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Primeira Edição: ...
Fonte: Fundação Maurício Grabois. Revista Princípios, Edição 15, Maio, 1988, pág: 11-21.
HTML: Fernando A. S. Araújo
Observação: A presente versão é um resumo da Revista Princípios, o texto original possui 98 páginas.
A teoria e a prática da "autogestão" iugoslava constituem uma negação cabal dos ensinamentos do marxismo-leninismo e das leis gerais da construção do socialismo. O socialismo de "autogestão" na economia tem como fundamento a idéia de que supostamente o socialismo não pode ser construído através da concentração dos meios de produção em mãos do Estado socialista, mediante a criação da propriedade estatal como forma superior de propriedade socialista, mas sim através do desmembramento da propriedade estatal socialista em propriedade de grupos particulares de operários, que hipoteticamente a administram diretamente. Marx e Engels, desde 1848, assinalavam que:
"o proletariado valer-se-á de sua dominação política para ir arrancando gradualmente da burguesia todo o capital, para centralizar todos os instrumentos de produção em mãos do Estado, ou seja, do proletariado organizado em classe dominante”(1).
Lênin também chamou a atenção para o mesmo quando combateu duramente os pontos de vista anarco-sindicalistas do grupo antipartido da "oposição operária", que exigia que as fábricas fossem entregues aos operários e que a direção e a organização da produção não fossem exercidas pelo Estado socialista, mas sim por um denominado "congresso de produtores", como representante dos grupos de trabalhadores particulares. Lênin qualificava este ponto de vista de:
“(...) ruptura total com o marxismo e o comunismo"(2),
e sublinhava que:
“Toda ação para legalizar, em forma direta ou indireta, a propriedade dos operários de fábricas isoladas ou de profissões isoladas sobre sua produção ou seu direito de debilitar ou estorvar as ordens do poder estatal, é uma grande tergiversação dos princípios fundamentais do Poder soviético e a renúncia completa ao socialismo"(3).
Desde junho de 1950, quando apresentou à Assembléia Popular da República Federativa Popular da Iugoslávia a lei sobre a "autogestão", desenvolvendo suas concepções revisionistas sobre a propriedade no "socialismo", Tito, entre outras coisas, disse:
"De agora em diante a propriedade estatal sobre os meios de produção, as fábricas, as minas, as estradas de ferro passam gradualmente à forma superior de propriedade socialista; a propriedade estatal é a forma inferior da propriedade social e não a superior”, entre os "atos mais característicos de um país socialista", "é a transferência das fábricas e de outras empresas econômicas estatais aos operários para que as administrem por sua conta própria (...)”, porque assim realizar-se-á "a palavra de ação do movimento operário: as fábricas aos operários"(4).
Estas teses de Tito se parecem como duas gotas d'água não somente às concepções reacionárias da "oposição operária" anarco-sindicalista, desmascaradas por Lênin em seu tempo, como também às de Proudhon que, em sua obra O que é a propriedade, afirma:
"o produto espontâneo de uma unidade coletiva (...) pode ser considerado como o triunfo da liberdade (...) e como a maior forma revolucionária existente e que pode ser oposta ao poder".
Ou então vejamos o que dizia um dos chefes da Segunda Internacional, Otto Bauer, em seu livro A via para o socialismo:
"Quem, portanto, no futuro dirigirá a indústria socializada? O governo? Não! Se o governo dirigisse todos os setores industriais, sem exceção, far-se-ia poderosíssimo em relação ao povo e à representação nacional. Tal crescimento do poder governamental seria perigoso para a democracia"(5).
Sustentando os mesmos pontos de vista que Tito, E. Kardelj sublinha também:
"Nossa sociedade está obrigada a atuar assim, visto estar destinada a aplicar a autogestão e a socialização, sob a forma de autogestão, da propriedade social, em oposição à perpetuação da propriedade do Estado nas relações socialistas de produção" (pág. 66)(6).
Isto quer dizer na Iugoslávia instaurou-se o sistema de propriedade privada e não existe a propriedade estatal socialista, a propriedade de todo o povo.
O oposto ocorre em nosso país, onde esta propriedade comum, socialista, é dirigida pelo Estado de ditadura do proletariado com a participação da classe operária e das massas trabalhadoras em formas corretas, centralizadas, planificadas de baixo e orientadas de cima.
O caminho da descentralização dos meios de produção, segundo as idéias anarco-sindicalistas da "autogestão" operária, em essência nada mais é que uma maneira refinada de conservar e consolidar a propriedade privada capitalista sobre os meios de produção, porém de uma forma mascarada como "propriedade administrada por grupos de operários". Na realidade, todos os termos complicados e obscuros inventados pelo "teórico" Kardelj em seu livro – como sejam: "a organização fundamental do trabalho associado", "os conselhos operários da organização fundamental composta, do trabalho associado", "as comunidades de autogestão dos interesses" etc. etc. e que também estão sancionados na legislação do Estado capitalista iugoslavo – não são mais que uma fachada envernizada, que oculta a negação à classe operária de seu direito à propriedade sobre os meios de produção e a sua feroz exploração por parte da burguesia.
Esta propriedade privada existe na Iugoslávia não só em forma mascarada como também em sua forma corrente, na cidade e no campo. Isto é reconhecido pelo próprio E. Kardelj quando escreve:
"em nossa sociedade têm particular importância também direitos tais como (...) o direito à propriedade pessoal, ou também, em determinados limites, à propriedade privada” (pág. 177).
Em vão se esforça Kardelj para atenuar o efeito negativo que possa produzir o aberto reconhecimento do direito à propriedade privada, mesmo sendo sob a forma de pequena produção, a qual, como dizia Lênin, engendra a cada dia e a cada hora capitalismo. Os revisionistas iugoslavos têm promulgado também leis especiais que estimulam a economia privada, leis que reconhecem aos cidadãos o direito de "fundar empresas" e "empregar mão-de-obra". A Constituição iugoslava menciona expressamente:
"Os produtores privados têm a mesma posição econômica e social, os mesmos direitos e obrigações que os trabalhadores nas organizações econômicas e sociais”.
A pequena propriedade privada predomina amplamente na agricultura iugoslava, ocupando cerca de 90% da superfície das terras cultiváveis: 9 milhões de ha. pertencem ao setor privado e 1.150.000 ha., ou seja, mais de 10%, ao setor capitalista monopolista chamado social. Mais de 5 milhões de camponeses na Iugoslávia trabalham nas terras do setor privado. O campo iugoslavo nunca se orientou pelo caminho da verdadeira transformação socialista. Kardelj em seu livro nada diz dessa situação e evita abordar o problema da maneira como seu sistema de "autogestão" se estende à agricultura. Mas se ele pretende construir o socialismo mediante este sistema, então como pode esquecer de "construir o socialismo" também na agricultura, que representa quase a metade da economia? A teoria marxista-leninista nos ensina que o socialismo se constrói tanto na cidade como no campo, e não sobre a base da propriedade capitalista de Estado, da propriedade supostamente administrada pelos grupos de operários ou da propriedade privada aberta, mas sim somente sobre a base da propriedade social socialista sobre os meios de produção.
