Os pequenos “parafusos” imprescindíveis à máquina partidária

Diógenes Arruda

Janeiro de 1978


Primeira publicação: A Classe Operária, número 122, janeiro de 1978 — São Paulo.

Transcrição e Adaptação: Thales Caramante.

HTML: Fernando Araújo.


Muito pouco se fala sobre os camaradas que no Partido se ocupam das tarefas especiais. Este fato se explica em parte pela rigorosa clandestinidade em que nosso Partido é obrigado a desenvolver sua atividade revolucionária. No entanto, estes devem merecer de todo o coletivo partidário, particularmente dos dirigentes, gratidão e respeito. Eles representam a base de sustentação imprescindível do trabalho partidário, sem a qual seria impossível assegurar a continuidade necessária de nossa atividade revolucionária cotidiana.

Certa vez, numa recepção no Kremlin, após a vitória contra a Alemanha nazista, o camarada Stálin pronunciou breve e surpreendente discurso. Era mais uma saudação que um discurso. Não pretendia dizer coisas extraordinárias nem palavras difíceis. Ao contrário, o que dizia era simples e comum, porém cheio de reconhecimento comunista e de calor revolucionário. Queria brindar àqueles que não tinham galões nem postos dirigentes, queria saudar os camaradas simples e modestos, a quem chamou de os pequenos “parafusos” da imensa máquina do Partido Bolchevique e do Estado Soviético.

“Os pequenos ‘parafusos’ — dizia ele — sem os quais todos nós, dirigentes, marechais e comandantes, muito pouco valemos, pois é suficiente que falte um deles e tudo está perdido. Eu gostaria de beber à saúde das pessoas simples e modestas, destes ‘parafusos’ que asseguram o funcionamento de nossa grande máquina socialista em todos os domínios: ciências, economia, guerra. Eles são milhares e milhares, formam uma legião sobre a qual pouco se tem escrito. Mas estes camaradas são a nossa base de sustentação. Eu bebo à saúde destas pessoas modestas — camaradas merecedores de especial respeito”.

Esta justa homenagem que Stálin rendeu em 1945 aos milhões de simples e modestos camaradas, não fazendo referência a um nome sequer, não pode ser considerada causai nem para um certo momento. Ao contrário, ela é uma homenagem muito significativa e destinada a ficar ao longo do tempo. Aparentemente singelas, são palavras muito ricas de conteúdo marxista-leninista. Exprimem a grande vivência de um velho e experimentado bolchevique, condensam valiosos ensinamentos proletário-revolucionários e têm profundo significado ideológico. É sempre oportuno recordá-las e acentuar sua inestimável importância. E um exemplo leninista de como se deve reconhecer o valor extraordinário da atividade construtiva dos modestos militantes, necessária e imprescindível.

