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Havia poucas semanas, Umberto Anastasia tinha sido visto nas salas do aeroporto internacional de Rancho Boyeros e logo depois nos mais diversos locais de Havana, com uma maleta de couro, o chapéu de aba larga, a fita de 3 polegadas, o terno cinza desabotoado e aquele jeito agressivo com que costumava impressionar.
A estada de dom Umberto foi bastante intensa: permaneceu cinco, talvez seis dias e noites, jogando suas fichas nos mais luxuosos cassinos, assistindo às corridas de cavalos e bebendo às vezes alguns tragos em bares conhecidos, sempre na companhia dos mesmos amigos, com os quais saía antes da meia-noite, à procura do cabaré mais esplendoroso do mundo.
Com seus arcos de cristal, o Tropicana era certamente o mais cativante dos refúgios: oferecia suas mulatas de fogo, o bingo da moda com 10 mil pesos para o ganhador, um restaurante com raras e sublimes iguarias e a mais poderosa banca de jogo.
Anastasia insistiu em vender tudo. Desejava degustar cada ideia, cada risco e as resistências que seus projetos poderiam encontrar. Martin Fox recebeu-o com atenções extremadas: fazia questão de que o diretor de Crime S.A. se sentisse como em sua própria casa. Tinha reservado para ele uma das melhores mesas, com o mais eficiente e refinado camareiro e gratas surpresas.
Por aqueles dias, Rodney celebrava o sexto aniversário de seus espetáculos fabulosos. Então, o cabaré mantinha em cartaz trechos de Tambores sobre Havana e alguns quadros de Tropicana Souvenirs. Em Nova York faziam-se os contatos para que o balé Aí Pérolas do Oriente aterrissasse em Boyeros com 25 filipinas encantadoras e três grandes estrelas: Loma Duque, Vivian Thom e Erlinda Cortés. E, como se fosse pouco, anunciava-se o retorno de Nat King Cole, cobrando cinco notas graúdas a cada três canções.
Com sua inconfundível cara leonina — tinha manchas de lepra no rosto —, Roderico Neyra, o Rodney, desatava um turbilhão de tambores e trompetes; e as provocantes mulatas atravessavam pontes, desciam por escadas mágicas e deslizavam através das múltiplas rampas, arrastando fumaças, cheiros, estampidos, clarões, entre luzes e sombras, num paraíso de árvores, palmeiras e flores, sob o esplendor das estrelas.
Naquele ano de 1957 os anfitriões valeram-se de todo tipo de esforços para agradar aos milhares de turistas norte-americanos que queriam beber e dançar, tentar a sorte nos cassinos, cheirar cocaína e divertir-se com as melhores cinturas de Havana, além de qualquer outra fantasia ou preferência, por muito extravagante ou insólita que parecesse. Com a chegada dos endinheirados, os taxistas e os negociantes faziam fila e, como que por encanto, surgia uma legião de carregadores, prostitutas com roupas alinhadas e serventes disponíveis para qualquer coisa.
A Ilha era o paraíso da rumba, das maracas e do rum. Era o reino da tolerância, onde tudo podia ser arranjado com total impunidade, fosse nos verões luminosos e ardentes ou nos meses de inverno, quando os fortíssimos ventos do norte chegavam de surpresa, castigando toda a costa; mas nos hotéis e locais de luxo, indiferente ao que acontecia no resto do mundo, o clima era sempre deliciosamente acolhedor. Por seus palcos desfilavam estrelas em noites quase intermináveis, permeadas por escândalos, cenas maravilhosas e lindas canções.
Mario Garcia (manager e gerente publicitário do Montmartre) transformara-se rapidamente num personagem daquele cabaré a dois passos de La Rampa, fechado por causa da ruidosa morte do coronel Blanco Rico. O chefe dos serviços de inteligência de Batista tinha sido surpreendido e baleado à saída dos elevadores e, como aquilo era algo mais do que se podia tolerar, os cérebros instalados no Hotel Nacional, para evitar impressionar negativamente os turistas, decidiram abafar o assunto.
De imediato, fecharam o cabaré e mandaram o complicado Garcia partir para Caracas, com um show conhecido como As Mil e uma Noites. O espetáculo foi montado pelo eminente Pedrito del Valle e daí em diante as apresentações foram feitas em um dos mais sofisticados cassinos da Venezuela.
