Problemas Mundiais do Povo Negro

Uma refutação de George Padmore

James W. Ford

1934


Tradução: Jorge Fonseca de Almeida.

Fonte para a tradução: opúsculo publicado pela Harlem Section of the Communist Party.

HTML: Lucas Schweppenstette.


Prefácio

A primeira Conferência Internacional dos Trabalhadores Negros realizou-se em Hamburgo, Alemanha em 1930. As deliberações dessa Conferência deviam ter sido estudadas pelas largas massas de trabalhadores, não apenas de trabalhadores Negros e intelectuais, mas pelos trabalhadores brancos e pelos simpatizantes da luta de libertação dos Negros. A Conferência efetuou uma análise minuciosa da situação económica e política do povo Negro, e produziu uma imagem clara da opressão capitalista-imperialista. Foi uma Conferência de trabalhadores e, por isso, estabeleceu um programa de organização sindical. Contudo, assumiu a totalidade dos problemas dos trabalhadores Negros e ligou a luta dos trabalhadores Negros com a luta pela libertação nacional. A Conferência não foi do tipo das muitas conferências organizadas e lideradas pela pequena burguesia que confinam o seu programa e as suas atividades aos interesses das classes altas Negras e aos seus lamentos e lamúrias. Não, esta Conferência teve um carater diferente, um caracter operário.

Estiveram representados onze sindicatos, duas centrais sindicais um partido político (da Nigéria) e duas organizações internacionais não sindicais. Estiveram presentes dezassete delegados regulares e três delegados fraternais de sete países (principalmente Estados Unidos, África e Caraíbas), representando 20.000 trabalhadores organizados. Foram colocadas, pelos governos coloniais, muitas dificuldades à deslocação dos delegados quer através da intimidação quer através do controlo dos passaportes. Os delegados foram também assediados ao chegar à Europa por detetives da Scotland Yard britânica. Por causa destas dificuldades nove dos delegados eleitos não conseguiram sequer chegar à Conferência, dois deles da África do Sul.

Quatro anos de crise económica mundial aumentaram o fardo e a opressão sobre o povo Negro. A resistência à opressão de classe e a melhoria da organização das lutas são testemunho da crescente consciência de classe dos trabalhadores Negros do mundo inteiro.

Nos Estados Unidos a crise veio colocar todo o seu peso nas costas das massas Negras. Os diferenciais dos códigos Jim Crow(1) diminuíram os níveis de vida e desencadearam uma onda de terror bárbaro.

O programa denominado “New Deal” do Presidente Roosevelt, que previa o arranque das plantas de algodão de forma a reduzir a produção e por essa via aumentar os preços beneficiando os grandes proprietários e a Lei Bankhead Cotton, ameaçam a existência de milhões de trabalhadores agrícolas na Cintura Negra do Sul. Os ataques dirigidos aos Negros também atingem os trabalhadores brancos.

Os Negros reformistas e os líderes nacionalistas pequeno-burgueses cantam loas a favor do “New Deal” e apoiam os diferenciais dos códigos Jim Crow. Mas as suas atividades a favor dos seus próprios interesses e dos da classe branca dominante têm sido incapazes de evitar que os trabalhadores Negros se mobilizem contra o “benévolo” programa do governo Roosevelt, tal como os dirigentes da Federação Americana do Trabalho tem sido incapazes de evitar as ações conjuntas dos trabalhadores Negros e brancos. A greve militante dos trabalhadores mineiros do Alabama, envolvendo 21.000 trabalhadores, 70% dos quais Negros e a luta militante dos estivadores Negros a nível nacional mostraram o brilho das capacidades de luta dos trabalhadores Negros. A unidade dos mineiros do Alabama foi tão forte e a sua determinação tão grande que os patrões se assustaram. A imprensa capitalista tentou instigar tumultos racistas destacando reportagens como “está iminente um conflito racial” e “Os Negros estão a tornar-se atrevidos e diabólicos”. Em reunião da Câmara de Comércio realizada em Birmingham no Alabama, trezentos dos mais proeminentes capitalistas declararam que, se necessário, avançariam para a secessão dos Estados Unidos e para a guerra civil antes de ceder às alterações dos códigos ou de ceder às reivindicações dos mineiros. Esta não foi, contudo, a primeira vez que os patrões sulistas inscreveram os códigos racistas nas bandeiras que defendem. Em 1861 os antigos esclavagistas colocaram a continuação da Escravatura na bandeira da secessão. Mas hoje as bombásticas declarações dos modernos barões esclavagistas incluem os trabalhadores brancos em conjunto com os Negros.