Na Iugoslávia está autorizada a propriedade privada de 10 até 25 hectares(7), porém a lei iugoslava, que permite a compra e venda, o arrendamento e a hipoteca da terra, a compra e venda de máquinas agrícolas e o trabalho assalariado na agricultura, concedeu à nova classe burguesa do campo, os kulaks, a possibilidade de aumentar, às expensas dos camponeses pobres, as superfícies das terras, os meios de cultivo, os tratores e os veículos de transporte e, por conseguinte, de acrescentar e intensificar a exploração capitalista.
As relações capitalistas de produção estenderam-se tão profundamente na economia iugoslava que inclusive se têm dado livre campo de ação aos capitalistas e às firmas estrangeiras, a fim de que façam suas inversões e, de acordo com a burguesia local, explorem a classe operária e as outras massas trabalhadoras iugoslavas. Com justa razão o sistema de "autogestão" iugoslava pode ser definido como um poder de cooperação do capitalismo iugoslavo com o capitalismo norte-americano e com os outros capitalistas. Estes se têm feito sócios na apropriação das riquezas da Iugoslávia em todos os campos, nas fábricas, nas comunicações, nos hotéis, nas casas e até no espírito da população.
Se a economia iugoslava fez algum progresso, este em absoluto se deve ao sistema de "autogestão", como os revisionistas titistas tentam fazer crer. Na Iugoslávia têm sido aplicados em forma de inversões, de créditos e de "ajudas" grandes capitais capitais provenientes do mundo capitalista, que constituem uma parte considerável da base material do sistema capitalista-revisionista iugoslavo. Somente as dívidas da Iugoslávia superam os 11 bilhões de dólares. Recebeu dos Estados Unidos da América mais de 7 bilhões de dólares em créditos.
Não é sem determinadas intenções que a burguesia internacional assentou o sistema de "autogestão socialista" iugoslavo sobre essa base material e financeira. As muletas do capitalismo ocidental têm auxiliado este sistema a se manter em pé como um modelo de conservação da ordem capitalista com etiquetas pseudo-socialistas.
Os capitalistas estrangeiros, com suas inversões, construíram na Iugoslávia numerosas obras industriais, que produzem artigos de muito boa e até de péssima qualidade. Os produtos de melhor qualidade são vendidos, naturalmente, ao exterior, mas poucos o são no país. Mesmo que no exterior exista uma grande produção capitalista e todos os mercados tenham sido monopolizados pelos mesmos capitalistas que fizeram inversões na Iugoslávia, de qualquer maneira estes vendem os produtos de boa qualidade em seus mercados obtendo enormes benefícios, porque a mão-de-obra na Iugoslávia é barata, o custo de produção é menos elevado que nos países capitalistas, onde os sindicatos, em certa medida, exigem do capital algumas reivindicações em favor dos operários. Os melhores artigos produzidos pelas fábricas iugoslavas são levados pelas sociedades multinacionais que operam também na Iugoslávia. Mas, além dos ganhos que obtêm por esta via, os investidores estrangeiros tiram outros, principalmente deduzindo interesses dos capitais que têm investido na Iugoslávia. Frequentemente retiram também estes ganhos sob a forma de matérias-primas ou elaboradas.
O demagogo Kardelj, em seu livro, fala muito do sistema de "autogestão"; no entanto, não diz palavra sobre a presença e o importante papel que desempenha o capital estrangeiro para manter de pé o sistema de "autogestão" .
Nos países burgueses, diz Kardelj, o verdadeiro poder se encontra e
"(...) se manifesta, antes de tudo, nos laços do poder executivo estatal com os cartéis políticos fora do parlamento”.
"Paralelamente ao incremento da força do poder interior extraparlamentar – prossegue Kardelj – as relações sociais atuais nos países capitalistas altamente desenvolvidos têm também como sinal característico um novo fenômeno: a criação do Poder extraparlamentar internacional, ou seja, mundial" (pág. 54).
Com isto Kardelj procura demonstrar que a "autogestão" iugoslava supostamente salvou-se de tal situação. Porém a realidade, como explicamos linhas acima, é inteiramente diversa: a "autogestão" iugoslava é uma co-administração capitalista, iugoslava e estrangeira. Os capitalistas estrangeiros, ou seja, as sociedades, os consórcios e os que têm feito inversões, têm na Iugoslávia o mesmo poder de decisão que o poder iugoslavo tem sobre a política e o desenvolvimento geral do país.
Na realidade, as chamadas empresas sob autogestão, pequenas ou grandes, são obrigadas a levar em conta as exigências dos investidores estrangeiros. Estes investidores têm suas próprias leis, as quais impuseram ao Estado iugoslavo, contam com seus representantes diretos nestas empresas conjuntas, representantes através dos quais exercem sua influência na Federação. Na realidade, o investidor impõe sua vontade direta ou indiretamente à Federação, às empresas ou às sociedades conjuntas e precisamente isto a "autogestão" quer dissimular. E é esta camuflagem, este tour de passe-passe — como dizem os franceses — que Kardelj quer fazer, para "demonstrar" o absurdo segundo o qual a "autogestão" iugoslava é o verdadeiro socialismo. Mas aquilo que tenta negar em seu livro é reconhecido diariamente, com numerosos fatos, pela imprensa ocidental, e inclusive pela agência iugoslava de informações TANJUG que, em 16 de agosto último, informou sobre a proclamação de um novo regulamento da Assembléia Executiva Federativa, que trata sobre os investimentos estrangeiros na Iugoslávia. Este regulamento estende ainda mais os direitos dos investidores estrangeiros na Iugoslávia.
"Conforme esta lei, sublinha esta agência, os sócios estrangeiros, dentro dos limites dos acordos concluídos com as organizações de trabalho socializado do país, podem realizar seus investimentos em forma de divisas, de equipamentos, de produtos semimanufaturados e de tecnologia. Os investidores estrangeiros têm os mesmos direitos que as organizações de trabalho socializado do país que investem seus meios em alguma outra organização de trabalho associado”.
Mais abaixo a agência TANJUG indica:
"prevê-se que este regulamento aumentará o interesse dos estrangeiros, porque ele garante a atividade econômica conjunta em longo prazo. Além disto, praticamente na atualidade não há setor, exceto dos seguros sociais, do comércio interior e das atividades sociais, onde os estrangeiros não possam investir seus fundos".