Porém, o escândalo mais imprevisível foi o protagonizado pela misteriosa Zizi de Paris. Pouco depois de aparecer em cena, a vedete foi tomada por um grande arrebatamento, devido ao uso exagerado de pó. Foi uma loucura, realmente, que chegou a custar a González Jerez a gerência do Sans Souci, apesar de ele não ter consentido em seu retorno aos palcos.
Foi Rolando Laserie quem começou a cantar depois de ser levado por seus padrinhos até Santo Trafficante Jr.; em seguida, foi promovido, ganhou uma orquestra montada especialmente para ele e uma ruidosa propaganda. Concederam-lhe as maiores facilidades, apesar do seu repertório, que não passava de quatro músicas, para convertê-lo em um dos cantores mais bem pagos da época.
Durante as temporadas, as apostas mais altas concentravam-se no Hipódromo de Havana, cujas noitadas estavam sempre sujeitas a muitas contingências, por causa dos ganhadores e perdedores mais exaltados. Normalmente, os clientes mais gastadores desejavam beber alguma coisa antes do jantar em algum lugar elegante; saíam do Hipódromo ou de uma das salas do Jockey Clube e ordenavam aos motoristas que avançassem pela avenida 51 até chegar às instalações do Sans Souci, com seu teto avermelhado.
O Sevilla Baltimore abria também um espaço muito seleto às portas do Palácio Presidencial. Possuía uma arquitetura grave, e de suas janelas e balcões, através da farta ramagem das árvores do parque, distinguiam-se trechos da mansão palatina. O testa-de-ferro daquele empório era o córsico Amleto Battisti, cabeça das maquinações mais refinadas (já era representante na Câmara). Amleto, além disso, gabava-se de colocar, a cada mês, uma nova remessa de prostitutas à disposição dos hóspedes de seu hotel.
De qualquer forma, para os grandes negócios o futuro de Havana parecia ser ainda mais promissor. A inauguração do luxuoso hotel Capri estava prevista para 15 de novembro, na esquina de N e 21, onde funcionava um extraordinário cassino num salão vermelho requintadíssimo, todo decorado com luminárias, cortinas, sedas e mármores, com muita pompa, além de contar com o atendimento de George Raft. O espetáculo de abertura seria montado por Carlyle, outro afamado coreografo havaneiro.
As apresentações de Naja Kajamura eram igualmente fascinantes. Mostrava as sugestivas danças do Brasil e assinava imediatamente um excelente contrato, para dançar duas vezes por noite, combinando sua sensualidade com um pouco de suspense: a brasileira, no meio da dança, deixava que várias serpentes se enrascassem em seu corpo.
Havia outras estrelas que gozavam de fama excepcional, como a dupla Ana Gloria e Rolando, cujas performances produziam em alguns um prazer quase espiritual. As reações provocadas por aquelas formas femininas! Rolando era o mais experimentado; suas apresentações remontavam a 1944, em um local noctívago conhecido como El Faraon, na zona mais pecaminosa do bairro chinês, antes de associar-se com a estupenda Ana Gloria.
Também Lucy Frabegas revelou-se uma grande sensação. Ela gostava do perfil marino de Havana e acabou instalando-se no Tolly Ho com suas canções. Não desejava voltar a Porto Rico. Havia encontrado na cidade um ambiente propício para a sua voz, de acordo com o seu estilo magistral. Entretanto, à margem de todos os acontecimentos que estremeciam a Ilha, destacou-se o logro de Gaspar Pumarejo: foi ele quem introduziu em Cuba a paixão desmesurada pelos golpes de sorte. Concebeu uma filosofia de falsas esperanças através da televisão. Empregando as técnicas mais modernas, lançou a ideia de que se uma pessoa era suficientemente sagaz, em um ato quase mágico, podia ganhar até 74 mil pesos.
Pouco se sabia então dos negócios secretos entre Pumarejo e don Amadeo Barletta. As pessoas sentiam-se nas nuvens por causa do programa; as chances oferecidas por ele pareciam um sonho. Ainda não se imaginava a grande astúcia que havia por trás daquelas promessas. Surpresas reforçavam a credibilidade do programa. Mas o fato é que as pessoas, depois de responder às perguntas, podiam ou não ficar com o prêmio — não dependia delas, de seus acertos, mas exclusivamente da vontade de Pumarejo. Algo assim ocorreu quando da presença de Pastor Villa. Ele foi apresentado na televisão como um agente de produtos farmacêuticos chegado dos confins de Pinar del Rio, mas como era possível que respondesse a tão diversas e complexas perguntas?