Os trabalhadores Negros do Alabama rejeitaram as políticas dos dirigentes Negros reformistas que os tentam transformar em passivos e submissos em relação aos patrões capitalistas e amargos e antagonistas em relação aos seus irmãos operários brancos. Entretanto os trabalhadores brancos estão a libertar-se das politicas Jim-Crow de ódio racial promovidas pelos dirigentes da Federação Americana do Trabalho (AFL) que procura manter a velha política da classe dominante de “dividir para reinar”.

Nas colónias Negras e nas colónias onde existe uma larga maioria de população Negra, também têm ocorrido grandes lutas. Estas lutas, envolvendo milhares de trabalhadores Negros atingiram níveis muito elevados. Em Cuba, por exemplo, teve lugar um grande levantamento revolucionário. Em Cuba está na ordem do dia a criação de um Governo Operário-Camponês que substitua o domínio dos latifundiários e capitalistas e derrube o jugo da dominação imperialista estrangeira dos capitalistas americanos. Os Negros constituem mais de um terço da população de Cuba e tiveram um papel importante no derrube do torcionário Machado, na tomada de governos municipais e estão atualmente a lutar pela autodeterminação dos Negros na província do Oriente onde constituem metade da população. A luta em Cuba é um exemplo brilhante da luta dos trabalhadores Negros nas Caraíbas, um exemplo a estudar e a emular. As lutas de Cuba já estão a influenciar os movimentos de emancipação no Haiti, na Jamaica, nas Ilhas Virgens e na Trinidad.

Os imperialistas britânicos, franceses e americanos estão a fazer tudo o que podem para travar os movimentos revolucionários nestas colónias. As autoridades britânicas proibiram a circulação do “Negro Worker” e ilegalizaram as centrais sindicais militantes e as ligas camponesas. Estão, igualmente, a tentar evitar a organização e o desenvolvimento de movimentos revolucionários em África. O aparecimento do “Negro Worker” na África Ocidental britânica causou um alvoroço no Parlamento britânico e na Africa Ocidental também proibiram o “Negro Worker” e os sindicatos militantes. De todas as colónias africanas chegam notícias de rebeliões e revoltas dos povos nativos contra o imperialismo.

Podemos, assim, constatar a existência de um alto grau de consciência de classe entre o povo Negro que se tem desenvolvido após a Primeira Conferência dos Trabalhadores Negros.

Com o aumento da intensidade da luta dos trabalhadores Negros tem-se verificado igualmente o aumento da reação, não só a reação do terror, mas também a reação organizada da pequena-burguesia nacionalista. Entre os que lideram esta reação encontram-se pessoas que desertaram do movimento revolucionário quer devido à sua ascendência pequeno-burguesa, quer porque não tenham chegado a desenvolver uma compreensão profunda do carácter do movimento de emancipação, ou pelas duas razões. Entre estas pessoas encontra-se George Padmore que foi expulso do Comité Sindical Internacional dos Trabalhadores Negros devido às suas atividades nacionalistas e anti operárias de natureza pequeno-burguesa. A declaração do Comité sobre a expulsão de Padmore diz o seguinte:

Gorge Padmore, antigo Secretário da I.T.U.C. of N.W.(2) e editor do “Negro Worker” foi expulso das fileiras do movimento revolucionário. As acusações em que se baseou a ação da Comissão de Controlo Internacional são muito sérias. Pessoas como Padmore, que mantêm relações com provocadores, que se associam com organizações Nacionalistas reformistas e anti operárias, e que, sob a capa de “ajudar” a Libéria a recolher fundos para “comprar” os Imperialistas a quem a Libéria se encontra endividada (um óbvio esquema fraudulento) não podem ser toleradas no interior das fileiras da movimento da classe operária. As ações de Padmore só podem levar a um resultado: minar a unidade dos trabalhadores liberianos na sua luta contra a exploração e opressão pelos imperialistas e pela classe dominante liberiana; ao enfraquecimento do movimento da classe operária sob a palavra de ordem de unidade racial em vez de unidade de classe e através dessa política fortalecimento dos opressores imperialistas e dos seus aliados Negros.

Depois da sua remoção do cargo de secretário da I.T.C.U. dos N.W., Padmore não entregou os contactos e outros bens do Comité. As razões deste procedimento, radicam, disso não temos dúvidas, na sua intenção de continuar a usá-los nas suas atividades disruptivas e para os seus fins privados.

Devido às suas ações perturbadoras e com base na decisão acima referida o I.T.C.U. dos N.W. decide expulsar Padmore das suas fileiras e apela a todos os membros do Comité Executivo, aos apoiantes do I.T.C.U. dos N.W. e do “Negro Worker” para quebrarem todas as relações com ele já que tal relação continuada apenas significará dar ajuda e cobertura às suas atividades anti operárias.