Mas não se pode vender o país ao capital estrangeiro. E, não obstante esta realidade inteiramente capitalista, o "comunista" Kardelj tem o descaramento de afirmar:
"(...) nossa sociedade adquiriu um conteúdo e uma estrutura socioeconômica própria muito mais sólida, constituídos sobre as relações socialistas de produção e de autogestão (...)” que“(...) permitem e asseguram o desenvolvimento cada vez mais livre, independente e auto-administrado de nossa sociedade!" (pág. 7-8).
Kardelj em seu livro coloca o homem em primeiro plano e o considera como o elemento principal da sociedade, o elemento produtor a quem corresponde o direito de organizar e de distribuir a produção. Segundo ele, este elemento, no sistema de "autogestão", socializa o trabalho nas empresas e exerce sua direção através dos chamados conselhos operários, "eleitos" pelos operários e que, supostamente, de acordo com os funcionários da administração expressamente designados, decidem sobre tudo na empresa, sobre o trabalho, os salários etc.
Esta constitui a forma típica das empresas capitalistas, onde nas ações domina o capitalista, o qual, a seu redor, tem grande número de funcionários e técnicos que conhecem a situação da produção e organizam sua distribuição. Naturalmente, a maior parte dos ganhos favorece o capitalista, que é o dono da empresa capitalista; em outras palavras, é ele quem se apropria da mais-valia. Na "autogestão" iugoslava, uma grande parte da mais-valia é apropriada pelos funcionários, pelos dirigentes das empresas e pelo pessoal de engenharia e técnico, enquanto a Federação ou uma República se apodera da "parte leonina" a fim de financiar os elevados salários de todos os funcionários do aparelho central, quer seja da Federação quer seja da República. É necessário dispor de fundos para manter de pé a ditadura titista: o exército, o Ministério do Interior e a Segurança do Estado, o Ministério das Relações Exteriores etc., que dependem da Federação, que são inflados e que ampliam-se incessantemente. Neste Estado federativo desenvolveu-se uma grande burocracia de funcionários e de dirigentes improdutivos, que recebem salários bastante elevados, fruto do suor e do sangue dos operários e dos camponeses. Além disso, uma grande parte da receita é apropriada pelos capitalistas estrangeiros que investiram nestas empresas, que têm seus representantes nos "conselhos administrativos" ou nos "conselhos operários", ou seja, que participam da direção das empresas. Assim é que neste sistema denominado "socialismo de autogestão", os operários encontram-se em uma situação de total exploração.
A engrenagem dos "conselhos operários" e dos "comitês de autogestão", com suas respectivas comissões, foi inventada pelos revisionistas de Belgrado somente para criar a ilusão entre os operários de que, "sendo eleitos", participando e discutindo nestes organismos, hipoteticamente eles é que decidem os assuntos da empresa, da "sua" propriedade. Segundo Kardelj,
"(...) Os operários na organização básica do trabalho associado (...) administram o trabalho e a atividade da organização de trabalho associado e os meios de reprodução sociais (...), decidem todas as formas de associação e de nexo entre seu trabalho e os meios de produção e sobre toda a receita que obtêm com seu trabalho associado (...) dividem a receita para o consumo pessoal, comum e geral em concordância com os critérios definidos sobre as bases da autogestão” (pág. 160) etc. etc.
Tudo isto nada mais é que mentiras, porque nesta Iugoslávia onde domina a democracia burguesa não existe uma verdadeira liberdade de pensamento nem de ação para os trabalhadores. A liberdade de ação nas empresas de "autogestão" é falsa. O operário iugoslavo não dirige nem goza dos direitos que proclama com tanta pompa o "ideólogo" Kardelj. O próprio Tito, no discurso pronunciado recentemente perante o ativo dirigente da Eslovênia, supostamente para demonstrar que é realista e adversário das injustiças de seu regime, disse: a "autogestão" não impede o aumento dos salários daqueles que trabalham mal às expensas dos que trabalham bem, enquanto os dirigentes das fábricas, responsáveis pelas perdas, podem encobrir sua responsabilidade ocupando funções de direção em outras fábricas, sem temer o fato de serem criticados por alguém pelos erros que cometeram. Ainda que em "teoria" E. Kardelj tenha suprimido a burocracia e a tecnocracia, o papel de uma classe dominante tecnocrática, na realidade, na prática, se desenvolveu rapidamente e encontrou um amplo campo de ação neste sistema supostamente democrático no qual o papel do homem trabalhador é ficticiamente "determinante". Na verdade, o que é determinante é o papel desta camada de funcionários e de novos burgueses que dominam as empresas sob "autogestão". São eles que elaboram o plano, que fixam os investimentos, os salários de cada um dos operários e os próprios, seguindo, naturalmente, a lei do funil. Promulgaram-se leis e regulamentos de tal modo que os ganhos sejam muito elevados para a direção e reduzidos para os operários.
Na Iugoslávia, esta camada reduzida de pessoas, engordada com o suor e o trabalho dos operários, que toma decisões em seu próprio interesse, converteu-se em classe capitalista. Assim foi criado o monopólio político do poder de decisão e da distribuição dos salários pela elite nas empresas sob "autogestão" socialista, enquanto Kardelj, não deixando de repetir a mesma cantilena, pretende fazer crer que este sistema político, inventado pelos titistas, contribui para criar as condições necessárias para o exercício real dos direitos de "autogestão" e "democráticos" dos operários, os quais o sistema reconhece em princípio.
Foi precisamente o sistema de "autogestão" que estimulou a formação da nova classe capitalista. O próprio Tito reconhece este triste fato através de uma "crítica severa" supostamente feita aos exploradores dos operários, a todos aqueles que dirigem este sistema de "autogestão socialista" e dele se aproveitam. Em seus numerosos discursos, não obstante esforçar-se por encobrir os males de seu sistema pseudo-socialista, tem-se visto obrigado a reconhecer a grande crise que se apoderou deste sistema pseudo-socialista e a polarização da sociedade iugoslava em ricos e pobres.
"Eu não considero enriquecimento, diz ele, o que o homem ganha por seu trabalho, inclusive se, com seus ganhos, tenha construído um chalé. Mas quando se trata de centenas de milhões e inclusive de bilhões, estamos frente a um roubo (...) Estes não são salários obtidos com a força de trabalho (...) Esta riqueza se cria por meio de diversas especulações dentro e fora do país (...) Agora, devemos ver o que ocorreu com aqueles que constroem casas, uma em Zagreb, outra em Belgrado, uma terceira em algum lugar da costa ou em algum outro lugar. Não se trata de simples casas de repouso, mas de chalés que freqüentemente são alugados. Além disso alguns não têm um, porém dois ou três carros por família”(8).