O jogo! Aquele vai-e-vem da sorte! Pumarejo trouxe a Havana até mesmo Marta Ruth, para que exibisse seus encantos teatrais; auxiliado por Otto Sirgo, foi o anfitrião das grandes estrelas de um e de outro continente. No entanto, o que alcançou maior sucesso foi o contrato assinado com Renato Carsone.
Da própria Itália, Carsone chegou a Havana de maneira triunfal. Completara 36 anos e era diretor musical, pianista, compositor e arranjador de um grupo que havia contagiado os cubanos com Marcelino, Pão e Vinho.
As propagandas afirmavam que qualquer um podia descobrir o galo escondido de Cruzellas, com sua torrente incessante de dinheiro, e que o sabão Rina era bom de verdade, dando ganho em quantidade. A ilusão de que um vale-prêmio podia estar escondido entre uma tampa e outra da lata de um produto era reforçada a cada momento:
Cuba — escrevia um cronista de então — havia-se convertido no país das surpresas: no edifício de apartamentos, apertando o tubo que continha o dentifrício; na própria cozinha, esperando que o arroz crescesse e soltasse a bolinha da sorte; ou dentro de um tanque, esfregando a roupa com sabão. Juanita estava no chuveiro, cantando Abrázame Fuerte, quando ganhou uma fortuna. Mas, se você assistisse a uma luta de boxe e começasse a levantar o braço do ganhador e o ganhador fosse exatamente quem estava jogado no chão, nocauteado, você não deveria se surpreender, porque esta ilha é o país das grandes surpresas.(1)
Tudo manipulado. Tudo escamoteado. Construía-se com a mentira o maior dos cultos. Em meio à miséria, colocavam-se em prática as mais diversas variantes do engano; cada vez mais refinado, alentava uma esperança sempre vã. Nos Estados Unidos, em um artigo publicado pelo The New York Times, assinado pelo jornalista R. Hunt Phillips, reconhecia-se:
O jogo ataca em Cuba como uma tempestade. As donas de casa passam a vida recortando cupons e tampas de caixas. Os programas de jogo invadiram a televisão com a força de um furacão tropical. Mesmo os maiores estabelecimentos sucumbiram. Cada cliente recebe um cupom por cada peso que gasta. Ao governo, sorte.(2)
Fazia cinco anos que o general Batista havia-se tornado o dono absoluto do poder. Depois de realizados grandes arranjos, entrou no Acampamento de Colúmbia e instalou em Cuba uma sangrenta tirania; mas, de qualquer forma, certos negócios caminhavam maravilhosamente, sobretudo aqueles que estavam amparados pelos mais sofisticados hotéis, cassinos, restaurantes e cabarés. Na zona do porto, eram cada vez mais sórdidos os locais noturnos. O número de motéis aumentava rapidamente. Não havia um lugar importante na cidade que não contasse com um fornecedor de drogas, uma mesa de jogo, um anotador de jogo e centenas de prostitutas.
Construía-se avidamente; hotéis fascinantes eram inaugurados. Na capital abriam-se novas e bonitas avenidas e levantavam-se edificações destinadas à administração daquele Estado de caráter criminoso e aos centros financeiros. Já se podia inclusive passar por baixo da baía, através do comentado túnel de Havana, que unia a cidade com as praias do leste. Tudo isso em função dos investimentos audazes que a Máfia norte-americana fizera na região da ribeira do Jamainitas até os brancos areais da tão promissora Varadero.
Tudo parecia perfeito naquela Havana de um milhão de habitantes, com milhares de bares, cantinas e pequenos botecos atendidos por uma legião de moças: trabalhavam com uma eficiência notável, consumindo minimamente e proporcionando encontros memoráveis nas mansões reservadas, sempre regidas por célebres matronas.
Tudo organizado. Tudo calculado. Tudo controlado. Marina tornava- se uma figura de singular relevo, enquanto metade da população encontrava-se desamparada: via-se, usualmente, perambulando pelas ruas um exército de mendigos, órfãos, doentes e viciados; em cada esquina encontrava- se uma banca de jogo do bicho, bilhetes de loteria, bingos, o jogo de dados e o sete-e-meio. Abundavam também os traficantes da erva da loucura. O pó, não: era caro demais, só podia ser consumido nos lugares de dinheiro.