Pelo Comité Sindical Internacional dos Trabalhadores Negros,

Charles Woodson, Secretário

Como principal organizador do Comité Sindical Internacional dos Trabalhadores Negros emiti este aviso em 1930. Posso testemunhar o crescimento do movimento Negro em todo o mundo. O IV Congresso da Federação Nacional do Trabalho, a que a minha recente viagem a Cuba assisti como delegado da Liga Sindical Unitária, onde estiveram presentes mais de 2.000 delegados representando mais de metade da classe operária cubana, mostrou até que picos o movimento está aí a atingir. Em Cuba os trabalhadores Negros mostraram ser não só os lutadores mais corajosos como também dos mais destacados dirigentes. Também em Cuba encontramos renegados. Junco(3) um Negro, antigo membro do Partido Comunista de Cuba, tornou-se um renegado tal como Padmore. Mas Junco foi expulso do Partido Comunista de Cuba, desacreditado e isolado do movimento revolucionário.

Apesar de terem passado quatro anos as questões levantadas pela Primeira Conferência Internacional dos Trabalhadores Negros mantêm toda a pertinência e as tarefas então definidas continuam de grande utilidade hoje em dia. Os mal-entendidos que estão a surgir podem ser esclarecidos relembrando o contexto histórico da Conferência.

PROBLEMAS MUNDIAIS DO POVO NEGRO

Relatório de James W. Ford à Primeira Conferência Internacional dos Trabalhadores Negros

Camaradas,

Esta conferência reúne num momento de crise aguda do capitalismo, que se estende por todo o mundo, afetando de forma mais profunda os territórios coloniais. Temos à nossa frente tarefas de grande dimensão. Temos de enfrentar os problemas que afetam os trabalhadores Negros e a raça Negra, em várias partes do mundo, que vivem sob o regime capitalista de exploração e opressão. Juntamo-nos aqui nesta Conferência com esse propósito.

Esta conferência deve fazer uma ampla declaração política e divulgar os resultados das nossas discussões da forma mais alargada possível entre as grandes massas dos trabalhadores Negros. Devemos abordar as questões organizacionais relativas à situação económica e às condições de trabalho dos Negros – trabalhadores industriais e agrícolas; devemos discutir os linchamentos, o terrorismo, os massacres perpetrados pela polícia e pelos militares, a leis de imposição de passes e de restrição de movimentos, as discriminações raciais, o trabalho forçado, a guerra imperialista que se aproxima e um número de outras questões e problemas.

Somos de diversas famílias políticas e estamos aqui para discutir aberta e francamente a situação dos trabalhadores Negros tal como ela se apresenta hoje no mundo, e para estudar os efeitos da exploração capitalista e imperialista sobre as massas dos Negros – e penso que todos concordamos, apesar do que outros possam dizer, que as deploráveis condições em que vivem as massas Negras resulta do sistema capitalista de exploração.

Reunimo-nos aqui para discutir o papel dos trabalhadores Negros no movimento sindical internacional e na luta de libertação do povo Negro. É nestas condições, que em nome do Comité Sindical Internacional Provisório dos Trabalhadores Negros que convocou esta Primeira Conferência Internacional dos Trabalhadores Negros saúdo os representantes dos trabalhadores Negros (bem como os fraternais representantes de outras raças aqui presentes).

Para entrar já na apreciação destes problemas diria que devemos discutir a situação internacional atual bem como o passado cuja memória pesa duramente na memória dos trabalhadores Negros. Genericamente quais são os temas que devemos abordar? (1) Resumidamente, a situação económica e política que o capitalismo está a passar nos anos mais recentes. (2) A posição e as condições dos trabalhadores Negros e da raça Negra sob o capitalismo e como libertar o povo Negro da opressão capitalista-imperialista. Ao discutir estas questões concluiremos, naturalmente, sobre o significado e importância desta Conferência de trabalhadores. Os capitalistas, asseguro-vos, olham com grande preocupação para os nossos esforços e os trabalhadores Negros esperam muito de nós.

Decadência do Sistema Capitalista

No que toca ao período temporal começarei em 1928. Nesse momento as rivalidades entre as principais potências imperialistas (e, em primeiro lugar entre o Reino Unido e os Estados Unidos) eram muito agudas e tensas. Porquê? Primeiro, existia a questão da redivisão do mundo pelas grandes potências capitalistas, com vista a obter maiores lucros e a dividir os mercados coloniais e internacionais, onde pudessem vender as suas mercadorias e investir os seus capitais em formas desumanas de exploração. Como não pode haver um acordo de “cavalheiros” sobre estes temas, estas rivalidades lançaram os Estados Unidos, o Reino Unido e outras potências imperialistas numa corrida de preparativos bélicos, de alianças militares, etc.. A guerra imperialista é a forma como tentam resolver estes assuntos. Tal como disse os Estados Unidos estão a pressionar fortemente o Reino Unido de forma a retirar-lhe a supremacia financeira, os capitalistas alemães querem recuperar as suas antigas colónias, a França e o Japão também querem mais mercados mundiais e territórios coloniais.