Em outra ocasião, para fazer crer que está, supostamente, contra o desenvolvimento de camadas ricas e pobres na sociedade, assinalou também que os depósitos de algumas pessoas ricas privadas nos bancos iugoslavos ascendem a cerca de 4.500 milhões de dólares, sem calcular as somas depositadas nos bancos estrangeiros e aquelas que têm em mãos.
Falando sobre o sistema inventado pelos revisionistas titistas, Kardelj vê-se obrigado a mencionar de passagem a necessidade de lutar
"(...) contra as diversas formas de deformação e as tentativas de usurpação dos direitos dos trabalhadores e dos cidadãos à autogestão" (pág. 174).
O caminho de saída para estes "abusos" é buscado novamente no marco do sistema de "autogestão" ampliando" (...) o correspondente mecanismo de controle social democrático” (pág. 178).
É oportuno indagar: a que classe Kardelj faz alusão, quando fala da "usurpação dos direitos dos trabalhadores à autogestão"? Naturalmente não o diz, porém se trata da velha e da nova classe burguesa que usurpou o poder da classe operária, que a mantém sob a férula e a explora até a medula.
Kardelj em vão se esforça para apresentar os "conselhos operários", as "organizações fundamentais do trabalho associado" etc. etc. como a expressão mais autêntica da "democracia" e da "liberdade" do homem em todas as esferas sociais. "Os conselhos operários" não são mais que órgãos puramente formais, que não defendem nem tornam realidade os interesses dos operários, mas sim a vontade dos dirigentes das empresas, porque corrompendo-os material, política e ideologicamente, integraram-nos na "aristocracia" e na "burocracia operária", agências que têm como missão enganar a classe operária com falsas ilusões.
A realidade iugoslava é um claro testemunho da falta da verdadeira democracia para as massas. E não poderia ser de outra maneira. Lênin assinalava que:
"(...) a democracia na produção é um termo que se presta a interpretações distorcidas. Pode-se entendê-la no sentido de que nega a ditadura e a direção unipessoal. Pode-se interpretá-la no sentido de um obstáculo ou de um pretexto que se põe à democracia ordinária"(9).
Não pode haver democracia socialista para a classe operária sem seu Estado de ditadura do proletariado. O marxismo-leninismo nos ensina que a negação do Estado da ditadura do proletariado é a negação da própria democracia para as massas trabalhadoras.
A negação dos revisionistas iugoslavos do Estado de ditadura do proletariado, da propriedade social socialista sobre a qual se apóia, levou-os a uma direção descentralizada da economia e sem um plano único de Estado. O desenvolvimento da economia nacional sobre a base do plano único de Estado e sua direção pelo Estado socialista sobre a base do princípio do centralismo democrático são uma das leis gerais e dos princípios fundamentais da construção do socialismo em cada país. Do contrário, ocorre como na Iugoslávia, onde se constrói o capitalismo. Kardelj pretende que é reconhecido aos operários, em suas organizações de "autogestão", o direito a "(...) dirigir a atividade da organização do trabalho associado” (pág. 160), ou seja, das empresas, podendo, pois, planificar supostamente também a produção. No entanto, qual é a realidade? O operário nestas organizações não dirige, tampouco elabora o chamado plano de base. Isto é feito pela nova burguesia a direção das empresas — enquanto se dá aos operários a impressão de que supostamente são os "conselhos operários" que fazem a lei nestas organizações sobre a "autogestão". Isto ocorre também nos países capitalistas, onde é o capitalista que detém todos os poderes nas empresas privadas, que conta com sua própria tecnocracia, seus tecnocratas que as dirigem, embora em certos países haja também representantes dos operários, cuja função é destituída de importância, mas o suficiente para forjar entre os operários a falsa ilusão de que supostamente também eles participam na direção dos assuntos da empresa. No entanto, isto é uma falácia.
A chamada planificação feita nas empresas iugoslavas sob a "autogestão" não somente não se pode qualificar de socialista senão que, ao realizá-la conforme o exemplo de todas as empresas capitalistas, ela conduz às mesmas consequências observadas em toda economia capitalista, como a anarquia na produção, a espontaneidade e a uma série de outras contradições que se manifestam da maneira mais aberta e aguda na economia e no mercado iugoslavos.
"(...) O livre intercâmbio do trabalho entre a produção de mercadorias e o mercado livre que se auto-administra, (o grifo é nosso) no atual estágio de desenvolvimento socioeconômico, escreve Kardelj, é uma condição para a auto-administração (...) Este mercado (...) é livre no sentido de que as organizações sob a autogestão do trabalho associado se integram livremente e com menos intervenções administrativas possíveis, nas relações de livre intercâmbio de trabalho. A supressão desta liberdade conduz inevitavelmente à renovação do monopólio estatal sobre o aparelho de Estado" (pág. 95).
Não há negação mais manifesta dos ensinamentos de Lênin, que escreveu:
"Ao comércio 'justo' que não se esquiva do controle do Estado, devemos apoiá-lo, nos convém desenvolvê-lo", "(...) já que a liberdade de venda, a liberdade de comércio é um desenvolvimento do capitalismo"(10).
A economia política do socialismo indica que em um regime socialista, o comércio, assim como todos os outros processos da reprodução social, é um processo planificado e dirigido de maneira centralizada, que se baseia na propriedade social socialista sobre os meios de produção e ao mesmo tempo é parte integrante das relações socialistas de produção. No entanto, estes ensinamentos para o revisionista Kardelj são totalmente estranhos e isto se deve à negação que faz do papel econômico do Estado socialista e da propriedade socialista. O mercado interno iugoslavo é um mercado tipicamente capitalista descentralizado no qual qualquer um pode vender e comprar livremente os meios de produção, o que está em oposição com as leis do socialismo. Por isso, a agência TANJUG se vê obrigada a admitir que todo o mercado iugoslavo está dominado pelos empresários, pelos intermediários e pelos especuladores. No mercado reina o caos, a espontaneidade, as flutuações catastróficas dos preços etc. Segundo dados do Instituto Federativo Iugoslavo de Estatística, os preços dos 45 produtos principais e as tarifas dos serviços sociais na Iugoslávia aumentaram 149,7% no período 1972-1977.
No que diz respeito à venda de mercadorias no país, o poder aquisitivo é muito débil, devido aos baixos salários dos trabalhadores e porque no último balanço das empresas não fica grande coisa para distribuir aos operários. A empresa deseja vender em qualquer parte e independentemente seus produtos, porque o único desejo de seus dirigentes principais, ou seja, dos príncipes da nova burguesia, é assegurar lucros. Porém como gerar estes lucros, se os compradores são pobres? Então se tem recorrido a outras formas, sendo uma delas a venda a crédito. A venda a crédito dos produtos fabricados por estas empresas sob a "autogestão" é uma nova cadeia arrastada pelo operário iugoslavo, do mesmo modo que este mesmo sistema capitalista faz pesar sobre os operários dos países capitalistas, mas que na Iugoslávia se intitula "autogestão socialista".