Naqueles dias, o calor sobre Havana aumentou furiosamente, mas para o grande Alberto Anastasia a capital cubana estava simplesmente encantadora: os negócios prometiam; a questão era pressionar um pouco mais, para que compreendessem que uma maravilha como aquela não podia ser fechada para quase todos. Além disso, com o que deveria preocupar-se: com prisões? Torturas? Assassinatos? Naquele ano de 1957, depois da prisão, do exílio e do desembarque de Fidel Castro,(3) nem o som dos tambores, que anunciavam a guerra no Oriente, tinha importância. Sabia-se que tinham desembarcado; que tinham sido surpreendidos e quase aniquilados; sabia-se que uns poucos tinham conseguido se reagrupar; e que, sempre em tom de guerra, Fidel se havia encerrado com doze homens nas montanhas da Sierra Maestra.
Foi em meados do ano que se restituíram as garantias. Não era muito, mas abriu-se um breve espaço na censura férrea; em pouco menos de uma semana, os rumores deram lugar a informações seguras. Da mesma forma que os embates de um grande ciclone, as notícias sobre mortos, torturados, tiros e tiroteios não vinham apenas do Oriente. Em Pinar del Rio, o festival do fumo terminou em explosões e chamas; ardia o edifício destinado ao quartel em San Juan y Martinez; noticiavam-se sabotagens, incêndios e explosões em Cienfuegos, Rodas e Camajuani. As estradas do país transformaram-se num mar de pregos, tachinhas e cacos de vidro. Entre Guaimaro e Las Tunas, apareceram os cadáveres de três jovens nas tubulações do esgoto; nos engenhos, centrais açucareiras e casebres, flamulavam bandeiras, slogans e cartazes do “26 de julho”. Em Guantánamo, dois camponeses foram torturados, assassinados e pendurados em uma árvore. Houve queima de canaviais em Gárdenas. Explodiu uma grande bomba no centro de Camaguey, e os campos de Jaronú, Cunagua, Jagueyal, Steward e Ciego de Avila foram incendiados. O exército e a polícia, por outro lado, reprimiam os trabalhadores das estradas-de-ferro de Morón. Dois mortos na estrada de Palma Soriano; sabotagem em Varadero, Banes e Puerto Padre; perto de Mariel, um jovem negro levou dois tiros na cabeça. Uma mãe denunciou que o filho estava sendo destroçado no regimento Leoncio Vidal de Santa Clara, e um policial foi ferido a bala em um parque de Havana. Enquanto isso, no norte da região oriental, o coronel Fermín Cowley declarou-se disposto a erradicar qualquer vestígio de comunistas.
De Havana, segundo despachos dirigidos à Prensa Unida pelo jornalista Francis L. Carthey, o exército de Batista havia concentrado suas tropas contra o grupo de rebeldes, numa espécie de anel de aço que cercava a zona em que se encontravam os guerrilheiros de Fidel.
A imprensa cubana acolheu a nova situação inserindo em suas páginas uma entrevista com o coronel Barreras(4). Da Central Estada Palma, quartel-general das operações do exército, Barreras, chefe militar das tropas, fez sua famosa declaração:
“Estamos aqui e, se os rebeldes se decidirem a topar conosco, liquidaremos o assunto”.
Mas em 27 de julho, duas semanas mais tarde, em uma ação que foi quase um mistério para a ditadura, o nascente Exército Rebelde ocupou as instalações da central. As tropas insurgentes permaneceram 2 horas naquele lugar, tempo mais que suficiente para que se incendiasse o velho quartel da Central Estrada Palma. Em seguida, os rebeldes se retiraram; e, com as primeiras luzes da manhã, os vizinhos começaram a espalhar que antes do início do ataque tinham escutado os gritos do fanfarrão clamando pela guerra(5).