Em segundo lugar, por forma a completarem os seus preparativos económicos e financeiros para a redivisão do mundo e dos lucros, estas nações imperialistas criaram poderosos monopólios financeiramente centralizados, fundos internacionais, etc.. Começaram, à custa dos trabalhadores dos países capitalistas, a introduzir nova maquinaria que permite aumentar a produção de mercadorias. Esta política atirou para o desemprego milhares de trabalhadores. E começaram a esmagar os salários a torto e a direito. A super abundância de mercadorias tem de encontrar mercados, porque os trabalhadores que as produzem não as podem comprar, daí esta luta feroz por mercados estrangeiros e territórios coloniais.

Naturalmente que começou uma luta mais intensa dos trabalhadores contra a exploração capitalista.

Terceiro. Poderia identificar todo um conjunto de provas de como os capitalistas começaram a diminuir o padrão de vida dos trabalhadores em todos os países: redução dos salários; aumento das horas de trabalho; atirar milhares de trabalhadores para as ruas e com apoio da Polícia e dos Tribunais espancam os trabalhadores que protestam; e, por último mas não menos importante; a forma como os sindicalistas e as organizações reformistas – quer a Federação Americana do Trabalho (AFL), a Internacional de Amesterdão e outras - ajudam os patrões contra os trabalhadores. Mas não perderei o vosso tempo a analisar estes casos um por um. Apenas quero sublinhar os factos relevantes.

É natural que os trabalhadores se revoltem contra estas condições de forma a proteger-se e a proteger o seu nível de vida e se afastem em grandes números dos sindicatos reformistas e iniciem lutas ferozes contra os capitalistas.

Imperialismo em África e nas Caraíbas

Em quarto lugar. Olhemos agora para outra parte do mundo – o mundo colonial, onde o capitalismo se esforça por perpetuar a escravatura. Com vista a apoiar o seu ataque aos trabalhadores do seus países e para fazer super lucros os capitalistas investem capitais nos países colonizados. E quando nós, especialmente os de nós que somos provenientes dos territórios colonizados em África e nas Caraíbas que conhecemos as condições de escravatura sob a qual laboram e vivem os trabalhadores, os seus níveis de vida muito baixos, os abusos raciais e tudo o mais, pudemos rapidamente perceber a forma como os capitalistas manipulam as coisas para conseguir mão-de-obra barata para competir com os trabalhadores dos seus países e para obter super lucros. Eles pegam as suas máquinas mais modernas e nos seus modernos padrões de produção e combinam-nos com o já muito baixo custo do trabalho e produzem mercadorias a baixo custo – vejam os casos da China, da Índia, da Indonésia, da Coreia e da América Latina, vejam a industrialização forçada das massas africanas, as quais através do imposto por cabeça ou por palhota ou de outras forma de tributação são obrigadas a abandonar as suas terras e a tornar-se escravos industriais dos imperialistas, ou vejam os Estados Unidos onde os capitalistas têm um exército de milhões de trabalhadores Negros que não são menos explorados e cujo trabalho gera biliões de lucros que são acumulados pela classe dominante dos capitalistas brancos.

Vejamos agora o papel das organizações reformistas (AFL, a Internacional de Amesterdão, o Conselho Geral, o Partido Trabalhista Independente e o Partido Trabalhista ingleses) que tal como atuam nos países imperialistas atuam nas colónias – ajudando os imperialistas a explorar os trabalhadores colonizados.

Central Sindical Internacional Vermelha

Comecei por salientar que esta era a situação no início de 1928. Em Março de 1928 realizou-se em Moscovo o Quarto Congresso da Central Sindical Internacional Vermelha (RILU). Fui delegado a esta conferência pelo Sindicato Unitário dos Trabalhadores da Educação dos Estados Unidos (atualmente Liga Unitária Sindical), e durante três semanas ouvi e participei na discussão de problemas que já relatei e assisti à definição das tarefas para as lutas operárias. Não pude deixar de ficar fortemente impressionado pela forma como os problemas dos trabalhadores foram abordadas, especialmente pela forma como foram tão diretamente ao amago dos interesses dos trabalhadores de todas as terras e de todas as profissões. A questão dos trabalhadores Negros foi abordada com algum detalhe. Mas antes de abordar este tema gostaria de explicar resumidamente como funcionou o Congresso. Tal poderá ser-nos útil nas nossa deliberações. Já toquei em alguns destes pontos. Agora gostaria de me focar na forma como a discussão se centrou nos objetivos da luta e na forma de lutar por eles.