O Partido Comunista do Brasil tem, na sua história de lutas ininterruptas, inúmeros destes camaradas, militantes modestos, comunistas exemplares, heróis anônimos. São camaradas que se ocupam de fazer ligações e de atender pontos de contato. São os responsáveis pelos aparelhos do Partido. São os pesquisadores, os tradutores, os datilógrafos, os que operam com máquinas de impressão. São os que tudo fazem para que A Classe Operária saia sempre regularmente e não deixe de chegar onde é preciso. São os profissionais liberais militantes e amigos do Partido que oferecem com desassombro seus préstimos nos momentos difíceis de um ou outro camarada, salvando, às vezes, a sua própria vida. São os pontos de apoio, aqueles que oferecem generosamente suas casas e seus carros para atender múltiplas necessidades partidárias. São os estafetas e os emissários ou os camaradas designados para abrir novas frentes de trabalho partidário, quase sempre enfrentando grandes dificuldades e suportando pesados sacrifícios. E não somente estes, mas também muitos e muitos outros camaradas, homens e mulheres, velhos e jovens, dedicados às mil tarefas especiais exigidas pela atividade revolucionária multiforme do Partido. Sem contar com a abnegação e a lealdade de tais camaradas, como poderiam funcionar a direção central e as direções dos vários escalões intermediários, na clandestinidade, num imenso país como o Brasil? O que teria sido dos camaradas que, saindo de cidades e de outras regiões brasileiras foram se radicar no Araguaia se não tivessem aprendido os mistérios da selva amazônica com humildes mateiros, caçadores, castanheiros e camponeses que os acompanhavam nas suas caminhadas e os abrigavam nas suas modestas choupanas? Como poderiam atuar com eficiência os dirigentes e comandantes militares da guerrilha do Araguaia sem ajuda de modestos moradores da região amazônica, que os ensinaram a sobreviver nas dificuldades da selva, a encontrar alimentos e refúgios, a caminhar silenciosamente pela mata adentro? Na rigorosa clandestinidade em que atua, como poderia nosso Partido se enraizar e desenvolver sua atividade revolucionária nas fábricas, no campo, nas escolas, em todas as frentes da luta de classes, se não fosse o trabalho cuidadoso, paciente e abnegado dos simples e modestos camaradas que abrem pistas, desbravam caminhos e plantam as nossas sementes revolucionárias entre as massas? Sem estes camaradas nenhuma direção do Partido pode funcionar normalmente nem ser eficaz. Sem eles, como bem disse Stálin, pouco valem os dirigentes, pois seria praticamente impossível assegurar o funcionamento cotidiano do Partido e dar continuidade histórica à sua luta revolucionária.

De uns, sabemos os nomes. De alguns, ficaram apenas os nomes de guerra. De outros, não é fácil nem ao menos identificá-los. Muitos destes camaradas tiveram de deixar seus familiares e suas raízes afetivas, precisaram mudar seus hábitos e costumes a fim de se entregarem inteiramente ao trabalho silencioso e anônimo da atividade partidária e clandestina. Diante da vida partidária exemplar de todos, é nosso dever reverenciá-los com o maior respeito e carinho. Dedicando não só meses, mas anos e anos, às vezes a vida inteira, exclusivamente ao Partido, nunca se desviaram do rumo proletário-revolucionário, empenharam-se de corpo e alma no fiel cumprimento de suas tarefas, com abnegação e amor. Em atividades cheias de dificuldades e riscos, é comovente e admirável que estes camaradas lutem quase com desprezo pela vida. Sempre tendo que observar disciplinarmente os princípios e normas exigidos pela rigorosa clandestinidade em que nosso Partido se vê obrigado a trabalhar, a sua vida não conhece comodidades nem aconchegos, não comporta cálculos pessoais nem ambições ou espera egoísta de promoções, títulos e honrarias. Somente a alegria tranquila do verdadeiro comunista pelo dever cumprido. E dever cumprido no anonimato, pois muitos destes militantes só participam de rápidas e esporádicas discussões e não aparecem nem mesmo em restritas reuniões partidárias, porque estão sempre vinculados apenas a um ou dois camaradas. Muito foi pedido a estes camaradas em nome da vigilância comunista; e eles tudo deram ao Partido de todo o coração, confiantes e dispostos a desempenharem tarefas cada vez mais difíceis, na grandeza silenciosa da clandestinidade revolucionária.

Nos momentos mais duros da vida de nosso Partido, os camaradas que desempenham tarefas especiais foram imprescindíveis e responderam aos apelos da direção partidária com verdadeira generosidade comunista. Não só nas tarefas do trabalho clandestino, mas também nos choques violentos com a repressão militar-policial, estes camaradas estiveram sempre nas primeiras linhas de combate. No passado, muito contribuíram na preparação do movimento armado de 1935 e nos combates da insurreição popular de novembro; no presente, ajudaram na preparação da resistência armada do Araguaia, trabalharam junto às massas camponesas e lutaram heroicamente nas Forças Guerrilheiras. Ontem e hoje foram e são lutadores valorosos em greves e manifestações ou enfrentando corajosamente o odiado inimigo de classe nos cárceres da ditadura ou ainda atuando abnegadamente nas fábricas, no campo, nos bairros, nas escolas. Onde quer que estivessem, estes camaradas souberam manter-se no seu posto de luta e honrá-lo como verdadeiros comunistas. Representaram o grande sustentáculo para o desenvolvimento da atividade revolucionária do Partido, dando inclusive suas vidas com bravura exemplar e grandeza edificante. Não são poucos os exemplos de camaradas, simples militantes, que se agigantam nas prisões e nas câmaras de tortura. Sem dizer uma única palavra, muitos deles ficaram mutilados para sempre ou foram trucidados e morreram, heroicamente, mostrando com a sua bravura e o seu sacrifício como é possível manter sempre bem alto a bandeira vermelha do Partido.