Estes são os mesmos traços que caracterizam igualmente o comércio exterior iugoslavo onde não existe o monopólio do Estado. Cada empresa, segundo os desejos da classe patronal, pode estabelecer contratos e acordos com qualquer firma ou sociedade multinacionais, com qualquer país estrangeiro para comprar ou vender matérias-primas, máquinas, produtos manufaturados, tecnologia etc. Esta prática antimarxista tem feito também com que a Iugoslávia se transforme em um país vassalo do capital mundial, que se agregue à profunda crise econômica e financeira que tem acossado todo o mundo capitalista e revisionista, crise que se manifesta também em outros setores.
Como revisionista recalcitrante, E. Kardelj nega, além disso, o papel do Estado socialista também em outros setores, como relações financeiras e outras atividades de caráter diverso. Ele escreve:
"As relações nos setores em que assentam as comunidades de autogestão dos interesses, por regra geral, sem a intervenção do Estado, ou seja, sem a mediação do orçamento e de outras medidas administrativas e fiscais” (pág. 167).
Na Iugoslávia, como nos outros países capitalistas, propagou-se em vasta escala o sistema de concessão de créditos por parte dos bancos em lugar do financiamento orçamentário das inversões para o desenvolvimento das forças produtivas e de outras atividades. Os bancos converteram-se em centros do capital financeiro e são precisamente estes os que jogam um importantíssimo papel na economia iugoslava, interesse da nova burguesia revisionista.
Assim, um sistema anarco-sindicalista instaurou-se na Iugoslávia e tem sido denominado de "autogestão socialista". E o que trouxe à Iugoslávia esta "autogestão socialista"? Todos os males. Em primeiro lugar a anarquia na produção. Neste país nada é estável, cada empresa inunda o mercado com seus produtos e se desenvolve a concorrência capitalista, posto que não existe uma atividade coordenada, porque não é a economia socialista que dirige a produção. A mesma empresa luta, em concorrência com outras, por segurar as matérias-primas, os mercados de venda etc. Muitas empresas entram em falência por falta de matérias-primas, devido aos grandes déficits que este desenvolvimento caótico capitalista cria, ao aumento dos estoques condicionados por falta de poder aquisitivo e à saturação do mercado com artigos fora de moda. A situação dos serviços de artesanato na Iugoslávia é também muito grave. Tito, falando a respeito no ativo dirigente da Eslovênia, não pôde ocultar o fato de que:
"Atualmente, com frequência, cansamo-nos um bocado para encontrar, por exemplo, um carpinteiro ou algum outro artesão para uma reparação qualquer, e quando o encontramos, exploramo-lo até o ponto em que seus cabelos ficam em pé".
Independentemente do fato de, como já indicamos mais acima, os produtos fabricados por alguns complexos industriais modernos serem de boa qualidade, na Iugoslávia cria-se uma situação difícil, em consequência da falta de mercados para estes produtos. Esta é a origem do déficit da balança comercial iugoslava. Somente nos 5 primeiros meses deste ano o déficit alcançou os 2 bilhões de dólares. No XI Congresso da Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia, Tito declarou:
"o déficit referente ao mercado ocidental tornou-se quase intolerável".
Aproximadamente três meses após este congresso, voltou a declarar na Eslovênia:
"Temos, em particular, grandes dificuldades em nossos intercâmbios comerciais com o Mercado Comum Europeu. Aqui a diferença, desfavorável para nós, é considerável e segue aumentando. Devemos falar muito sério com eles a respeito. Muitos deles nos prometem que estas coisas se ajustarão, que eles aumentarão as importações da Iugoslávia, porém de todos estes informes até o presente temos obtido pouco benefício. Cada um joga a culpa no outro”.
E o déficit nos intercâmbios comerciais com o exterior, não mencionado por Tito em seu discurso, em 1977 superou os 4 bilhões de dólares. Isto é uma catástrofe para a Iugoslávia.
Todo o país encontra-se em uma crise contínua e as grandes massas trabalhadoras vivem na pobreza. Um grande número de operários iugoslavos está desempregado, é demitido ou emigra para o exterior. Esta emigração econômica, este fenômeno capitalista, Tito não só o conhece, como também tem recomendado estimulá-lo. Em um país socialista não pode haver desemprego e o mais claro testemunho disto é a Albânia. Enquanto isso, nos países capitalistas, nos quais naturalmente também se inclui a Iugoslávia, existe e se cria desemprego em todas as partes. Quando na Iugoslávia há mais de 1 milhão de desempregados e mais de um milhão e trezentos mil emigrantes econômicos que vendem sua força de trabalho à Alemanha Federal, à Bélgica, à França etc.; quando continua aumentando rapidamente a riqueza privada dos indivíduos que exercem altas funções, quer seja no poder, quer seja nas empresas e instituições; quando os preços dos artigos de primeira necessidade aumentam dia a dia e as empresas e suas filiais que falem se contam aos milhares, tudo isto demonstra que o sistema de "autogestão iugoslava" é um grande blefe. E Kardelj, com o maior descaramento, chega até ao ponto de dizer:
"em nossas condições, a auto-administração socialista é a forma mais direta e a maior expressão da luta pela emancipação do trabalhador, por sua liberdade de trabalhar e de criar, para que sua influência econômica e política seja determinante na sociedade" (pág. 158).
Indo mais além com sua conhecida fraseologia, com sua demagogia de tipo burguês, Kardelj mente até o extremo ao dizer:
"Havendo-se sancionado mediante a Constituição e as leis, os direitos dos operários, sobre a base de seu trabalho socializado, nossa sociedade amplia ainda mais as dimensões da verdadeira liberdade dos operários e dos trabalhadores nas relações materiais da sociedade" (pág. 162).
Que entende este apologista da burguesia por "extensão das dimensões da verdadeira liberdade dos operários"? "Liberdade" de estar desempregado, "liberdade" de abandonar sua família e sua pátria para ir vender sua força de trabalho e sua capacidade intelectual aos capitalistas do mundo ocidental, "liberdade" de pagar impostos, de ser objeto de discriminação e de ser explorado barbaramente pela velha e pela nova burguesia iugoslava, assim como pela burguesia estrangeira? O Sistema de “autogestão” e a negação do papel dirigente do Partido
Os revisionistas iugoslavos mantêm, além disso, uma atitude antimarxista em relação ao papel dirigente do partido comunista na construção do socialismo. Segundo a "teoria" de Kardelj, o partido não pode dirigir nenhuma atividade econômica ou administrativa, mas somente pode e deve exercer sua influência através do trabalho de educação entre os operários, a fim de que estes compreendam melhor o sistema socialista.