Programa de Ação da Central Sindical Internacional Vermelha
  1. Em primeiro lugar pela semana das 7 horas e contra a supressão da jornada de 8 horas onde ela foi já conquistada; por aumentos salariais; contra as horas extraordinárias; por um mínimo de duas semanas de férias pagas e por um mês de férias para os trabalhadores com trabalhos pesados ou perigosos; reivindicações específicas para os jovens trabalhadores e para as mulheres trabalhadoras;

  2. Que a mais persistente luta deve ser conduzida contra os dirigentes sindicais reformistas de todas as estirpes (e veremos que isto se aplica também aos reformistas Negros traidores); que no curso das lutas novos métodos de greve devem ser usados – tais como a organização e a participação diária das massas trabalhadoras para a luta; a participação das mais amplas massas populares na definição das reivindicações das greves; na formação de comités de greve alargados para a dirigir as greves; a extensão da luta económica por salários e condições de trabalho, etc., para lutas contra as medidas repressivas e o aparelho de Estado dos patrões – em luta política contra a totalidade do sistema capitalista.

  3. Que a tremenda diferença de situação dos trabalhadores no Estado Operário-camponês, a União Soviética, foi assinalada e contrastada com a situação deplorável dos trabalhadores nos países capitalistas, como resultado do sistema capitalista, e com a inumana exploração e tratamento dos povos oprimidos das colónias sob o imperialismo – como na URSS a redução das horas de trabalho dos trabalhadores, o aumento dos salários, a melhoria das condições de trabalho, a redução do desemprego para zero, a progressão do nível cultural dos trabalhadores e as largas liberdades e a autodeterminação das nacionalidades e minorias oprimidas (sob o czarismo) e o facto de Estado dos operários dominar um sexto do mundo - e a sua simples existência divide o mundo em dois campos – de um lado o mundo capitalista e do outro o Estado operário, ardente aliado e amigo dos trabalhadores e dos povos oprimidos do mundo. Eis a razão por que os capitalistas têm tamanho ódio à URSS e a razão por que preparam a guerra contra ela.

  4. E depois veio a questão da solidariedade internacional e o reforço do movimento sindical internacional. Ao contrário da Internacional de Amesterdão e do seu Congresso o mundo para a RILU não se circunscreve à América e à Europa e aos extratos superiores da classe trabalhadora destes países, o mundo para a RILU estende-se através da totalidade geográfica da Terra incluindo os territórios colonizados, e não apenas os extratos superiores dos trabalhadores mas também os extratos inferiores, os desorganizados que são traídos pelos reformistas que se recusam a organizá-los mesmo que sejam operários brancos na Europa e na América.

A RILU mostrou como é que os capitalistas usam os trabalhadores das colónias contra os trabalhadores dos países capitalistas, como é que usam os trabalhadores desorganizados contra os sindicalizados e, consequentemente, como é que os reformistas traem os trabalhadores com a sua atitude face aos trabalhadores das colónias e aos trabalhadores desorganizados, como é que os reformistas enfraquecem a luta dos trabalhadores contra os capitalistas. A RILU já tinha estabelecido contacto com os trabalhadores das colónias através do Secretariado do Pan-Pacífico e do Secretariado da América Latina e contactado diretamente com os trabalhadores Negros da África do Sul. A RILU não olhava de cima para baixo com desprezo os trabalhadores Negros e de cor nem os via como pessoas desprezíveis como faz a Internacional de Amesterdão. Esta era a forma como a RILU criava a verdadeira Internacional e estabelecia a solidariedade internacional.

Preparativos para a Conferência dos Trabalhadores Negros

E agora camaradas este ponto leva-me diretamente à definição da Questão Negra como ela foi abordada no Quarto Congresso da RILU. Quando se discutiam as atividades das secções dos Estados Unidos, França, Reino Unido e África do Sul, e as suas tarefas entre os trabalhadores Negros, especial atenção foi dada aos trabalhadores Negros. Verificou-se que nestas secções tinha havido muitas debilidades no trabalho entre os Negros. Mas muito antes do Quarto Congresso, a Questão Negra tinha recebido uma atenção séria do Comité Executivo da RILU.

Em 1929 fui delegado ao II Congresso Mundial da Liga Contra o Imperialismo que se realizou em Frankfurt na Alemanha, enquanto lá estive, tive a oportunidade de, em nome do nosso comité, convocar algumas reuniões com todos os delegados Negros que tinham vindo ao Congresso da Liga Contra o Imperialismo (dos EUA, das Caraíbas e de África). Para além das questões específicas abordadas no Congresso da Liga, discutimos os problemas e as questões relacionadas com a organização sindical entre os trabalhadores Negros. Decidimos que para isso se devia convocar uma Conferência dos Trabalhadores Negros. Um Comité Provisório foi eleito para esse efeito. Hoje esta Conferência é o resultado do nosso trabalho. Não entrarei em detalhes sobre a forma como esse trabalho foi desenvolvido, nem sobre as dificuldades que enfrentámos já que esses temas são bem conhecidos de muitos aqui presentes e outros factos serão conhecidos mais tarde. Quero avançar para a segunda parte do meu relatório que se refere à forma como sobrevive o povo Negro sob o capitalismo.

