocorrem no movimento do mercado de dinheiro-mercadoria quando esse movimento envolve uma mercadoria incomum tal como a força de trabalho. Essa mercadoria introduz no movimento da circulação de dinheiro-mercadoria precisamente aquelas mudanças que transformam a circulação de dinheiro-mercadoria na esfera de produção de mais-valor.
A próprio força de trabalho não é aqui considerada como uma característica eterna idêntica em todas as formações, mas em sua determinidade histórica concreta como mercadoria. Isso significa que a primeira coisa que é descoberta nela (e gravada em um conceito) é a forma historicamente definida que assume somente na esfera da circulação de dinheiro-mercadoria.
É isso que distingue a reprodução teórica científica da criação de mais-valor de uma descrição abstrata desse processo, de uma mera expressão abstrata de seus fenômenos superficiais.
Para entender e expressar em conceitos a essência da produção capitalista, de trabalho produzindo mais-valor, é preciso primeiro estabelecer a totalidade inteira de condições necessárias com base na qual tal trabalho se torna possível em geral, e mais tare delineia as mudanças que ela introduz nas próprias condições de sua realização.
A análise das mudanças introduzidas pela força de trabalho na circulação de dinheiro-mercadoria, na produção de valor, portanto, assume a análise preliminar das condições que sofreram essas mudanças, isto é, análise da produção de valor – o processo no qual trabalho assalariado encontra sua existência. Sem isso, a origem do mais-valor é, em princípio, impossível de entender.
Esse método de interpretar os fenômenos permite mais do que uma mera descrição do aspecto no qual eles surgem perante a contemplação direta sobre a superfície do estágio desenvolvimento da existência deles – permite reproduzir, no sentido pleno do termo, sua origem, delinear o surgimento e desenvolvimento deles no presente estado através dos estágios estritamente necessários.
O método de ascensão do abstrato ao concreto é baseado, neste ponto, sobre a circunstância real de que as condições realmente necessárias e universais da origem e desenvolvimento do objeto são retidas a cada momento determinado como formas de sua existência. É por isso que o pensamento pode discernir, na análise de um objeto desenvolvido, sua história suprassumida. Uma abordagem histórica para o estudo de um objeto não pode ser realizada senão por um método de ascensão do abstrato ao concreto.
Portanto, o retrato apresentado nas partes mais abstratas da teoria (por exemplo, o primeiro capítulo de O Capital) diferente muito radicalmente do retrato como ele aprece na contemplação direta e nas noções do estágio desenvolvido do processo. Caso contrário, o grande número de influências governadas por lei, tendências e estímulos levados em conta na ascensão do abstrato ao concreto e, quanto mais concreto o retrato, mas próximo ele chega de coincidir completamente com o retrato dado na contemplação direta e noção.
Como resultado, O Capital de Marx mostra mais do que o “esqueleto econômico” do organismo social, mais do que sua estrutura interna. Lenin acreditava ser a grande vantagem do método de Marx que, ao “explicar a estrutura e desenvolvimento de determinada formação da sociedade exclusivamente através das relações de produção, ele contudo em todo lugar e incessantemente escrutinou a superestrutura correspondente a essas relações de produção e vestiu o esqueleto em carne e sangue”. O Capital, como Lenin apontou, “mostrou o todo da formação social capitalista para o leitor como uma coisa viva – com seus aspectos cotidianos, com a verdadeira manifestação social do antagonismo de classe inerente nas relações de produção, com a superestrutura política burguesa que protege a regra da classe capitalista, com as ideias burguesas de liberdade, igualdade e assim por diante, com as relações familiares burguesas” (Lenin, 1960, pp. 141-142)Referência 13.
O Capital também mostra que essas relações não podem ser outra que não elas, tanto quanto toda a vida social é baseada na economia mercantil capitalista privadamente proprietária, assim como uma pessoa com uma curvatura da espinha não pode ser graciosa. É somente o túmulo que pode corrigir essas relações reais. Desde que a lei do mais-valor funcione, tanto as crises quanto o desemprego são inevitáveis, pois eles são meramente as formas externas de manifestação da essência mais profunda do organismo de mercadoria capitalista – as contradições da acumulação do mais-valor. Essas contradições são inerentes ao capitalismo da mesma forma que o metabolismo proteico é inerente ao corpo vivo. Eles não são pontos na superfície, mas uma expressão de sua própria essência. Isso é exatamente o que O Capital mostra, e isso é o que seu método é usado – o método de alcançar uma compreensão dos fenômenos a partir da essência universal deles, o método de ascensão do abstrato ao concreto.
Tendo aceito o método de Marx, é impossível não aceitar todas as conclusões de O Capital. É por isso que o método é tão odiado pelos apologistas do capitalismo moderno. Ele prova que a crise de superprodução, a existência de um exército de reserva de desempregados e todas as outras formas similares de “riqueza” burguesa são formas universais e absolutas da produção e acumulação de mais-valor, suas formas integrais, não somente as consequências, mas também as condições necessárias desse processo.
Por essa razão, os filósofos e lógicos burgueses há muito tentam desacreditar o método de Marx, chamando-o de “construção especulativa”, “a forma hegeliana de raciocínio”, alegadamente adotado por Marx sem a devida crítica etc., embora, como nos esforçamos para mostrar, a semelhança com o método hegeliano é puramente externa e formal. A dedução desempenhada por Marx é meramente um sinônimo do método materialista, um método de explicar as relações espirituais-ideológicas, políticas, legais, morais e outras, a partir das relações materiais, a partir das relações de produção.
Em O Capital, Marx indicou esse fato bastante inequivocamente:
De fato, é muito mais fácil encontrar, por meio da análise, o núcleo terreno das nebulosas representações religiosas do que, inversamente, desenvolver, a partir das condições reais de vida de cada momento, suas correspondentes formas celestializadas. Este é o único método materialista e, portanto, científico (Marx, 2013, p. 446, nota 89)Referência 14.
Esse é o método que insiste que a tarefa do conhecimento científico do dinheiro não reside em agarrar o fato de que o dinheiro é também uma mercadoria, mas em delinear as razões e a forma na qual a mercadoria se torna dinheiro. Essa é uma forma muito mais difícil, mas também mais segura. Esse método mostra as relações da vida real que são refletidas nas formas ideológicas conhecidas e, além disso, explica porque as formas determinas, ao invés de alguma outra, ideológica, política, legal e científica, se desenvolveram. Todas essas formas são literalmente “deduzidas” a partir das relações da vida real, a partir de suas contradições. Aqui reside a profunda diferente entre a crítica marxiana e a feuerbachiana das formas de consciência religiosa. Aqui consiste a principal vantagem do método dialético de Marx, Engels e Lenin, e, ao mesmo tempo, sua natureza materialista, em aplicação a qualquer campo de investigação – desde a economia política até epistemologia e estética.
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O Capital de Marx, é de fato o tipo superior de escola para o pensamento teórico. Um cientista se especializando em qualquer campo do conhecimento pode usá-lo como fonte das mais válidas ideias a respeito do método teórico de pesquisa. Filósofos e lógicos devem tornar este tesouro mais acessível. Naturalmente, um único autor e um único livro podem resolver essa tarefa somente em uma extensão muito limitada. Tendo em vista a complexidade e quantidade de trabalho envolvido, essa tarefa necessitará de toda uma série de estudos.