A negação do papel desempenhado pelo partido comunista na construção do socialismo e a redução deste papel a um "fator ideológico" e de simples "orientação", está em aberta oposição com o marxismo-leninismo. Os inimigos do socialismo científico "argumentam" esta tese, pretendendo que a direção do partido é incompatível com o papel decisivo que devem desempenhar as massas de produtores, às quais, segundo eles, corresponde influir politicamente de maneira direta e não mediante o partido comunista, posto que este conduziria ao "despotismo burocrático"!
Opostamente a estas teses anticientíficas destes inimigos do comunismo, a experiência histórica tem demonstrado que o papel dirigente e indivisível do partido revolucionário da classe operária é indispensável na luta pelo socialismo e pelo comunismo. Como é sabido, o papel dirigente do partido constitui uma questão de importância vital para os destinos da revolução e da ditadura do proletariado, e isto obedece a uma lei geral da revolução socialista. Lênin diz:
"(...) não é possível exercer a ditadura do proletariado senão através do partido comunista"(11).
A influência política direta das massas trabalhadoras na sociedade socialista de maneira alguma pode ser obstaculizada pelo partido comunista, que representa a classe operária, cujos interesses não estão em oposição aos interesses dos demais trabalhadores. Pelo contrário, somente sob a direção da classe operária e de sua vanguarda, as massas trabalhadoras participam amplamente no governo do país e tornam realidade seus interesses. Em um país verdadeiramente socialista, como é a Albânia, toma-se diretamente a opinião das massas trabalhadoras sobre importantes questões. Os exemplos a respeito são inumeráveis, começando pela consulta popular que deu lugar ao debate e à aprovação da Constituição e a elaboração dos planos econômicos etc. etc. O "despotismo burocrático" é uma característica típica do Estado capitalista e jamais pode ser confundido com o papel dirigente do partido no sistema da ditadura do proletariado, que por sua natureza e seu caráter de classe é rigorosamente antiburocrático.
Prosseguindo o desenvolvimento das idéias revisionistas sobre o papel do partido, Kardelj escreve que a Liga dos "Comunistas",
“apesar de dever lutar a fim de que as principais funções do poder estejam nas mãos das forças subjetivas favoráveis ao socialismo e à autogestão socialista" (...) “não pode ser um partido político de classe" (pág. 119).
Eis aqui o partido que os revisionistas iugoslavos buscam! Estes não desejam, e em realidade não têm, um partido político da classe operária, mas sim desejam uma organização burguesa, um clube no qual qualquer um pode entrar e sair, quando e como quiser, bastando declarar ser "comunista", sem que seja necessário sê-lo. Naturalmente isto é uma prática normal para um partido como a Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia, que nada tem de comunista. Nunca houve nem jamais haverá partido e Estado à margem das classes. O Estado e o partido são produtos de classe. E, como tais, nasceram e assim serão os partidos e os Estados até se chegar ao comunismo.
Não obstante considerar liquidado o papel dirigente da Liga dos "Comunistas", não deixa de dizer de todos os modos e por pura demagogia que esta Liga,
"com suas posições claras” (que por sinal não são nada claras, mas, pelo contrário, obscuras e confusas) “deve empenhar-se na busca dos meios para resolver os múltiplos problemas, assim como dos métodos e formas para o ulterior desenvolvimento do sistema político da auto-administração socialista".
Se o Estado e o partido não podem criar a felicidade do povo, como escreve o renegado Kardelj, então por que se pede que se concedam essas prerrogativas à Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia? Se a sociedade de "autogestão" iugoslava não necessita da direção de um partido político único, como se pretende, então, que necessidade há da direção da Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia?
Enquanto Marx defende um autêntico partido da classe operária, que dirija esta classe e a faça tomar consciência de sua missão histórica, para Kardelj o proletariado pode fazer progredir o país e tornar realidade suas aspirações de maneira espontânea, inclusive sem o papel dirigente do partido. Isto o faz para legalizar a teoria da "auto-administração", teoria que está também a favor do pluralismo político, ou seja, pela união de todas as forças sociais na chamada Liga Socialista do Povo Trabalhador, independentemente de suas distinções ideológicas e políticas, e a favor de um partido que nada tem de comunista, porém que lhe põem o rótulo de dirigente de todo o sistema antimarxista da "auto-administração".
O revisionista Kardelj fala do burocratismo dos partidos ocidentais do capital. Porém, tampouco aqui nada de novo descobriu, porque é sabido que o burocratismo é inerente à natureza do capitalismo e constitui um traço característico deste. Se denuncia a burocratização dos outros partidos não é para criticá-los, mas para dissimular o burocratismo e logo a liquidação do Partido Comunista da Iugoslávia e despojá-lo de toda prerrogativa que lhe correspondia. Os titistas consideram como desburocratização pôr o partido à retaguarda dos acontecimentos, dos fenômenos e dos processos da vida política e social e transformá-lo em um partido da burguesia e, para encobrir sua traição, colaram-lhe a etiqueta de "Liga dos Comunistas da Iugoslávia".
Para saber se um partido é ou não comunista, ou se é ou não um partido da classe operária, não se pode julgar através do nome que leva, mas sobretudo pelo fato de quem são aqueles que o dirigem e qual é a atividade que realiza. Lênin dizia:
"(...) que um partido seja, ou não, um autêntico partido político operário depende também de quem o dirige e do conteúdo de sua ação e de sua tática política"(12).
Em verdade, a Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia não só não escapou do burocratismo, como há tempos deixou de existir como partido dos comunistas iugoslavos. Sua saturação através de numerosos aparelhos, de uma multidão de funcionários e burocratas a soldo, do mesmo modo que os partidos revisionistas ocidentais ou os partidos social-democratas, é um dos fatores que fez com que este partido, longe de estar na vanguarda da classe operária, tenha se convertido em um partido que se opõe a esta classe.
Na Iugoslávia já não existe, como direção do Estado e da sociedade, o papel dominante da classe operária e de seu partido de vanguarda. Segundo Kardelj, na Iugoslávia a Liga dos "Comunistas" não tem nenhum direito à direção política no sistema do Estado, porque ali o poder é exercido
"(...) através do sistema de delegação, enquanto a Liga dos Comunistas, ainda que parte integrante do sistema de auto-administração, constitui um dos fatores mais importantes da influência social na formação da consciência dos auto-administradores e dos órgãos de delegados" (pág. 73).
Penso que aqui não há necessidade de muitas explicações. Basta o que escreve este renegado para se convencer de que na Iugoslávia não existe a ditadura do proletariado como dominação política da classe operária e como direção estatal da sociedade por parte desta classe. E posto que ali não existe esta ditadura, tampouco pode-se falar da existência do partido da classe operária, senão de um partido da burguesia.