Opressão Capitalista das Massas Negras

Camaradas, nós Negros não podemos esquecer hoje os efeitos do passado sobre nós – o facto de durante 300 anos mais de 100.000.000 de Negros terem sido arrancados das costas de África e levados para os mercados de escravos no Novo Mundo, a América e as Antilhas pelos capitalistas e os seus agentes, e que na base da escravatura dos Negros e do trabalho dos Negros eles edificaram o seu poder capitalista e a sua riqueza – e temos de perguntar o que é que essa situação nos trouxe ao longo destes 300 anos, dos últimos 100 anos ou mesmo atualmente? Não só durante o período do trafego esclavagista, nos trouxe uma miséria indizível, uma questão com a qual estamos familiarizados, mas deixou-nos, por todo o lado, na ignorância e na degradação, e apesar da emergência de um pequeno estrato superior de Negros nos Estados Unidos e noutros locais, os factos são de que as grandes massas de Negros do mundo cresceram na ignorância e na degradação por perseguições e limitações deliberadamente desenhadas para os manter e perpetuar como peões e escravos da exploração capitalista. A maior miséria e as formas mais extremas e inumanas de exploração continuam a existir.

Hoje a escravatura disfarçada chama-se trabalho forçado por toda a África e peonagem e trabalho forçado nos Estados Unidos e nas Antilhas; trabalho dos presos acorrentados, vida em campos de trabalho, implementada através das leis dos passes, do recolher obrigatório, da discriminação e de restrições raciais de todo o tipo, impostas sobrepostas e tornadas mais “disfarçadas” pela religião, e por outras formas de ópio trazidas pelos missionários, pelos padres, pelo YMCA e outros passadores de drogas.

Não satisfeitos com esta situação eles, ao menor sinal de resistência a este sistema, afogaram, com as suas tropas coloniais e a sua polícia, milhares de nativos em sangue. Nos últimos 35 anos nos EUA mais de 3.000 Negros foram linchados pelo fogo e por outros meios. Camaradas, estes são os factos. Há mais? Sim. Lembrem-se do reinado do Rei Leopoldo da Bélgica no Congo Belga, dos imperialistas franceses na África Central e no Congo, da destruição dos Zulus na África do Sul pelas forças combinadas dos britânicos e dos Boers, o assassinato a tiro dos nativos no Haiti pelos marines americanos, o transporte pelos portugueses de nativos da África Oriental para a África do Sul como trabalhadores forçados em tais condições que muitos morrem no caminho.

Os Negros na Grande Guerra

Durante a guerra imperialista a França, a Inglaterra, a Alemanha e os Estados Unidos usaram centenas de milhares de soldados Negros nos seus exércitos imperialistas e milhares foram chacinados no altar do imperialismo. Apesar da promessa hipócrita de “Liberdade, Igualdade, Fraternidade” e de “façamos o mundo seguro para as pequenas minorias” e “Que Deus guarde as terras do Rei” e outras, desde que a guerra terminou, o que vemos é o intensificar da nossa exploração e opressão sob o jugo de todas as potências imperialistas.

Durante a guerra aprendemos muitas coisas. Desde logo muitos de nós aprendemos a natureza de classe da guerra imperialista, que a guerra foi travada pelas potências imperialistas e a favor dos seus interesses, que lutaram entre outras coisas para subjugar os territórios colonizados para continuar a explorar os povos colonizados. Que os trabalhadores brancos também foram assassinados (uns pelos outros) em prol dos imperialistas, vimos que no decurso desta guerra que os operários revolucionários derrubaram o capitalismo num país – a Rússia – e que ergueram um Estado Operário-camponês que governa hoje em dia. Aprendemos camaradas que para obtermos a nossa liberdade que também devemos organizar as nossas forças para a luta contra o imperialismo e o capitalismo.

Estamos hoje em posição de o fazer e temos forças em que nos podemos basear para levar a cabo o nosso trabalho. A guerra criou um grande exército de trabalhadores Negros, na África do Sul, na África ocidental, nas Antilhas, nos Estados Unidos – milhões de proletários Negros. São os operários Negros, criados na indústria capitalista (da mesma forma que os operários brancos o tinham sido), que descobrem a amarga necessidade da luta contra o capitalismo e que têm a estabilidade, a coragem, a disciplina, e a consciência de classe, sobre a qual organizam eficazmente as suas forças pela libertação do povo Negro no seu conjunto.