Foi um ano realmente excepcional; mas, para os membros da Máfia norte-americana que operavam desde o Hotel Nacional, os acontecimentos que se produziam no outro extremo da capital cubana não representavam ainda um perigo verdadeiro. Mais que isso, para os que sustentavam o poder, eram mais cativantes os encontros fixados no meio da tarde; aquelas exuberantes festas noturnas que se sucediam em lugares encantadores; ou notícias de diversões com os ídolos de Beverly Hills, Malibu Beach e Bel Air: a ruiva Maureen O’Hara fora surpreendida entalada em três cadeiras de um teatro. O que aconteceu com Robert Mitchum foi ainda mais delirante. Em meio a uma festa, depois de fumar um cigarro de maconha, começou a tirar a roupa e, alegando ser um incompreendido, lambuzou o corpo com uma garrafa de molho e se pôs a gritar que era o mais apetitoso dos hambúrgueres. Contudo, o maior dos desastres foi a confusão em que se viram envolvidas duas personagens de Hollywood: o encontro pecaminoso de Ava, reconhecida por sua natureza de mulher fatal, e Lana, num canto discreto de Palm Beach.
A Máfia tinha planejado tudo. Pouco a pouco, as maiores estrelas de Hollywood marcariam sua presença na esplendorosa Havana(6). O primeiro seria Frank Sinatra (coroou-se naquele ano como um monstro de popularidade), enquanto La Gardner estava para assumir o papel da grande duquesa de Alva.
Durante aquele ano espantoso, a imprensa norte-americana noticiou que o Congresso dos Estados Unidos estaria acumulando provas para prender os principais capos mafiosos; porém, em Cuba, dado um certo conjunto de interesses, destacavam-se personagens como Amleto Battisti y Lora ou dom Amadeo Barletta Barletta. Essas pessoas respondiam por inúmeros negócios impunes, entre o pseudo legal e o reino da malandragem. Nas negociatas mercantis do açúcar sobressaía-se o grande Jules Wolf, e até o escorregadio e astuto Meyer Lansky era tido como um honrado homem de negócios. Luigi Santo Trafficante Jr. não seria a exceção, porque os vínculos e relações da Máfia chegavam até o próprio despacho presidencial(7).
Foi pouco depois do meio-dia que Anastasia apareceu no motel Copacabana. Na realidade, permaneceu naquele lugar quase 3 horas e teve uma discussão virulenta com os interessados; diz-se que estava violento, como sempre, com seus gestos tão temidos; diz-se inclusive que abriu a grande maleta de couro, para que não ficassem dúvidas sobre sua pretensão.
Em seguida, uma imagem sangrenta percorreu com rapidez o mundo: dom Humberto estendido no chão de uma barbearia envidraçada no Hotel Sheraton Park de Nova York. Foi pouco antes das 10 da manhã de 25 de outubro. Os gângsteres (foram dois, com idades entre 30 e 35 anos; estavam vestidos na moda, com chapéus enfeitados com fitas de 3 polegadas, óculos escuros e os rostos cobertos com lenços) entraram pela porta central, atravessaram o lobby, dirigiam-se para a barbearia e se posicionaram ao lado da cadeira número 4, antes de começar a disparar.
Os grupos rivais deixaram dezenas de mortos nas principais cidades norte-americanas; e os serviços especiais americanos estiveram elaborando algumas teses sobre essa guerra mafiosa que estremeceu os Estados Unidos, persuadidos de que na origem de tudo encontravam-se os imensos interesses que estavam em jogo na capital cubana.
Foi uma grande disputa, realmente. Um problema escabroso entre as famílias do Império de Havana e os poderosos grupos mafiosos de Nova York, pois ninguém estava disposto a ser excluído nem marginalizado no fabuloso reparte de Cuba.
Notas de rodapé:
(1) Revista Bohemia,seção "Em Cuba", Havana, 8 de setembro de 1957, pp. 76-77. (retornar ao texto)
(2) Phillips, Hans R., do artigo publicado no The New York Times, em 1957, sobre o jogo em Cuba. (retornar ao texto)
(3) Almeida Bosque, Juan. Presídio, Exílio e Desembarque. Editorial Ciências Sociales. Havana, 1987-1988. (retornar ao texto)
(4) Revista Bohemia, Havana, 14 de junho de 1957, p. 74. (retornar ao texto)
(5) Revista Bohemia, Havana, 4 de agosto de 1957. (retornar ao texto)
(6) Arquivo Nacional de Cuba. Fondo Banco Nacional. Legajo 591 e 526. Números:16 e 7, respectivamente. (retornar ao texto)
(7) Sondem, Frederic Jr. Brotherhood of evil: the mafia (La Mafia). Editorial Brugueras, S.A., Barcelona, 1960, p. 24. (retornar ao texto)