Kardelj pretende que o "sistema de partido único" em um país socialista é uma transformação específica do sistema político burguês e que o papel de um partido (aqui se refere ao Partido Bolchevique) é o mesmo que o do "sistema de pluralidade de partidos", do pluralismo político burguês, porém com uma "pequena" diferença: no sistema de partido único, à frente do poder político estão unicamente os dirigentes deste partido, enquanto no sistema de pluralidade de partidos, os dirigentes se revezam no poder. Este falsificador põe em um mesmo plano os partidos burgueses e o partido dos bolcheviques, criado pelos revolucionários russos com Lênin à frente. Segundo ele, não existe nenhuma diferença entre a direção do Estado e a direção da sociedade em relação a um verdadeiro partido dos comunistas e a dominação da burguesia através do sistema de pluralidade de partidos. Isto demonstra uma vez mais que os titistas, assim como a burguesia, consideram os partidos políticos e o Estado como instituições que estariam acima das classes.
Se a classe operária é adversária até a morte da burguesia e se estas duas classes têm-se organizado em partidos políticos para defender seus interesses antagônicos e dominar cada uma por sua vez a sociedade, isto não significa que o partido da classe operária, o partido marxista-leninista, não tenha diferenças com o partido burguês; pelo contrário. Quando o Partido Comunista da Iugoslávia se transformou em um partido burguês, de maneira alguma converteu-se em um partido acima das classes, mas sim transformou-se de vanguarda da classe operária em instrumento da burguesia, perdeu somente seu caráter de classe proletária, mas não seu caráter de classe em geral, porque sobreveio um partido da nova classe burguesa. A diferença entre o partido comunista e um partido burguês na direção do Estado não é "pequena", mas muito grande, profunda, de princípios, de classe, que não pode ser reduzida à "rotação" de seus chefes no poder político, como pretende este renegado.
Com estas "elucubrações" sobre a "pequena diferença" que existe entre o sistema político burguês e o sistema socialista, entre o partido burguês e o partido marxista-leninista, os revisionistas iugoslavos querem dizer que sua pressurosa marcha para o capitalismo não deve ser imputada como um grande erro. Está inteiramente claro que os revisionistas iugoslavos não podem expressar na teoria posições diversas às que têm mantido na prática.
Fazendo sermões sobre as "diferenças do sistema de partido único", buscando assim atacar a construção do socialismo na União Soviética dos tempos de Lênin e Stalin, ele escreve:
"Ali constata-se ante tudo a tendência à união pessoal dos dirigentes do partido com o aparelho executivo do Estado, convertendo-se este partido em um instrumento de ação das tendências tecnoburocráticas na sociedade” (pág. 64).
A fim de "escapar" deste "tecnoburocratismo" e desta tendência "à união pessoal dos chefes do partido com o aparelho executivo do Estado sob o socialismo", que arbitrariamente atribuem-no aos bolcheviques, os senhores revisionistas iugoslavos criaram seu próprio sistema, que não é senão uma ditadura do grupo titista. Nas denominadas assembléias das comunidades de autogestão e em seus aparelhos executivos, como admite o próprio autor do livro:
"(...) estão manifestando-se com mais força as tendências burocrático-centralistas" (pág. 232).
Na Iugoslávia, o poder executivo é manipulado por Tito e sua camarilha. Não obstante assegurar que supostamente não aspiram ao poder, o presidente da Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia é presidente eterno do Estado iugoslavo e todos os altos funcionários que ocupam postos-chave no poder, no exército, na economia, na política exterior, na cultura, nas organizações sociais etc. desempenham importantes funções na Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia. Toda questão é que os revisionistas iugoslavos, enquanto atacam os ensinamentos marxistas-leninistas sobre a direção do partido proletário na sociedade socialista, na prática se esforçam por manter firmemente em suas mãos as rédeas do poder. A chamada Presidência da Iugoslávia não foi constituída para assegurar a direção coletiva do Estado, nem para combater o burocratismo no qual se assenta, nem para defender o Estado iugoslavo das forças dominantes externas com respeito a esta, como temos ouvido dizer algumas vezes, mas é uma desesperada tentativa de assegurar a dominação do titismo após a morte de Tito. Isto demonstra que o regime iugoslavo não somente em seu conteúdo, mas também em sua forma, não é senão um poder capitalista que reprime o povo, tentando mascarar-se atrás de slogans enganosos.
Kardelj não pode apagar o sombrio período negro na história da Iugoslávia quando, como consequência da traição da direção do Partido Comunista da Iugoslávia e da instauração da ditadura titista, os povos deste país sentiram na própria carne as injustiças, a violência e o terror mais desenfreados. O porta-voz titista, Kardelj, tenta passar por alto este período obscuro com alguns slogans tendentes a convencer os povos da Iugoslávia de que não se queixem dos sofrimentos, posto que "também nossa revolução socialista, em sua primeira fase constituiu, sob determinada forma, um
"sistema de partido único de democracia revolucionária, mas jamais tomou uma forma "clássica stalinista" (pág. 64-5).
Este renegado nem sequer é digno de mencionar a "forma clássica stalinista", que é uma forma tão democrática e socialista que não somente o regime de Tito—Kardelj—Rankovich dele não se aproxima em absoluto, mas que seria uma vergonha querer compará-lo a ela.
Os monstruosos crimes cometidos na Iugoslávia não foram perpetrados durante o período no qual existiam relações de amizade com Stalin e a União Soviética de sua época, mas precisamente após o rompimento desta amizade e quando a Iugoslávia tomou abertamente o caminho da "autogestão".
Atualmente na Iugoslávia, segundo a "teoria" de Kardelj, desapareceu "completa e radicalmente" a união pessoal dos órgãos executivos da Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia e dos órgãos executivos do Estado, porque a Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia está supostamente privada de toda competência que lhe permite exercer o papel de força dirigente ideológica e política na sociedade. Seu único papel se reduz a exercer influência sobre as massas.
Porém, como, e em que, esta espécie de Liga poderá influir sobre as massas, quando não está investida de nenhuma competência para dirigir? Em nada. Tito, em um momento de desespero, reconheceu: a "Liga dos Comunistas da Iugoslávia se reduziu a uma organização amorfa, apolítica". Mas Kardelj, para evitar o descrédito total dos titistas, e corrigindo as afirmações de seu chefe, indica que supostamente a
"(...) Liga dos Comunistas converteu-se em um dos mais poderosos pilares da democracia de novo tipo: da democracia do pluralismo de interesses de auto-administração" (pág. 65).