É na base da consciência de classe dos trabalhadores Negros dos centros industriais que, em conjunto com os trabalhadores agrícolas (a quem devem ajudar a organizar-se), os contactos com os camponeses das quintas e das vilas se devem fazer no sentido de levar a cabo uma luta conjunta contra aqueles que os oprimem. Camaradas, é apenas com estas forças que podem liderar a luta pela libertação de toda a raça Negra.

Influência dos reformistas Negros

A classe média Negra, os intelectuais e os dirigentes pequeno-burgueses mostraram e mostrarão que eles, apesar de fingirem um pretenso interesse racial, na realidade aliarão as suas forças com as da crescente burguesia Negra a favor dos capitalistas Negros, e do capitalismo Negro, e que todos em conjunto trairão os trabalhadores Negros, a maioria da raça Negra. Tal como os professores e doutores do tipo de G. E. Haynes(4); William Pickens(5), Du Bois, e um conjunto de outros traem os nativos a favor dos imperialistas, nomeadamente na África Central; e também como o Garveyismo está, não somente, construído para apoiar o desenvolvimento do capitalismo Negro como também para trair as massas dos Negros comuns a favor dos imperialistas. Camaradas, abordo apenas de passagem estes pontos porque serão discutidos em detalhe mais à frente.

Os Trabalhadores Negros Lutadores

E quais são as perspetivas, quais são as provas da crescente consciência de classe dos trabalhadores Negros de todo o mundo e da sua capacidade de liderar as lutas do povo Negro?

Camaradas, por todo o lado vemos o capitalismo a afundar-se em diversas crises – vemos os capitalistas a reduzir os salários dos trabalhadores, a reduzir-lhes o nível de vida, a aumentar o ritmo de trabalho, tudo com o intuito de transferir os custos da crise para as costas dos trabalhadores, vemos o desemprego a aumentar no mundo inteiro, vemos que nos Estados Unidos dos mais de 5 milhões de desempregados pelo menos 500.000 são trabalhadores Negros que enfrentam a fome, o cenário repete-se na África do Sul, nas Antilhas, etc., etc.. Os imperialistas estão a tentar transferir o peso da crise para as costas dos povos colonizados e para as costas dos nativos de África – em todos os parlamentos os dirigentes Socialistas estão a ajudar os capitalistas votando a favor de Leis e medidas especiais que intensificam a exploração dos trabalhadores destes territórios.

Em todos os países capitalistas os trabalhadores lutam contra esta crise capitalista nas ruas e nas manifestações de massas. Por todo o lado há uma luta militante dos trabalhadores. A Revolução Indiana levanta-se, os trabalhadores chineses constroem o seu Exército Vermelho e estabeleceram um soviete de operários e camponeses em grande parte da China. Devemos dar também atenção às lutas dos trabalhadores Negros. Recentemente têm vindo a desenvolver-se grandes e sérias lutas das massas Negras contra a exploração capitalista em diversas partes de África, das Antilhas e dos Estados Unidos. Recordemos sumariamente estas lutas.

África Equatorial Francesa

Esta colónia, devido às suas riquezas, é particularmente explorada pelos militaristas franceses. O sistema de concessões transformou os nativos em praticamente escravos das empresas francesas, e as condições de vida miseráveis levou à extinção dos nativos. A população diminuiu quase 75% durante o domínio francês. A construção de um caminho-de-ferro ligando Brazzaville, a capital da colónia, à costa marítima, constituiu uma enorme carga pesada sobre os nativos. A ganância das empresas contratadas para construir o caminho-de-ferro levou à morte de cerca de 20.000 nativos ao longo dos oito anos de trabalhos (1921-1928). A revolta, que incendiou quase o país todo, estalou em Novembro de 1928 na sequência do alistamento forçado de um novo contingente de trabalhadores para a ferrovia. A revolta estendeu-se por mais de três meses e para a subjugar foi necessário o envio de forças militares consideráveis. O resultado foi que o ritmo de construção se reduziu e as empresas tentaram substituir os trabalhadores nativos por “coolies” trazidos da Indochina.

Madagáscar

Também em Madagáscar existe um importante movimento de nativos; em Maio de 1929 o movimento avançou para uma enorme manifestação dirigida pelo Partido Comunista. Muitos manifestantes foram presos e levados a julgamento tendo o tribunal sido particularmente duro para com dois dirigentes Comunistas. Um deles – Negro – foi condenado a cinco anos e meio e o outro a três anos e meio.

Guadalupe

O setor mais importante da indústria da Guadalupe, uma das ilhas francesas das Caraíbas, é a indústria açucareira. Na sequência da queda dos preços no mercado mundial do açúcar os capitalistas intensificaram a exploração dos trabalhadores de maneira a transferir para os ombros dos trabalhadores o fardo da crise. Os trabalhadores responderam com uma grande greve realizada em Fevereiro de 1930. Os grevistas e a Polícia enfrentaram-se em batalhas campais. Vários trabalhadores foram mortos e muitos feridos. O movimento revolucionário ganhou novas forças depois da morte destes trabalhadores. Para subjugar a revolta a Administração francesa foi obrigada a requisitar a Polícia da vizinha ilha da Martinica.