Mesmo sem saber os seus nomes, o Partido Comunista do Brasil reconhecerá sempre o extraordinário valor destes camaradas que souberam com os seus exemplos provar o que significa a grande força moral de suas profundas convicções revolucionárias e a grandeza de ser um verdadeiro comunista. Estes homens e mulheres cuja consciência e sentimentos de Partido se materializaram nas suas vidas, são como elos de aço sem os quais a grande corrente partidária estaria rompida e com os quais ela é inquebrantável. Estes camaradas são nossos heróis anônimos, ficarão na história de nosso Partido como sementes e como modelos. Lênin dizia que sem a energia, o desprendimento e a bravura dos heróis anônimos a revolução e o socialismo não seriam possíveis, sem eles as massas não poderiam conquistar a sua total emancipação de todas as formas de exploração e opressão.

Ao render homenagem aos camaradas que desempenharam ou desempenham tarefas especiais, aos homens e mulheres simples e modestos de nosso Partido, justo é acentuar que suas tarefas, aparentemente pequenas, não só são necessárias, mas também absolutamente indispensáveis. Eles são as pequenas gotas que formam o caudal de luta do povo trabalhador; e nesta corrente, cada gota conta. As tarefas destes camaradas têm imenso valor revolucionário, a grandeza edificante do verdadeiro trabalho comunista.

O valor e a grandeza de uma tarefa não estão na razão direta de sua aparente importância, os pequenos atos são repetidos vezes atos decisivos. Todos os múltiplos e variados trabalhos partidários, se somam num todo único que é o Partido e o Partido somos todos nós juntos, militantes, quadros intermediários e dirigentes superiores, ombro a ombro responsáveis pelos destinos do Partido e de cada passo resoluto dado no caminho que levará à vitória da causa revolucionária da classe operária. Esta compreensão leninista tem a força de uma unidade partidária inquebrantável, monolítica, que nos conduzirá a novos êxitos na nossa caminhada de sentido e dimensões históricas.

A continuidade de nosso Partido não é somente assegurada por sua coerência marxista-leninista, pelo caráter correto de sua linha revolucionária e pelo exemplo proletário-revolucionário de seus dirigentes, mas também pelo abnegado trabalho do coletivo partidário. No final de contas, é ele quem transforma em realidade viva as palavras e diretivas da direção, a qual deve ser sempre a legítima expressão de sua vontade soberana, se observados fielmente os princípios e as normas proletário-revolucionários, leninistas, de Partido.

Se cada comunista tiver presente, na sua opção quotidiana, que é uma gota da grande corrente revolucionária, um “parafuso” imprescindível sem o qual a grande máquina partidária não poderá funcionar, se todos os dirigentes e militantes compreenderem plenamente que em qualquer campo onde estiverem e com qualquer arma que lutarem são partes necessárias e valiosas do exército proletário de vanguarda, marxista-leninista, que vai construir o futuro de nosso país, então o trabalho do Partido crescerá sem limites, irá sempre adiante, levará mais rápido a classe operária e as massas trabalhadoras à vitória da revolução popular rumo ao socialismo e ao comunismo.

Seguindo esta conduta, cada comunista poderá trabalhar e viver, no dia-a-dia, como proletário-revolucionário consequente e resoluto, fiel à causa do Partido e da classe operária, causa que triunfará inevitavelmente.