Se a "auto-administração" iugoslava despojou a Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia de seu papel de direção política, subentende-se que esta "auto-administração" privou também a classe operária de seu papel político, posto que esta pode exercer suas prerrogativas unicamente através de sua vanguarda, o partido comunista. Se a vanguarda da classe operária vê-se privada de seu poder de direção, seria absurdo pretender que a classe exerça os direitos que lhe correspondem. Nestas condições, é de se imaginar como o proletariado e as demais massas trabalhadoras podem "auto-administrar-se" nesta espécie de democracia "de novo tipo"! Vejamos o que Kardelj diz concretamente a respeito:
"A Liga dos Comunistas não domina através do monopólio político, mas expressa, de uma forma específica, porém muito importante do ponto de vista sócio-histórico, os interesses da classe operária, e ao mesmo tempo os interesses de todos os trabalhadores e da sociedade, no sistema de auto-administração e do poder da classe operária e do povo trabalhador, sistema que se apóia no pluralismo democrático dos interesses dos indivíduos sob a auto-administração" (pág. 65-6).
Esta fraseologia empolada e obscura não demonstra outra coisa senão o fato incontestável de que o partido na Iugoslávia caminha a reboque, que existe somente no papel. Não obstante se pronuncie, por pura retórica, pelo reforçamento do papel do partido, mas, devido à maneira como o concebe, não restou a Kardelj outra alternativa senão afirmar:
"(...) A Liga dos Comunistas da Iugoslávia não está politicamente e de maneira criadora suficientemente presente (...) em todo o sistema democrático da auto-administração e na estrutura da política e da prática das outras organizações sociais e políticas” (pág. 263-264).
E então, onde está presente a Liga, se não está nos lugares onde deveria estar e se na Iugoslávia, como informou a agência iugoslava TANJUG, dois terços das aldeias não têm, em absoluto, organizações de base da Liga dos "Comunistas"? Kardelj não está em condições de responder a esta pergunta embaraçosa, porém a análise concreta da atividade prática exercida pela Liga nos demonstra de maneira incontestável que, como "partido dos comunistas", não está presente em nenhuma parte, enquanto, como partido da nova burguesia iugoslava e da ditadura fascista de Tito, pode estar presente em todas as partes.
Neste "socialismo de autogestão" iugoslavo, que Kardelj assumiu a tarefa de abordar "teoricamente", a Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia sempre ocupa uma posição específica. Esta posição específica, a qual pode ser observada no decorrer de todo o seu livro, pode ser interpretada de diversas maneiras, ou seja, como uma posição específica da educação dos trabalhadores, posição específica com respeito ao proletariado, posição específica no chamado sistema de delegação, no qual não deveria participar e menos ainda dirigir por temor do "monopólio político" e a outros elementos específicos. Este partido, com essa infinidade de elementos específicos, tem o direito, no marco do poder de delegação da denominada Liga Socialista do Povo Trabalhador da Iugoslávia, a ter sua delegação nas assembléias por intermédio da qual colabora com outras delegações com atribuições de "auto-administração". Isto demonstra que a Liga dos "Comunistas" da Iugoslávia não tem nenhuma força política independente e que há tempos vem servindo como uma agência do federalismo anarquista iugoslavo. Se existe, é para dar satisfações ao capital estrangeiro, que fincou raízes no país, para assegurar-lhe que a "autogestão" não atenta contra o sistema da propriedade privada, que nenhum partido, qualquer que seja, não modificará a linha deste Estado anarco-sindicalista.
Segundo E. Kardelj, o único elemento que vale é o papel do indivíduo na sociedade, enquanto a classe operária e seu partido não valem nada. Segundo ele, não é o partido marxista-leninista a vanguarda da classe operária, mas sim "as comunidades auto-administradoras", uma organização abstrata, improvisada para aparentar uma transformação importante, mas que de fato não tem uma existência real. A classe operária não é considerada por este revisionista como a classe dirigente da sociedade, mas é confundida com todos os trabalhadores. Todo o povo iugoslavo, pretende ele, pode ser considerado vanguarda, naturalmente com a condição de se pôr à cabeça desta "vanguarda" o homem, que expressa e alcança "livremente" (ou seja, de modo anárquico) seus objetivos (nesta sociedade anárquica). Destas investigações resulta claro que a classe operária, na Iugoslávia, há tempos deixou de atuar unida, e perdeu seu papel dirigente nesta sociedade. Ao sair das mãos da classe operária o partido e o poder, não só esta já não está no poder como também se reduziu à situação de uma classe explorada pela nova burguesia, a qual domina as massas trabalhadoras mediante o poder do Estado que manipula.
Para evitar ser acusado de que sua atitude negativa em relação ao papel dirigente do partido da classe operária é uma traição aos interesses desta classe, este conhecido traidor extraiu do Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels estes trechos:
"Os comunistas não formam um partido à parte, oposto aos partidos operários", "não têm interesses que os separam do conjunto do proletariado", "não proclamam princípios especiais aos que quiserem se ajustar ao movimento proletário".
Com
citações deste gênero, Kardelj busca criar a impressão de que Marx e Engels haviam supostamente defendido a idéia de que os comunistas não
necessitam de seu partido, posto que este não é um partido com
características, interesses e princípios distintos aos dos outros
partidos operários. Que renegado! Sem o menor escrúpulo, vê o
proletariado com os óculos do antimarxista social-democrata, como uma
massa amorfa que luta, supostamente, por seus interesses gerais, mas que
está desprovida de todo princípio, de toda direção de classe
revolucionária, de todo programa de luta para conquistar seus direitos!
Notas de rodapé:
(1) MARX, K. & ENGELS, F. Obras Escolhidas, T.1, p. 42, Tirana, 1975. (retornar ao texto)
(2) LÊNIN, V. I. Obras, ed. albanesa, t. XXXII, p. 283. (retornar ao texto)
(3) LÊNIN, V. I. Sobre o democratismo e o caráter socialista do Poder soviético. (retornar ao texto)
(4) "As fábricas aos operários", Prishtina, 1951, p. 37, 19, 1. (retornar ao texto)
(5) BAUER, Otto. A via para o socialismo, p. 18, Paris, 1919. (retornar ao texto)
(6) Todas as citações do livro de E. Kardelj foram tomadas da tradução albanesa pela Editora de Prishtina, em 1977 (Nota da Casa Editora "8 Nentori", Tirana). (retornar ao texto)
(7) VASICH, V. A política econômica da Iugoslávia, publicação da Universidade de Prishtina, 1970. (retornar ao texto)
(8) Entrevista de Tito a uma correspondente do periódico Vjestnik, outubro de 1972. (retornar ao texto)
(9) LÊNIN, V. I. Obras, ed. albanesa, t. XXXII, p. 80. (retornar ao texto)
(10) LÊNIN, V. I. Obras, ed. albanesa, t. XXXII, p. 426, 413. (retornar ao texto)
(11) LÊNIN, V. I. Obras, ed. albanesa, t. XXXI, p. 266. (retornar ao texto)
(12) LÊNIN, V. I. Obras, ed. albanesa, t. XXXI, p. 285. (retornar ao texto)
Fonte |
Inclusão | 22/03/2015 |