Nigéria

Em Dezembro de 1929 ocorreram graves distúrbios na Nigéria. As mulheres trabalhadoras tiveram um importante papel nestas lutas. No decurso da repressão destas ocorrências levada a cabo pela soldadesca enviada pelo governo socialista dos Trabalhistas encontravam-se 83 mulheres entre os mortos. Os distúrbios foram causados pela introdução de um imposto por cabeça lançado sobre as mulheres. Esta nova carga fiscal é um passo mais além no sentido de confiscar as terras dos nativos. Apesar de a Administração ter resolvido o assunto muito rapidamente e até ter obrigado as populações a pagar um enorme contributo para compensar os pretensos prejuízos incorridos pela população branca, a situação contínua tensa, e os chefes tribais têm sido obrigados a pedir proteção para se defenderem dos seus próprios compatriotas que perceberam perfeitamente que os seus chefes os venderam ao inimigo e que não passam de agentes do imperialismo.

Gâmbia

As principais riquezas da Gâmbia, território situado na costa ocidental de África, são o amendoim e o óleo de palma. Como o óleo produzido por estas duas plantas é muito importante para as indústrias da margarina e do sabão, é fácil perceber a razão da colónia estar completamente nas mãos de uma grande empresas internacional de margarina, que é o patrão indiscutível de todo este território. Os trabalhadores estão organizados em sindicatos e quando o gestor da empresa exigiu que abandonassem os sindicatos os trabalhadores declararam greve geral. Os grevistas, apesar do terror praticado pelos destacamentos militares que foram concentrados em Bathrust, a capital da colónia e o centro da greve, não se renderam e a administração foi obrigada a reconhecer o direito dos trabalhadores a organizarem-se sindicalmente.

Haiti

No Haiti, uma república formalmente independente mas que é praticamente uma colónia dos Estados Unidos, existe um forte movimento anti-imperialista. Em 1929, devido à aguda crise agrária estalou uma revolta no país dirigida contra o governo do Presidente Borno, um fantoche dos americanos. Os Estados Unidos enviaram grandes destacamentos de fuzileiros apoiados por aviões e barcos de guerra para ajudar a suprimir a revolta. Apesar de terem sido bem-sucedidos, o Presidente Hoover achou necessário fazer algumas conceções. Foi constituída uma comissão especial para investigar as razões da revolta e, simultaneamente, foi prometido a demissão do Presidente Borno. É evidente que estas conceções não satisfazem os trabalhadores haitianos que terão que continuar a lutar, uma e outra vez, até se libertarem do jugo do imperialismo.

Na África do Sul travaram-se importantes lutas dos trabalhadores. Nos Estados Unidos os trabalhadores Negros estão a aderir em grandes números à Liga Sindical Unitária.

Os Dirigentes Negros Reformistas

Em todos estes lugares os dirigentes sindicais reformistas falsos mostraram as suas verdadeiras cores da traição. Na África do Sul, Kadalie traiu os trabalhadores nativos ao juntar-se à Internacional de Amesterdão – a organização chauvinista que não passa de uma ferramenta do capitalismo internacional. Nos Estados Unidos, A. P. Randolph filiou a Irmandade das Criadas e dos Carregadores Ferroviários na Federação Americana do Trabalho, organização racista e adepta do regime de Jim-Crow.

Camaradas, o capitalismo está em crise profunda. Os próximos passos são no sentido de organizar as lutas dos trabalhadores, devemos dar aqui resposta a todas estas questões. Devemos erguer o sinal de REVOLTA. Devemos indicar a forma de organizar a luta contra a exploração de classe e a opressão racial, devemos declarar que a nossa luta se integra na luta internacional contra o capitalismo, devemos organizar as nossas forças para esse fim, aprendendo com as lições dos nossos irmãos de classe da Índia da China e dos países capitalistas bem como com os operários e camponeses da União Soviética. Devemos dar especial atenção à questão da nova guerra imperialista especialmente preparada contra a URSS, e ao uso que os capitalistas pretendem fazer dos soldados Negros nesta guerra. A nossa Conferência deve dar uma liderança ativa e apoio à luta dos trabalhadores Negros do mundo inteiro e para o fazer precisamos de indicar tarefas e passos organizativos concretos. Camaradas, se o fizermos, teríamos avançado muito no caminho de conquistar os trabalhadores Negros para a luta internacional contra o capitalismo. O nosso grito de guerra deve ser "ABAIXO O IMPERIALISMO”.